Os fundadores da Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade (TFP), um dos mais famosos símbolos do pensamento conservador do país, perderam a batalha judicial pelo comando da entidade – do qual já estavam afastados desde 2003. Nesta terça-feira (27), a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou decisão da Justiça de São Paulo que havia reconhecido o direito de voto nas assembleias da TFP aos sócios não fundadores, fato que permitiu a uma ala dissidente tomar o controle da entidade após uma série de disputas internas.
Por maioria, a Quarta Turma decidiu que todos
os sócios efetivos da TFP devem ser considerados como sócios que, além de
possuir direito a voto, têm também o de convocar, comparecer e participar
efetivamente das assembleias gerais ordinárias e extraordinárias, devendo, para
tal fim, delas ter ciência prévia.
O julgamento do recurso – interposto no STJ
pelo grupo de fundadores – estava interrompido por pedido de vista do ministro
Luis Felipe Salomão. Na sessão de 20 de março, ao trazer o seu voto, o ministro
divergiu do entendimento do ministro João Otávio de Noronha, relator do
processo, que havia votado favoravelmente à pretensão dos sócios fundadores.
O ministro Raul Araújo acompanhou o voto
divergente e a ministra Isabel Gallotti votou com o relator. Nesta terça-feira,
concluiu-se o julgamento com o voto desempate do ministro Antonio Carlos
Ferreira, acompanhando a divergência inaugurada por Salomão.
Segundo Noronha, o direito de voto não é
direito essencial dos associados, de modo que é possível atribuí-lo a apenas
uma ou algumas categorias de associados.
“A interferência dos poderes públicos na
economia interna das associações de fins ideológicos”, afirmou o relator, “deve
ser o mais restrita possível. Não vejo razão jurídica para negar-lhes a
liberdade de estipular os direitos e deveres de associados na forma que melhor
atenda aos fins ideológicos que perseguem, facultando ao estatuto estabelecer
vantagens especiais para alguns dos seus membros e mesmo classe ou classes de
associados sem direito a voto.”
Manutenção oligárquica
Entretanto, para o ministro Salomão,
“verifica-se no estatuto a existência de um feixe de normas tendentes ao
mesmo fim, qual seja, a manutenção oligárquica do poder de comando da sociedade
nas mãos dos sócios fundadores”.
“As regras estatutárias não convivem bem com
os tempos modernos. Com efeito, todas as cláusulas estatutárias objeto da
demanda mostram-se nulas de pleno direito, uma vez que violam frontalmente o
artigo 1.394 do Código Civil”, concluiu Salomão.
Assim, o ministro acolheu o pedido de nulidade
da cláusula restritiva do direito de voto e das demais dela decorrentes,
determinando a invalidação de todas as assembleias realizadas desde dezembro de
1997, início da ação.
Histórico
Criada nos anos 60 sob a liderança de Plinio
Corrêa de Oliveira, a TFP teve destacada atuação na propaganda contra o
comunismo durante o regime militar. Após a morte do líder, em 1995, passou a
viver disputas internas que culminaram na chegada ao poder de um grupo que se
opunha à diretoria, dominada até então pelos sócios fundadores – os únicos que
detinham poder de voto, segundo o estatuto original da entidade.
Os dissidentes – ligados a outra organização
católica tradicionalista, a Arautos do Evangelho – entraram na Justiça, em
1997, pedindo a declaração de nulidade do estatuto da TFP, para que o direito
de voto fosse estendido a não fundadores. Perderam na primeira instância, mas
ganharam no Tribunal de Justiça de São Paulo, em 2001. O processo se arrastou
de recurso em recurso, até que, em 2003, os dissidentes obtiveram da Justiça a
execução provisória da decisão que lhes era favorável.
Com o apoio de associados mais jovens, a ala
dissidente promoveu alterações estatutárias e conseguiu dominar a TFP. Os
antigos dirigentes recorreram ao STJ. Além do uso do nome e dos símbolos da
TFP, a disputa envolve o controle do patrimônio e das contribuições financeiras
que ela recebe de seus colaboradores.
Fonte: STJ
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