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quinta-feira, 12 de março de 2015

Contradições quanto ao Direito de Greve e Negociação Coletiva pelo Estado: O caso da greve dos Técnico Administrativos em Educação de 2014 (Clovis Renato Costa Farias)

Contradições quanto ao Direito de Greve e Negociação Coletiva pelo Estado: O caso da greve dos Técnico Administrativos em Educação de 2014 
(Inadéquations dans la perception du droit de grève et l'état de la négociation collective: Le cas de grève de l'éducation technicien administratif 2014)

Clovis Renato Costa Farias*
(Doutorando em Direito. Universidade Federal do Ceará. Bolsista da CAPES)


Sumário: 1. Introdução. 2. Representação Sindical, Negociação Coletiva e Emancipação Humana. 3. O caso da greve dos servidores Técnico Administrativos em Educação (TAE) e a postura avessa à negociação assumida pela Administração Pública; 3.1. Falta de negociação como foco dos conflitos e a postura antidemocrática do Estado; 3.2. Estado se distancia do Direito e da Democracia; 3.3 Dos direitos desrespeitados em espécie; 3.4. Da violação de Tratado Internacional sobre Direitos Humanos (equivalência às normas constitucionais – art. 5º, § 3º, da CF/88), de normas constitucionais e legais. 4. Conclusões.
Resumo: O presente artigo pretende demonstrar que no Brasil, segue-se padrões tradicionais antidemocráticos ora predominantes no Ocidente, há descompasso relacionado à Democracia, com desprezo do aprendizado histórico relacionado à pacificação social dos grupos em constante tensão. Ainda, que o Estado tem sido agente de possível retrocesso social, ao assumir postura idêntica aos empresários do Capital Privado, defendendo teses que afastam o Econômico da discussão política. Situação que tem possibilitado, inclusive, a ocorrência de conflitos violentos nos locais de trabalho, registrada vastamente pela História, diante da grande insatisfação dos obreiros em determinados contextos, também, entre os próprios membros da categoria patronal, em face da redução dos custos de produção pelos empreendedores que praticam a mais valia ao arrepio dos direitos laborais, opostos pelos que desenvolvem suas atividades econômicas em ambientes de forte união dos trabalhadores e/ou fiscalização ostensiva pelo Estado com foco no aprimoramento das relações de trabalho e produção (dano moral coletivo/dumping social). Pretende-se reafirmar a imprescindibilidade da via de solução por meio da negociação coletiva quando legitimada no senso comum dos obreiros e da sociedade, com Poder Real, mas que vem sendo destruído com a utilização inadequada, especialmente, quanto ao afastamento de temáticas essenciais da discussão nas mesas, como os aspectos econômicos e democráticos. Para demonstrar tal contexto, serão apresentadas nuances do último conflito coletivo entre os servidores Técnico Administrativos em Educação (TAE) e a Administração Pública (UFC), em que houve desrespeito às normas constitucionais, bem como às normas equiparadas às fundamentais e claro desrespeito aos Direitos Humanos.
Résumé: Cet article fera valoir que, au Brésil, suivie par les normes traditionnelles non démocratiques qui prévalent maintenant dans l'Ouest, il ya inadéquation liées à la démocratie et en ignorant l'apprentissage historique relatif à la pacification sociale de tension constante dans les groupes. Pourtant, l'état a été possible agent de régression sociale, de prendre la même approche pour les entreprises, la défense de thèses qui animent la discussion de la politique économique. Situation qui a permis, même l'apparition de conflits violents dans le lieu de travail, largement enregistrées par l'histoire, avant le grand mécontentement des travailleurs dans certains contextes aussi parmi les membres eux-mêmes de la catégorie de l'employeur, en raison de la réduction des coûts de production par des entrepreneurs qui pratiquent le gain en violation des droits du travail, contrés par le développement de leurs activités économiques dans forte union des travailleurs et / ou de surveillance manifeste par l'État en mettant l'accent sur l'amélioration des relations de travail et des environnements de production. Elle est destinée à réaffirmer le caractère indispensable de la voie de solution à travers la négociation collective quand légitimé le sens commun des travailleurs et de la société, avec le pouvoir réel, mais qui a été détruit par une mauvaise utilisation, en particulier de la distance des thèmes essentiels de la discussion les tables, les aspects économiques et démocratiques. Pour démontrer ce contexte, les nuances seront présentés le dernier conflit collectif entre les serveurs techniques administratives dans l'éducation et les administrations publiques, dans lequel il y avait un mépris des exigences constitutionnelles et des normes équivalentes à l'irrespect flagrant et claire des droits humain.
