A MP 881/2019 e a manutenção
das leis municipais e negociações coletivas para o funcionamento do comércio
nos domingos e feriados
Demítrius Bruno Farias Valente*
Clovis Renato Costa Farias*
RESUMO: O presente trabalho aborda
a influência da Medida Provisória nº 881, de 30 de abril de 2019, que trata
sobre a liberdade econômica, com artigo específico acerca do funcionamento dos
empreendimentos nos domingos e feriados, o que tem gerado impasses nas negociações
coletivas para a formação de acordos e convenções coletivas de trabalho que regulam
a matéria, obedecendo às competência local e leis municipais, conforme
jurisprudência pacífica em âmbito nacional. Demonstra-se que interpretações
divergentes, com preponderância da liberdade ampla para o funcionamento,
independente de observação sistemática da normatização pátria, lesa o direito
dos trabalhadores, entidades representativas e a negociação coletiva no Estado
Democrático de Direito como um todo, nos termos do art. 1º, da Constituição de
1988. Situação que tem travado mesas de negociação em curso e ensejado
interpretações de descumprimento de acordos e convenções coletivas já
negociados entre os sindicatos e as empresas com a representação dos
trabalhadores por meio sindical. Assim, o presente escrito visa refletir sobre
a matéria, trazer a normatização nacional e internacional sobre o tema, assim
como a jurisprudência brasileira, para fins de melhor apreciação do tema, evitando-se
lesões a direitos consolidados e regulamentados, com consequente busca do Poder
Judiciário para resolver a questão.
PALAVRAS-CHAVE: Direito. Competência
Municipal. Negociação coletiva. Sindicatos
I.
ASPECTOS INTRODUTÓRIOS
Em 30 de abril de 2019, foi editada a
Medida Provisória 881, conhecida como “PEC da liberdade econômica”, que prevê
em seu artigo 1º o objetivo de instituir
“a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, que estabelece normas
de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica
e disposições sobre a atuação do Estado
como agente normativo e regulador, nos termos do disposto no inciso IV do caput do art. 1º, no
parágrafo único do art. 170 e no caput do art. 174 da Constituição Federal”.[1]
[2]
[3]
Ao presente estudo importa
especificamente o seu art. 3º, II, especialmente diante das diversas
interpretações conflitantes decorrentes do direito de “produzir,
empregar e gerar renda, assegurada a liberdade para desenvolver atividade
econômica em qualquer horário ou dia da semana”, como se transcreve:
[4]DA DECLARAÇÃO DE DIREITOS DE LIBERDADE
ECONÔMICA
Art. 3º São direitos de toda pessoa, natural ou jurídica,
essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País, observado
o disposto no parágrafo único do art. 170 da Constituição:
(...)
II - produzir, empregar e gerar renda,
assegurada a liberdade para desenvolver atividade econômica em qualquer horário
ou dia da semana, observadas:
a) as normas de proteção ao meio
ambiente, incluídas as de combate à poluição sonora e à perturbação de sossego;
b) as restrições advindas de obrigações
do direito privado, incluídas as situações de domínio de um determinado bem ou
de partes de um bem por mais de uma pessoa simultaneamente;
(...)
O contexto de liberalização adotado pelo atual
governo, inclusive assoberbando o Poder Legislativo e a sociedade em geral com
a chuvas de medidas provisórias impróprias, tem gerado forte insegurança jurídica
e precarizando as relações econômicas que a conjuntura afirma pretender
aprimorar, como se demonstrará, no caso exemplificativo constante no presente
artigo.
II.
LIBERDADE PARA DESENVOLVER ATIVIDADE ECONÔMICA
EM QUALQUER HORÁRIO OU DIA DA SEMANA: POSSÍVEIS IMPACTOS SOBRE O DIREITO DO
TRABALHO
O art. 3º da Medida Provisória enuncia que “são direitos de toda pessoa,
natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento
econômicos do País, observado o disposto no parágrafo único do art. 170 da
Constituição: II – produzir, empregar e
gerar renda, assegurada a liberdade para desenvolver atividade econômica em
qualquer horário ou dia da semana, observadas: d) a legislação trabalhista”, na
expectativa de propiciar um ambiente jurídico favorável à “criação de emprego e
geração de renda”.
