Poder
Judiciário – TRT-7ª Região – Processo nº 0000077-84.2013.5.07.0017 (RO)
RECORRENTE:
JOSE EVALDO RIBEIRO, FLAVIO REMO LIMA VERDE LEITE, MARIA OSMARINA MODESTO
SILVA, JOSE AIRTON LUCENA FILHO, CRISTINA MARIA PONTES MAGALHAES, RITA DE
CASSIA GOMES DE ARAUJO
RECORRIDO:
SINDICATO DOS TRAB NO SERVICO PUBLICO EST DO CE MOVA-SE, MINISTÉRIO PÚBLICO DO
TRABALHO - PRT 7ª REGIÃO
RELATOR:
DULCINA DE HOLANDA PALHANO
EMENTA:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
ELEIÇÕES SINDICAIS. INVERVENÇÃO
DA AUTORIDADE PÚBLICA. POSSIBILIDADE. Diante dos
ânimos exaltados entre as
chapas concorrentes, a
atuação da autoridade
pública, aqui representada pelo
MPT e também
pelo Poder Judiciário,
tornou-se imprescindível, numa
tentativa de apaziguar a situação interna do sindicato e garantir um processo
eleitoral justo e democrático, sem que se possa falar em
ofensa ao princípio
da liberdade sindical,
previsto no art.
8° da CF/88. Recurso conhecido,
porém improvido.
Detalhes da decisão:
Não vejo
qualquer razão aos argumentos dos recorrentes.
A escolha do Dr. Clóvis Renato para proferir determinada palestra em
nada desqualifica a sua imparcialidade enquanto membro - presidente
da Junta Governativa/ Comissão Eleitoral.
Veja-se que o saber jurídico em matéria sindical do mencionado senhor é
algo inegável, diante do curriculum e da prática de que é
detentor e, é normal que,
para se realizar
eventos, procura-se, no
mercado, os que
mais têm "know
how" sobre determinado assunto,
considerando a experiência
profissional associada à
titulação acadêmica, como ocorreu
no caso. Nem mesmo
o fato de
se ter certificado
quanto à inatividade
da COMSINDICAL, em dezembro de
2012, altera a isenção do Dr. Clóvis,
tendo em vista que a consulta ao
site da OAB-CE revela não apenas
que o Dr.
Thiago Pinheiro de Azevedo OAB/CE 19.279
(indicado como um dos
membros da Comissão Eleitoral)
figura como presidente da
Comissão de Direito Sindical, biênio
2013-2015, o Dr. Clóvis Renato Costa Farias OAB/CE
20.500, como 1° vice- presidente, mas
também que o signatário do recurso ordinário, o Dr. Rodrigo Rocha Gomes de Loiola OAB/CE
20.082, ocupa a Diretoria da referida
Comissão como 2° vice- presidente.
Ora, o que parece,
é que, em detrimento de
brilhantismos pessoais, estar-se, em
verdade, dissipando interesses coletivos, em especial a
representação sindical,
constitucionalmente garantida no art.
8° da Constituição Federal de 1988.
Nesse sentido, vale a transcrição dos ensinos de Amauri Mascaro
Nascimento (Compêndio de Direito Sindical,
2005, pág.188/189):
"Que é
representação sindical? Representar
quer dizer pôr-se
a frente de
alguém.
Representante é aquele
que atua em nome de outrem, para quem age, defendendo os seus interesses. O
sindicato é o representante. Determinar a natureza do vínculo entre o sindicato
e o grupo que representa é questão que comporta mais de uma posição.
A doutrina
sublinha a importância
da diferença entre
representação e representatividade.
Aquela é
uma questão de
legalidade, esta, um
problema de legitimidade.
Pode um sindicato ter a
representação legal, mas não
a real e efetiva. Nesse caso, é possível
dizer que falta representatividade ao sindicato, embora portador dos poderes
legais de atuar em nome dos representados. (...)"
Aqui, nem
se tem representação
nem mesmo representatividade, por
se estar diante de
um ente sindical
acéfalo. Veja-se que
o caos instaurado
continua a existir,
mesmo passado mais de seis meses da primitiva ordem judicial, datada de janeiro deste ano, revelando que após mais de uma tentativa de
realização de eleição para composição da Diretoria do Sindicato
Mova-se, o quórum de
participantes fica bem
aquém daquele exigido
pelo estatuto da
entidade sindical. Isso
é bastante preocupante, pois
o desinteresse dos
associados revelam, no,
mínimo, a ausência
de solidariedade/corporativismo entres
os participantes a fim de
lutarem por seus
próprios interesses, sentimento gerado,
quem sabe, pelo
fato de um
pequeno grupo pretender
perpetuar-se no poder, a qualquer custo.
