Giovanni
di Pietro di Bernardone, mais conhecido como São Francisco de Assis (Assis, 5
de julho de 1182 [1] — 3 de outubro de 1226), foi um frade católico da Itália.
Depois de uma juventude irrequieta e mundana, voltou-se para uma vida religiosa
de completa pobreza, fundando a ordem mendicante dos Frades Menores, mais
conhecidos como Franciscanos, que renovaram o Catolicismo de seu tempo. Com o
hábito da pregação itinerante, quando os religiosos de seu tempo costumavam
fixar-se em mosteiros, e com sua crença de que o Evangelho devia ser seguido à risca,
imitando-se a vida de Cristo, desenvolveu uma profunda identificação com os
problemas de seus semelhantes e com a humanidade do próprio Cristo. Sua atitude
foi original também quando afirmou a bondade e a maravilha da Criação num tempo
em que o mundo era visto como essencialmente mau, quando se dedicou aos mais
pobres dos pobres, e quando amou todas as criaturas chamando-as de irmãos.
Alguns estudiosos afirmam que sua visão positiva da natureza e do homem, que
impregnou a imaginação de toda a sociedade de sua época, foi uma das forças
primeiras que levaram à formação da filosofia da Renascença.[2]
Dante
Alighieri disse que ele foi uma "luz que brilhou sobre o mundo", e
para muitos ele foi a maior figura do Cristianismo desde Jesus, mas a despeito
do enorme prestígio de que ele desfruta até os dias de hoje nos círculos
cristãos, que fez sua vida e mensagem serem envoltas em copioso folclore e
darem origem a inumeráveis representações na arte, a pesquisa acadêmica moderna
sugere que ainda há muito por elucidar quanto aos aspectos políticos de sua
atuação, e que devem ser mais exploradas as conexões desses aspectos com o seu
misticismo pessoal. Sua vida é reconstituída a partir de biografias escritas
pouco após sua morte mas, segundo alguns estudiosos, essas fontes primitivas
ainda estão à espera de edições críticas mais profundas e completas, pois
apresentam contradições factuais e tendem a fazer uma apologia de seu caráter e
obras; assim, deveriam ser analisadas sob uma óptica mais científica e mais isenta
de apreciações emocionais do que tem ocorrido até agora, a fim de que sua
verdadeira estatura como figura histórica e social, e não apenas religiosa, se
esclareça. De qualquer forma, sua posição como um dos grandes santos da
Cristandade se firmou enquanto ele ainda era vivo, e permanece inabalada. Foi
canonizado pela Igreja Católica menos de dois anos após falecer, em 1228, e por
seu apreço à natureza é mundialmente conhecido como o santo patrono dos animais
e do meio ambiente.[3]
Era
filho do comerciante italiano Pietro di Bernadone dei Moriconi e sua esposa
Pica Bourlemont, cuja família tinha raízes francesas. Os pais de Francisco
faziam parte da burguesia da cidade de Assis, e graças a negócios bem sucedidos
na Provença, França, conquistaram riqueza e bem estar. Na ausência do pai, em
viagem à França, sua mãe o batizou com o nome de Giovanni (João, em português,
a partir do profeta São João Batista) na igreja construída em homenagem ao
padroeiro da cidade, o mártir Rufino. A origem de seu nome Francesco (Francisco)
é incerta. Para uns, depois de uma viagem à França, onde o menino teria ficado
cativado pela vida francesa, sua música, sua poesia e seu povo, seu pai teria
começado a chamá-lo de "francesco", que significa "francês"
em italiano. Para outros seu pai teria feito, em vez, uma homenagem ao país
natal de sua esposa, embora não haja provas de sua naturalidade francesa.
Também foi sugerido que o nome foi dado por seu gosto pela língua francesa, que
perdurou por toda a vida de Francisco e era em sua época a linguagem por
excelência da literatura cavaleiresca e da expressão amorosa.[4][5] O menino
cresceu e se tornou um jovem popular entre seus amigos, por sua indisciplina e
extravagâncias, por sua paixão pelas aventuras, pelas roupas da moda e pela bebida,
e por sua liberalidade com o dinheiro, mas mostrava uma índole bondosa. Era
nessa época fascinado pelas histórias de cavalaria, e desejava ganhar fama como
um herói. Assim, em 1202 alistou-se como soldado na guerra que Assis
desenvolvia contra Peruggia, mas foi capturado e permaneceu preso, à espera de
um resgate, por cerca de um ano. Ao ser libertado caiu doente, com episódios de
febre que duraram quase todo o ano de 1204. Ali se apresentaram as duas
afecções que o acompanharam por toda a sua vida: problemas de visão e no
aparelho digestivo.[4][5]
Hino a São Francisco - Fagner
Luan Santana ao Papa Francisco
Depois
de recuperado tentou novamente a carreira das armas, engajou-se em 1205 no
exército papal que lutava contra Frederico II, incentivado por um sonho que
tivera. Nele apareceu-lhe alguém chamando-o pelo nome e levando-o a um rico
palácio, onde vivia uma linda donzela, e que estava cheio de armas
resplandecentes e outros apetrechos de guerra. Indagando de quem eram essas
armas esplêndidas e o palácio magnífico, foi-lhe respondido que tudo aquilo era
seu e de seus soldados. Animado com a perspectiva de glória, pôs-se a caminho,
mas no trajeto teve outro sonho, ou uma visão, onde ouviu, segundo a versão da
Legenda trium sociorum, uma voz a dizer: Quem te pode ser de mais proveito? O
senhor ou o servo? Como Francisco respondesse: O senhor, ouviu novamente a voz:
Então por que deixas o senhor pelo servo e o príncipe pelo vassalo?.
Confundido, Francisco disse: Que queres que eu faça?, e a voz replicou: Volta
para tua terra, e te será dito o que haverás de fazer. Pois deves entender de
outro modo a visão que tiveste.[6]
Poucos
dias depois, já em Assis, durante uma algazarra com seus amigos, teria sido
tocado pela presença divina, e desde então, segundo a Legenda, começou a perder
o interesse por seus antigos hábitos de vida e mostrar preocupação pelos
necessitados. Eleito "rei da juventude" em um festejo folclórico
tradicional, em vez de preparar-se para a entrada em uma vida de casado, como
seria o costume, retirou-se, conforme relatou seu primeiro biógrafo Tomás de
Celano, para uma caverna a fim de meditar, acompanhado de apenas um amigo fiel,
para quem revelou suas preocupações e seu desejo de obter o tesouro da
sabedoria e de desposar a vida religiosa. Mas ainda era um período de
hesitação. Quando tinha arroubos de devoção e os expressava publicamente, era
ridicularizado; tinha pesadelos com uma horrível mulher corcunda, e imaginava
que esta era a imagem de sua futura vida de pobreza.[5]
Certo
dia saiu em um passeio pelos campos nos arredores, e ao penetrar em uma
clareira ouviu o som do sino que os leprosos, proscritos pela sociedade, deviam
usar para indicar a sua aproximação, e logo se viu frente a frente com o homem
doente. Fazia frio e o leproso tinha apenas trapos sobre o corpo. Francisco
sempre sentira repulsa dos leprosos, mas nesse momento desceu de seu cavalo e
cobriu o homem com seu próprio manto. Espantado consigo mesmo, olhou nos olhos
do outro, e viu sua gratidão, e enquanto ele mesmo chorava, beijou aquele rosto
deformado pela moléstia. Este parece ter sido o ponto de virada em sua vida,
mas sua vocação não se declarou toda subitamente, e a cronologia desses e
outros episódios preparatórios para sua conversão não é clara nas fontes
antigas. Também parece ter tentado seguir o ofício de seu pai, mas sem
conseguir devotar-se a ele. Ao contrário, estava cada vez mais interessado em
ajudar os pobres.[4]
Mas
certa feita entrou para orar na igreja de São Damião, fora das portas da
cidade, e ali, diz a tradição, ele ouviu pela primeira vez a voz de Cristo, que
lhe falou de um crucifixo. A voz chamou a sua atenção para o estado de ruína de
sua Igreja, e instou para que Francisco a reconstruísse. Imediatamente voltou
para sua casa, recolheu diversos tecidos caros da loja de seu pai e os vendeu a
baixo preço no mercado da cidade, e voltou para a igreja onde tivera sua
revelação doando o dinheiro para o padre, a fim de que ele restaurasse o prédio
decadente. Ao saber disso o pai se enfureceu e mandou que o buscassem.
Atemorizado, Francisco se escondeu em um celeiro, onde seu amigo lhe levava um
pouco de comida. Passado algum tempo, decidiu revelar-se, e diante do povo de
Assis se acusou de preguiçoso e desocupado. A multidão o tomou por louco e
divertiu-se apedrejando-o. O pai ouviu o tumulto e o recolheu para sua casa,
mas o acorrentou no porão. Alguns dias depois sua mãe, por compaixão, livrou-o
das correntes, e Francisco foi buscar refúgio junto ao bispo. O pai seguiu-o e
o acusou de dissipador de sua fortuna, reclamando uma compensação pelo que ele
havia tirado sem licença de sua loja. Então, para a surpresa de todos,
Francisco despiu todas as suas belas roupas e as colocou aos pés do pai,
renunciou à sua herança, pediu a bênção do bispo e partiu, completamente nu,
para iniciar uma vida de pobreza junto do povo, da qual jamais retornou.[4][5]
O bispo viu nesse gesto um sinal divino e se tornou seu protetor pelo resto da
vida.[7]
A
fundação da Ordem e primeiras obras
Francisco,
tomando ao pé da letra o que o crucifixo de São Damião ordenara, iniciou sua
nova vida como pedreiro, ajudando a reconstruir diversas igrejas nos arredores
de Assis - esta de São Damião, a de São Pedro e a da Porciúncula, que segundo
São Boaventura era a que ele mais amava. Nela descobriu, em 1208 ou 1209, na
leitura de uma passagem do evangelho de Mateus, as linhas gerais que orientaram
sua vocação:
"Ide,
disse o Salvador, e proclamai em todas as partes que o Reino do Céu está
aberto. Vós recebestes gratuitamente; dai sem receber pagamento. Não leveis nem
ouro, nem prata nem cobre em vossos cintos, nem um alforje, nem uma segunda
túnica, nem sandálias, nem o cajado de viajante, pois o trabalhador merece ser
sustentado. Em qualquer vila em que entrardes procurai alguma pessoa digna, e
hospedai-vos com ela até partirdes. E quando entrardes em uma casa, saudai-a;
se a casa for digna, desça sobre ela a vossa paz; mas, se não for digna, torne
para vós a vossa paz."[8]
Dessa
forma, de devoto passou a ser missionário, e começou a pregação da palavra
divina, fazendo seus primeiros conversos, entre eles Bernardo de Quintavalle,
um rico burguês de Assis, que vendeu tudo o que tinha para dar aos pobres,
Pietro Cattani, que foi mais tarde seu sucessor na Ordem, e o Irmão Giles.