Em primeiro lugar, observe-se que a aludida norma tem como núcleos
“produzir”, “empregar” e “gerar renda”. Portanto, não teve o objetivo de
disciplinar exclusivamente o empreendedorismo individual, mas sim as relações
produtivas em sua integralidade, incluindo as relações trabalhistas.
Entretanto, deve-se tomar muito cuidado com análises acerca do
respectivo dispositivo que se limitem a uma visão exegética, uma vez que este
deve ser analisado à luz do sistema normativo brasileiro em sua integralidade,
especialmente das normas trabalhistas (previstas no art. 3º, II, “d” da MP
881/2019 como um fator limitante ao dito direito), e à normatização
constitucional e convencional acerca do tema. Segundo Mônica de Sá Pinto
Nogueira[5]:
(…) embora a Exposição de Motivos da MP 881/19 diga respeito, unicamente, aos intervalos, não é possível
alcançar essa conclusão sem atingir todo o quadro normativo relativo à duração
do trabalho. Note-se, entretanto, que quando a MP 881/19 estabelece a
possibilidade de se exercer a atividade econômica em qualquer dia e horário,
não permite negligenciar as restrições imposta ao trabalho realizado aos
domingos e feriados. A Constituição
Federal de 1988 estabelece a excepcionalidade do trabalho aos domingos, indicando
que o descanso semanal remunerado deve ser fruído preferencialmente aos
domingos (art. 7º, XV, CF/88).
O próprio dispositivo ressalva limites ao direito de liberdade previsto,
já que nas alíneas que seguem o inciso II lê-se, entre as observações a serem
respeitadas: “a) as normas de proteção ao meio ambiente, incluídas as de
combate à poluição sonora e à perturbação de sossego; b) as restrições advindas
de obrigações do direito privado, incluídas as situações de domínio de um
determinado bem ou de partes de um bem por mais de uma pessoa simultaneamente;
c) as normas referentes ao direito de vizinhança; e d) a legislação
trabalhista;”
A redação é clara e não deixa márgem para dúvidas
no sentido de que a legislação trabalhista deve ser respeitada pelo direito
estatuído, ou seja, a legislação trabalhista impõe limites àquele direito. E
nem precisaria tê-lo feito, posto que o Direito não pode ser interpretado de
forma isolada, uma vez que todo novo dispositivo legal deve ser visto à luz da
legislação já existente.
Dentro dessa totalidade da legislação
trabalhista, encontra-se a Lei 10.101/2001, que trata da participação dos
trabalhadores nos lucros e resultados da empresa, que dispõe:
Art. 6º-A. É
permitido o trabalho em feriados nas atividades do comércio em geral, desde que
autorizado em convenção coletiva de trabalho e observada a legislação
municipal, nos termos do art. 30, inciso I, da Constituição.
Na mesma lei, também, torna-se importante
destacar:
“Art. 6o - Fica autorizado o trabalho aos domingos nas
atividades do comércio em geral, observada a legislação municipal, nos termos
do art. 30, inciso I, da Constituição.Parágrafo único. O repouso semanal
remunerado deverá coincidir, pelo menos uma vez no período máximo de três
semanas, com o domingo, respeitadas as demais normas de proteção ao trabalho
e outras a serem estipuladas em negociação coletiva”.
Além disso, há a necessidade de observância da
legislação municipal de cada cidade em cada caso concreto. E tal limitação ao
direito de liberdade trazido pela MP 881/2019 se justifica não só na questão
dos feriados (nesse caso, em conjunto com a necessária autorização por norma
coletiva), mas também na questão dos domingos.
Ou seja, havendo legislação municipal que vede a
abertura de comércio aos domingos, a mesma continua sendo válida e eficaz, uma
vez que não afastada pela MP 881/2019, mas, em verdade, tendo sua
aplicabilidade literalmente sido preservada entre as hipóteses de limitação do
direito de abertura, mais especificamente nas alíneas “a” e “c”.