Também não
merece prosperar o argumento de que houve desrespeito ao princípio da liberdade
sindical, pois de acordo com o que
sustentam os recorrentes, a nomeação da
Junta Governativa foi imposta e não passou pelo crivo da categoria. Ao contrário,
conforme provado nos autos, a constituição
da referida Junta
foi realizada em
comum acordo entres
as chapas disputantes, administrativamente, perante
o Ministério Público
do Trabalho. Ocorre
que, em razão
de descontentamentos dos integrantes da chapa 1, que foram os primeiros a buscarem respaldo do
MPT, ora recorrentes, estes
resolveram convocar assembleia geral,
em verdadeiro descompasso ao Estatuto da entidade sindical, atropelando o acordado perante o MPT , a fim de definir uma chapa única, formada por eles próprios, bem como para realizar as eleições. Então,
o Parquet ingressou com a
presente ACP a fim de garantir a realização do processo eleitoral, através da Junta Governativa/ Comissão
Eleitoral - de modo a assegurar a transparência e a democracia no pleito.
Ora, veja-se,
se até hoje, repise-se, decorrido mais de seis meses, ainda
há disputas individualistas e, por que não dizer, egoístas,
em busca de uma vaga na Diretoria do Sindicato Mova-se, imagine
se não houvesse a intermediação
do Órgão Ministerial, inclusive como custus legis, através da indicação a Junta Governativa/Comissão
Eleitoral, tal qual acatada na sentença
de primeiro grau. Ao que
parece, os recorrentes só enxergam a liberdade sindical quando os seus
interesses estejam satisfeitos, o que é
vedado pelo ordenamento jurídico, quando
estabelece o papel dos sindicatos, em
prol da coletividade que representa,
conforme disposto nos artigos 513 e 514 da CLT,verbis:
"Art. 513. São
prerrogativas dos sindicatos :
a) representar, perante
as autoridades administrativas e
judiciárias os interesses gerais
da respectiva categoria ou profissão liberal ou interesses individuais dos associados
relativos á atividade ou profissão exercida;
b) celebrar contratos
coletivos de trabalho;
c) eleger
ou designar os
representantes da respectiva
categoria ou profissão liberal;
d) colaborar
com o Estado,
como órgãos técnicos
e consultivos, na
estudo e solução dos
problemas que se
relacionam com a
respectiva categoria ou profissão liberal;
e) impor
contribuições a todos
aqueles que participam
das categorias econômicas
ou profissionais ou das profissões liberais representadas. (...)
Art. 514. São deveres
dos sindicatos :
a) colaborar
com os poderes
públicos no desenvolvimento da
solidariedade social;
b) manter serviços de
assistência judiciária para os associados;
c) promover a
conciliação nos dissídios de trabalho.
d) sempre que possível,
e de acordo com as suas possibilidades, manter no seu quadro de pessoal, em
convênio com entidades
assistenciais ou por
conta própria, um
assistente social com as atribuições específicas de promover a cooperação
operacional na empresa e a integração profissional na Classe. " (grifo
nosso).
No âmbito
internacional, o direito
à livre associação
e a liberdade
sindical também são assegurados,
como se extrai
dos arts. 8°
e 9° da Declaração Sociolaboral do Mercosul, verbis:
"DIREITOS COLETIVOS
Liberdade de associação
Art. 8º Todos os
empregadores e trabalhadores têm o direito de constituir as organizações que considerem
convenientes, assim como
de afiliar-se a
essas organizações, em conformidade com as legislações nacionais
vigentes.
Os Estados Partes
comprometem-se a assegurar, mediante dispositivos legais, o direito à livre associação, abstendo-se de
qualquer ingerência na
criação e gestão
das organizações
constituídas, além de
reconhecer sua legitimidade
na representação e na defesa
dos interesses de seus membros.
Liberdade sindical
Art. 9º
Os trabalhadores deverão
gozar de adequada
proteção contra todo
ato de discriminação tendente a
menoscabar a liberdade sindical com relação a seu emprego.
