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segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

História: O CASO DO SINDICATO MOVA-SE: DECISÃO DO TRT-7ª REGIÃO - MANUTENÇÃO DA JUNTA GOVERNATIVA (Agosto/2013)

Poder Judiciário – TRT-7ª Região – Processo nº 0000077-84.2013.5.07.0017 (RO)
RECORRENTE: JOSE EVALDO RIBEIRO, FLAVIO REMO LIMA VERDE LEITE, MARIA OSMARINA MODESTO SILVA, JOSE AIRTON LUCENA FILHO, CRISTINA MARIA PONTES MAGALHAES, RITA DE CASSIA GOMES DE ARAUJO
RECORRIDO: SINDICATO DOS TRAB NO SERVICO PUBLICO EST DO CE MOVA-SE, MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO - PRT 7ª REGIÃO
RELATOR: DULCINA DE HOLANDA PALHANO
EMENTA: AÇÃO  CIVIL  PÚBLICA.  ELEIÇÕES  SINDICAIS.  INVERVENÇÃO  DA AUTORIDADE  PÚBLICA.  POSSIBILIDADE. Diante  dos  ânimos  exaltados entre  as  chapas  concorrentes,   a  atuação  da  autoridade  pública,   aqui representada  pelo  MPT  e  também  pelo  Poder  Judiciário,   tornou-se imprescindível,  numa tentativa de apaziguar a situação interna do sindicato e garantir um processo eleitoral  justo e democrático,  sem que se possa  falar em  ofensa  ao  princípio  da  liberdade  sindical,   previsto  no  art.   8°  da CF/88. Recurso conhecido, porém improvido.