Nesse período inicial, segundo Celano, teve uma revelação do futuro brilhante
de sua Ordem, e ao mesmo tempo das provações que estavam pela frente. Diz o
cronista:
"No
começo desta nossa vida vamos encontrar alguns frutos doces e deliciosos.
Depois serão oferecidos outros de menor sabor e doçura. No fim, serão dados
alguns cheios de amargor, de que não poderemos viver, porque sua acidez será
intragável para todos, apesar da aparência de frutos belos e cheirosos.
Entretanto, como vos disse, o Senhor fará de nós um grande povo"[9]
Tendo
reunido mais um grupo de seguidores, dirigiu-se para Roma a fim de obter do
papa a autorização da primeira Regra para a fundação de sua Ordem, a chamada
Regra primitiva, que prescrevia uma pobreza absoluta para os monges e para a
Ordem, em imitação literal da vida de Jesus Cristo e seus apóstolos conforme
narrada nos Evangelhos, que não possuíam nada pessoalmente nem em comum.
Segundo o cronista inglês Matthew Paris, lá chegando, sujos e vestidos
pobremente, foram ridicularizados pela corte de Inocêncio III, que mandou não
aborrecê-lo com sua Regra, considerada excessivamente rigorosa e impraticável,
e que fosse pregar entre os porcos. Tendo-o feito num chiqueiro próximo,
coberto de lama voltou para o papa, que refletindo um momento, decidiu
recebê-los em uma audiência formal depois que se lavassem. Francisco e seus
amigos se prepararam então para esse outro encontro conseguindo o apoio de
prelados eminentes para a sua causa. Segundo os relatos antigos, nesse ínterim
Inocêncio teve um sonho, onde viu a Basílica de São João de Latrão prestes a
desabar, apenas sustentada por um pobre religioso, que ele interpretou como
sendo Francisco. Com a recomendação favorável de alguns conselheiros e com o
aviso recebido em sonho, Inocêncio finalmente autorizou a Regra, mas não por
escrito, nem outorgou o estatuto de Ordem maior ao grupo, apenas permitiu que
pregassem e dessem socorro moral às pessoas, mas acrescentando que se eles
conseguissem frutos de seu trabalho, voltassem a ele para que sua situação
fosse completamente regularizada. Alguns relatos antigos, como o deixado por
Roger de Wendover, sugerem que Francisco e seus companheiros não ficaram
completamente satisfeitos com o resultado de seu encontro com o papa, e em seu
caminho de volta, ao pararem em Spoleto, parece ter havido uma crise entre o
grupo. Alguns teriam se inclinado a abandonar a pregação para viverem como
monges eremitas, desiludidos com a ostentação de luxo da corte papal. Também
nessa ocasião parece ter ocorrido o célebre Sermão aos pássaros, mas os
cronistas divergem na sua descrição. Para Wendover ele foi a manifestação da
revolta de Francisco, que teria mandado as aves devorarem os poderosos, mas os
que seguem a versão de Celano o referem como um idílio cheio de poesia e
doçura.[10][11]
Chegando
a Assis, instalaram-se em uma cabana no campo, onde se dedicaram ao cuidado dos
leprosos, ao trabalho manual e à pregação, vivendo de esmolas. Logo a cabana se
tornou pequena para o crescente número de irmãos, mas o abade do mosteiro
beneditino do Monte Subásio lhes concedeu em fins de 1210 o uso da capela da
Porciúncula e de uma terra adjacente. Entre os novos amigos de Francisco
estavam o Irmão Leo, seu futuro confessor e amigo inseparável, o Irmão Ruffino,
que segundo a lenda pregava até dormindo, o Irmão Junípero, o Irmão Masseo e o
Irmão Illuminato. Nesse período sua pregação já alcançara toda a região
entorno, mas não eram sempre bem recebidos. Em 1212 a Ordem foi enriquecida com
a primeira mulher, Clara d'Offreducci, a futura Santa Clara, fundadora do ramo
feminino dos Frades Menores, as Clarissas, que logo trouxe suas irmãs, a quem
foi dado o uso da capela de São Damião. No mesmo ano fizeram sua primeira
tentativa, frustrada, de evangelizar os sarracenos na Síria, mas não
conseguiram chegar ao seu destino e acabaram voltando a Assis com grande
dificuldade. Durante a viagem de navio, conta a tradição que o santo fez o
milagre de pacificar uma tempestade e de multiplicar a comida dos marinheiros,
que terminava. Nessa época seus milagres foram numerosos. Em Ascoli curou
enfermos e fez muitas conversões, em Arezzo os arreios de um cavalo que ele
havia tocado curaram uma mãe em perigoso trabalho de parto, em Narni curou um
paralítico, em San Gimignano expulsou demônios, e em Gubbio pacificou um lobo
que assolava a região, entre muitos outros prodígios. Sua fama como santo já se
espalhava, e recebeu em doação o monte Alverne para que erguesse ali um refúgio
para os irmãos. Em 1214 se dirigiu para o Marrocos para pregar entre os mouros,
mas só pôde chegar à Espanha, onde caiu doente, mas outros irmãos
prosseguiram.[12] Em 1219, durante a Quinta Cruzada, foi ao Egito, encontrou-se
com os cruzados que assediavam Damietta, profetizando sua derrota, em seguida
manteve uma entrevista com o sultão aiúbida Al-Kamil que, impressionado, ao fim
da visita pediu que Francisco orasse para que Deus lhe mostrasse a forma de
cultuá-lo que fosse de seu agrado e permitiu que pregasse entre seus
súditos.[13] Dali passou para a Palestina, peregrinando pelos lugares santos,
onde recebeu a notícia de que os irmãos no Marrocos haviam sido martirizados, e
que a comunidade em Assis, na sua longa ausência, estava em crise.[12]
Reforma
da Ordem
Voltou
à Itália e passou por Roma a fim de obter ajuda do papa. Quando chegou em Assis
viu que seus ideais haviam sido abandonados e reinava grande confusão entre os
irmãos. Alguns se haviam tornado vagabundos e se associavam com mulheres,
outros queriam erguer igrejas suntuosas, abandonar o rigorismo da Regra
inicial, dedicar-se aos estudos eruditos, e pediam favores e privilégios para o
papa. Ao mesmo tempo, a liberdade de pensamento outorgada pela Regra primitiva,
que permitia o questionamento de preceitos e ordens percebidos como contrários
à consciência, havia degenerado em disputas constantes de opinião entre os
irmãos e em desobediência. Pelo menos em um caso a reação de Francisco foi
violenta. Em Bolonha, onde o Irmão João fundara um colégio, expulsou todos de
lá, inclusive os doentes. Depois teve de aceitar, com a intervenção papal,
várias mudanças importantes. Foi estabelecido o período probatório de um ano
para novos candidatos, um representante do papa foi indicado governador e
corregedor da Ordem, e Francisco passou a administração da comunidade para o
Irmão Pietro Cattani, logo substituído pelo Irmão Elias, enquanto que Francisco
permanecia apenas como guia espiritual. Foi criada a Ordem Terceira para os
irmãos leigos, foi autorizado o estudo avançado de teologia, e o Francisco
elaborou uma Segunda regra, em 1221, tentando torná-la o mais clara e
inequívoca possível. Ainda assim a Segunda regra, também chamada Regra não
bulada, se revelou ineficaz para a solução da crise, era em essência a mesma, e
foi solicitada nova revisão para Francisco, auxiliado pelos irmãos Leo e
Bonizzo.[14][15] Segundo o relato do Speculum perfectionis, prevendo que
Francisco não cederia em muito, o Irmão Elias, acompanhado de outros, foi ao
encontro de Francisco e solicitou um abrandamento no texto, e nesse momento
todos teriam ouvido a voz de Cristo dizendo que desejava preservar a pureza do
conteúdo dos Evangelhos e que quem não se conformasse deixasse a Ordem.[16]
Ficando
pronto em 1223, aparentemente com poucas modificações novas, o novo texto foi
enviado para Roma para aprovação papal, mas recebeu ainda muitos outros ajustes
e cortes do cardeal Ugolino e finalmente foi confirmado pelo papa Honório III,
na bula Solet annuere, de 29 de novembro de 1223, e por isso é chamada de a
Regra bulada. O texto da Regra primitiva resultou ainda mais profundamente
alterado; a maioria das citações do Evangelho e as passagens poéticas foram
removidas e substituídas por fórmulas legais. O artigo que autorizava a
desobediência de superiores indignos foi excluído, assim como os que
prescreviam o cuidado dos leprosos, junto com todas as obrigações de pobreza
absoluta. Já não se insistia no trabalho manual e se permitiu que os irmãos
usassem quaisquer livros, que naquela época eram raros artigos de luxo.[14][15]