Deverá garantir-se:
a) a
liberdade de filiação,
de não filiação
e desfiliação, sem
que isto comprometa
o ingresso em um emprego ou sua continuidade no mesmo;
b) evitar demissões ou
prejuízos a um trabalhador por causa de sua filiação sindical ou de sua
participação em atividades sindicais;
c) o direito de ser
representado sindicalmente, de acordo com a legislação, acordos e convênios
coletivos de trabalho em vigor nos Estados Partes." (grifo nosso).
A própria
Convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho, embora
não ratificada
pelo Brasil, traz diretrizes
a serem observadas
no Direito Sindical, por refletirem
valores constantes no texto constitucional de 1988. Vejamos:
"Art. 2
Os trabalhadores e os empregadores,
sem distinção de
qualquer espécie, terão direito de constituir , sem autorização
prévia, organizações de sua escolha, bem como o
direito de se
filiar a essas
organizações, sob a
única condição de
se conformar com os estatutos das
mesmas.
Art. 3 1. As
organizações de trabalhadores e de
empregadores terão o direito de elaborar
seus estatutos
e regulamentos administrativos, de eleger
livremente seus
representantes, de
organizar a gestão
e a atividade
dos mesmos e de formular
seu
programa de ação.
Art. 8 1. No exercício
dos direitos que lhe são reconhecidos pela presente convenção, os trabalhadores, os
empregadores e suas respectivas
organizações deverão da mesma
forma que outras pessoas ou coletividades organizadas, respeitar a
lei." (grifo nosso).
A princípio,
poderia parecer que a intervenção
do Ministério Público,
ou melhor da Junta
Governativa/Comissão
Eleitoral, representasse uma
ingerência no sindicato, incompatibilizando o direito dos
associados de eleger livremente os seus representantes. Nem de
longe é essa a situação dos autos. Isso
porque, diante dos ânimos exaltados
entre as chapas concorrentes, a atuação
da autoridade pública, aqui representada pelo MPT e também pelo Poder Judiciário, tornou-se imprescindível, numa
tentativa de apaziguar
a situação interna
do sindicato e
garantir um processo eleitoral justo e democrático.
Ora, é de
reconhecida relevância o papel do
Parquet, entidade essencial à função jurisdicional do
Estado, a quem incumbe a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses
sociais e individuais indisponíveis
(Art.127, CF/88). O Ministério Público do Trabalho, por sua vez,
define a liberdade
sindical entre suas
prioridades da atuação,
através da CONALIS,
criada pela portaria PGT n° 211
de 28/05/2009, além de possuir a
missão institucional de fortalecer os sindicatos e coibir os atos
atentatórios ao exercício satisfatório da liberdade sindical.
Nesse
contexto, é importante ressaltar as orientações da OIT que permitem, em
situações excepcionais, como é o
caso, a
intervenção das autoridades públicas no
funcionamento interno das organizações de trabalhadores, com único escopo de garantir o funcionamento
democrático de tais entes e salvaguardar os interesses dos seus membros:
Verbete 331:
"Disposições
legislativas que regulam
detalhadamente o funcionamento interno das organizações de
trabalhadores e de empregadores envolvem graves riscos de ingerência pelas
autoridades públicas. No
caso de sua
adoção ser considerada indispensável pelas
autoridades, estas disposições
deveriam limitar-se a
estabelecer um limite geral,
deixando às organizações
a maior autonomia
possível para reger
seu funcionamento e administração. As restrições
a este princípio
deveriam ter como únicos
objetivos garantir o
funcionamento democrático das organizações e salvaguardar os
interesses de seus membros. Por outra
parte, deveria ser previsto recurso a órgão judiciário,
imparcial e independente, para
evitar todo risco de
ingerência excessiva e arbitrária no livre funcionamento das organizações."
Verbete 339:
"É admissível a existência
de disposições que
tenham por finalidade promover os
princípios democráticos no
seio das organizações
sindicais. A votação secreta e
direta é uma
das modalidades democráticas e,
nesse sentido, não
seria objetável."
Verbete 350: "A
liberdade sindical implica o
direito de trabalhadores e empregadores
de escolher livremente seus representantes."
