Osmar
Serraglio (PMDB-PR) e Nílson Leitão (PSDB-MT) estariam envolvidos em esquema de
invasão de territórios demarcados
POR VINICIUS
SASSINE E EVANDRO ÉBOLI
BRASÍLIA — A
Justiça Federal do Mato Grosso decidiu enviar para o Supremo Tribunal Federal
(STF) o processo que investiga possível envolvimento
dos deputados federais Osmar Serraglio (PMDB-PR) e Nílson Leitão (PSDB-MT), num
esquema, segundo o Ministério Público Federal em Mato Grosso, de invasão de
terras indígenas e de arrecadação de R$ 30 mil para direcionar parecer na
comissão da Câmara que trata de demarcação de territórios.
Leitão é o
vice-presidente da Comissão Especial da Demarcação de Terras Indígenas, que
discute essa proposta de emenda à Constituição, a PEC 215. Serraglio é o
relator na comissão. Ambos são ligados aos ruralistas.
A decisão de
enviar a investigação ao STF, tribunal que julga autoridades com foro, foi do
juiz federal de Barra do Garça (MT), Cesar Augusto Bearsi, na última
quarta-feira. Ele declinou da competência para julgar o caso.
"Constatou-se o possível envolvimento de deputados federais, qual passa a
ser (o STF) o órgão jurisdicional competente para processar e julgar o feito.
Nesse sentido, a competência para apreciar os fatos e prosseguir com as
investigações em comento é do STF" - disse o juiz Bearsi em seu despacho.
O juiz, assim, atendeu a um pedido do MPF no estado. A Procuradoria Geral da
República irá se manifestar pela abertura ou não de processos contra os dois
deputados no STF.
Escutas, com autorização judicial, obtidas pelo
Ministério Público demonstram, segundo os procuradores, o pagamento de R$ 30
mil ao advogado Rudy Maia Ferraz, que foi ligado à Confederação Nacional de
Agricultura (CNA), e que teria auxiliado Serraglio em seu relatório. A investigação constatou também a presença de um grupo que tentava
ocupar uma terra de índios xavantes empregando ações tidas como criminosas pela
Polícia Federal (PF). Cinco pessoas chegaram a ser presas, em agosto,
suspeitas de comandar as ações. Leitão é
mencionado nos diálogos gravados como o suporte do grupo em Brasília e como
incentivador da ocupação das terras demarcadas.
O relatório de Serraglio está prestes a ser votado
na comissão, o que pode acontecer na próxima terça-feira. O seu texto agrada
aos ruralistas e prevê que será do Congresso Nacional a palavra final sobre a
demarcação de terras indígenas. Hoje, com
base em pareceres da Fundação Nacional do Índio (Funai), o ministro da Justiça
é quem assina a portaria com a demarcação. A decisão final, pelo relatório,
deixará de ser do Executivo e vai para o Legislativo. O governo é contra o
relatório de Serraglio e tentará derrotá-lo, mas tem minoria na comissão. A
proposta ainda tramitará na Câmara e, se aprovada, no Senado.
O Ministério Público no Mato Grosso aponta
que existia uma associação criminosa que atuava no estado. O suposto líder
do grupo, Sebastião Ferreira Prado, flagrado nas gravações telefônicas, alegava
“possuir influência junto a parlamentares federais e membros do Poder
Judiciário”. Num áudio, Sebastião diz que irá “a Brasília essa semana
justamente para falar com Nilson Leitão, que é amigo do desembargador que vai
apreciar a causa”. Sebastião é presidente da Associação dos Produtores Rurais
da Suiá-Missu (Aprosum), principal porta-voz de uma ocupação que ocorreu nas
terra indígena Marãiwatsédé. O líder da associação seria o principal
responsável pela grilagem das áreas.
Em outra
conversa degravada pela Polícia Federal, de 7 de março deste ano, alguns investigados mencionam uma suposta
conversa mantida entre uma pastora – também investigada por incentivar as
ocupações – e o deputado tucano. “A pastora foi lá hoje e disse que conversou
com Nilson Leitão e que o Nilson Leitão falou que é pro povo descer e entrar
pra dentro da área mesmo, que é pra dá força. Que é pra voltar com máquina,
voltar com gado e entrar pra dentro das terras”, cita o diálogo. O deputado
teria pedido, segundo essa conversa, “30 escrituras para ele”. Seriam
escrituras das terras registradas irregularmente por posseiros em cartórios da
região.