A seguir um trecho comparativo entre as regras Não bulada e a Bulada, referente
ao modo como os frades deviam trabalhar:
Regra
não bulada
Todos os frades, em qualquer lugar em que
estiverem em casa de outros para servir ou trabalhar, não sejam mordomos nem
chanceleres nem estejam à frente das casas em que servem; nem recebam algum
emprego que cause escândalo ou produza detrimento para sua alma (Mc. 8,36); mas
sejam menores e submissos a todos que estão na mesma casa. E os frades, que
sabem trabalhar, trabalhem e exerçam o mesmo ofício que sabem, se não for
contra a salvação da alma e puder ser feito honradamente. Pois diz o profeta:
Comerás do fruto dos teus trabalhos; és feliz e estarás bem (Sl 127,2); e o
apóstolo: Quem não quer trabalhar, não coma (cfr. 2Ts 3,10); e cada um fique na
arte e ofício em que foi chamado (cfr. 1Cor 7,24). E pelo trabalho possam
receber tudo que for necessário, menos dinheiro. E quando for necessário, vão
pela esmola como os outros pobres. E possam ter ferramentas e instrumentos
convenientes para seus ofícios. Todos os frades esforcem-se por suar em boas
obras (S Greg. M. Hom. 13 in Ev.), porque está escrito: Faz sempre alguma coisa
boa, para que o diabo te encontre ocupado (S. Jeron. Ep. 125,11). E ainda: A
ociosidade é inimiga da alma (S. Bern. Reg. 48,1). Por isso os servos de Deus
devem insistir sempre na oração ou em alguma obra boa. Guardem-se os frades,
onde quer que estejam, em eremitérios ou outros lugares, de apropriar-se de
lugar algum ou de impedi-lo a alguém. E quem quer que venha a eles, amigo ou
adversário, ladrão ou assaltante, receba-se benignamente. E onde quer que
estejam os frades e onde quer que se encontrem, devem voltar a ver-se e
honrar-se espiritual e diligentemente mutuamente sem murmuração (1Pd 4,9). E
cuidem de não se mostrar tristes por fora e sombrios hipócritas; mas se mostrem
alegres no Senhor (Fl. 4,4) e bem humorados e convenientemente amáveis.[17]
Impostas
pela hierarquia eclesiástica romana e pela pressão de parte de seus próprios
companheiros, essas mudanças pouco refletiam o espírito original franciscano,
mas foram inevitáveis diante da tensão entre um grupo que crescia, se
diversificava e estava prestes a perder sua unidade, e a necessidade de
mantê-lo funcional e organizado. Mas expressavam ainda o conflito aberto entre
a hierarquia espiritual e a institucional. Francisco via a si mesmo como o
mensageiro de um mandado divino, crendo que sua Regra não podia ser alterada
sem traição a Cristo que o inspirava e que era a autoridade suprema a ser
considerada, a quem o próprio papa devia subordinação, mas parece não ter
compreendido que Cristo não falava ao papa nem aos monges, somente ele ouvia
sua voz, e assim inevitavelmente sua credibilidade e a propriedade de sua intransigência
eram postas em dúvida.[19] Segundo os relatos a Regra bulada só foi aceita por
Francisco por força da obediência que devia ao papa como líder da Igreja, da
qual jamais quis afastar-se, mas submeteu-se, com grande pesar, e os seus
primeiros biógrafos referem este período como o da sua "grande
tentação", a de abandonar todo o trabalho. Por fim aceitou o fato
consumado, e entregando os frutos para Deus, pacificou-se.[14]
Anos
finais e morte
Seus
anos finais foram passados em tranquilidade interior, quando segundo seus
biógrafos primitivos seu amor e compaixão por todas as criaturas fluíam
abundantes, ao mesmo tempo que ele experimentava repetidas visões e êxtases
místicos, fazia outros milagres, continuava a percorrer a região em pregações,
e multidões acorriam para vê-lo e tocá-lo. No Natal de 1223 foi convidado pelo
senhor de Greccio para celebrar a festa numa gruta com pastores e animais,
desejando recriar o nascimento de Cristo em Belém, sendo a origem da tradição
dos presépios. Na primavera seguinte viajou para a Porciúncula a fim de
assistir a reunião do Capítulo Geral, e em seguida retirou-se para o santuário
do Monte Alverne, acompanhado dos irmãos Leo, Ruffino, Angelo, Silvestre,
Illuminato, Masseo e talvez também Bonizzo. Muitas vezes os deixava e se
embrenhava nas matas, a fim de meditar solitário, levando consigo apenas os
Evangelhos e comendo muito pouco.[20] Às vezes o Irmão Leo, em segredo, o
observava, e por mais de uma vez testemunhou seus êxtases e viu parte das
visões que o santo via. Nos estados contemplativos eram-lhe reveladas por Deus
não somente coisas do presente, mas também do futuro, assim como lhe fazia
conhecer as dúvidas, os secretos desejos e os pensamentos dos irmãos. Numa
dessas ocasiões, segundo relata a coletânea I Fioretti di San Francesco, o
Irmão Leo o viu levar a mão ao peito e parecer tirar algo de lá e oferecer a
uma língua de fogo que descera sobre ele. Perguntando depois o que sucedera,
Francisco respondeu:
"Por
que vieste aqui, irmão cordeirinho? Diz-me: viste ou ouviste alguma coisa?
"Leo
respondeu: Pai, ouvi-te falar e repetir várias vezes: 'Quem és Tu? Quem és Tu,
oh dulcíssimo Deus? E eu quem sou, verme desprezível e teu inútil servo?'
Giotto:
Estigmatização de São Francisco (detalhe), c. 1300. Museu do Louvre.
Basílica
de São Francisco de Assis, Assis.
"Ao
que Francisco disse: Sabe, irmão cordeirinho de Jesus Cristo, que, enquanto eu
dizia aquelas palavras que ouviste, eram nesse momento mostradas à minha alma
duas luzes, uma a da revelação e do conhecimento do Criador, a outra a do
conhecimento de mim mesmo. Quando eu dizia 'Quem és Tu, oh meu dulcíssimo
Deus?', estava numa luz de contemplação na qual via o abismo de infinita
bondade, sabedoria e poder de Deus; e quando dizia 'Que sou eu, etc.', estava
numa luz de contemplação na qual via a profundidade lamentável da minha abjeção
e miséria, e era por isso que indagava do Senhor da infinita bondade o mistério
de Ele dignar-Se a visitar-me, a mim que não sou mais que um verme desprezível
e inútil. E entre outras coisas que Ele me disse, pediu-me que Lhe fizesse três
dádivas, e eu respondi-Lhe: 'Meu Senhor, sou Teu, e bem sabes que nada tenho
além da túnica, da corda e das bragas, e estas três coisas também são Tuas. Que
posso pois oferecer ou dar à Tua majestade?' Então Deus disse-me: 'Procura no
teu íntimo e oferece-me o que lá encontrares.' Eu procurei e encontrei lá uma
bola de ouro e ofereci-a a Deus; e fiz isso três vezes, pois três vezes Deus mo
ordenou; depois ajoelhei três vezes e bendisse e agradeci a Deus que me dera
alguma coisa para eu Lhe oferecer. E logo me foi dado compreender que essas
três oferendas significavam a santa obediência, a extrema pobreza e a belíssima
castidade que Deus, por Sua graça, me concedeu observar tão perfeitamente. E
como Deus depositara no meu íntimo aquelas três bolas de ouro, assim também deu
à minha alma essa virtude de sempre O louvar e enaltecer, com o coração e a
boca, por todos os bens e por todas as graças que Ele me concedeu, por Sua
santíssima bondade."[21]
Durante
uma dessas meditações, em 14 de setembro de 1224, no dia da Festa da Exaltação
da Santa Cruz, Francisco viu a figura de um homem com seis asas, semelhante a
um serafim, e pregado a uma cruz, e à medida que continuava na contemplação,
que lhe dava imensa felicidade mas era sombreada de tristeza, sentiu se abrirem
em seu corpo as feridas que o tornaram uma imitação do próprio Cristo
crucificado. Foi, dessa forma, o primeiro cristão a ser estigmatizado, mas
enquanto isso lhe trazia alegria, sendo um sinal do favor divino, foi-lhe
motivo de muito embaraço e sofrimento físico. Sempre tentou ocultar os estigmas
com faixas e seu hábito, e poucos irmãos os viram enquanto ele viveu. Mas eles
lhe causavam muita dor e com isso dificultavam seus movimentos, além de
sangrarem com frequência. Muitas vezes teve de ser carregado por não poder
andar, ou teve de viajar sobre uma mula, o que não era permitido aos irmãos por
ser um luxo. Também padeceu de outras enfermidades, ficou quase cego, e as suas
dores de cabeça eram terríveis, mas apesar de receber ordem de procurar
tratamento, os médicos nada puderam fazer para aliviá-lo. Passou algum tempo
sob os cuidados de Clara, e ali deve ter composto, em 1225, seu Cântico ao
irmão Sol, mas sua condição se deteriorava diariamente, e ditou seu Testamento.