Verbete 361:
"Não há
violação dos princípios
da liberdade sindical
quando a legislação contém
algumas regras com a finalidade
de promover os
princípios democráticos no seio
das organizações sindicais
ou então garantir o desenvolvimento normal do processo
eleitoral,respeitados os direitos dos membros, a fim de evitar qualquer
conflito no que tange ao resultado das eleições."
Verbete 366: "Nos
casos de serem impugnados os resultados de eleições sindicais, estas questões
deveriam ser submetidas às autoridades judiciais que deveriam garantir processo
imparcial, objetivo e rápido."(grifo nosso).
Há, ainda,
verbetes que atribuem
ao Poder Judiciário
emitir decisões, em caso
de conflito interno
no sindicato, com a missão
de concretizar os
direitos fundamentais do trabalhadores, ao garantir eleições imparciais e
objetivas, como se pretendeu fazer, no caso em análise, ao se estabelecer uma
Comissão Eleitoral/ Junta Governativa.
Vejamos:
Verbete 394: "Com relação a um
conflito interno no seio da organização
sindical entre duas direções rivais,
o Comitê lembrou
que, para garantir a
imparcialidade e a objetividade do processo, conviria que o
controle das eleições sindicais ficasse a cargo de autoridades judiciárias
competentes."
Verbete 405:
"Nos casos em que sejam
impugnados os resultados
de eleições sindicais, estas questões
deveriam ser submetidas
às autoridades judiciais
que deveriam garantir um processo
imparcial, objetivo e rápido."
Verbete 406: "A fim
de evitar o perigo de graves limitações
ao direito dos trabalhadores de eleger
livremente seus representantes, os
casos submetidos aos
tribunais por autoridades administrativas, que
não aceitam os
resultados de eleições
sindicais, não deveriam
- ao aguardo do
resultado definitivo do
processo judicial -
paralisar o funcionamento
das organizações sindicais."
Verbete 413:
"Mesmo reconhecendo que
alguns fatos se
revestiam de um
caráter muito excepcional e
tinham podido justificar uma intervenção das autoridades, o Comitê achou que,
para ser
admissível, a intervenção
do sindicato, tal
como havia sido executada, deveria
ser rigorosamente provisória
e ter como
objetivo exclusivo permitir a
organização das eleições livres." (grifo nosso).
[...]
Destarte, diante da evidente "fraqueza
sindical", a solução acolhida pelo
juízo a
quo não poderia ter
sido melhor, razão
pela qual resta
inteiramente mantida. É
essencial que os trabalhadores possam
exercer o direito
de eleger livremente
seus representantes, pois
é pressuposto básico para
a atuação efetiva
e independente de
suas organizações. E
cabe ao Judiciário,
nesse contexto, afirmar os
direitos fundamentais dos
trabalhadores, em especial
no que tange
à liberdade sindical, permitindo,
na prática, a lisura processo eletivo, em observância aos pilares de uma verdadeira Democracia.
ACORDAM OS
INTEGRANTES DA 1ª TURMA DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 7ª REGIÃO,
por unanimidade, conhecer
do recurso interposto
e, no mérito, negar-lhe provimento.
DULCINA DE
HOLANDA PALHANO
Relator
Colegas ADVOGADOS, estamos precisando muito de DEMOCRACIA no Brasil e em suas instituições privadas, especialmente as que se divulgam como defensoras da sociedade, mas, infelizmente, camuflam pequeno-grandes ditadores que se utilizam de incontáveis artifícios para ludibriar os representados. Tudo bem diante do Neoconstitucionalismo, porém, esquecendo completamente princípios e regras fundamentais como a ampla defesa, o contraditório, o respeito à imagem e a dignidade da pessoa humana... Tudo engendrado com o intuito de proteger a imagem pessoal e os interesses particulares, esquivando-se, inclusive, de tomar o cuidado de observar o teor de decisões de Tribunais, transitadas em julgado, como a apresentada neste post. O pior é que levam nos seus desvarios a imagem das instituições, que ainda conseguem ocupar o imaginário de esperança do povo na busca por um mundo mais livre, justo e solidário. Minhas saudações! Por vezes lembro das aulas de hermenêutica e de ética que tinha com o Prof. Marcelo Uchôa, que bom que juntássemos pessoas que pudessem resgatar nossos sonhos. DEUS EM TODAS AS CAUSAS E DIANTE DE TUDO PARA FAZER JUSTIÇA!
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