Morreu
nesta quinta-feira (9), aos 79 anos, o polêmico poeta, dramaturgo e ativista
americano Amiri Baraka, considerado "o Malcom X da literatura" e
apontado como precursor do hip hop. Homem das letras e incansável agitador e
militante, ele escreveu poemas influenciados pela cadência do blues e
assertivo, além de peças e críticas. A obra o tornou uma força provocadora e
inovadora da cultura dos Estados Unidos.
Sua agente
literária, Celeste Bateman, afirmou à Associated Press que Baraka, cujo nome
verdadeiro era Everett LeRoi Jones, estava hospitalizado desde dezembro no
hospital Newark Beth Israel Medical Center.
Talvez
nenhum escritor dos anos 1960 e 1970 tenha sido mais radical e polarizador do
que Baraka, e ninguém se esforçou mais para levar usar nas artes os debates
políticos da luta pelos direitos civis. Ele inspirou pelo menos uma geração de
poetas, dramaturgos e músicos, e sua imersão na tradição oral e linguagem crua
das ruas antecipou o rap, o hip-hop e a poesia slam (no orinal "slam
poetry", espécie de batalha de poetas, que usam microfone, nos moldes das
batalhas de MCs).
O FBI o
temia ao ponto de "homenageá-lo" com a seguinte idenfiticação:
"a pessoa que provavelmente emergirá como o líder do movimento panafricano
nos Estados Unidos".
Inicialmente
um dos raros negros a se juntar à caravana Beat de Allen Ginsberg e Jack Kerouac,
Baraka transformou-se num dos líderes do Black Arts Moviment e aliado do
movimento Black Power que rejeitava o otimismo dos primeiros anos da década de
1960. Ele intensificou uma uma divisão sobre como e se os artistas negros
deveriam participar das questões sociais.
Desprezando
a arte pela arte e a busca por uma unidade entre negros e brancos, Baraka
integrou a filosofia que pediu pelo ensino de arte e história negra e que
produziu obras que clamavam declaramente pela revolução.
"Queremos
poemas que matem", escreveu no seu famoso "Black Art", manifesto
publicado em 1965, ano em que ele ajudou a fundar o Black Arts Movement.
"Poemas assassinos. Poemas que disparem feito armas/ Poemas que derrubem
policiais nas vielas/ E tomem suas armas deixando-os mortos/ com línguas de
fora e enviados para a Irlanda".
Ele era
tão eclético quanto prolífico: suas inflências variavam de Ray Bradbury a Mao
Zedong, Ginsberg e John Coltrane, um músico. Baraka escreveu poemas, contos,
novelas, ensaios, peças e críticas musicais e culturais de jazz. Seu livro de
1963 "Blues people" foi considerado a primeira grande história de
música negra escrita por afro-americano.
Um verso
de seu poema "Black people!" – "Up agains the wall mother
fucker" (algo "mão na parede, filho da puta", em tradução
livre") – se converteu num slogan da contracultura. Servia tanto a
estudantes que participavam de protestos quanto à banda de rock Jefferson
Airplane. Um poema que ele escreveu em 2002, alegando que alguns israelenses
tinham conhecimento prévio dos ataques do 11 de Setembro, causou ira
generalizada.
Baraka foi
denunciado por críticos como bufão, homofóbico, antissemita e demagogo. Outros
consideravam-no gênio, profeta e o Malcom X da literatura. Eldridge Clever o
saudou como o bardo dos "assuntos funky". Ishmael Reed
responsabilizou o Black Arts Moviment por encorajar artistas de todas as
origens e permitir a ascensão do multiculturalismo.
O
acadêmico Arnold Rampersad o colocou ao lado de Frederick Douglass e Richard
Wright no pantão das influências culturais dos negros. "Através de Amiri
Baraka, eu aprendi que toda arte é política, embora eu não escreva ensaios
políticos, disse o dramaturgo ganhador do prêmio Pulitzer August Wilson.
Publicado
originalmente nos anos 1950, Baraka fez barulho na cena literária em 1964, no
teatro Cherry Lane, no famoso bairro Greenwich Village, em Nova York, quando a
peça "Dutchman" estrou e imediatamente fez história no auge do
movimento pelos direitos civis. A montagem de um único ato retrata um confronto
entre um homem de classe média negro, Clay, e uma mulher branca sexualmente
ousada, terminando com uma discussão repleta de provocações e confissões.
Baraka
ainda era LeRoi Jones quando escreveu "Dutchman." Mas a Revolução
Cubana, o assassinato de Malcom X em 1965 e as revoltas de Newark em 1967,
quando o poeta foi preso e fotografado atordoado e sangrando, o tornaram
radical. Jones deixou sua esposa (Hettie Chohen), cortou relações com seus
amigos brancos e se mudou do Greenwich Village para o Harlem. Ele trocou o nome
para Imamu Ameer Baraka, "líder espiritual e príncipe abençoado", e
rejeitou Martin Luther King, dizendo que se tratava de um "Negro que
sofreu lavagem cerebral".
O escritor
ajudou a organizar em 1972 a National Black Political Convention e fundou o
Congresso dos Povos Africanos. Também fundou grupos comunitários no Harlem e em
Newark, sua cidade natal, para a qual acabou retornando.
O Black
Arts Moviment teve força, essencialmente até meados da década de 1970, e Baraka
deixou de corresponder a alguns de seus comentários mais duros – sobre Martin
Luther King, sobre os gays e sobre brancos em geral. Mas ele seguiu causando
controvérsia. No início dos anos 1990, quando o cineasta Spike Lee estava
filmando a cinebiografia "Malcom X", Baraka ridicularizou o diretor
como "um pequeno burguês negro", que não fazia jus ao seu personagem.
Em 2002,
respeitado o suficiente para ser tido como laureado poeta de Nova Jersey, ele
chocou de novo com "Somebody blew up America", poema sobre o 11 de
setembro. "Quem sabia que o World Trade Center ia ser 'bombardeado'",
escreveu num verso. "Quem falou aos 4 mil trabalhadores israelenses das
Torres Gêmeas para ficarem em casa naquele dia?"
O
governador James E. McGreevey, assim como outras figuras públicas, exigiram
desculpas. Baraka recusou, negando que "Somebody to blew up" fosse
antissemita (o poema também ataca Hitler e o Holocausto). Ele condenou a
"desonesta, conscientemente distorcida e insultante má interpretação"
a obra.
Fonte:
Panorama
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