Clovis
Renato Costa Farias*
O presente estudo analítico
parte de inquietações geradas na greve dos Técnico Administrativos em Educação
(TAE), em 2016, quanto a representação estadual do SINTUFCE (Sindicato dos
Trabalhadores na UFC, Unilab e UFCA), três instituições federais de ensino,
autônomas, e as competências dos Comandos Locais de Greve.
I.
Representatividade do Sindicato e do Comando Local de Greve
De início, esclarece-se que
a existência de um CLG (Comando Local de Greve), formado de modo democrático e
pluralista atende ao Estado Democrático de Direito (art. 1º, I, CF/88), mas
possui limitações jurídicas em suas competências e, consequentemente, em no
desempenho de suas funções, em especial, por não deter personalidade jurídica e
não ter sido a opção principal de representação da categoria pelo Legislador,
nem pela Organização Internacional do Trabalho, que centram a
representatividade, de regra nas entidades sindicais.
Dispõe a Convenção nº 87 da
OIT (Liberdade Sindical e Proteção ao Direito de Sindicalização), art. 2º, que os
trabalhadores e os empregadores, sem distinção de qualquer espécie, terão
direito de constituir, sem autorização
prévia, organizações de sua escolha, bem como o direito de se filiar a
essas organizações, sob a única condição de se conformar com os estatutos das
mesmas. Tais organizações (sindicatos,
confederações e centrais sindicais no modelo brasileiro), devem ter o
direito de elaborar seus estatutos e regulamentos administrativos, de eleger
livremente seus representantes, de organizar a gestão e a atividade dos mesmos
e de formular seu programa de ação, conforme o art. 3º, a aquisição de personalidade jurídica por parte das organizações de
trabalhadores e de empregadores, suas federações e confederações, não poderá
estar sujeita a condições de natureza a restringi-las (art. 7º).
Quanto aos servidores
públicos, a OIT regulamentou na Convenção nº 151 (Direito de Sindicalização e
Relações de Trabalho na Administração Pública), que devem ser concedidas aos representantes das organizações
reconhecidas de empregados públicos facilidades para permitir-lhes o
desempenho rápido e eficaz de suas funções, durante suas horas de trabalho ou
fora delas.
A Constituição de 1988, na
República Federativa do Brasil, reconhece a representação da categoria pelo sindicato, como pode ser destacado
no art. 8º, III:
“Art. 8º É livre a
associação profissional ou sindical, observado o seguinte:
[...]
III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou
individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;
[...]
VI - é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de
trabalho;” (grifou-se)
Para o Ordenamento Jurídico Brasileiro,
como regra, cabe ao sindicato a defesa
dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em
questões judiciais ou administrativas, bem como é obrigatória a participação
dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho.
Em caso de greve, atende-se a Lei de Greve
(Lei nº 7.783, de 28 de junho de 1989, que dispõe sobre o exercício do direito
de greve, define as atividades essenciais, regula o atendimento das
necessidades inadiáveis da comunidade, e dá outras providências), aplicável aos
servidores públicos nos termos de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), ao
julgar os Mandados de Injunção (MIs) nºs 670, 708 e 712, a qual dispõe que o
direito de greve deve ser exercido na forma estabelecida nesta Lei (art. 1º,
parágrafo único da Lei de Greve). Decisão que perdura até a omissão legislativa
do Congresso Nacional em regulamentar a matéria, conforme determina o artigo
37, inciso VII, da Constituição Federal, perdurar.
A entidade sindical deve seguir a vontade
da assembleia geral (art. 4º, da Lei de Greve) e conforme seu estatuto, nos
termos do art. 4º, § 1º, da norma em comento, o estatuto da entidade sindical
deverá prever as formalidades de convocação e o quórum para a deliberação,
tanto da deflagração quanto da cessação da greve.
Conforme a legislação pertinente, somente
na falta de entidade sindical a assembleia geral dos trabalhadores interessados
deliberará para escolher negociador representante coletivo, constituindo
comissão de negociação (Comando de Greve ou Comissão de Negociação), como se
pode destacar do art. 4º, § 2º, da Lei de Greve:
“Art. 4º Caberá à entidade sindical correspondente convocar, na forma do seu
estatuto, assembleia geral que definirá as reivindicações da categoria e
deliberará sobre a paralisação coletiva da prestação de serviços.
§ 1º O estatuto da entidade sindical deverá
prever as formalidades de convocação e o quórum para a deliberação, tanto da
deflagração quanto da cessação da greve.
§ 2º Na
falta de entidade sindical, a assembleia geral dos trabalhadores
interessados deliberará para os fins previstos no "caput",
constituindo comissão de negociação.” (grifou-se)
Para
tanto, apesar de legítima a formação dos Comandos Locais de Greve ou outras
formações congêneres para fins de negociação, cabe ao sindicato tal defesa e
representação, vislumbrando-se possiblidades de ampliação de competências, em
caso de previsão expressa e clara nos estatutos respectivos.