Palavras-chave: Greve. Negociação Coletiva. Estado. Democracia
Mots-clés: Greve. Négociation collective. État. Démocratie.



1. Introdução
O presente escrito toma como base as inquietações sentidas pelo mundo pós crise econômico/financeira de 2008, desencadeada, dentre outros motivos, pela inserção das potências dominantes no Sistema Capitalista na chamada Economia de Mercado, com estratégias insustentáveis e medidas de austeridades para com as camadas mais frágeis da relação capital e trabalho.
Os impactos novamente instigaram o ressurgimento de correntes tradicionais do pensamento ocidental, centradas no Neoliberalismo (Estado mínimo, manutenção e ampliação dos lucros da livre iniciativa), ainda que em detrimento da dignidade da pessoa humana. São fortalecidos argumentos como “A Toika acertou a firmar que o que a Economia não concede, não pode ser dado por instrumentos de negociação coletiva” (dito por professor em palestra ministrada nas Jornadas Internacionais realizadas em 2014 pela Universidade de Lisboa e pela Universidade Federal do Ceará), bem como “Sem o econômico não há o humano” (manifestação de um gestor dos servidores públicos Técnicos Administrativos em Educação da Universidade Federal do Ceará em reunião com o sindicato dos servidores, ao ser destacado que o humano precede a economicidade).
O que tem se materializado com o perecimento da efetividade da negociação coletiva entre as classes patronal (posição que também é ocupada pela Administração Pública com relação a seus servidores) e laboral, de modo que os instrumentos negociais estão perdendo sua força normativa, passando a registrar flexibilizações, precariedade no trabalho e a justificarem relações injustas e desumanas. Quando ocorrem, não raro, cumprem meras formalidades, sem que haja real transparência nos dados apresentados e boa fé nas propostas para a melhoria das condições de trabalho e produção e/ou prestação dos serviços, além de não serem apresentadas propostas viáveis ou minimamente adequadas.
Neste diapasão, olvida-se de aspectos históricos na formulação dos conceitos com perigos e prejuízos evidentes a serem sofridos pela humanidade, com perecimento dos Direitos Humanos e da própria Economia, de natureza equilibrada. Assim, esquece-se que o reconhecimento das entidades representativas de trabalhadores como ente mediador dos conflitos entre os obreiros e os empregadores/administradores, depois de anos de combate pelo Estado com leis que criminalizavam os movimentos, como por exemplo, a abolição das Corporações de Ofício (Lei Le Chapelier – 1791/França); a interdição das associações sindicais de trabalhadores livres (Combination Act – 1799/Inglaterra); a criminalização das Coalizões Operárias (Código Penal Napoleônico – 1810/França); e o Sindicalismo enquadrado como crime de sedição ou conspiração (Sedition Meeting Act - 1817/Inglaterra).
Ressalte-se que o momento da ‘Tolerância Jurídica’ ocorreu diante da ineficiência das normas proibitivas, diante das reais disparidades nas relações de trabalho que não foram historicamente resolvidas apenas com base em leis, mas por meio de negociações e ajustes que aprimoram a emancipação humana. Tal período de tolerância, conforme Martinez[1], foi marcado pela descriminalização do delito de coalização de trabalhadores, embora com previsão de punição contra a violência e atos de intimidação que acompanhassem o movimento grevista (1824/1825/Inglaterra); reconhecimento do direito a associação sindical na Inglaterra (1825/1826). O que trouxe o próprio mundo capitalista ao êxito atual, mas que é sempre combatido pelos que se acham detentores do Poder, pretendendo vilipendiar e desacreditar as entidades, as negociações coletivas e deslegitimar os instrumentos coletivos, como se demonstrará, com efeitos nefastos para a Ordem Jurídica, Econômica e Social.