Daí a conclusão da Central dos Trabalhadores e
Trabalhadoras do Brasil no Rio Grande do Sul de que: “qualquer empresa empregadora que adote
interpretação contrária e resolva ordenar trabalho de seus trabalhadores em
feriados, nesse caso sem observância de permissão por norma negociada
coletivamente e da legislação municipal, e em domingos, nesse caso sem
observância de eventual vedação de funcionamento na legislação municipal
pertinente à cidade do caso concreto, estará sujeita à demanda judicial, no
caso via ação civil pública, para que seja obrigada a respeitar o direito
coletivo da categoria comerciária e a pagar aos seus empregados as verbas e
adicionais decorrentes do trabalho praticado em dias não permitidos pela
legislação trabalhista”[6].
Ressalte-se ainda que a lei nº 13.467 de 2017
trouxe ao direito trabalhista o princípio da prevalência da negociação
coletiva, de tal forma que, ainda que diante de nova legislação, devem ter
prevalência as negociações coletivas já celebradas, especialmente naqueles
pontos relativos a abertura do comércio nos feriados. Independentemente do
texto final aprovado da MP, segue vigente, por exemplo, a CLÁUSULA SEXAGÉSIMA
SÉTIMA DA CCT realizada entre o SINDICATO DOS EMPREGADOS NO COMERCIO DE
FORTALEZA e SINDICATO DO COMERCIO VAREJISTA E LOJISTA DE FORTALEZA, no tocante
a abertura do comércio no feriado em Fortaleza-Ce.
III.
DA NORMATIZAÇÃO ACERCA DO TEMA
O Brasil é signatário das
Convenções 14 e 106 da Organização Internacional do Trabalho. A Convenção 14
trata da concessão do repouso semanal nos estabelecimentos industriais e foi
ratificada pelo Brasil por meio do Decreto Presidencial nº 41721, de 25 de
junho de 1957, após o Decreto Legislativo nº 24, de 1956.
Art. 2 — 1. Todo pessoal ocupado em qualquer
estabelecimento industrial, público ou privado, ou nas suas dependências,
deverá, ressalvadas as exceções previstas nos artigos presentes, ser
beneficiado, no correr de cada período de sete dias, com um repouso, ao menos
de 24 horas consecutivas.
2. Esse repouso será concedido, quando possível, ao
mesmo tempo a todo o pessoal de cada estabelecimento.
3. Coincidirá, quando possível, com os dias
consagrados pela tradição ou costume do país ou da região.
A Convenção nº 106 da OIT
(Organização Internacional do Tabalho), que dispõe sobre o repouso semanal no
Comércio e nos Escritórios e foi ratificada pelo Brasil, através do Decreto
Presidencial nº 58.823, de 14 de julho de 1966, tendo sido esse ato autorizado
pelo Decreto Legislativo nº 20, de 30 de abril de 1965.
Art. 6 — 1. Todas as pessoas às quais se aplica a
presente convenção terão direito, sob ressalva das derrogações previstas nos
artigos seguintes, a um período de repouso semanal, compreendendo um mínimo de
vinte e quatro horas consecutivas, no decorrer de cada período de sete dias.
2. O período de repouso semanal será, sempre que possível, concedido simultaneamente a todas as pessoas interessadas de um mesmo estabelecimento.
3. O período de repouso semanal, sempre que possível, coincidirá com o dia da semana reconhecido como o dia de repouso pela tradição ou pelos usos do país ou da região.
2. O período de repouso semanal será, sempre que possível, concedido simultaneamente a todas as pessoas interessadas de um mesmo estabelecimento.
3. O período de repouso semanal, sempre que possível, coincidirá com o dia da semana reconhecido como o dia de repouso pela tradição ou pelos usos do país ou da região.
(...)