Melhorou então, e viajou para um eremitério perto de Cortona, mas ali piorou
novamente, e foi levado para Assis, hospedando-se na casa do bispo em meados de
1226. Pouco depois, pediu para ser levado à Porciúncula, para que pudesse
morrer entre os irmãos.[20]
Sentindo
a morte próxima, solicitou a uma amiga romana, a nobre Jacopa de' Settesoli,
que trouxesse o necessário para seu sepultamento, e também alguma comida bem
preparada, que ele havia provado em sua residência em Roma e que deveria
aliviar seu sofrimento. Foi despedir-se de Clara e das irmãs em São Damião e
voltou à Porciúncula, deu instruções para ser sepultado nu, e no por do sol de
3 de outubro de 1226, depois de ler algumas passagens do Evangelho, faleceu
rodeado de seus companheiros, nobres amigos e outras personalidades. As fontes
antigas dizem que nesse momento um bando de aves veio pousar no telhado e
cantou.[22] Logo em seguida o Irmão Elias notificou a todos de seu
desaparecimento e divulgou sua estigmatização, até ali mantida em sigilo, seu
corpo foi examinado por muitas testemunhas a fim de comprová-lo, e o povo de
Assis e dos arredores acorreu para prestar-lhe sua última homenagem.[23]
Foi
enterrado no dia seguinte na igreja de São Jorge. Menos de dois anos depois, o
papa Gregório IX foi pessoalmente para Assis para canonizá-lo, o que aconteceu
em 6 de julho de 1228 com grande pompa. Em 1230 foi inaugurada uma nova
basílica em Assis, que recebeu seu nome e hoje guarda as suas relíquias e
abriga o seu túmulo definitivo. A basílica foi decorada no fim do século XIII
por Giotto di Bondone com uma grande série de afrescos que retratam a vida do
santo.[22]
Sua
aparência
Segundo
a descrição deixada por Tomás de Celano a aparência física de Francisco era
extremamente agradável, e sua face refletia a inocência de sua vida, a pureza
de seu coração e o ardor do fogo divino que o consumia. Era de estatura um
pouco abaixo da média, cabeça proporcionada e redonda, com a face alongada e
nariz reto e fino, pescoço esguio, testa plana e curta, olhos negros e
límpidos, cabelos castanhos, orelhas pequenas. Sua voz era forte, doce, clara e
sonora; os dentes eram unidos, alinhados e brancos, os lábios pequenos e
delgados, a barba era preta e um tanto rala; seus ombros eram direitos, os
braços curtos, as mãos delicadas com dedos longos, as pernas delgadas, pés
pequenos, pele fina e sempre muito magro.[24] Sua visão de si mesmo era, porém,
oposta: descrevia-se como um "franguinho preto", e o retrato pintado
no Fioretti segue a mesma linha, mostrando-o como um homem miúdo de aspecto muito
desprezível e vil e que por esse motivo nunca conseguia muitas esmolas entre
gentes que não o conheciam.[25]
Contexto
histórico
Um
século antes de Francisco nascer a espiritualidade europeia estava
principalmente concentrada nos mosteiros enclausurados, desenvolvendo-se de uma
forma introvertida e contemplativa que tinha muito de pessimismo em relação ao
mundo e ao ser humano. Eram também os maiores centros de cultura erudita, em
suas bibliotecas e através de suas oficinas de copistas se preservou boa parte
do que hoje se conhece de literatura clássica, e seus membros muitas vezes
alcançaram níveis altos e refinados de pensamento abstrato e teológico, com
grande penetração psicológica. Os monges eram pessoalmente pobres mas nada lhes
faltava de sustento material, pois suas Ordens eram muitos ricas, recebendo
doações da nobreza e do povo, possuindo grandes extensões de terra e muitos
tesouros em suas igrejas. De qualquer modo, na percepção daquela época uma vida
de monge era o caminho mais garantido, na verdade praticamente o único, para a
conquista do Paraíso, e era comum que leigos, depois de terem vivido a maior
parte de suas vidas no desfrute do mundo, ao sentirem a morte se aproximar
deixassem suas famílias para ingressar em um mosteiro, num processo que veio a
ser chamado de "piedade fugitiva", esperando que a conversão, mesmo
de última hora, fosse suficiente para alcançar a recompensa eterna.
Acompanhando esse modo de pensar, era uma crença corrente de que o céu tinha
uma população reduzida, e que ela era composta na maior parte de
monges.[26][27]
No
decorrer do século XII começou a se verificar uma mudança, a sociedade passou a
demonstrar um crescente otimismo quanto às coisas espirituais, e parecia mais
fácil à gente comum partilhar do Paraíso com os monges. Essa mudança se explica
através de dois fatores principais - a concepção de Deus se tornou mais amorosa
e benévola, e os doutores das faculdades de teologia, especialmente os
proto-humanistas de Paris, elaboraram e divulgaram o conceito do Purgatório,
que previa para após a morte uma estadia temporária num plano intermédio entre
terra e céu onde as almas seriam purificadas de seus pecados veniais,
possibilitando seu acesso à beatitude algum tempo depois. No encerramento do
século Hugo de Avalon veio reforçar esse otimismo dizendo que o céu não era um
destino exclusivo para os monges e autoridades da Igreja, e que no Juízo Final
todos seriam julgados de acordo com sua observância dos princípios do
Cristianismo, e não do monasticismo. Francisco nasceu nesse momento de
abertura, e embora mantivesse em parte o modelo da ascese em renúncia pessoal
do mundo, buscou a santificação de toda a família humana em comunhão e em
íntimo contato com seus semelhantes numa pregação itinerante dentro dos centros
urbanos, sem estar vinculado a nenhum núcleo religioso fixo no espaço e sem
submeter-se à clausura nem às armadilhas da erudição.[26] Num período em que o
modelo feudal entravam em declínio e emergia a burguesia mercantil como grande
força econômica, tentou ensinar aos novos poderosos a responsabilidade social e
os perigos que trazia sua riqueza, e aos miseráveis as virtudes e
possibilidades espirituais ocultas em sua condição desfavorecida e seu valor
inalienável como filhos de Deus, mostrando a todos que a religião podia ser
fonte de alegria e não causa de opressão, e apresentando novas alternativas de
expressão para uma espiritualidade que estava num processo de transição, o qual
se não fosse iluminado por seu exemplo de fraternidade e obediência estrita às instituições
religiosas estabelecidas poderia resultar num beco sem saída ou na revolta
cismática.[28][29] Como observou Susan McMichaels, deve-se entender a renovação
franciscana da vida religiosa de seu tempo dentro de parâmetros limitados, já
que a Igreja Católica, mesmo nessa fase de mudança, ainda era a principal força
social da Europa, tinha autoridade sobre reis e imperadores, e qualquer
movimento excessivamente heterodoxo facilmente era condenado como heresia e
seus membros, nesse caso, ficavam sujeitos a um destino de perseguição e
morte.[30]
Wenzel
Hollar: São Francisco em retiro, século XVII. Universidade de Toronto.
Giotto:
Expulsão dos demônios de Arezzo, 1297-1299. Basílica de São Francisco de Assis,
Assis.
Por
fim, ao estudar a biografia de um santo, a pesquisa moderna se depara
constantemente com o problema de como encarar seus milagres e outros prodígios
que se lhe atribuem. Roger Sorrell lembra que os relatos que envolvem o
controle taumatúrgico das forças naturais e dos seres irracionais são
frequentemente descartados hoje como fruto de alucinação, fantasia ou
superstição, mas essa postura impede uma apreciação correta do ethos ascético e
místico, e é irrelevante para o contexto histórico. Esse ethos envolvia a
crença de que o mundo poderia ter sua harmonia restaurada através de uma vida
de acordo com o mandamento divino. O antigo asceta Santo Antônio do Deserto
dizia que a Criação era um livro onde podia ler as palavras de Deus, e essa
opinião era comum entre vários outros místicos. Nesse sentido, se o asceta
estava em harmonia com Deus, se tornava possível um diálogo efetivo e
inteligível com todo o mundo criado, e a natureza aparentemente hostil e muda
para o homem comum se tornava amistosa e responsiva para o místico em comunhão
divina. A psicologia moderna também diz coisa semelhante quando afirma que a
reação de uma pessoa ao seu ambiente reflete seu estado psíquico interior.