Detalhes da decisão:
Não vejo qualquer razão aos argumentos dos recorrentes.  A escolha do Dr. Clóvis Renato para proferir determinada palestra em nada desqualifica a  sua  imparcialidade enquanto membro - presidente da Junta Governativa/ Comissão Eleitoral.  Veja-se que o saber jurídico em matéria sindical do mencionado senhor é algo inegável,  diante do curriculum e da prática de que é detentor e,  é normal  que,   para  se  realizar  eventos,   procura-se,   no  mercado,   os  que  mais  têm "know  how"  sobre determinado  assunto,   considerando  a  experiência  profissional  associada  à  titulação  acadêmica,   como ocorreu  no  caso.  Nem mesmo  o  fato  de  se  ter  certificado  quanto  à  inatividade  da COMSINDICAL,   em dezembro de 2012,  altera a  isenção do Dr.  Clóvis,   tendo em  vista que a  consulta ao  site da OAB-CE revela  não  apenas  que  o  Dr.   Thiago  Pinheiro  de Azevedo OAB/CE  19.279  (indicado  como  um  dos membros da Comissão Eleitoral)  figura  como presidente da Comissão de Direito Sindical,  biênio 2013-2015,  o Dr.  Clóvis Renato Costa Farias OAB/CE 20.500,  como 1° vice- presidente,  mas  também que o signatário do recurso ordinário,  o Dr. Rodrigo Rocha Gomes de Loiola OAB/CE 20.082,  ocupa a Diretoria da referida Comissão como 2° vice- presidente.
Ora,  o que parece,  é que,  em detrimento de brilhantismos pessoais,  estar-se, em verdade,  dissipando  interesses coletivos,  em especial a  representação sindical,  constitucionalmente garantida no art.  8° da Constituição Federal de 1988.  Nesse sentido,  vale a  transcrição dos ensinos de Amauri Mascaro Nascimento (Compêndio de Direito Sindical,  2005,  pág.188/189):
"Que  é  representação  sindical?  Representar  quer  dizer  pôr-se  a  frente  de  alguém.
Representante é aquele que atua em nome de outrem, para quem age, defendendo os seus interesses. O sindicato é o representante. Determinar a natureza do vínculo entre o sindicato e o grupo que representa é questão que comporta mais de uma posição.
A  doutrina  sublinha  a  importância  da  diferença  entre  representação  e  representatividade.
Aquela  é  uma  questão  de  legalidade,  esta,  um  problema  de  legitimidade.  Pode  um sindicato  ter a  representação  legal, mas não a  real e efetiva. Nesse caso, é possível dizer que falta representatividade ao sindicato, embora portador dos poderes legais de atuar em nome dos representados. (...)"
Aqui,   nem  se  tem  representação  nem  mesmo  representatividade,   por  se estar  diante  de  um  ente  sindical  acéfalo.   Veja-se  que  o  caos  instaurado  continua  a  existir,   mesmo passado mais de seis meses da primitiva ordem judicial,  datada de janeiro deste ano,  revelando que após mais de uma  tentativa de  realização de eleição para composição da Diretoria do Sindicato Mova-se,  o quórum  de  participantes  fica  bem  aquém  daquele  exigido  pelo  estatuto  da  entidade  sindical.   Isso  é bastante  preocupante,   pois  o  desinteresse  dos  associados  revelam,   no,   mínimo,   a  ausência  de  solidariedade/corporativismo  entres  os  participantes  a  fim  de  lutarem  por  seus  próprios  interesses, sentimento  gerado,   quem  sabe,   pelo  fato  de  um  pequeno  grupo  pretender  perpetuar-se  no  poder, a qualquer custo.
Também não merece prosperar o argumento de que houve desrespeito ao princípio da liberdade sindical,  pois de acordo com o que sustentam os recorrentes,  a nomeação da Junta Governativa foi imposta e não passou pelo crivo da categoria.  Ao contrário,  conforme provado nos autos, a  constituição  da  referida  Junta  foi  realizada  em  comum  acordo  entres  as  chapas  disputantes, administrativamente,   perante  o  Ministério  Público  do  Trabalho.   Ocorre  que,   em  razão  de descontentamentos dos integrantes da chapa 1,  que foram os primeiros a buscarem respaldo do MPT,  ora recorrentes,  estes  resolveram convocar assembleia geral,  em verdadeiro descompasso ao Estatuto da entidade sindical,  atropelando o acordado perante o MPT ,  a fim de definir uma chapa única,  formada por eles próprios,  bem como para realizar as eleições.  Então,  o Parquet ingressou com a presente ACP a fim de garantir a realização do processo eleitoral,  através da Junta Governativa/ Comissão Eleitoral - de modo a assegurar a transparência e a democracia no pleito.
Ora,  veja-se,  se até hoje,  repise-se,  decorrido mais de seis meses,  ainda há disputas  individualistas e,  por que não dizer,  egoístas,  em busca de uma vaga na Diretoria do Sindicato Mova-se,   imagine  se não houvesse a  intermediação do Órgão Ministerial,   inclusive  como custus  legis, através da  indicação a Junta Governativa/Comissão Eleitoral,   tal qual acatada na sentença de primeiro grau.  Ao que parece,  os recorrentes só enxergam a liberdade sindical quando os seus interesses estejam satisfeitos,  o que é vedado pelo ordenamento jurídico,  quando estabelece o papel dos sindicatos,  em prol da coletividade que representa,  conforme disposto nos artigos 513 e 514 da CLT,verbis:
"Art. 513. São prerrogativas dos sindicatos :
a) representar, perante as autoridades administrativas e  judiciárias os  interesses gerais da respectiva categoria ou profissão liberal ou interesses individuais dos associados relativos á atividade ou profissão exercida;
b) celebrar contratos coletivos de trabalho;
c)  eleger  ou  designar  os  representantes  da  respectiva  categoria  ou  profissão liberal;
d)  colaborar  com  o  Estado,  como  órgãos  técnicos  e  consultivos,  na  estudo  e solução  dos  problemas  que  se  relacionam  com  a  respectiva  categoria  ou profissão liberal;
e)  impor  contribuições  a  todos  aqueles  que  participam  das  categorias  econômicas  ou profissionais ou das profissões liberais representadas. (...)
Art. 514. São deveres dos sindicatos :
a)  colaborar  com  os  poderes  públicos  no  desenvolvimento  da  solidariedade social;
b) manter serviços de assistência judiciária para os associados;
c) promover a conciliação nos dissídios de trabalho.
d) sempre que possível, e de acordo com as suas possibilidades, manter no seu quadro de pessoal,  em  convênio  com  entidades  assistenciais  ou  por  conta  própria,  um  assistente social com as atribuições específicas de promover a cooperação operacional na empresa e a integração profissional na Classe. " (grifo nosso).
No  âmbito  internacional,   o  direito  à  livre  associação  e  a  liberdade  sindical também  são  assegurados,   como  se  extrai  dos  arts.   8°  e  9°  da Declaração Sociolaboral  do Mercosul, verbis:
"DIREITOS COLETIVOS
Liberdade de associação
Art. 8º Todos os empregadores e  trabalhadores  têm o direito de constituir as organizações que  considerem  convenientes,  assim  como  de  afiliar-se  a  essas  organizações,  em conformidade com as legislações nacionais vigentes.
Os Estados Partes comprometem-se a assegurar, mediante dispositivos legais, o direito à livre  associação, abstendo-se  de  qualquer  ingerência  na  criação  e  gestão  das organizações  constituídas,  além  de  reconhecer  sua  legitimidade  na  representação  e  na defesa dos interesses de seus membros.
Liberdade sindical
Art.  9º  Os  trabalhadores  deverão  gozar  de  adequada  proteção  contra  todo  ato  de discriminação tendente a menoscabar a liberdade sindical com relação a seu emprego.
Deverá garantir-se:
a)  a  liberdade  de  filiação,  de  não  filiação  e  desfiliação,  sem  que  isto  comprometa  o ingresso em um emprego ou sua continuidade no mesmo;
b) evitar demissões ou prejuízos a um trabalhador por causa de sua filiação sindical ou de sua participação em atividades sindicais;
c) o direito de ser representado sindicalmente, de acordo com a legislação, acordos e convênios coletivos de trabalho em vigor nos Estados Partes." (grifo nosso).
A própria Convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho,  embora
não  ratificada  pelo Brasil,   traz  diretrizes  a  serem  observadas  no Direito Sindical,   por  refletirem  valores constantes no texto constitucional de 1988.  Vejamos:
"Art.  2  Os  trabalhadores  e  os  empregadores,  sem  distinção  de  qualquer  espécie,  terão direito de constituir , sem autorização prévia, organizações de sua escolha, bem como o  direito  de  se  filiar  a  essas  organizações,  sob  a  única  condição  de  se  conformar com os estatutos das mesmas.
Art. 3 1. As organizações de  trabalhadores e de empregadores  terão o direito de elaborar
seus  estatutos  e  regulamentos  administrativos, de  eleger  livremente  seus
representantes,  de  organizar  a  gestão  e  a  atividade  dos  mesmos  e  de  formular  seu
programa de ação.
Art. 8 1. No exercício dos direitos que  lhe são  reconhecidos pela presente convenção, os  trabalhadores,  os  empregadores  e  suas  respectivas  organizações  deverão  da mesma  forma que outras pessoas ou coletividades organizadas,  respeitar a  lei." (grifo nosso).