Sobre a negociação coletiva, é
importante destacar as Convenções de número 87 da OIT que trata sobre liberdade
sindical e direito de sindicalização (ainda não ratificada pelo Brasil) e a de
número 154 da OIT, que trata sobre fomento a negociação coletiva, aprovada na
67ª reunião da Conferência Internacional do Trabalho (Genebra — 1981), em vigor
no plano internacional em 11.8.83. No Brasil, aprovada pelo Decreto Legislativo
n. 22, de 12.5.92 e promulgado pelo Decreto n. 1.256, de 29.9.94.
O descanso remunerado aos
domingos é tema relevante à ordem constitucional brasileira, tendo sido
prevista no art. 7º da Constituição Federal. Da mesma forma, a Constituição
também reconhece como direito dos trabalhadores urbanos e rurais o
reconhecimento das convenções coletivas de trabalho.
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de
outros que visem à melhoria de sua condição social:
Além disso, a Constituição
Federal ainda determina que é da competência dos municípios legislar sobre
assuntos de interesse local, dos quais são exemplos os dias e horários de
funcionamento do comércio, tanto em dias úteis quanto em domingos e feriados.
Art. 30. Compete aos Municípios:
Não é outro o entendimento
jurisprudencial sobre o tema, consolidado, inclusive, na súmula vinculante 38.
Súmula
vinculante 38-STF: É competente o município para fixar o horário de
funcionamento de estabelecimento comercial. Aprovada pelo Plenário do STF em
11/03/2015.
Daí já é possível perceber a
flagrante ilegalidade da Portaria Nº 604, de 18 de junho
de 2019 do Ministério da Economia, que prevê que “Art. 1º É concedida,
em caráter permanente, autorização para o trabalho aos domingos e feriados às
atividades constantes do anexo à esta Portaria”. Com a devida vênia, trata-se
de ato normativo editado sem qualquer técnica legislativa, posto ser portaria
que procura revogar o texto constitucional, em total dissonância com o seu
sentido já consolidado inclusive por súmula vinculante.
Na legislação
infraconstitucional também há previsões bem específicas acerca dos direitos em
comento. Em especial, a já mencionada Lei nº 10.101/2001, que trata da participação
dos trabalhadores nos lucros e resultados da empresa. Quanto a negociação
coletiva especificamente, merece destaque a Lei nº 13.467 de 2017, que trouxe
ao direito trabalhista o princípio da prevalência da negociação coletiva.
Dessa forma,
qualquer inovação legislativa deverá obedecer aos parâmetros convencionais,
constitucionais, legais e negociais acerca do tema, com especial atendimento à
vedação ao “efeito cliquet”, que proíbe o retrocesso em matéria de
direitos fundamentais, âmbito em que estão situados os direitos sociais.
Ademais, já
há precedentes sobre o tema, onde o judiciário determinou de forma firme que a
MP 881/2019 não afasta a necessidade de negociação coletiva para trabalhos aos
feriados. A decisão veio do Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região
(processo nº 0000226.61.2019.5.20.0000), que negou mais um recurso interposto
pelos empresários do comércio e dos shoppings, que pediam o direito de abrir o
comércio nos feriados sem autorização em Convenção Coletiva de Trabalho (CCT),
como prevê o artigo 6º da Lei 10.101 de 2000, atualizada pela redação dada pela
Lei nº 11.603 de 2017, a qual subordina a exigência de previsão coletiva para a
abertura do comércio nos feriados.
O que se tem, então, é que o art. art. 6º da Lei nº 10.101/2000, com a
redação dada pela Lei 11.603/2007,subordina a exigência de trabalho dos
trabalhadores em feriados à prévia negociação coletiva da categoria, sendo posterior
ao art. 68 da CLT. Logo, na hipótese, a portaria do Ministério da
Economia/Secretaria Especial de Previdência e Trabalho/Secretaria de
Previdência não é norma jurídica que se sobreponha à lei específica. É
claro, em tese, que o trabalho em feriados não é vedado no ordenamento
jurídico brasileiro; ele só impõe uma condição: negociação coletiva.