Tal descompasso, com desprezo do aprendizado histórico relacionado à pacificação social dos grupos em constante tensão, em face da disparidade de interesses por parte da classe trabalhadora e dos empregadores/administradores, tem o condão de trazer um retrocesso social, com a união entre Estado e Capital defendendo teses que afastam o Econômico da discussão política. Algo que possibilita, inclusive, a ocorrência de conflitos violentos nos locais de trabalho, registrada vastamente pela História, diante da grande insatisfação dos obreiros em determinados contextos, também, entre os próprios membros da categoria patronal, em face da redução dos custos de produção pelos empreendedores que praticam a mais valia ao arrepio dos direitos laborais, opostos pelos que desenvolvem suas atividades econômicas em ambientes de forte união dos trabalhadores e/ou fiscalização ostensiva pelo Estado com foco no aprimoramento das relações de trabalho e produção (dano moral coletivo/dumping social). Ressaltando-se que a melhor via de solução tem sido a negociação coletiva quando legitimada no senso comum dos obreiros e da sociedade, legitimidade que vem sendo destruída com a utilização de forma inadequada, especialmente, quanto ao afastamento de temáticas essenciais da discussão nas mesas, como os aspectos econômicos.
2. Representação Sindical, Negociação Coletiva e Emancipação Humana
Os três temas que nomeiam o presente item, são complementares e funcionam como dimensões que interagem na efetivação do Estado Democrático de Direito[2], os quais surgiram a partir da experiência social, na prática das relações trabalho, e foram sendo consolidados como meio adequado para a pacificação social dos conflitos decorrentes das necessidades que os trabalhadores têm para garantirem maior dignidade em suas vidas e em seus papel na coletividade familiar e local, em face dos interesses que norteiam a livre iniciativa, de regra, pautada na obtenção dos lucros com a redução dos custos, o que, de regra, causa impactos no lado mais frágil da relação, os trabalhadores.
Tal percepção, identicamente, foi pactuada na Carta Política do Brasil, ao colocar em um mesmo inciso no art. 1º, que traz os fundamentos da República Federativa do Brasil, a interação que deve existir entre “os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa[3]. Posição geográfica no texto fundamental que inquieta muitos juristas, mas que deve ser considerada com ênfase na necessidade que se impõe aos trabalhadores e empregadores/administradores de negociarem suas relações de trabalho para a melhoria das condições de convivência rumo a uma vida decente para os trabalhadores que, dentro do possível, deve ser harmonizada com as noções de progresso e desenvolvimento econômico, inerentes à postura dos gestores no Sistema Capitalista.
O reconhecimento do papel dos instrumentos de negociação coletiva, gerados, via de regra, autonomamente, encontra-se no texto constitucional ao dispor-se que “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social [...]reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho[4]. Tal trecho demarca um momento ímpar no percurso de afirmação do Direito, com normas surgidas com caráter imperativo, de regra, apenas quando emanadas de forma heterônoma, advindas da organização do Estado, as quais, diante da realidade social, tiveram de reconhecer que nas relações de trabalho o papel estatal deve antes reconhecer a negociação e suas normas próprias, em face da dinâmica e complexidade que envolvem essas relações jurídico-sociais específicas.
Ademais, impõe-se a negociação coletiva prévia e extrajudicial, inclusive, como pressuposto processual para o manejo de ações judiciais, tais como o dissídio coletivo, como pode ser notado no artigo 114, da Constituição do Brasil. O dispositivo impõe a negociação autônoma e extrajudicial, em seguida, nos casos de insucesso, sugere o constituinte a busca de outra via não estatal, a Arbitragem (via privada em que as partes entregam a terceiro imparcial, escolhido por ambas, o poder de decisão sobre os pontos sem acordo), para, após nova negociação autônoma específica sobre a busca ou não da via judicial para solucionar as questões insolúveis diretamente pelas partes (comum acordo), ao final, buscar-se o Poder Judiciário via Justiça do Trabalho. A Constituição somente permite a intromissão do Estado, via Ministério Público do Trabalho, excepcionalmente, em casos de ocorrência de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, quando o Parquet Trabalhista poderá ajuizar dissídio coletivo, como se pode notar:
Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:
[...]
§ 1º - Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros.