Tomando-se como exemplo o Estatuto
do SINTUFCE, veja-se o artigo 2º, I, II, III, X e XI, litteris:
“Art. 2º - O SINTUFCe tem por objetivos e
prerrogativas:
I – Defender continuamente os direitos da
categoria;
II – Representar, perante autoridades
administrativas e jurídicas, os interesses gerais da categoria e os interesses
individuais de seus sindicalizados;
III- Celebrar convenções e acordos
coletivos;
[...]
X – Lutar pela defesa das liberdades
individuais e coletivas, pelo respeito à justiça social, pelos direitos
fundamentais dos homens e mulheres e pelo fim de toda e qualquer forma de
exploração e opressão;
XI – Avançar na unidade da classe trabalhadora,
lutando por sua independência econômica, política e organizativa;”
No mesmo passo, no art. 4º
do Estatuto do SINTUFCE, não concede direitos ao sindicalizado de representar a
categoria, mas votar e ser votado, participar das assembleias, apresentar
sugestões e recorrer, quando necessário, das decisões dos representantes.
Ademais, não se insere nos órgãos
do SINTUFCE, art. 7º do Estatuto, qualquer comissão representativa alheia ao
sindicato, em caso de greve, sendo reconhecidas com membros não necessariamente
integrantes da diretoria: o Congresso, a Assembleia Geral e o Conselho de
Representantes (incisos I, II e III).
A própria Assembleia Geral,
art. 13 do Estatuto, somente tem previsão estatutária de criação de órgãos
externos (comissões e grupos de trabalho) de acordo com os interesses do
SINTUFCE (decisão da diretoria colegiada). Assim como, o Conselho de
Representantes possui competências limitadas (art. 21 do Estatuto do SINTUFCE).
Eventuais Comandos de Greve ou Comissões de
Negociação, podem ir ganhando legitimidade com o tempo e aplicações históricas
viáveis, atendendo ao Princípio Democrático, mas suas competências não podem
chocar com as da entidade sindical, dispostas no estatuto respectivo e o
estatuto não pode contrariar a Lei ou a Constituição. Sendo relevante, em caso
de existência de tais órgãos extrasindicais, que haja inserção obrigatória de
representantes do sindicato, bem como que os instrumentos negociais firmados
sejam firmados pelos representantes eleitos diretores sindicais, sob pena de nulidade.
O papel de tais comissões, de outro modo, é
essencial e reconhecido legalmente em caso de inexistência de sindicato representante,
como regra. Porém, existindo sindicato,
este é ente de representação superior a quaisquer outros Conselhos, devendo
atender ao seu Estatuto, que submete, durante sua vigência, inclusive, a
Assembleia Geral dos Trabalhadores, que tem competência limitada
estatutariamente.
Desse modo, nos termos do art. 4º da Lei de
Greve, cabe a entidade sindical
correspondente convocar, na forma do seu
estatuto, assembleia geral que definirá as reivindicações da categoria e
deliberará sobre a paralisação coletiva da prestação de serviços.
II.
Representação estadual, composição de
percentuais mínimos e deliberações locais conforme a instituição em que os
servidores estejam vinculados
Tomando-se como exemplo os Técnico
Administrativos em Educação da UFC, Unilab e UFCA, representados pelo SINTUFCE,
historicamente, tem sido constituído um Comando Local de Greve, de regra
situado em Fortaleza, uma vez que a UFCA e a UNILAB são de criação recente.
Contudo, diante da autonomia
universitária, art. 207 da Constituição de 1988, decorrente da independência formal
da UFCA e UNILAB, já implantadas, bem como atendendo-se aos imperativos da lei
de greve, decisões do STF sobre a representação em negociação permanente sobre
questões locais de greve, como percentuais mínimos, por exemplo, e da lógica de
prestação sinalagmática dos serviços que pressupõe direitos e obrigações entre
os trabalhadores subordinados e o chefes/patrões detentores do poder diretivo
na prestação laboral, há autonomia do Comando Local de Greve em cada uma das
instituições.
Situação que não afasta a
possibilidade da vinda de representantes para participarem de um Comando Estadual de Greve, para decidir questões gerais, uma vez
que a greve dos TAE, em regra decorre de motivos e com negociação nacionais, o que se aplica a representação de membros do
Estado do Ceará para a representação nacional, para debate das questões
nacionais. Restando, contudo, a autonomia
dos comandos locais, formados nas próprias instituições federais de ensino
(IFES), para decidirem as questões locais, uma vez que negociam com gestores
distintos, cabendo ao sindicato cumprir tais decisões, caso sejam tomadas em
Assembleia Geral dos Trabalhadores, devidamente convocada nos termos do Estatuto
do SINTUFCE.
Ademais, para que se evite
conflitos, a criação de tais instituições extrasindicais deve estar registrada
em regulamento próprio, previamente
elaborado e de acordo com os limites impostos pela legalidade (Constituição,
Lei e Estatuto), para evitar tratamentos desiguais e posturas arbitrárias,
de modo que, em caso de não regulamentação, o caminho mais sólido a ser seguido
é o da previsão estatutária do sindicato e a legislação referente à autonomia
das IFES.
