Por 6 votos a 3, o Supremo
Tribunal Federal (STF) decidiu, na manhã desta sexta-feira (29), declarar a
constitucionalidade do ponto da Reforma Trabalhista que extinguiu a
obrigatoriedade da contribuição sindical. O dispositivo foi questionado na Ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5794, em outras 18 ADIs ajuizadas contra
a nova regra e na Ação Declaratória de constitucionalidade (ADC) 55, que
buscava o reconhecimento da validade da mudança na legislação. Como as ações
tramitaram de forma conjunta, a decisão de hoje aplica-se a todos os processos.
Prevaleceu o entendimento do
ministro Luiz Fux, apresentado ontem (28), quando o julgamento foi iniciado.
Entre os argumentos expostos por ele e pelos ministros Alexandre de Moraes,
Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Cármen Lúcia, está o de
não se poder admitir que a contribuição sindical seja imposta a trabalhadores e
empregadores quando a Constituição determina que ninguém é obrigado a se filiar
ou a se manter filiado a uma entidade sindical. Além disso, eles concordaram
que o fim da obrigatoriedade da contribuição sindical não ofende a
Constituição.
O ministro Fux foi o primeiro a
divergir do relator dos processos, ministros Edson Fachin, que votou pela
inconstitucionalidade do fim contribuição sindical obrigatória. Entre os
argumentos expostos por Fachin e pelo ministro Dias Toffoli e pela ministra
Rosa Weber, o fim da obrigatoriedade do tributo vai impedir os sindicatos de
buscar formas de organização mais eficazes para defender os direitos dos
trabalhadores perante os interesses patronais.
A ADI 5794, à qual as demais
ações foram apensadas, norteou o julgamento. A ação foi ajuizada pela
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Aquaviário e Aéreo, na
Pesca e nos Portos (CONTTMAF). Nela e nos demais processos, o objeto de
contestação foi o artigo 1º da Lei 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), que deu
nova redação aos artigos 545, 578, 579, 582, 583, 587 e 602 da Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT) para condicionar o recolhimento da contribuição sindical
à expressa autorização dos trabalhadores
Contribuição facultativa
Nesta manhã, o julgamento foi
retomado com o voto do ministro Alexandre de Moraes, para quem a liberdade
associativa, uma premissa constitucional, é a questão primordial envolvida na
discussão sobre o fim da obrigatoriedade da contribuição sindical. Na avaliação
do ministro, essa regra constitucional amplia a liberdade do trabalhador de se
associar ou não a um sindicato e de contribuir ou não com essa representação.
Segundo o ministro, desde a
Constituição de 1988 houve uma diminuição do tradicional "sistema de
cabresto", instituído pelo Estado Novo em 1937, tanto no nível do Estado
perante os sindicatos, quanto no dos sindicatos sobre os trabalhadores. Nesse
sentido, em sua avaliação, a Reforma Trabalhista busca a evolução de um sistema
sindical centralizador, arcaico e paternalista para um modelo mais moderno,
baseado na liberdade. “Se o empregador tem a opção de se filiar a um sindicato,
ele também tem a opção de se não se filiar, de não recolher essa contribuição”,
disse.
“Não há autonomia enquanto um
sistema sindical depender de dinheiro estatal para sobreviver”, complementou,
acrescentando que o legislador constituinte não constitucionalizou a
contribuição sindical, mas apenas recepcionou a legislação que a havia criado e
permitiu a existência da contribuição sindical de forma subsidiária, mas não
compulsória. “Não criou e também não vetou”, disse.
O ministro Luís Roberto Barroso
também acompanhou a divergência iniciada pelo ministro Fux ao defender que o
fim da contribuição sindical obrigatória não está em desarmonia com a
Constituição Federal. Na avaliação dele, não há que se falar em
inconstitucionalidade formal ou material, uma vez que é o Congresso Nacional o protagonista
dessa discussão que é eminentemente política, por envolver modelo de gestão
sindical que se pretende adotar no Brasil.
“O Congresso Nacional é o cenário
para que essas decisões sejam tomadas. O STF deve ser autocontido, de forma a
respeitar as escolhas políticas do Legislativo”, disse, aproveitando para fazer
um apelo para que o Poder Legislativo conclua a Reforma Trabalhista, acabando
com a chamada unicidade sindical.
Para Barroso, o princípio
constitucional envolvido no caso é o da liberdade sindical, o direito de o
trabalhador filiar-se ou não, ou e de contribuir ou não, a uma entidade. Nesse
sentido, ele considera o modelo de contribuição compulsória ruim porque não
estimula a competitividade e a representatividade, levando um verdadeiro “business”
privado. “O sistema é bom para os sindicalistas, mas não é bom para os
trabalhadores.”