A  princípio,   poderia  parecer  que  a  intervenção  do  Ministério  Público,   ou melhor  da  Junta  Governativa/Comissão  Eleitoral,   representasse  uma  ingerência  no  sindicato, incompatibilizando o direito dos associados de eleger livremente os seus representantes.  Nem de longe é essa a situação dos autos.   Isso porque,  diante dos ânimos exaltados entre as chapas concorrentes,  a atuação da autoridade pública,  aqui  representada pelo MPT e  também pelo Poder Judiciário,   tornou-se imprescindível,   numa  tentativa  de  apaziguar  a  situação  interna  do  sindicato  e  garantir  um  processo eleitoral justo e democrático.
Ora,  é de  reconhecida  relevância o papel do Parquet,  entidade essencial à função jurisdicional do Estado,  a quem incumbe a defesa da ordem jurídica,  do regime democrático e dos interesses sociais e  individuais  indisponíveis  (Art.127,  CF/88).  O Ministério Público do Trabalho,  por sua vez,   define  a  liberdade  sindical  entre  suas  prioridades  da  atuação,   através  da  CONALIS,   criada  pela portaria PGT n° 211 de 28/05/2009,  além de possuir a missão  institucional de  fortalecer os sindicatos e coibir os atos atentatórios ao exercício satisfatório da liberdade sindical.
Nesse contexto,  é importante ressaltar as orientações da OIT que permitem, em situações excepcionais,  como é o caso,  a  intervenção das autoridades públicas no  funcionamento interno das organizações de trabalhadores,  com único escopo de garantir o funcionamento democrático de tais entes e salvaguardar os interesses dos seus membros:
Verbete  331:  "Disposições  legislativas  que  regulam  detalhadamente  o  funcionamento interno das organizações de trabalhadores e de empregadores envolvem graves riscos de ingerência  pelas  autoridades  públicas.  No  caso  de  sua  adoção  ser  considerada indispensável  pelas  autoridades,  estas  disposições  deveriam  limitar-se  a  estabelecer  um limite  geral,  deixando  às  organizações  a  maior  autonomia  possível  para  reger  seu funcionamento  e  administração. As  restrições  a  este  princípio  deveriam  ter  como únicos  objetivos  garantir  o  funcionamento  democrático  das  organizações  e salvaguardar  os  interesses  de  seus membros. Por  outra  parte,  deveria  ser  previsto recurso a órgão  judiciário,  imparcial e  independente, para evitar  todo  risco de  ingerência excessiva e arbitrária no livre funcionamento das organizações."
Verbete  339:  "É  admissível  a  existência  de  disposições  que  tenham  por  finalidade promover  os  princípios  democráticos  no  seio  das  organizações  sindicais.  A  votação secreta  e  direta  é  uma  das  modalidades  democráticas  e,  nesse  sentido,  não  seria objetável."
Verbete 350:  "A  liberdade sindical  implica o direito de  trabalhadores e empregadores de escolher livremente seus representantes."
Verbete  361:  "Não  há  violação  dos  princípios  da  liberdade  sindical  quando  a legislação  contém  algumas  regras  com  a  finalidade  de  promover  os  princípios democráticos  no  seio  das  organizações  sindicais  ou  então garantir  o desenvolvimento normal do processo eleitoral,respeitados os direitos dos membros, a fim de evitar qualquer conflito no que tange ao resultado das eleições."
Verbete 366:  "Nos casos de serem  impugnados os  resultados de eleições sindicais, estas questões deveriam ser submetidas às autoridades judiciais que deveriam garantir processo imparcial, objetivo e rápido."(grifo nosso).
Há,   ainda,   verbetes  que  atribuem  ao  Poder  Judiciário  emitir  decisões,   em caso  de  conflito  interno  no  sindicato,   com  a  missão  de  concretizar  os  direitos  fundamentais  do trabalhadores,  ao garantir eleições imparciais e objetivas,  como se pretendeu fazer,  no caso em análise, ao se estabelecer uma Comissão Eleitoral/ Junta Governativa.  Vejamos:
Verbete 394:  "Com  relação a um conflito  interno no seio da organização sindical entre duas  direções  rivais,  o  Comitê  lembrou  que, para  garantir  a  imparcialidade  e  a objetividade do processo, conviria que o controle das eleições sindicais ficasse a cargo de autoridades judiciárias competentes."
Verbete  405:  "Nos  casos  em  que  sejam  impugnados  os  resultados  de  eleições  sindicais, estas  questões  deveriam  ser  submetidas  às  autoridades  judiciais  que  deveriam garantir um processo imparcial, objetivo e rápido."
Verbete 406: "A fim de evitar o perigo de graves limitações ao direito dos trabalhadores de eleger  livremente  seus  representantes,  os  casos  submetidos  aos  tribunais  por  autoridades administrativas,  que  não  aceitam  os  resultados  de  eleições  sindicais,  não  deveriam  -  ao aguardo  do  resultado  definitivo  do  processo  judicial  -  paralisar  o  funcionamento  das organizações sindicais."
Verbete  413:  "Mesmo  reconhecendo  que  alguns  fatos  se  revestiam  de  um  caráter muito excepcional e  tinham podido  justificar uma  intervenção das autoridades, o Comitê achou que, para  ser  admissível,  a  intervenção  do  sindicato,  tal  como  havia  sido executada,  deveria  ser  rigorosamente  provisória  e  ter  como  objetivo  exclusivo permitir a organização das eleições livres." (grifo nosso).
[...]
Destarte,  diante da evidente "fraqueza sindical",  a solução acolhida pelo juízo a  quo  não  poderia  ter  sido  melhor,   razão  pela  qual  resta  inteiramente  mantida.   É  essencial  que  os trabalhadores  possam  exercer  o  direito  de  eleger  livremente  seus  representantes,   pois  é  pressuposto básico  para  a  atuação  efetiva  e  independente  de  suas  organizações.   E  cabe  ao  Judiciário,   nesse contexto,   afirmar  os  direitos  fundamentais  dos  trabalhadores,   em  especial  no  que  tange  à  liberdade sindical,  permitindo,  na prática,  a  lisura processo eletivo,  em observância aos pilares de uma verdadeira Democracia.
ACORDAM OS INTEGRANTES DA 1ª TURMA DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA  7ª REGIÃO,   por  unanimidade,   conhecer  do  recurso  interposto  e,   no mérito,   negar-lhe provimento.

