Capítulo escrito por Clovis Renato Costa Farias na Obra “Carta
de Liberdades Sindicais”, publicada pelo Ministério Público do Trabalho em
2016, organizada pelo Prof. Dr. Gérson Marques. ISBN nº 978-85-67589-28-2
A negociação coletiva para a
otimização da dignidade da pessoa humana nas relações de trabalho, no Estado
Democrático de Direito, somente pode ser efetiva quando as comissões de negociação
contam com representantes da Administração dotados de poderes ou autorização
para assumir compromissos.
Algo que coaduna com o
desenvolvimento do conceito de Trabalho Decente, nos termos propalados pela
Organização Internacional do Trabalho (OIT), quanto ao reconhecimento efetivo
do direito de negociação coletiva e ao fortalecimento do diálogo social.
Tais agentes do Poder Público com
poderes demarcam a realização dos dispositivos previstos na Convenção nº 151 da
OIT, sendo um dos plenos mecanismos para o fomento das negociações coletivas
sobre as relações de trabalho no serviço público.
A relevância do tópico em comento
se dá em face da percepção das entidades representativas dos trabalhadores da
falta de priorização das mesas de negociação pelo Poder Público, de modo que
recorrentemente envia representantes inaptos à negociação por não terem poderes
de assumirem responsabilidades frente as propostas.
A realização de negociação com o
Poder Público sem a presença de representante apto a assumir compromissos fere
a legalidade, a economicidade e a boa fé.
Malfere a legalidade (art. 37 da
CF/88) por descumprir dispositivos específicos da Convenção 151 da OIT,
ratificada pelo Decreto 7.944 de 06/03/2013, que impõe o encorajamento e a
promoção do desenvolvimento e utilização plenos de mecanismos que permitam a
negociação das condições de trabalho entre as autoridades públicas interessadas
e as organizações de trabalhadores da Administração Pública ou de qualquer
outro meio que permita aos representantes dos trabalhadores da Administração
Pública participarem na fixação das referidas condições (art. 7º, Conv. 151).
Vergasta a economicidade por não
compor adequadamente a mesa e levar à necessária realização de novas reuniões,
ainda que com escassez de tempo em face dos prazos para votação das leis
orçamentárias e compromissos das partes, o que impõe um custo para todos.
Ainda, pode levar à incompreensões por parte dos trabalhadores quanto à má-fé
administrativa e ao estabelecimento ou elastecimento de eventuais greves para o
aprimoramento dos canais de negociação.
Impõem-se deveres de cooperação e
colaboração para o atendimento da boa fé nas mesas de negociação, sendo lógico
que o envio de representantes sem poderes de assunção de compromissos fere tal
princípio. A concretização da boa-fé, objetivamente, parte da proteção da
confiança nas negociações.
Nestes termos, a legalidade, a
economicidade e a boa fé formam a base do trânsito jurídico e, em particular,
de toda vinculação jurídica das partes em negociação. Algo que não pode se
concretizar com a presença de representantes sem poderes nas negociações,
tornando-se marco da confiança e um elemento essencial para a solução dos
conflitos de interesses nas relações laborais.
Destaque-se que a confiança está
inserida tanto na boa-fé objetiva quanto na boa-fé subjetiva, sendo protegida
pelo ordenamento jurídico.
Um aspecto relevante para a
compreensão do verbete é observar os elementos de validade dos atos que sairão
da mesa de negociação coletiva, os quais devem passar por um agente capaz,
objeto lícito e forma prescrita em lei, muito utilizado no Direito Civil.
Requisito que materializa a viabilidade da negociação coletiva com o Poder
Público quando os representantes da Administração são competentes e dotados de
poderes para assumirem compromissos.
Algo previsto na Lei da Ação
Popular, que visa proteger o patrimônio público, a qual prevê que são nulos os
atos lesivos ao patrimônio das entidades nos casos de incompetência, vício de
forma, ilegalidade do objeto, inexistência dos motivos e desvio de finalidade.
Ademais, para justificar a
desídia de alguns gestores na instalação das negociações coletivas, há autores
que defendem a supremacia do interesse público como algo impassível de
negociação, mas a legislação e a jurisprudência pátrias vêm vencendo tais
teses.
Nestes termos, a Lei nº
9.469/1997 (intervenção da União nas causas em que figurarem, como autores ou
réus, entes da administração indireta; regula os pagamentos devidos pela
Fazenda Pública em virtude de sentença judiciária) dispõe que o Advogado-Geral
da União, diretamente ou mediante delegação, e os dirigentes máximos das
empresas públicas federais poderão autorizar a realização de acordos ou
transações, em juízo, para terminar o litígio, nas causas de valor até R$
500.000,00 (quinhentos mil reais), bem como o Advogado-Geral da União poderá
dispensar a inscrição de crédito, autorizar o não ajuizamento de ações e a
não-interposição de recursos, assim como o requerimento de extinção das ações
em curso ou de desistência dos respectivos recursos judiciais, para cobrança de
créditos da União e das autarquias e fundações públicas federais, observados os
critérios de custos de administração e cobrança.
Outrossim, a mesma norma dispõe
que os dirigentes máximos das empresas públicas federais poderão autorizar a
não-propositura de ações e a não-interposicão de recursos, assim como o
requerimento de extinção das ações em curso ou de desistência dos respectivos
recursos judiciais, para cobrança de créditos, atualizados, de valor igual ou
inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), em que interessadas essas entidades na
qualidade de autoras, rés, assistentes ou opoentes, nas condições aqui
estabelecidas.
A Lei nº 13.140, de 26/06/2015,
dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de
controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração
pública. No art. 35 ressalta que as controvérsias jurídicas que envolvam a
administração pública federal direta, suas autarquias e fundações poderão ser objeto
de transação por adesão, com fundamento em autorização do Advogado-Geral da
União, com base na jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal ou de
tribunais superiores; ou parecer do Advogado-Geral da União, aprovado pelo
Presidente da República. Algo que incentiva e facilita a designação de
representantes dotados de poderes de transação para participarem da negociação
coletiva e impõem aos gestores maior respeito às mesas de negociação
instaladas.
Desse modo, resta comprovada a
relevância do verbete, bem como reflete a necessidade de amadurecimento do
diálogo via negociação coletiva pelo Poder Público.
(Clovis
Renato Costa Farias)
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