Lançado em
2011 como forma de facilitar e agilizar o acesso à Justiça, o Processo Judicial
Eletrônico (PJe) tem se mostrado um
problema para as pessoas com deficiência, em especial os deficientes visuais.
Ao invés de auxiliá-los a acessar a Justiça, usuários informam que a mudança
trouxe novas dificuldades.
O tema foi
tratado em audiência realizada hoje entre o presidente em exercício do Supremo
Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski, e o desembargador Ricardo
Tadeu Marques da Fonseca, do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 9ª Região,
único desembargador do Brasil deficiente visual. Em pauta estava a implementação de mudanças no PJe a fim melhorar sua
acessibilidade.
“O PJe apresenta problemas, mas no que diz
respeito às pessoas com deficiência ele é absolutamente hostil”, afirma o
desembargador. Segundo ele, as pessoas
com deficiência visual ou mesmo física ou auditiva utilizam-se de programas de
computador que possibilitam sua atuação. No caso dos cegos, há programas de voz que falam o que está na tela, e
com isso eles podem trabalhar normalmente. O problema é que o sistema do
processo eletrônico “trava” se o usuário estiver utilizando algum programa de
assistência para pessoas com deficiência.
“Em um primeiro momento, quando se anunciou
a generalização do PJe, houve grande expectativa. Mas a frustração foi terrível”,
afirma. Segundo o desembargador, há
1.800 advogados com deficiência visual inscritos na Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB) que não poderão trabalhar caso o Pje seja o único meio de acesso à
Justiça.
Soluções
O desembargador preside comissão do Conselho
Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), que tem por finalidade fazer o PJe
acessível. Por esse meio, foi desenvolvido um sistema que viabiliza o acesso às
pessoas com deficiência visual. “O sistema está em fase experimental, mas é
muito promissor, por isso procurei o ministro Lewandowski, a fim de marcar uma
nova audiência para tratar do assunto oficialmente”, afirma.
O
desembargador observa que a Recomendação 27 do Conselho Nacional de Justiça
(CNJ), de 2009, estabelece que os tribunais devem trabalhar priorizando os
interesses das pessoas com deficiência para tornar o Judiciário acessível. Para
ele, não se trata, no caso da
acessibilidade do PJe, de um problema normativo, mas de colocar em prática a
determinação do próprio CNJ.
Convenção
de Nova York
A comissão
brasileira que participou da elaboração da Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, publicada pela
Organização das Nações Unidas (ONU) em 2006, contou com a participação do
prórpio desembargador Ricardo Tadeu Marques da Fonseca. Ele também trabalhou no Congresso Nacional pela
ratificação do tratado, que foi o primeiro tratado internacional a ser
ratificado no Brasil com status constitucional, nos termos do parágrafo 3º do
artigo 5º da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional nº
45/2004.
De acordo
com Marques da Fonseca, essa convenção
diz, em seu artigo 13, que o Poder Judiciário deve ser totalmente acessível ao
deficiente, e estabelece, em seu artigo 2º, que é discriminatória também a recusa de adaptação.
“Onde ocorre recusa de adaptação ocorre discriminação. É preciso que o CNJ
atente para isso e dê cumprimento à Recomendação 27, para que se adapte e não
crie um cenário de discriminação contra jurisdicionados e profissionais do
direito”, afirma.
História
Marques da
Fonseca é o primeiro juiz cego do Brasil
e o segundo no mundo. Estudou na faculdade de direito da Universidade de São
Paulo (USP), onde também fez mestrado, e tem doutorado pela Universidade
Federal do Paraná (UFPR). Em 1991, tomou posse como procurador do trabalho,
aprovado em concurso público em sexto lugar. Foi empossado no TRT da 9ª Região
em 2009, onde entrou pelo quinto constitucional.
Petições
impressas
Em janeiro, o ministro Ricardo Lewandowski
deferiu liminar no Mandado de Segurança (MS) 32751, a fim de garantir à
advogada cega Deborah Maria Prates Barbosa, inscrita na Ordem dos Advogados do
Brasil seccional do Rio de Janeiro (OAB-RJ), a possibilidade de apresentar
petições, em papel, até que os sites do Poder Judiciário tornem-se
completamente acessíveis em relação ao Processo Judicial Eletrônico (PJe). A
advogada impetrou o MS em seu próprio favor, a fim de restaurar seu direito de
exercer a advocacia com liberdade e independência.
Fonte:
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=272354
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