Francisco de Assis se insere nessa longa linhagem de santos ascetas,
taumaturgos e místicos; certamente estava familiarizado com as histórias dos
santos antigos, a própria Assis dera nascimento a vários santos e mártires
antes dele, e, leitor assíduo da Bíblia, em especial do Novo Testamento, devia
também conhecer passagens que referem à integração entre as criaturas e o
Criador, como em Romanos I:20: "Porque as coisas invisíveis, desde a
criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem,
e claramente se vêem pelas coisas que estão criadas...", ou em Timóteo
IV:4-5: "Porque toda a criatura de Deus é boa, e não há nada que rejeitar,
sendo recebida com ações de graças. Porque pela palavra de Deus e pela oração é
santificada". Para o seu tempo o milagroso era parte integrante da verdade
corrente. Por outro lado, muitos dos fenômenos maravilhosos encontrados nas
narrativas sobre a sua vida, se não eram explicáveis naquele tempo, poderiam
sê-lo hoje, com a ressalva de que mesmo a ciência e a psicologia, por avançadas
que estejam atualmente, ainda não são capazes de explicar todos os fenômenos naturais
do mundo ou os da mente, e o problema permanece, pois, irresolvido.[31]
As
fontes documentais primitivas e a historiografia moderna
Francisco
deixou escritos, que apesar de poucos e sucintos são uma fonte de grande
importância para o conhecimento de suas ideias e objetivos, mas ele não
escreveu sua própria história e foi sempre muito avesso a relatar sua vida
privada, tarefa que ficou para seus biógrafos. Diversos daqueles documentos são
de autoria controvertida, e são-lhe atribuídos mais pela tradição do que por
qualquer outro motivo, não havendo provas que os autentiquem. É o caso da
famosa Epistola ad populorum rectores (Carta aos governantes dos povos) e o da
Epistola ad fratrem Antonium (Carta ao Irmão Antônio de Pádua). O seu conteúdo,
no contexto do pensamento franciscano mais reconhecido, é pouco congruente. A
primeira é uma admonição apocalíptica, mas se a preparação para o Juízo Final
era uma preocupação para Francisco, não há evidência de que ele o considerasse
um evento iminente, como o texto da carta sugere. Quanto à segunda, a aprovação
que faz do estudo teológico erudito não parece concordar com a marcada
inclinação de Francisco para a simplicidade. Seja como for, sua autenticidade é
um problema ainda em aberto. A Regula (Regra primitiva) da Ordem, que escreveu
de próprio punho entre 1209 e 1210, teve seu original perdido, e a
reconstituição que foi feita mais tarde é, assim, incerta, mas crê-se que
trechos dela sobrevivam em pelo menos três fontes secundárias, o códice
fragmentário da Catedral de Worcester, a Explicação da Regra escrita por Hugo
de Digne entre 1245 e 1255, e a Vita secunda Sancti Francisci, de Tomás de
Celano, além de ter sido a fonte básica para a elaboração da Regula non bullata
(Regra não bulada) e da Regula bullata (Regra bulada). Também autógrafa é a
Benedictio fratri Leoni data (Bênção ao irmão Leo), e que está preservada na
Basílica de Assis. Seu Testamentum (Testamento) deve ser autêntico, ainda que
ditado a outrem, e nele ele faz uma apologia do trabalho cotidiano e manual,
expressando o desejo de que todos os Irmãos trabalhassem como ele de forma
honesta. Também parece estar fora de dúvida sua autoria do Cantico di frate
Sole (Cântico do irmão Sol), que é uma bela demonstração de sua veia mística e
também de seu talento poético, mas outros poemas que ele, segundo a tradição,
escreveu em italiano, latim e francês, foram perdidos.[32][33][34] Suas
Admoestações, uma coleção de 28 textos curtos, podem ter sido escritas a partir
de suas próprias palavras, mas o texto em si muito provavelmente não é de sua
lavra. O fragmento Audite, poverelle (Ouvi, pobrezinhas), escrito para as
Clarissas, descoberto em 1976 em dois manuscritos do século XIV, parece ser
autêntico, do mesmo modo que a Forma vivendi Sanctae Clarae data (Forma de vida
para Santa Clara) e a Ultima voluntas Sanctae Clarae scripta (Última vontade
para Santa Clara), que sobreviveram em cópias de Santa Clara inclusas em sua
própria Regra. Também sobrevivem um punhado de cartas a destinatários diversos,
orações e fragmentos vários, e embora sua autenticidade seja debatida e se
encontrem registrados apenas em manuscritos posteriores, muitos desses textos
são considerados originais.[33] A vastamente popular Oração de São Francisco, a
que inicia com as palavras Senhor, fazei de mim um instrumento de vossa paz...,
não é de sua autoria, tendo sido escrita em 1913 e publicada em um magazine
francês anonimamente.[35]
A
célebre Legenda maior Sancti Francisci (História de São Francisco, 1263), de
São Boaventura, que sobreviveu em inúmeras cópias, não parece ser de muita
utilidade. Apesar de ele a ter elaborado a partir de fontes de primeira mão,
sua preocupação com a harmonização da comunidade franciscana e a ausência
naquela época de métodos de referência científica fazem dela um relato
excessivamente poético e fantasioso, quando não claramente parcial, da vida de
Francisco. Se ela tem um lugar garantido na tradição piedosa e devocional, no
estudo histórico acadêmico não sucede da mesma forma, e os peritos apontam nela
uma série de contradições, a evidência de uma compilação seletiva de suas
fontes e de um propósito de com ela criar uma imagem unificada e positiva da
Ordem segundo a visão original de Francisco, numa época em que ela estava já
agitada por dissidências internas e enriquecia a olhos vistos. Entretanto, essa
Legenda se tornou canônica, já que em 1266 o Capítulo Geral da Ordem se reuniu
e decidiu que os irmãos não deveriam ler nenhuma outra biografia que não essa,
e determinou a destruição de todas as outras que se haviam escrito até então, o
que causou a perda de muita documentação importante. No século XIV Bartolomeu
de Pisa escreveu um novo relato biográfico, aprovado pelo Capítulo Geral em
1399 como sendo o mais veraz, mas esta obra é considerada pela crítica moderna
literariamente medíocre e de pouco valor documental. Afortunadamente a partir
do século XVII foram sendo encontradas cópias de outros documentos dados como
perdidos, suprindo em parte a imensa lacuna deixada pela supressão de fontes
antigas em 1266.[36]
A Vita
prima Sancti Francisci (Primeira biografia de São Francisco, 1228), de Celano,
escrita a pedido do papa Gregório IX, foi resumida pelo autor em 1230 sob o
nome de Legenda ad usum chori, mas apesar de ser uma obra de refinado estilo,
ela padece também de parcialidade. Celano novamente foi chamado em 1244 para
escrever uma versão ampliada da Vita prima, dando outras informações trazidas
por frades que haviam conhecido bem a Francisco e integravam seu primeiro
círculo de associados, como Rufino, Leo e Angelo, o que resultou na Vita
secunda Sancti Francisci (1245). Esta nova versão foi concebida numa linha
rigorista, sem enfatizar os milagres do santo e tentando oferecer uma visão de
sua trajetória mais de acordo com a que ele mantivera em vida, de certa forma
atendendo melhor ao critério de verdade histórica apreciado contemporaneamente.
Mas a obra não teve especial aceitação na sua época, pois era grande o desejo
de todos por narrações fantásticas e maravilhosas, de modo que mais uma vez
Celano foi convocado ao trabalho, desta vez para escrever o Tractatus de
Miraculis Sancti Francisci (Tratado sobre os Milagres de São Francisco), de
1253.[33][36][37]
Outras
fontes importantes são a Legenda trium sociorum (História dos três
companheiros, 1246), anônima, uma compilação de material heterogêneo; o Actus
beati Francisci et sociorum ejus (Atos do beato Francisco e seus companheiros,
c. 1331-1337), de Ugolino de Montegiorgio, podendo incluir material original do
Irmão Leo; o breve épico Sacrum commercium beati Francisci cum domina Pauperate
(A sacra aliança entre São Francisco e a Senhora Pobreza, c. 1260 - 1270?), que
deriva de um tema caro a Francisco; a coleção informal de episódios da vida de
Francisco conhecida como I Fioretti di San Francesco (Florilégio de São
Francisco, c. 1340), uma reelaboração livre do Actus que se tornou muito
popular; o Speculum perfectionis (Espelho de perfeição, 1318, duas versões), o
mais copiado depois da Legenda maior; a Compilação de Assis (1310-1312, com sua
variante a Legenda perusina), e por fim a Legenda antiqua (História antiga),
quase certamente de autoria do Irmão Leo. Existem ainda algumas outras fontes
primitivas, mas em sua maioria são derivações dessas já citadas.[36]
No
final do século XIX, já dispondo de uma metodologia e de uma visão
historiográfica mais científica e consistente, os estudiosos começaram um
trabalho de revisão do material antigo disponível. O primeiro estudo nesses
moldes foi publicado em 1894 pelo protestante Paul Sabatier, em sua Vida de São
Francisco de Assis, e desde então eles se multiplicaram de forma abundante. No
início do século XX toda a literatura biográfica e folclórica escrita em torno
de Francisco nos séculos XIII e XIV que foi recuperada, foi compilada por
eruditos franciscanos no Analecta Franciscana, de mais de 800 páginas, mas para
os estudiosos modernos essas fontes primitivas, apesar de essenciais e
incontornáveis, apresentam diversos problemas que as impedem de ser
consideradas inteiramente fidedignas, principalmente pela incerteza sobre a
datação da maioria delas, por suas contradições e imprecisões, por adornarem as
passagens da sua vida com uma profusão de lendas maravilhosas cuja comprovação
se faz muito difícil, e por muito frequentemente o retratarem apenas como um
herói da fé, com escassa menção aos problemas que a Ordem enfrentava em sua
morte e aos seus conflitos com a Igreja estabelecida, e colorindo seu caráter
com apreciações carregadas de emocionalismo. Embora se acredite que não haja
motivos importantes para se duvidar da pureza das intenções e da vida de
Francisco, nem de sua importância para a história da religião Católica e para a
devoção moderna, toda a substância dos relatos parece ser pouco objetiva.[38]
O
legado de suas ideias e de seu exemplo de vida
A fama
de santidade que granjeou em vida e perdura até os dias de hoje não decorreu de
grandes manifestações de erudição religiosa, que jamais fez questão de possuir,
e tampouco de seus milagres, que não obstante foram muitos e impressionantes,
mas do seu exemplo de uma vida de completa dedicação ao próximo, dedicação que
era animada por uma compreensão profunda, uma sinceridade espontânea, uma
simplicidade autêntica em todas as coisas, qualidades banhadas de uma calorosa