Portanto,
mesmo diante de eventual conversão em lei da MP 881/2019, ou mesmo de seu
projeto de conversão mais nefasto, o PLV 17/2019, subsistirá a obrigação de
atendimento às leis municipais acerca dos dias e horários de funcionamento de
comerciais, a necessidade de obediência aos direitos sociais já consolidados no
ordenamento jurídico brasileiro e a imperatividade de atendimento aos Acordos e
Convenções Coletivas vigentes.
IV.
DA INCONSTITUCIONALIDADE POR CONTRABANDO
LEGISLATIVO DO PVL 17/2019
A tática de
inflar o texto base de uma medida provisória para inserir novos dispositivos
sem pertinência temática, desvirtuando-a e fraudando as etapas democráticas da
produção legislativa já é há muito tempo conhecida. Trata-se do funesto
contrabando legislativo.
Durante a tramitação de uma medida provisória
no Congresso Nacional, os parlamentares poderão apresentar emendas? SIM, no
entanto, tais emendas deverão ter relação de pertinência temática com a medida
provisória que está sendo apreciada. Assim, a emenda apresentada deverá ter
relação com o assunto tratado na medida provisória. Desse modo, é incompatível
com a Constituição a apresentação de emendas sem relação de pertinência
temática com medida provisória submetida à sua apreciação. STF. Plenário. ADI
5127/DF, rel. orig. Min. Rosa Weber, red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin,
julgado em 15/10/2015 (Info 803). STF. Plenário. ADI 5012/DF, Rel. Min. Rosa
Weber, julgado em 16/3/2017 (Info 857).
A inserção,
por meio de emenda parlamentar, de assunto diferente do que é tratado na medida
provisória que tramita no Congresso Nacional é chamada de “contrabando
legislativo”, sendo uma prática vedada.
Segundo
Marcio André Lopes Cavalcante, o uso de medidas provisórias se dá por motivos
de urgência e relevância da matéria, cuja análise compete ao chefe do Poder
Executivo. Assim, toda e qualquer emenda parlamentar em projeto de conversão de
medida provisória em lei deve ficar restrita ao tema definido como urgente e
relevante.
Ressalte-se
que a Resolução 1/2002, do Congresso Nacional, que trata sobre os procedimentos
para tramitação das medidas provisórias, veda a apresentação de emendas sem
pertinência temática com a MP.
Art. 4º (...) § 4º É vedada a apresentação de
emendas que versem sobre matéria estranha àquela tratada na Medida Provisória,
cabendo ao Presidente da Comissão o seu indeferimento liminar.
Assim, é até
possível emenda parlamentar ao projeto de conversão da MP, no entanto, deverá
ser observada a devida pertinência lógico-temática.
Essa foi a
conclusão do Supremo Tribunal Federal (STF) ao julgar a ADI nº 5127/DF proposta
contra o art. 76 da Lei nº 12.249/2010, inserido mediante emenda parlamentar em
projeto de conversão de medida provisória em lei, e que tratava sobre assunto
diferente daquele veiculado no texto da MP.
Tal raciocínio deverá ser
aplicado ao Projeto de Lei de Conversão (PLV) nº 17/2019, que utiliza o
texto base da MP 881/2019 como pretexto para fazer uma verdadeira nova reforma
trabalhista, com uma revisão de diversos dispositivos da CLT, sem atender aos
requisitos da relevância e urgência e sem pertinência temática com o texto
original[7].
V.
CONCLUSÃO
Portanto, a liberdade para desenvolver atividade
econômica em qualquer horário ou dia da semana, como qualquer outro direito em
nosso ordenamento jurídico, encontra restrições, não podendo ser entendido como
um salvo conduto para a flexibilização de direitos trabalhistas.
Permanecem, portanto, válidas
as leis municipais e negociações coletivas relativas aos horários e dias de
funcionamento do comércio, de tal forma que qualquer
empresa empregadora que adote interpretação contrária e resolva ordenar
trabalho de seus trabalhadores em feriados, nesse caso sem observância de
permissão por norma negociada coletivamente e da legislação municipal, e em
domingos, nesse caso sem observância de eventual vedação de funcionamento na
legislação municipal pertinente à cidade do caso concreto, estará sujeita à
demanda judicial, no caso via ação civil pública, para que seja obrigada a
respeitar o direito coletivo da categoria comerciária e a pagar aos seus
empregados as verbas e adicionais decorrentes do trabalho praticado em dias não
permitidos pela legislação trabalhista”.
