Espiritualidade:
Carta de Clara Nunes (Psicografia de Chico Xavier -1984)
"Querida
Maria, eu pressentia que o encontro através de notícias seria primeiramente com
você. Somente você teria suficiente disposição para viajar de Caetanópolis até
aqui , no objetivo de atingir o nosso intercâmbio.
Descrever-lhe
o que se passou comigo é impossível agora. Aquela anestesia suave que me fazia
sorrir se transformou numa outra espécie de repouso que me fazia dormir.
Sonhava
com vocês todos e me via de regresso à infância. Cantava. Era uma alegria que
me situava num mundo fantástico. Melodias e cores, lembranças e vozes se
mesclavam e eu me perdia naquele êxtase desconhecido. Não cuidava de mim.
Lembrava-me dos que ficavam, mas ainda não sabia se a mudança seria definitiva.
Conte ao
nosso querido Paulo a minha experiência. Tantos dias no descanso, ignorando o
que vinha a ser tudo aquilo que se apresentava à imaginação por fantasia que
desconhecia como deslindar.
Peço a
você solicitar ao Paulo me perdoe se lhes transmito as presentes notícias com a
fidelidade possível.
Acordei
num barco engalanado de flores, seguida de outras embarcações nas quais muitos
irmãos entoavam hinos que me eram estranhos, hinos em que o amor por Iemanjá
era a tônica de todas as palavras. Os amigos que me seguiam falavam de
libertação e vitória.
Muito pouco a pouco, me conscientizei e passei, da euforia ao pranto de saudade, porque a memória despertava para a vida na retaguarda e o nosso Paulo se fazia o centro de minhas recordações. Queria-o ali naquela abordagem maravilhosa, pois os barcos se abeiravam de certa praia encantadoramente enfeitada de verde nas plantas bravas que a guarneciam.
Muito pouco a pouco, me conscientizei e passei, da euforia ao pranto de saudade, porque a memória despertava para a vida na retaguarda e o nosso Paulo se fazia o centro de minhas recordações. Queria-o ali naquela abordagem maravilhosa, pois os barcos se abeiravam de certa praia encantadoramente enfeitada de verde nas plantas bravas que a guarneciam.
Quando o
barco que me conduzia ancorou suavemente, uma entidade de grande porte se
dirigiu à mim com paternal bondade e me convidou a pisar na terra firme. Ali
estavam o meu pai Manoel e a nossa mãezinha Amélia. Os abraços que nos
assinalavam as lágrimas de alegria pareciam sem fim. Era muita saudade
acumulada no coração.
O conjunto musical de Clara Nunes - Nosso Samba
Ali,
passei ao convívio de meus pais e os meus guardiões retornavam ao mar alto.
Retomei a nossa vida natural e, em companhia de meu pai Manoel, pude rever você
e os irmãos todos, comovendo-me ao abraçar a nossa Valdemira que me pareceu um
anjo preso ao corpo.
Querida
irmã, não disponho das palavras exatas que me correspondam às emoções. Peço a
você reconfortar o nosso Paulo e dizer-lhe que não perdi o sonho de meu
filhinho que nascesse na terra de nossa união e de nosso amor...
O futuro é
luz de Deus. Quem sabe virá para nós uma vida renovada e diferente, na qual
possamos realmente pertencer-nos para as minhas lindas realizações?
Você diga
ao meu poeta e beletrista querido, que estou contente por vê-lo fortalecido e
resistente, exceção feita aos copinhos que ele conhece e que estou vendo agora
um tanto aumentados.
Desejo que
ele saiba que o meu amor pelo esposo e noivo permanente, que ele continua sendo
para mim, está brilhando em meu coração, em meu coração que continua cantando
fora do outro coração que me prendia.
A cigarra,
por vezes, canta com tanta persistência em louvor à Deus e à natureza que se
perde nas cordas que lhe coordenam a cantiga, caindo ao chão desencantada.
O meu
coração da vida física não suportou a extensão das melodias que me faziam viver
e, uma simples renovação para tratamento justo, me fez repousar nas maravilhas
diferentes a que fui conduzida.
Espero que
o nosso Paulo consiga ouvir-me nestas letras.
Agradeço a
ele as atitudes dignas com que me acompanhou até o fim do corpo, tanto quanto
agradeço a você e às nossas irmãs e irmãos o respeito com que me honraram a
memória, abstendo-se de reclamações indébitas junto aos médicos humanitários
que se dispuseram a servir-nos.
Muitas
saudades e lembranças a todos os nossos e pra você um beijo fraternal com
muitas saudades de sua, Clara."
Veja, também, a volta à Terra Natal (Paraopeba/MG):
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