fraternidade, simpatia e caridade. Todos os seus primeiros biógrafos ressaltam
esses aspectos de seu caráter, e por esses motivos sua figura é também admirada
por muitos fora da esfera do Catolicismo.[32] Na visão de seus contemporâneos
ele era o mais perfeito seguidor de Jesus Cristo, e sua presença em qualquer
cidade era sempre um acontecimento, enquanto que seus irmãos eram tidos na mais
alta estima por muitos prelados importantes e autoridades civis. Para Jacques
de Vitry, bispo de Acre, sua aparição foi o consolo de um século corrupto,[39]
e na bula Mira circa nos de sua canonização foi descrito como aquele que entrou
no céu "precedendo muitos dotados de ciência, ele que deliberadamente era
sem ciência e sabiamente ignorante".[40]
A
despeito das críticas a que ele é ocasionalmente submetido, que o acusam de
obscurecer a figura do próprio Jesus,[41] e das dúvidas que às vezes surgem
sobre sua sanidade mental em vista de seu caráter emocional arrebatado, suas
oscilações entre extremos de intensa euforia quando falava de Deus e de
profunda tristeza quando observava suas supostas fraquezas, sua imaginação
exuberante e pelas constantes visões e revelações que alegava ter,[42] para
Kenneth Wolf sua enorme importância histórica e espiritual se confirma na abundante
literatura devocional e erudita que é continuamente produzida sobre ele nos
tempos recentes, e assinala que mesmo os acadêmicos laicos, por mais
distanciados que procurem se manter de uma análise emocional e adulatória de
sua vida e obras, acabam com frequência por reconduzí-lo ao pedestal de onde o
baixaram para seus estudos científicos.[41]
As
virtudes, a disciplina e o relacionamento entre os irmãos
Para
Francisco a pobreza, a "Senhora Pobreza" que ele costumava dizer ter
desposado, não era um objetivo, mas antes um instrumento pelo qual se podia
obter a purificação necessária para a habitação de Deus no interior de cada um
e para a perfeita comunhão com o semelhante, metas frente às quais todas as
outras considerações eram subordinadas. O outro instrumento privilegiado para
isso era a imitação do exemplo de vida dado por Cristo nos Evangelhos, e para
tanto a obediência era fundamental. Cristo fora pobre, e assim os irmãos também
o seriam, e ela devia ser entendida por todos os seus companheiros não só como
uma disciplina de ascetismo em si, mas como fonte de verdadeira graça e
alegria.[43]
Mas
além da pobreza exterior, comandada expressamente na sua Regra primitiva, que
proibia os monges até de andarem calçados e possuírem domicílio fixo, Francisco
enfatizava a pobreza interior, entendida no despojamento de toda pretensão a
aquisições intelectuais e mesmo morais e espirituais, consideradas como formas
dissimuladas de obter domínio sobre os outros e como expressões de orgulho e
individualismo.[44] Por outro lado, Wolf aponta para alguns paradoxos em suas
posições sobre a pobreza, e para ele parece claro que Francisco assumiu a
pobreza neste mundo para ser investido de riquezas no céu. Além disso, o autor
sugere que seu exemplo pouco fez para mudar a mentalidade de seus
contemporâneos sobre a pobreza da população em geral ou para chamar a atenção
para as vantagens da pobreza como um modo de vida, e ele parece ter-se tornado
involuntariamente o destinatário da maior parte das esmolas e doações na Úmbria,
cujos doadores estavam possivelmente mais interessados nos ganhos secundários
que deviam advir do apoio a um grande e famoso santo, deixando os outros
pobres, que não haviam escolhido voluntariamente sua própria pobreza, ainda
entregues à própria sorte.[41] Entretanto, Voegelin considera que foi uma
escolha sábia ele ter buscado imitar antes a pobreza e os sofrimentos de
Cristo, ou seja, o seu lado eminentemente humano, uma vez que a tentativa de
imitá-lo em sua glória teria sido impossível. Fez, desse modo, o que estava
dentro do alcance de um homem fazer diante de um modelo ideal que em sua
natureza mais íntima era excessivamente transcendental para ser transposto para
o mundo da vida objetiva.[45]
Dentro
das suas práticas de austeridade era dada atenção especial ao corpo humano, a
quem ele chamou de "Irmão Burrico", pois ao mesmo tempo que ele era
um inimigo e uma grande fonte de pecado, também era um instrumento para a
salvação por ser o único veículo através do qual se podia levar a cabo todo o
trabalho, e era ainda o campo de batalha onde se efetuava a luta espiritual, e
por isso devia ser constantemente mantido sob estrita vigilância e disciplina
férrea. Por outro lado, assim como Cristo suportara benignamente as grandes
dores de sua Paixão, todas as aflições e doenças corporais deviam ser aceitas
com paciência e alegria e encaradas como formas de purificação, o que incluía a
resistência às urgências sexuais, preservando-se completa castidade, e aos
apelos da gula e do desejo por confortos físicos. Mas também o corpo era visto
como uma maravilha, uma das formas de expressão da bondade e da beleza de Deus,
já que segundo as Escrituras o homem fora feito à imagem e semelhança da
divindade, e seu corpo, depois de purificado, havia de ser o templo vivo do
Deus vivo.[34]
Niccolò
Antonio Colantonio: São Francisco dando a Regra para as suas Ordens, c.
1440-1470. Museu de Capodimonte.
Como
administrador da Ordem era benevolente, exuberante e caloroso no trato,
almejava uma observância voluntária da Regra e quando necessário exigia a
obediência, mas com doçura, persuasão e humor; era brando no apontar as faltas
de seus companheiros e perspicaz ao encontrar sempre o corretivo mais
proveitoso, estimulava a independência, a sinceridade e a criatividade dos irmãos,
fomentava a harmonia entre todos e contraindicava grandes exercícios de ascese;
era rigoroso sobretudo consigo mesmo, imaginando sempre novas formas de
autonegação, impondo-se inúmeras mortificações e penitências por deslizes
mínimos, e acusando-se repetidamente de fraqueza e indignidade e uma multidão
de vícios que só ele percebia em si.[27][46]
Dos
leigos, que não haviam feito votos sagrados, não esperava tanta disciplina, e
Francisco em vez de denunciar e condenar seus hábitos, como faziam outras Ordens,
buscava que as atividades do mundo não fossem suprimidas, antes, que fossem
realizadas num espírito de reverência para com o Criador de todas as coisas, o
que se estendia para a atividade sexual, mas a ser realizada preferencialmente
dentro do estado conjugal.[47] Apesar de prescrever aos irmãos que mantivessem
distância das mulheres, não parece ter nutrido preconceitos contra elas; a
separação de sexos nas Ordens religiosas era uma praxe, assim como o celibato,
dessa forma a distância era uma medida de precaução contra as tentações da
carne; além disso foi um grande devoto da Virgem Maria, parece ter mantido uma
relação afetiva especial para com Santa Clara, vendo nela ainda uma liderança
natural e uma continuadora de sua obra, e em seus escritos, bem como nos dos
seus biógrafos, abundam referências a ele e aos irmãos como mães uns dos
outros, como esposas de Jesus e como gestantes do espírito de Deus, numa
simbologia reversa que era comum no seu tempo e não causava surpresa.[48][49]
Entre
os irmãos era proibida toda observação de hierarquia salvo para com os
superiores indicados regularmente e para com o papa, mas eram obrigados a
servir uns aos outros à primeira necessidade e sem questionamento, incluindo o
dever de lavarem os pés uns dos outros como forma de praticar a humildade. Não
deviam expressar críticas ou emitir julgamentos nem entre si nem dirigí-los
para as outras pessoas, nem combater os heréticos, não podiam se envolver em
querelas, nem devolver insultos ou agressões físicas. Ao contrário, deviam
"ser meigos, pacíficos e despretensiosos, gentis e humildes, falando com
todos educadamente". Francisco foi o primeiro na história do Cristianismo
a chamar sua comunidade de fraternidade.[44][50]
Depois
de sua conversão alimentou sempre desconfiança contra os estudos eruditos, ele
próprio recebeu em sua juventude uma educação medíocre e jamais foi ordenado
sacerdote, não podendo celebrar a missa, permanecendo apenas como diácono por
outorga especial de Inocêncio III, e alertou seus companheiros várias vezes
para não se basearem em preceitos derivados de interpretações individuais de
textos sagrados, mesmo aquelas emanadas do alto clero e dos doutores sacros.
Considerava o texto da Bíblia impecável e inalterável, pois, de acordo com a
tradição de sua época, fora ditado diretamente por Deus e não carecia assim que
fosse corrigido ou parafraseado, e da mesma forma envidou esforços para que
seus próprios escritos não fossem reinterpretados ou adulterados por terceiros
- não obstante seus cuidados, sua Regra primitiva foi reformada várias vezes
contra a sua vontade e seu Testamento, que havia sido dado como um complemento
à Regra para ser lido sempre que a Regra o fosse, foi desautorizado pelo papa
poucos anos depois de sua morte.[15][51]
Dessa
forma, sem estudos profundos, atendo-se literalmente à palavra escrita na
Bíblia e observando à risca o ritual elaborado pela Igreja constituída, sua
religiosidade, segundo Raoul Manselli, se colocava absolutamente numa dimensão
originária do nível popular, como se podia esperar do povo comum de seu tempo e
no seu caso de um filho de mercador, ainda que ela tenha sido
extraordinariamente enriquecida com sua própria e intensa experiência do
fenômeno religioso e com sua intuição pessoal - ou com o auxílio das revelações
que recebia - para dar-lhe sentido prático, e foi essa sua contribuição
adicional a uma tradição já estabelecida que deu originalidade para o movimento
que ele iniciou.[52]
O
hábito de São Francisco, todo remendado de trapos, preservado na Basílica de Assis
Sua
insistência na pobreza total - não só individualmente, mas para a Ordem também
- na simplicidade em tudo e no rigor da disciplina foi o maior foco de
discórdia na consolidação interna de seu grupo, e foi vista pela comunidade
laica de sua região como um elemento de subversão social; ainda em sua vida ela
foi posta em xeque por seus irmãos e com ainda mais força pela alta hierarquia
católica, que sentiu-se ameaçada na perspectiva de que a extrema pobreza
franciscana fosse tomada como um sinal de pureza maior do que a da própria
Igreja, e que isso fosse usado por aqueles que combatiam a corrupção do clero
em detrimento da instituição.[50][51][53] A exigência acabou por ser em muito
atenuada, contra a sua vontade expressa, e menos de um século depois de seu