DULCINA DE HOLANDA PALHANO
Relator

Um comentário:

Anônimo disse...

Colegas ADVOGADOS, estamos precisando muito de DEMOCRACIA no Brasil e em suas instituições privadas, especialmente as que se divulgam como defensoras da sociedade, mas, infelizmente, camuflam pequeno-grandes ditadores que se utilizam de incontáveis artifícios para ludibriar os representados. Tudo bem diante do Neoconstitucionalismo, porém, esquecendo completamente princípios e regras fundamentais como a ampla defesa, o contraditório, o respeito à imagem e a dignidade da pessoa humana... Tudo engendrado com o intuito de proteger a imagem pessoal e os interesses particulares, esquivando-se, inclusive, de tomar o cuidado de observar o teor de decisões de Tribunais, transitadas em julgado, como a apresentada neste post. O pior é que levam nos seus desvarios a imagem das instituições, que ainda conseguem ocupar o imaginário de esperança do povo na busca por um mundo mais livre, justo e solidário. Minhas saudações! Por vezes lembro das aulas de hermenêutica e de ética que tinha com o Prof. Marcelo Uchôa, que bom que juntássemos pessoas que pudessem resgatar nossos sonhos. DEUS EM TODAS AS CAUSAS E DIANTE DE TUDO PARA FAZER JUSTIÇA!