Ao repensar as estruturas para a reafirmação da democracia no
pós-guerra, a Organização Internacional do Trabalho – OIT adotou a Convenção nº
87, de 1948, elevando a liberdade sindical a verdadeiro pilar do mundo do
trabalho moderno e democrático.
O Brasil, contudo, é um dos poucos países do Mundo que ainda não
ratificaram essa Convenção.
Nesse cenário, o Seminário "Liberdade sindical e os novos
rumos do sindicalismo no Brasil", organizado pelo Tribunal Superior do
Trabalho – TST, pretende analisar alguns dos principais aspectos do
sistema sindical brasileiro - unicidade sindical, fontes de custeio, direito de
greve e negociação coletiva no serviço público, proteção contra condutas
antissindicais - à luz das diretrizes e experiências internacionais sobre
liberdade sindical, de modo a contribuir para a consolidação dos valores
democráticos universais em nosso país.
A discussão sobre experiências e
propostas inovadoras voltadas para o aprimoramento das relações de trabalho
terão espaço na programação do Seminário sobre Liberdade Sindical e
os Novos Rumos do Sindicalismo no Brasil, que o Tribunal Superior do
Trabalho realizará entre os dias 25 e 27 de abril em sua sede, em Brasília. Um
painel na manhã do dia 27 reunirá o coordenador de projetos da Federação
Internacional dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas (FITIM), Manuel
Campos, e o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Sérgio Nobre, para
discorrer sobre experiências inovadoras de atuação sindical e refletir sobre as
novas perspectivas do sindicalismo no Brasil.
A presença de
lideranças sindicais do setor dos metalúrgicos não é por acaso. A ideia de
convidá-las partiu do presidente do TST, ministro João Oreste Dalazen, que, em
fevereiro, visitou o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (SMABC). O motivo da
visita foi a assinatura do protocolo de adesão do sindicato ao Programa
Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho, mas o presidente do TST
aproveitou também para conhecer a estrutura sindical dos metalúrgicos, que o
deixou bastante impressionado com o modelo de negociação coletiva por meio dos
Comitês Sindicais de Empresa (CSE).
Comitês
sindicais nas empresas
Crítico do
"sindicalismo frágil" atualmente vigente no país, o presidente do TST
viu no modelo praticado no ABC paulista "uma luz no fim do túnel"
para o futuro das relações sindicais. O grande diferencial do sindicato dos
metalúrgicos atende pelo nome de Comitê Sindical de Empresa, ou CSE. Diferente
das chamadas "comissões de fábrica", o CSE faz parte da estrutura
orgânica do sindicato e está previsto em seu estatuto. Para concorrer a um
cargo de direção e fazer parte do colégio que elegerá a executiva do sindicato,
o metalúrgico tem necessariamente de pertencer a um comitê.
Entre várias
atribuições, cabe ao CSE fiscalizar o cumprimento da legislação e dos instrumentos
coletivos, encaminhar reivindicações dos trabalhadores e negociar condições
específicas de trabalho na empresa. É ele também que se encarrega de negociar a
adequação da aplicação da legislação trabalhista à realidade da empresa e à
vontade dos trabalhadores, por meio dos acordos coletivos de trabalho.
Na visita ao
ABC, o ministro Dalazen conheceu o CSE da Mercedes-Benz, do qual é oriundo o
atual presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, Sérgio Nobre. É ao comitê que
os trabalhadores encaminham as mais variadas demandas, e é ele quem negocia
diretamente com a empresa tanto temas de interesse coletivo quanto problemas
individuais.
A inclusão do
CSE no organograma do sindicato, segundo Sérgio Nobre, fortalece a
representatividade da diretoria, ao exigir que os dirigentes estejam ligados
diretamente à base. "Há sindicatos – tanto de trabalhadores quanto
patronais – presididos por pessoas vindas de empresas que fecharam há anos, e
que perderam contato com as necessidades concretas dos trabalhadores", afirma.
"No nosso modelo, não tem como isso acontecer".
Para o
presidente do TST, a existência de um comitê sindical dentro da empresa pode
representar "uma comunicação franca e aberta entre interlocutores sociais
atuando no espaço da empresa em que há o primeiro contato, ou o primeiro
conflito, entre o trabalhador e o chefe". Na fábrica da Mercedes em São
Bernardo – que tem mais de 14 mil empregados -, Dalazen viu "um cultivo
sério e responsável de relações muito proveitosas entre o capital e o trabalho".
