ARTIGO PUBLICADO NA REVISTA: IN FORMA SINDICAL
Clovis Renato
Costa Farias (advogado, professor universitário, doutor em Direito, membro do
GRUPE e da Excola)
As manifestações do
Poder Executivo da União, nos rudimentos da presente gestão, vêm sendo alvo de
críticas negativas, em especial, pelo fato de beneficiar, sem equilíbrio,
determinados segmentos da sociedade e assumir postura belicosa contra segmentos
que ocupam papel histórico, social e representativo, tais como os sindicatos.
Algo que segue além
das declarações públicas, em que deveria cumprir os fundamentos da República
Federativa do Brasil harmonizando os valores sociais do trabalho com a livre
iniciativa, nos termos do art. 1º, inciso IV, da Constituição. Neste período
festivo nacional, com fim de semana e feriado inclusos, impôs a MP nº 873, de
01.03.2019 (sexta-feira de carnaval), em descumprimento a requisitos
fundamentais essenciais, p. ex. o art. 8º, IV, constitucional, mas,
imediatamente, causando impactos.
Apegam-se ao caso as
observações de Azevedo[1] ao
destacar que “as medidas provisórias
representam o câncer que consome, lenta e gradualmente, a saúde da nossa
democracia”. Situação percebida pelo Congresso Nacional, como demarcado
pela PEC nº 72/2005-SF, já aprovada em dois turnos no Senado Federal e remetida
à Câmara dos Deputados (PEC 511/2006-DC), a qual dispõe dentre as alterações
que para a edição e tramitação das MPs, tais normas não teriam mais força de
lei assim que editadas pelo Executivo, de modo que gerariam efeitos apenas após
avaliação em três dias úteis, pelas Comissões de Constituição, Justiça e
Cidadania da Câmara ou Senado. Tal PEC, encontra-se pronta para Pauta no
Plenário, em segundo turno, uma vez que foi aprovada em primeiro turno no dia
17/02/2009.
Em termos atuais, o
art. 62, caput, da Constituição, dispõe
que somente “em caso de relevância e
urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com
força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional”.
Tais normas poderão
ter eficácia por até 120 dias[2], contado
de sua publicação, de modo que, não havendo apreciação pelo Congresso Nacional,
tal norma perderá a eficácia desde a sua edição (rejeição tácita). O parlamento
também poderá expressamente deixar de converter a MP em lei, disciplinando
apenas os efeitos delas decorrentes por meio de decreto legislativo. Contudo,
se não for editado o decreto legislativo até 60 dias da rejeição da MP pelo CN,
as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante a
sua vigência serão mantidos os dispositivos da MP no período de vigência (art.
62, § 11).
No caso da MP nº 873,
seria relevante que o CN editasse o decreto legislativo para fins de elidir seu
cumprimento em qualquer hipótese. A edição da MP, que tem força de lei, torna
as leis e normas infralegais incompatíveis com eficácia suspensa, no período de
vigência da MP. Rejeitada a MP pelo CN, a lei que teve a eficácia suspensa
volta a produzir efeitos, uma vez que a lei não foi revogada pela MP, o que,
somente, ocorrerá se a MP for convertida em lei.
Outro alerta importante
quanto a eficácia da MP decorre do disposto no art. 62, § 12, caso do CN
converta a MP em lei, “aprovado projeto
de lei de conversão alterando o texto original da medida provisória, esta
manter-se-á integralmente em vigor até que seja sancionado ou vetado o projeto”.
Outrossim, o prazo a
que de vigência da MP, art. 62, § 4, deve ser contado da publicação da medida
provisória, suspendendo-se durante os períodos de recesso do Congresso
Nacional. Ressalte-se que o recesso é a suspensão das atividades do Congresso
Nacional, ocorre nos períodos de 18 a 31 de julho e de 23 de dezembro a 1º de
fevereiro. Para haver o recesso de julho é necessário que o Congresso aprove o
projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Ainda, com objetivo de zelar
pelas prerrogativas do Legislativo, a Comissão Representativa funciona no
período de recesso, detendo alguns poderes, tais como o de aprovar créditos
adicionais solicitados pelo governo e fiscalizar os atos do Executivo.
Destaque-se que
compete à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas
provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão
separada, pelo plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional (art. 62, §
9º). A deliberação de cada uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito
das medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre o atendimento de seus
pressupostos constitucionais (relevância e urgência). Ademais, terão sua
votação iniciada na Câmara dos Deputados (art. 62, § 8º).
Nos termos do § 10º
do art. 62, “é vedada a reedição, na
mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada ou que
tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo”. Leia-se rejeição em
termos de rejeição expressa e tácita pelo CN, uma vez que posicionamentos do
STF quanto a possibilidade de reedição de MP em caso de perda da eficácia da MP
por decurso do prazo de vigência sem análise pelo CN, são anteriores à EC nº
32/2001 (alterou MP), incluindo o § 10º no art. 62.
Observa-se que, por
flagrante inocorrência da urgência e relevância ensejadores da MP, de modo excepcional,
presente desvio de finalidade ou abuso de poder de legislar, pode o Poder
Judiciário adentrar na esfera discricionária do Presidente da República,
garantindo-se a supremacia constitucional. Algo destacado na jurisprudência do
STF, ao assentar que: “Conforme
entendimento consolidado da Corte, os requisitos constitucionais legitimadores
da edição de medidas provisórias, vertidos nos conceitos jurídicos
indeterminados de "relevância" e "urgência" (art. 62 da
CF), apenas em caráter excepcional se submetem ao crivo do Poder Judiciário,
por força da regra da separação de poderes (art. 2º da CF)”, nos termos da ADI
2.213, rel. min. Celso de Mello, DJ de 23-4-2004; ADI 1.647, rel. min. Carlos
Velloso, DJ de 26-3-1999; ADI 1.753 MC, rel. min. Sepúlveda Pertence, DJ de
12-6-1998; ADI 162 MC, rel. min. Moreira Alves, DJ de 19-9-1997, ADC 11 MC,
voto do rel. min. Cezar Peluso, j. 28-3-2007, P, DJ de 29-6-2007, ADI 4.029,
rel. min. Luiz Fux, j. 8-3-2012, P, DJE de 27-6-2012.
[1] AZEVEDO, Márcia Maria Corrêa de. Prática do processo legislativo: jogo
parlamentar; fluxos de poder e ideias no Congresso; exemplos e momentos
comentados. São Paulo: Atlas, 2001. p. 178.
[2] CF/88, art. 62, § 3º c/ § 7º. 60d
regra de vigência + 60d uma única prorrogação por igual período da vigência,
caso não tiver a sua votação encerrada nas duas Casas do Congresso Nacional.
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