falecimento a Ordem dos Franciscanos já era tão rica quanto as outras Ordens e
muitos de seus membros haviam se tornado grandes doutores eruditos e ocupantes
de importantes cargos na Igreja e nas universidades, com o resultado da perda
de grande parte de seu carisma original e o surgimento de sentimentos de
desilusão e cinismo em larga escala. Segundo a opinião de Kleinberg & Todd,
a "domesticação" dos franciscanos e sua inserção definitiva no
esquema monástico-clerical padrão foi um dos fatores que levaram a uma radical
queda do prestígio da Igreja na Idade Média tardia,[51] mas seu exemplo de
fraternidade e de engajamento autêntico com a vida dos pobres tem presentemente
um grande valor inspiracional para os teólogos da libertação em suas lutas
políticas no Terceiro Mundo.[54]
Pregador
e pacificador
Os
testemunhos de época relatam que seu estilo de pregação era direto e simples,
usando o vernáculo, longe da eloquência sacra de seu tempo, mas afirmam que sua
sinceridade e compreensão das dificuldades da vida popular, sua habilidade em
evocar imagens ilustrativas vivazes em pequenas parábolas ou histórias
retiradas de suas experiências do cotidiano entre o povo, e sua capacidade de
apresentar a doutrina cristã de forma inteligível, faziam que seu discurso tivesse
um efeito persuasivo profundo. Também fazia uso do humor e de uma atuação que
tinha muito de teatral, a fim de que a mensagem se fizesse mais acessível e
atraente,[51][55][56] e usualmente solicitava permissão da autoridade religiosa
local para iniciar sua fala ao povo. Às vezes acompanhava a pregação com o
canto de hinos sacros, alguns compostos em letra e música por ele mesmo, e
chamava a si e seus irmãos de "os menestréis de Deus".[57]
Sua
paciência e bondade para com todos fizeram com que fosse procurado
constantemente por pessoas de todas as posições sociais que iam a ele em busca
de conselho e orientação, e a todos instruía na melhor forma de alcançar a
salvação na condição em que se encontravam, regozijando-se em ver que suas
palavras amiúde davam frutos positivos e que os costumes se iam reformando
gradualmente. No florido estilo de sua Vita prima Celano afirma que em virtude
de sua presença e atuação em pouco tempo toda a Úmbria se havia transformado, e
se tornara um lugar mais aprazível.[26] Francisco desejava acima de tudo que os
irmãos pregassem através do exemplo pessoal, conseguido na imitação do exemplo
de Cristo, e o modelo monástico que ele implementou representa uma transição
entre o monasticismo medieval enclausurado e as novas formas de vida apostólica
que mais tarde se consolidaram, mais abertas para o mundo exterior e mais
dedicadas ao serviço prático para com os necessitados, e fez essa reforma sem
jamais ter pretendido ser um reformador. Outra de suas contribuições foi a de
enfatizar a paz, a tolerância, o respeito e a concórdia, e ele sempre teve a
convicção de que os irmãos deviam ser pacificadores, o que deixou expresso em
vários escritos e foi repetido por seus biógrafos. Mesmo nas missões que enviou
para entre os muçulmanos fez recomendações para que os missionários mantivessem
uma postura de respeito para com as manifestações da divindade em todos os
credos e de sujeição às leis civis locais, e que evitassem se envolver em
disputas teológicas. Ele pessoalmente conseguiu a paz em vários conflitos
internos nas cidades italianas de Arezzo, Peruggia, Siena, Gubbio e Bolonha, e
pouco antes de morrer, já gravemente enfermo, fez a paz entre o bispo e o poder
civil em Assis, o que não deixa de ter conotações simbólicas, apontando para seu
perene desejo de reconciliação entre a religião e o mundo profano.[58]
Como
Cristo recomendara a seus apóstolos que em cada casa em que entrassem dissessem
"Que a paz do Senhor esteja nesta casa", usualmente Francisco
costumava iniciar e terminar suas prédicas com a proclamação da paz.[59][60] A
seus próprios seguidores, Francisco dissera: "Assim como anunciais a paz
pela boca, estejais certos de que a paz esteja em vossos corações". A
saudação Pax et bonum (Paz e bem), que usava frequentemente, se tornou mais
tarde o lema da sua Ordem[61][62] e também da cidade de Assis.[63] Em 2002 o
papa João Paulo II presidiu uma cerimônia em Assis que reuniu duzentos líderes
de vinte e quatro religiões para que fosse celebrado um Dia Internacional de
Preces para a Paz no Mundo. Foi elaborado o documento O Decálogo da Paz de
Assis e enviado para todos os Chefes de Estado do mundo, e no encerramento da
cerimônia todos trocaram o beijo da paz enquanto era cantado o Cântico ao irmão
Sol.[64]
O
místico
Segundo
Bernard McGinn o elemento místico no Cristianismo é aquela parte da crença e
das práticas que preparam e conscientizam o indivíduo para aquilo que pode ser
descrito como a presença imediata e direta de Deus, mas para Paul Lachance o
misticismo pessoal de Francisco, parte tão proeminente de sua vida, até há
pouco tempo vinha sendo estudado quase apenas a partir das biografias escritas
sobre ele e das numerosas lendas criadas a seu respeito, com pouca atenção ao
que ele mesmo expressara em seus escritos ou fora registrado a partir de suas
próprias palavras - até onde é possível considerar a documentação a ele
atribuída como autêntica. Mesmo na tradição cristã que o considera, obviamente,
um santo, poucas vezes ele é descrito como um místico, e esse silêncio também
se deve ao fato de que o estudo de sua experiência interior é extremamente
difícil, pois ele poucas vezes falou diretamente no assunto e seus escritos dão
apenas indicações indiretas. Nisso ele seguiu na contramão da tendência de seu
tempo entre as outras Ordens religiosas, cuja literatura é muito mais abundante
e explícita a esse respeito, e seu modo de ser estava muito mais relacionado
com o dos cristãos primitivos, dos primeiros padres do deserto e dos patriarcas
do oriente, para quem as revelações autobiográficas eram coisa estranha. Um dos
documentos que dão uma primeira ideia sobre sua visão sobre a divindade é a
própria Regra Primitiva, o seu primeiro credo expresso em sua pureza, a qual,
embora perdido seu original, crê-se que sobreviva em fragmentos dispersos entre
vários manuscritos. Nesses trechos Deus é mostrado como criador, redentor e
salvador, fonte de todo o bem, e essência e objetivo último de todo o ser,
sendo "uno, sem início e sem fim, imutável, invisível, indescritível,
inefável, incompreensível, insondável, bendito, digno de louvor, glorioso,
exaltado nas alturas, sublime, altíssimo, gentil, amável, deleitável e
totalmente desejável acima de tudo para sempre". Sua atitude diante desse
Deus "onipotente, santíssimo, altíssimo e supremo" era de completa
sujeição e entrega, movidas por um desejo intenso de "amar, honrar,
adorar, servir, louvar e bendizer, glorificar e exaltar, magnificar e
agradecer", e essas cadeias de adjetivos entusiásticos são comuns em todos
os seus escritos, e evidenciam que para Francisco Deus era essencialmente
inapreensível e maravilhoso sob todos os aspectos, e não deixa de ser tocante o
esforço que ele fazia para pelo menos em parte tentar descrever o que não podia
ser descrito e menos ainda transmitido a outrem através de palavras.[65][66]
Sassetta:
Êxtase de São Francisco, 1437-44. Coleção particular, Florença.
Na
Epistola ad Fideles II (Segunda carta aos fiéis) ele enalteceu o sacramento da
Eucaristia, pelo qual tinha uma especial veneração em virtude de a hóstia consagrada
ser, segundo o dogma católico, o próprio corpo de Cristo transubstanciado, dado
aos homens como uma lembrança perpétua de si mesmo e como dádiva de seu amor, e
enfatizou não tanto a simples imitação da vida e paixão de Cristo, mas sim a
importância da habitação do Deus vivo no interior de cada um através da
descrição dos benefícios recebidos por aquele que obtém esse prêmio:[67][68]
"O
Espírito do Senhor descansará sobre eles e fará neles habitação e morada. E
serão filhos do Pai celeste, cujas obras fazem. E são esposas, irmãos e mães de
nosso Senhor Jesus Cristo. Somos esposas quando a alma fiel se une a Jesus
Cristo através do Espírito Santo. Somos certamente irmãos, quando fazemos a
vontade de seu Pai, que está no céu. Somos mães quando o carregamos em nossos
corações e corpos através do amor e de uma consciência pura e sincera; damo-lo
à luz através de sua santa maneira de operar, a qual deve brilhar diante dos
outros como exemplo. Oh, quão glorioso, quão santo e portentoso é ter um Pai no
céu! Oh! como é santo ter um esposo consolador, belo e admirável! Oh, quão
santo e quão adorável, prazeroso, humilde, tranquilo, doce, amável e desejável
acima de todas as coisas ter tal Irmão e Filho, que deu sua vida por suas
ovelhas e orou ao Pai por nós dizendo: 'Pai santo, guarda em teu nome os que me
deste' !"[69]
Mesmo
dando essas descrições indiretas de suas experiências místicas, em nenhum de
seus escritos ele as descreve objetivamente, e coube aos seus biógrafos fazerem
extrapolações e descrições mais vívidas, cuja veracidade fica sempre sujeita ao
imponderável da interpretação alheia. Entretanto, em vários pontos desses
documentos posteriores parece sobreviver, discernível através da ornamentação
literária, um reflexo autêntico de como apareceram para ele suas visões e
êxtases, ou como suportou os frequentes ataques de seres demoníacos, tais como
se narra nos Fioretti, do qual um fragmento já foi exposto antes e que descreve
o abismo que ele via entre a magnificência de Deus e sua pessoa miserável. De qualquer
forma, suas contemplações frequentemente revolviam em torno de trechos da
Paixão que lia nos Evangelhos, e nesse sentido ele deu nascimento a uma nova
forma de misticismo, o "misticismo Cristomimético" ou de imitação de
Cristo, que Ewert Cousins chamou de "misticismo do evento histórico",
que consiste na lembrança de um evento significativo do passado, na entrada em
seu conteúdo dramático e na extração a partir dele de uma energia espiritual
que eventualmente transporta o contemplador além do evento para a união com
Deus. Sua própria estigmatização foi o corolário desse modo de meditar, e que
depois dele foi muito explorada por outros místicos como São Boaventura e Santa
Clara, e mais uma multidão de outros nos séculos seguintes.[34][67]
Por
fim, o outro aspecto importante a ser analisado no seu misticismo é sua intensa
e amorosa relação com a natureza, relação que o tornou modernamente em um
patrono dos animais e do meio ambiente. Este aspecto é um dos que mais acusam a
originalidade de sua concepção de mundo em relação ao contexto de seu tempo.