A possibilidade
concreta de solução de conflitos e composição de interesses logo no nascedouro
permite, segundo Sérgio Nobre, uma negociação mais forte. "O problema
nasceu ali e é solucionado ali, não vai para o Judiciário", observa.
"Como o trabalhador só recorre à Justiça do Trabalho quando sai da
empresa, o Judiciário repara, mas não resolve. O ideal é que não haja dano a
reparar".
Embora
lembrando a enorme contribuição que as greves, particularmente as do ABC, deram
para a retomada da democracia no país, o sindicalista acredita que, no momento
atual, a greve não é mais demonstração de força. "Moderno é não fazer
greve. Quando há espaço para o entendimento, há menos conflito".
Acordo
Coletivo
O próximo
passo proposto pelos metalúrgicos é a instituição de um mecanismo legal que dê
efetividade às condições negociadas pelos CSEs diretamente com as empresas.
Trata-se do Acordo Coletivo Especial (ACE),
objeto de anteprojeto de lei já encaminhado à Secretaria-Geral da Presidência
da República e à Câmara dos Deputados.
Sérgio Nobre
explica que, apesar da evolução nas relações entre patrões e empregados, o
espaço para negociação ainda é estreito, pois os acordos coletivos têm de se
enquadrar nas condições previstas na legislação trabalhista, especialmente na
CLT – que remonta à década de 40. "Há um descompasso entre alguns aspectos
da legislação e a realidade atual", avalia.
Um exemplo é a
impossibilidade de dividir os 30 dias anuais de férias em períodos menores.
Ainda que trabalhadores e empresas concordem com o fracionamento, um acordo
nesse sentido não teria respaldo legal. "Se alguém – empregado ou
Ministério Público – questionar, a empresa pode ter um passivo trabalhista
enorme", afirma Nobre.
Outro exemplo
são os dois intervalos de meia hora cada, para amamentação, a que a
trabalhadora tem direito até que o filho complete seis meses de idade. Em
alguns acordos e convenções coletivas, trabalhadoras e empresas concordaram em
"trocar" esses intervalos por um prolongamento da
licença-maternidade, que pode chegar a até 15 dias. A CLT, porém, não permite
sua supressão. "Isso enfraquece a negociação coletiva, aumenta a
litigiosidade na Justiça do Trabalho e gera insegurança jurídica", diz
Nobre.
O anteprojeto
elaborado pelo SMABC propõe que um sindicato e uma empresa firmem o que define
como "acordos coletivos de trabalho com propósito específico", com o
objetivo de dar segurança jurídica a essas situações. O texto estabelece
critérios para esse tipo de acordo que visam dar legitimidade às negociações e
proteger os trabalhadores, e a principal delas é que o sindicato possua
representação sindical no local de trabalho, ou seja, que exista um Comitê
Sindical de Empresa. A existência do CSE é requisito para habilitação do
sindicato junto ao Ministério do Trabalho e Emprego: se o comitê for extinto,
perde-se a habilitação e o acordo é denunciado, podendo perder seus efeitos
jurídicos.
Outra
exigência, em termos de representatividade, e a de que no mínimo 50% mais um
dos trabalhadores da empresa têm de ser sindicalizados, e o acordo tem de ser
aprovado, em votação secreta, por pelo menos 60% dos votos apurados. A empresa,
por sua vez, deve reconhecer o CSE e não pode ter pendências judiciais
relativas a decisão condenatória transitada em julgado por restrição ao
exercício de direitos sindicais.
Sérgio Nobre
explica que o anteprojeto não cria nenhuma obrigação, apenas condições para que
profissionais e empregadores avancem nas negociações sempre que isso for
interessante para ambos. "O Estado tem que amparar os mais frágeis, mas
precisa também dar espaço e liberdade para os setores que evoluíram",
conclui.
Seminário
As inscrições
para o Seminário sobre Liberdade Sindical e
os Novos Rumos do Sindicalismo no Brasil estão abertas e podem ser feitas até o
dia 24 de abril, gratuitamente, na área específica do evento disponível no
Portal do TST. O número de vagas é limitado.
(Carmem Feijó)
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