Também seguindo a divergência, o
ministro Gilmar Mendes não verificou nenhuma inconstitucionalidade nas novas
regras sobre a contribuição sindical. A seu ver, o modelo anterior causou uma
“brutal distorção” com a criação de 16,8 mil sindicatos no país. “Era um modelo
de associativismo subsidiado pela contribuição sindical. A África do Sul tem
191 sindicatos, os Estados Unidos, 160, e a Argentina, 91”, citou.
Para ele, o novo regime não
suprime a sustentabilidade do sistema. “Simplesmente irá fazer com que os
sindicatos sejam sustentados como todas as demais associações por contribuições
voluntárias”, ponderou.
O ministro Marco Aurélio, por sua
vez, ressaltou que não considera a contribuição sindical como tributo
propriamente dito. “Não concebo que pessoa jurídica de direito privado seja
parte ativa tributária”, sustentou.
Na sua avaliação, a contribuição
sindical não se enquadra no artigo 149 da Constituição Federal, que trata das
contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das
categorias profissionais ou econômicas. “Não me consta que essa contribuição
vise a atuação do estado. Visa sim a atuação do fortalecimento das entidades
sindicais”, assinalou.
O ministro Marco Aurélio frisou
ainda que o artigo 8º da Carta Magna repete duas vezes que é livre a associação
profissional ou sindical e o inciso X do artigo 7º prevê a proteção do salário
na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa.
A presidente do STF, ministra
Cármen Lúcia, finalizou o julgamento avaliando que as novas regras não ofendem
a Constituição Federal. “Seria conveniente haver normas de transição.
Entretanto, não considero que isso seja suficiente para tornar incompatível com
a Constituição Federal as normas promulgadas”, apontou.
Para a presidente do Supremo, a
mudança leva a um novo pensar da sociedade de como lidar com todas as
categorias econômicas e trabalhistas e com todas as formas de atuação na
sociedade, sem depender necessariamente do Estado, que nem sempre pode acudir
todas as demandas de forma automática.
Contribuição compulsória
Na sessão de hoje, a primeira a
acompanhar o voto do ministro Edson Fachin foi a ministra Rosa Weber. Ela
iniciou sua fala destacando não ter “simpatia nenhuma pela contribuição
sindical obrigatória”, porém destacou que da Constituição Federal emerge um
sistema sindical que tem três pilares. “Não podemos mexer em parte sem que haja
uma alteração do todo, sob pena de uma desarmonia que atenta contra os comandos
constitucionais”, disse a ministra. “É um tripé. Afasta um, a casa cai”,
complementou.
Rosa Weber explicou que a
Constituição Federal, sem materializar em sua completude o princípio da
liberdade sindical, afasta de forma expressa o pluralismo e impõe a unicidade
sindical para a legitimidade da representação da atuação sindical. De acordo
com ela, é nessa perspectiva que se insere a contribuição compulsória, receita
fundamental para o fortalecimento e manutenção dos sindicatos.
A ministra citou dados que
apontam para uma queda de 79,6% na arrecadação da contribuição sindical, a
maior fonte de receita do sistema, após a Reforma Trabalhista. “É inegável,
portanto, o enorme prejuízo na arrecadação do sistema sindical brasileiro, com profundos
reflexos na atuação das entidades sindicais como agentes centrais da
representação coletiva trabalhista, responsáveis pela defesa dos interesses e
direitos de todos os integrantes das respectivas categorias”.
O ministro Dias Toffoli, por sua
vez, deu o terceiro voto acompanhando o relator. “Do ponto de vista
constitucional, me convenceram os votos dos ministros Edson Fachin e o veemente
voto da ministra Rosa Weber.” Toffoli disse concordar com afirmação feita pelo
ministro Barroso no sentido de que o país precisa de mais sociedade,
argumentando que, “no Brasil, o Estado veio antes da sociedade”.
Mas ponderou que seria necessário
que o Congresso fizesse uma reforma gradativa na área, e não, “da noite para o
dia”, subverter todo o sistema sem ter uma regra de transição, sem ter uma
preparação para a substituição desse financiamento. “Penso que aí está a grande
fragilidade do ponto específico que estamos a discutir. Não é possível essa
subtração que houve da contribuição sindical sem ter preparado essa transição,
sem ter preparado a assunção de mais sociedade civil com menos Estado”,
finalizou.
Os ministros Ricardo Lewandowski
e Celso de Mello não participaram do julgamento, pois estavam ausentes
justificadamente. O ministro Luiz Fux será o redator do acórdão.
RR,AR,RP/CR
Processos relacionados
ADC 55
ADI 5794
Fonte:
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=382819
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