Já na
véspera de ser preso, em agosto, Sebastião
planejou o pagamento de R$ 30 mil para influenciar o parecer do deputado Osmar
Serraglio sobre a PEC 215, Gravações telefônicas revelam que o líder da Aprosum
organizava a arrecadação do dinheiro para financiar um relatório que incluiria “coisas
de interesse nosso”. No mesmo dia, a mulher dele, Nailza Rita Bispo, teria
tratado do suposto pagamento ao consultor jurídico da Frente Parlamentar da
Agropecuária, em outra conversa telefônica transcrita pela PF. Num dos grampos,
ela chama o relator de Osmar "Ferralho".
Os R$ 30
mil, conforme os diálogos, seriam repassados ao advogado Rudy Maia Ferraz, que
atua para a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), nome oficial da bancada
ruralista. Rudy já assessorou a CNA no passado, até agosto de 2013. Segundo o
relato de Sebastião, caberia a Rudy a elaboração do parecer na comissão
especial.
Numa
conversa com um homem não identificado pelas investigações, Sebastião cita “o
deputado federal que é relator da PEC 215”. “Quem tá fazendo pra ele a relatoria
é o Rudy, advogado da CNA, que é amigo e companheiro nosso”, diz Sebastião.
“Nós temos que pagar uma assessoria pra ele pra nós colocar as coisas de
interesse nosso. Esse trem custa trinta conto”, afirma.
O MPF, ao
pedir a prisão de Sebastião, aponta como principal razão essa ofensiva sobre a
comissão especial da Câmara. “A conversa
torna irretorquível o fato de que os esforços da associação criminosa
destinavam-se a fazer inserir, no parecer da comissão especial da PEC 215/2000,
'coisas de interesse nosso'”, cita o MPF. A Justiça Federal, na decretação
da prisão preventiva, cita como episódio grave, caso se confirmem as afirmações
das conversas telefônicas, o fato de o relatório da PEC ter sido “supostamente
terceirizado”, o que representa um “desvirtuamento da conduta do parlamentar
responsável pela elaboração da PEC”.
OUTRO LADO
O deputado
Osmar Serraglio classificou a acusação contra ele de "ridícula" e
estranhou o envio do caso ao STF sem que tenha sido ouvido até agora. O
parlamentar negou que Rudy Maia participou da confecção de seu relatório.
— Acho
ridículo isso. Nem conheço o cara que fez essas gravações (Sebastião). Meu
parecer está lá, pronto para ser votado. Quem conhece minha linguagem vai
entender que se trata de uma produção pessoal minha. O relatório que produzi
partiu de decisões do STF sobre a terra Raposa Serra do Sol, as condicionantes
impostas pelo tribunal. Não tem novidade — disse Serraglio ontem ao GLOBO.
— Isso soa
como algo plantado para criar um clima adverso ao parecer. Quem me ajuda são
consultores da Câmara — afirmou o relator.
O deputado
Nilson Leitão disse estar tranquilo com o envio do caso para o STF e não
acredita que a denúncia vá prosperar. Sobre Sebastião, ele afirmou ser um
"cara de bem", mas que é um falastrão.
— Isso que
ele disse não é verdade. Falou besteira. Com a estrutura que a FPA e com os
técnicos da Câmara, não precisa pagar nem R$ 20 mil nem R$ 30 mil para ninguém.
A assessoria técnica da Câmara é de primeiro mundo — disse Leitão, que negou
incentivar invasão de terras indígenas em Mato Grosso.
O advogado
Rudy Ferraz disse ter saído da CNA no início de 2013 e que não advoga para a
Frente Parlamentar da Agropecuária. Ele nega qualquer participação na
elaboração do parecer da PEC 215.
— Foi um
tremendo equívoco. Apenas acompanho o relatório da PEC como advogado. Não tenho
nenhuma relação com Sebastião, já fiz os esclarecimentos à PF — afirmou.
Fonte: http://oglobo.globo.com/brasil/processo-contra-relator-vice-de-comissao-sobre-terras-indigenas-chega-ao-stf-14832331#ixzz3VW4hEk2z
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