Em termos exemplificativos,
no caso do SINTUFCE, dada a ausência de regimento próprio para dispor sobre as
competências do Comando de Greve, a não previsão estatutária e a existência, de
fato, do Comando de Greve, observa-se que,
quando formado o Comando de Greve por IFE, este tem autonomia em relação ao
Comando Geral de Greve, uma vez que decorre da natureza autônoma da IFE e da
subordinação dos servidores a ela vinculados, cabendo ao sindicato cumprir as decisões
tomadas em assembleia geral dos trabalhadores, por instituição federal de
ensino onde os servidores prestem seus serviços.
III
– Conclusões
Cabe ao
sindicato a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da
categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas, bem como é obrigatória
a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho.
Eventuais Comandos de Greve ou Comissões de
Negociação, podem ir ganhando legitimidade com o tempo e aplicações históricas
viáveis, atendendo ao Princípio Democrático, mas suas competências não podem
chocar com as da entidade sindical, dispostas no estatuto respectivo e o
estatuto não pode contrariar a Lei ou a Constituição. Sendo relevante, em caso
de existência de tais órgãos extrasindicais, que haja inserção obrigatória de
representantes do sindicato, bem como que os instrumentos negociais firmados
sejam firmados pelos representantes eleitos diretores sindicais, sob pena de nulidade.
O papel de tais comissões, de outro modo, é
essencial e reconhecido legalmente em caso de inexistência de sindicato representante,
como regra. Porém, existindo sindicato,
este é ente de representação superior a quaisquer outros Conselhos, devendo
atender ao seu Estatuto, que submete, durante sua vigência, inclusive, a
Assembleia Geral dos Trabalhadores, que tem competência limitada
estatutariamente.
A lógica de prestação
sinalagmática dos serviços que pressupõe direitos e obrigações entre os
trabalhadores subordinados e os chefes/patrões detentores do poder diretivo na
prestação laboral, impõe que haja autonomia do Comando Local de Greve em cada
uma das instituições.
Quando
formado o Comando de Greve por IFE, este tem autonomia em relação ao Comando
Geral de Greve, uma vez que decorre da natureza autônoma da IFE e da subordinação
dos servidores a ela vinculados, cabendo ao sindicato cumprir as decisões
tomadas em assembleia geral dos trabalhadores, por instituição federal de
ensino onde os servidores prestem seus serviços.
Clovis
Renato Costa Farias*: Advogado
Sindical. Doutorando em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC),
bolsista da CAPES/CNPq. Vencedor do Prêmio Nacional em Direitos Humanos da
Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA), Troféu
'Cilindro de Ciro', Placa de Reconhecimento da Coordenadoria Nacional de
Liberdades Sindicais do Ministério Público do Trabalho (CONALIS) e do Fórum das
Centrais Sindicais no Ceará (FCSEC), medalha dos 80 anos da GLMECE, medalha
Cavaleiros de York. Membro Vice Tutor do GRUPE (Grupo de Estudos e Defesa do
Direito do Trabalho e do Processo Trabalhista), do Grupo de Estudos Boaventura
de Sousa Santos no Ceará, no Curso de Ciências Sociais da UFC, e da ATRACE.
Editor e elaborador da página virtual de difusão cultural: Vida, Arte e Direito
(vidaarteedireito.blogspot.com/), do Periódico Atividade - ISSN 2359-5590
(vidaarteedireitonoticias.blogspot.com/) e do Canal Vida, Arte e Direito
(www.youtube.com/user/3mestress). Autor do livro: 'Desjudicialização: conflitos
coletivos do trabalho'. Graduado em
Letras pela Universidade Federal do Ceará (2003), em Direito pela Universidade
de Fortaleza (2008), especialista em Direito e Processo do Trabalho (RJ), mestre em Direito Constitucional
(Mestrado em Direito da UFC). Tem experiência como Professor de Literatura,
Direito e Processo do Trabalho, Sociologia Jurídica, Direito Constitucional,
Mediação e Arbitragem, Direito Sindical, tendo atuado em cursinhos, cursos de
graduação, pós-graduação em Direito, nas áreas trabalhista, processual e
constitucional; é Advogado (OAB 20.500) de organizações sindicais de
trabalhadores e partidos políticos,
mediador coletivo, Vice Presidente da Comissão de Direito Sindical da
OAB/CE. Foi Chefe da Assessoria Jurídica do Procurador Chefe do Ministério
Público do Trabalho/PRT-7ª Região (2009-2011), Secretário Regional Adjunto do
MPT, Chefe do Gabinete do Procurador Chefe/PRT, Assessor Jurídico da Secretaria
de Cultura do Ceará (Constituinte Estadual da Cultura e Plano Estadual do
Livro), conciliador pelo TJCE/CNJ e orientador no Projeto Cidadania
Ativa/UNIFOR, orientador do Escritório de Direitos Humanos da UNICHRISTUS -
Projeto Comunidade e Direitos Sociais, membro do Comitê Gestor de Grandes
Eventos (SRTE/MTE), delegado eleito da Conferência Nacional do Emprego e
Trabalho Decente (OIT/MTE), delegado eleito da UNE (47º CONUNE), secretário
geral do Sindicato dos Advogados no Estado do Ceará (Sindace).
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