Além disso, é necessário
destacar a flagrante inconstitucionalidade do
PVL 17/2019, decorrente de contrabando legislativo. Na verdade, o que começou
com a edição de uma Medida Provisória com a performática denominação “Medida
Provisória da Liberdade Econômica”, na surdina, envolta nas diárias cortinas de
fumaça criadas pelo Governo Federal, tem se tornado uma nova reforma
trabalhista que trata sobre assuntos sem pertinência temática com o texto
original da MP 881/2019 e sem atender aos requisitos da relevância e urgência.
BIBLIOGRAFIA
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“liberdade econômica” e a desconsideração da
personalidade jurídica (Art. 50, CC): primeiras
impressões. Disponível em: https://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/artigos/703454040/a-medida-provisoria-da-liberdade-economica-e-a-desconsideracao-da-personalidade-juridica-art-50-cc-primeiras-impressoes.
Acesso em: 23 jun. 2019.
LEONARDO, Rodrigo Xavier; RODRIGUES
JUNIOR, Otavio Luiz. A MP da liberdade econômica: o que mudou no Código
Civil? (parte 1). Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-mai-06/direito-civil-atual-mp-liberdade-economica-mudou-codigo-civil.
Acesso em: 23 jun. 2019.
LEONARDO, Rodrigo Xavier; RODRIGUES
JUNIOR, Otavio Luiz. A MP da liberdade econômica: o que mudou no Código
Civil? (parte 2). Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-mai-08/direito-comparado-mp-liberdade-economica-mudou-codigo-civil-parteAcesso em: 23 jun. 2019.
LÔBO, Paulo. Inconstitucionalidades da MP da
"liberdade
econômica" e o Direito Civil. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-jun-06/paulo-lobo-inconstitucionalidades-mp881-direito-civil.
Acesso em: 23 jun. 2019.
MUSZAT, André; MADEIRA, Bruno. A
desconsideração da personalidade jurídica na MP da "liberdade
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em: https://www.conjur.com.br/2019-mai-28/opiniao-desconsideracao-personalidade-juridica-mp-881.
Acesso em: 23 jun. 2019.
TARTUCE, Flávio. A Medida Provisória 881/2019 e as Alterações do
Código Civil - Primeira Parte: Desconsideração da personalidade jurídica e
função social do contrato.
Disponível em: https://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/artigos/703994479/a-medida-provisoria-881-2019-e-as-alteracoes-do-codigo-civil-primeira-parte-desconsideracao-da-personalidade-juridica-e-funcao-social-do-contrato.
Acesso em: 23 jun. 2019.
Demítrius Bruno Farias Valente: Advogado, Professor
Universitário, Mestre em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC).
Clovis Renato Costa Farias:
Advogado,
Professor Universitário, Doutor em Direito pela Universidade Federal do Ceará
(UFC), Assessor Técnico na OIT (107ª e 108ª Conferência Internacional do
Trabalho em Genebra/Suiça), membro do GRUPE e Professor da Excola.
[1]Art. 1º, CF/88. A
República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito
e tem como fundamentos: IV - os valores sociais do trabalho e da livre
iniciativa.
[2] Art. 170, Parágrafo único, CF/88. É assegurado a todos o livre exercício
de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos
públicos, salvo nos casos previstos em lei.
[3] Art. 174, CF/88. Como
agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na
forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este
determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.
[5] NOGUEIRA. Mônica de Sá
Pinto. MP 881/2019 (MP da liberdade econômica). 2019, online.
[7] CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Emenda
parlamentar em medida provisória e contrabando legislativoo.
Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/c32d9bf27a3da7ec8163957080c8628e>. Acesso em: 28/07/2019
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