Embora muitas características de seu misticismo não fossem novas, sendo
encontradas nas vidas de vários espirituais anteriores, outras eram inéditas
até ali - sua relação direta, pessoal e familiar com todos os elementos
constituintes da Criação, sua ênfase no caráter beneficente e não neutro ou
ambivalente de todas as coisas e seres do mundo natural, sua exortação literal,
e não alegórica, a animais, plantas e objetos inanimados para que servissem e
louvassem a Deus, sua proposta de que se criasse legislação para que o povo
alimentasse as aves selvagens no inverno no mesmo espírito em que davam esmolas
aos pobres, e a inclusão de animais na celebração da missa. Para Francisco toda
a Criação estava intimamente interconectada, e para ele era fácil transitar de
um nível espiritual para outro e apreciar os múltiplos significados que extraía
de sua leitura do "livro da natureza".[70] Eric Voegelin pensa que
foi por descobrir e aceitar os mais baixos estratos da Criação como partes do
mundo dotadas de significado e dignidade inerentes que ele se tornou uma das
figuras mais importantes da história ocidental.[45]
Mosaico
de Maria Ludgera Haberstroh ilustrando o Cântico das Criaturas, na
Liebfrauenkirche, Innenhof
Essa
forma de ver o mundo ficou expressa com clareza no seu Cântico ao irmão Sol, ou
Cântico das Criaturas, onde chamou os ventos, o sol, a lua, o fogo e outros
elementos do mundo natural de irmãos e convidava a todos celebrarem juntos a
maravilha do mundo e servirem com alegria o seu autor. Neste poema, que além de
possuir altas qualidades estéticas marcou o nascimento da literatura vernacular
italiana, ele deu um testemunho ao mesmo tempo de sua visão integrada da
realidade e do amor que sentia por ela, o que transparece ainda em diversos
relatos posteriores de seus biógrafos e nas inúmeras histórias onde os animais
estão presentes como co-protagonistas, sempre tratados como irmãos e não raro
doutrinados como se fossem pessoas, aproximando-se dele espontaneamente mesmo
quando selvagens e dando sinais de compreenderem suas palavras ao obedecerem
suas instruções, e nas que contam como andava reverente sobre as rochas ou
admirava as flores cheio de júbilo, ou quando defendeu as árvores recomendando
aos lenhadores que não cortassem seus troncos muito embaixo, a fim de que elas
pudessem renascer.[71][72]
O
Cântico também sintetiza o significado profundo e a função essencial da prece
para Francisco, o de sempre glorificar a Deus e abençoar o mundo pela palavra e
pelo trabalho. A natureza para ele era digna de apreço e admiração porque era
uma expressão da divindade onipresente. Mas para Leonardo Boff essa admiração
não foi a causa central que o levou a reordenar e purificar sua consciência,
mas sim o resultado desse processo, e diz: "Quem quer que tente imitar
romanticamente São Francisco em seu amor pela natureza sem passar pelo
ascetismo, pela autonegação, pela penitência e pela cruz há de cair na mais
profunda das ilusões".[73] Complementando essa ideia, numa leitura
psicológica de sua vida, McMichaels vê sua experiência pessoal de um Deus
imanente, numa época em que a divindade era concebida apenas como
transcendente, como um auxílio para que o homem contemporâneo possa transformar
positivamente sua própria concepção de mundo, uma concepção cada vez mais
desafiada por novas descobertas acerca da natureza última da matéria, do tempo
e do espaço, e do poder das forças do inconsciente, e a compara a um processo
bem sucedido de individuação por ter se baseado num senso de responsabilidade
pessoal e social, por ter compreendido e aceitado a necessidade da luta, da dor
e do esforço pelo aperfeiçoamento, e por dar origem a um corpo de valores
coletivos integradores.[74]
O
Cântico ao Irmão Sol, ou Cântico das Criaturas
Altíssimo,
onipotente e bom Senhor, a ti subam os louvores, a glória e a honra e todas as
bênçãos!
A ti
somente, Altíssimo, eles são devidos, e nenhum homem é sequer digno de dizer
teu nome.
Louvado
sejas, Senhor meu, junto com todas tuas criaturas, especialmente o senhor irmão
sol, que é o dia e nos dá a luz em teu nome.
Pois
ele é belo e radioso com grande esplendor, e é teu símbolo, Altíssimo.
Louvado
sejas, Senhor meu, pela irmã lua e as estrelas, as quais formaste claras,
preciosas e belas.
Louvado
sejas, Senhor meu, pelo irmão vento, e pelo ar, pelas nuvens e o céu claro, e
por todos os tempos, pelos quais dás às tuas criaturas sustento.
Louvado
sejas, Senhor meu, pela irmã água, que é tão útil e humilde, e preciosa e
casta.
Louvado
sejas, Senhor meu, pelo irmão fogo, por cujo meio a noite alumias, ele que é
formoso e alegre e robusto e forte.
Louvado
sejas, Senhor meu, pela irmã, nossa mãe, a terra, que nos sustenta e nos
governa, e dá tantos frutos e coloridas flores, e também as ervas.
Louvado
sejas, Senhor meu, por aqueles que perdoam por amor a ti e suportam
enfermidades e atribulações.
Benditos
aqueles que sustentam a paz, pois serão por ti, Altíssimo, coroados.
Louvado
sejas, Senhor meu, por nossa irmã, a morte corpórea, da qual nenhum homem vivo
pode fugir.
Pobres
dos que morrem em pecado mortal! e benditos quem a morte encontrar conformes à
tua santíssima vontade, pois a segunda morte não lhes fará mal.
Louvai
todos vós e bendizei o meu Senhor, e dai-lhe graças, e o servi com grande
humildade![75]
Lista
de escritos a ele atribuídos
Esta
listagem é a que consta no portal da Província dos Capuchinhos de São Paulo,
Brasil. Vários deles têm autenticidade controvertida, e alguns documentos cuja
existência foi registrada em outras fontes mas cujo texto não sobreviveu não
foram incluídos.[76]
Regras
Regula
(apenas fragmentos)
Regula
non bullata (Francisco e outros)
Regula
bullata (Francisco e outros)
Forma
vivendi Sanctae Clarae data
Ultima
voluntas Sanctae Clarae scripta
Testamentum
Admoestações[editar
| editar código-fonte]
De
corpore Domini
De malo
propriae voluntatis
De
perfecta obedientia
Ut nemo
appropriet sibi praelationen
Ut nemo superbiat, sed glorietur in
cruce Domini
De
imitatione Domini
Ut bona
operatio sequatur scientiam
De
pecato invidiae vitando
De
dilectione
De
castigatione corporis
Ut nemo
corrumpatur malo alterius
De
cognoscendo spiritu Domini
De
patientia
De
pauperate spiritus
De pace
De
munditia cordis
De servo
dei humili
De
compassioni proximi
De
humili servo Dei
De bono
et vano religioso
De
inani et loquaci religioso
De
correctione
De
humilitate
De vera
dilectione
Item de
eodem
Ut
servi Dei honorent clericos
De
virtute effugate vitiam
De
abscondendo bono ne perdatur
Cartas
Epistola ad quendam ministrum
Epistola ad fideles
Epistola ad fideles (II)
Epistola ad custodes
Epistola ad custodes (II)
Epistola ad clericos (Recensio prior)
Epistola ad clericos (Recensio
Posterior)
Epistola toti ordini missa
Epistola ad fratrem Leonem
Epistola ad fratrem Antonium (Epistola
ad Sanctum Antonium)
Orações
e cânticos[editar | editar código-fonte]
Oratio
ante Crucifixum dicta
Exhortatio
ad laudem Dei
Laudes
ad omnes horas dicendae
Incipiunt
psalmi
Expositio
in Pater Noster
Benedictio
Fratri Leoni data
Laudes
Dei Altissimi
Salutatio
Beatae Mariae Virginis
Salutatio
Virtutum
Canticum
Fratris Solis vel Laudes Creaturarum
Audite,
poverelle
Fragmentos
diversos
Benedictio
fratri Bernardo data
Testamentum
Senis factum
De vera
et perfecta laetitia
Super
his autem
Representações
e homenagens
Francisco
apreciava a arte e a considerava um instrumento útil no cultivo da devoção. Já
foi visto como ele e seus irmãos usaram a música, a poesia e as encenações em
suas pregações, queria que as igrejas fossem bem adornadas em honra ao corpo de
Cristo que continham, e os franciscanos se tornaram mais tarde incentivadores
de uma arte que fosse imediatamente acessível ao povo.[77] Desde sua morte ele
foi representado inúmeras vezes na pintura e na escultura, da cultura erudita
ou popular, apareceu na literatura ficcional e inspirou diversos músicos
importantes. Entre as criações musicais pode-se destacar:
Cantico
del Sol di Francesco d'Assisi (1862, 1880-81, várias versões); e St. François
d'Assise: La Prédication aux oiseaux (piano, 1862-63), de Franz Liszt;[78][79]
Fioretti
(voz e orquestra, 1920), de Mario Castelnuovo-Tedesco;[80]
San
Francesco d'Assisi (cantata para solistas, coro e orquestra, 1920-1921) de Gian
Francesco Malipiero;[81]
Saint
François d'Assise (1975-83, ópera) de Olivier Messiaen.[82]
Como
personagem de romances ou livros de poesia, apareceu em:
Sant
Francesc (1895), de Jacint Verdaguer;[83]
Saint Francis of Assisi (1923), de
Gilbert Keith Chesterton;[84]
Saint
Francis (1962), de Nikos Kazantzakis,[85] entre muitos outros.
No
cinema foi protagonista em:
The Flowers of St. Francis (1950) de
Roberto Rossellini e Federico Fellini;[86]
Francis
of Assisi (1961) de Michael Curtiz;[87]
Francesco
d'Assisi (1966) de Liliana Cavani;
Brother Sun, Sister Moon (1972) de
Franco Zeffirelli;[88]
Francesco
(1989) de Liliana Cavani;[89]
Chiara
e Francesco (2007) de Fabrizio Costa.[90]
Assis é
naturalmente o maior centro de romaria franciscana do mundo, mas seu santuário
do Monte Alverne também é muito visitado.[91] O município de Canindé no estado
do Ceará, é o maior foco para as romarias franciscanas no Brasil, atraindo 2,5
milhões de romeiros anualmente, onde foi erguida uma estátua do santo medindo
30,25 metros de altura.[92] Francisco foi ainda escolhido padroeiro de grande
quantidade de templos, asilos, escolas e outras instituições em todo o mundo,
bem como se tornou nome de rios (Rio São Francisco) e cidades (San Francisco
nos Estados Unidos, São Francisco de Assis e São Francisco de Assis do Piauí no
Brasil, entre muitas outras).
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Fonte:
Wikipédia
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