§ 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
§ 3º Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
Ressaltando-se que, o Ordenamento Jurídico do Brasil delimita o que são as atividades essenciais e as inadiáveis, nos termos da Lei de Greve[5], de modo que são considerados serviços ou atividades essenciais, nos termos do art. 10 da Lei mencionada, tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; assistência médica e hospitalar; distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos; funerários; transporte coletivo; captação e tratamento de esgoto e lixo; telecomunicações; guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares; processamento de dados ligados a serviços essenciais; controle de tráfego aéreo; compensação bancária. Em tais serviços ou atividades essenciais, os sindicatos, os empregadores e os trabalhadores ficam obrigados, de comum acordo, a garantir, durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, nos termos postados no art. 11 da Lei.
Outrossim, “São necessidades inadiáveis, da comunidade aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população”, o que, identicamente, está disciplinado pela Lei de Greve, art. 11, parágrafo único. O reconhecimento do direito de greve como um instrumento de pressão voltado para a reabertura dos canais de negociação coletiva é tão relevante que o Poder Público é obrigado a assegurar a prestação dos serviços indispensáveis no caso de eventual desrespeito dos quesitos legais quanto às atividades inadiáveis e essenciais, conforme o art. 12 da norma em destaque. De todo modo, na greve, em serviços ou atividades essenciais, ficam as entidades sindicais ou os trabalhadores, conforme o caso, obrigados a comunicar a decisão aos empregadores e aos usuários com antecedência mínima de 72 (setenta e duas) horas da paralisação, art. 13 do texto ora comentado. 
Quanto à greve na Administração Pública, ora visibilizada com postura patronal com relação à seus trabalhadores subordinados, como destacado por Gérson Marques[6], “embora o direito dos servidores públicos se encontre constitucionalmente assegurado pelo art. 37, VII, da CF, o seu exercício depende de lei específica que o regulamente”. Diante de tal lacuna que ainda perdura, de modo que o Supremo Tribunal Federal (STF), em 2007, ao decidir sobre os Mandados de Injunção[7] nº 712-8/PA (Relator Ministro Eros Grau), 670 e 708 (Relator Ministro Gilmar Mendes), com destacado pelo autor mencionado:
“[...] a Lei 7.783/1989 não se aplicaria, em princípio, às relações públicas. Contudo, admitiu que, por falta de norma regulamentadora do Congresso Nacional, era possível fazer uso da mencionada lei, ao menos em parte, cabendo ao STF definir os contornos de sua aplicabilidade, conferindo os parâmetros do exercício do direito de greve no setor público (v. tópico 45, do voto do Min. Eros Grau). Explicou que o STF, no mandado de injunção, formula supletivamente a norma regulamentadora, com ‘função normativa, porém não legislativa’.”[8]
Traçados os liames que envolvem a representação sindical (patronal e laboral, em termos brasileiros), para a negociação coletiva, importa destacar que o texto fundamental em nenhum momento afasta o trabalho humano de seus delineamentos da Economia, pelo contrário, o destaca em posição essencial tanto na Ordem Social quanto na Ordem Econômica, de modo que esta última não se encontra disciplinada como algo inatingível pela discussão política democrática entre trabalhadores e empregadores/administradores, o que eleva a discussão sobre a emancipação humana, como destacado pelo advogado do Sindicato dos Trabalhadores na Universidade Federal do Ceará (UFC) em debate com o Pró Reitor de Gestão de Pessoas (PROGEP) da UFC, promovido em 11 de novembro de 2014, diante da afirmativa do gestor que os advogados procurassem primeiramente o Poder Judiciário quando divergissem da postura da Universidade quanto à aplicação de normas relacionadas aos servidores, ao invés de manter as provocações oficiais pela via administrativa:
“[...] vamos primar pela negociação antes de ingressar com ação. [...] de antemão, o que posso fazer, [...] as ações estão feitas, [...] fiz o mandado de segurança para aquele dia [...], mas buscamos ver se é verdade o que está sendo denunciado pelos servidores, pois não gostamos de fazer coisas desusadas, pois sabemos que vocês têm o que fazer, porque uma ação coletiva dessas que eu entro, você diz que ‘é serviço’, mas o senhor teve dez dias para responder ao mandado de segurança, dez dias, mas vocês diretamente não respondem[9]. [...] Mas, primeiro, estamos tentando, negociar. Primeiro explicar. Primeiro oficiar, ai a PROGEP faça a fundamentação dela e responda, agora, é chato para a PROGEP responder, pois esses ofícios administrativos ela responde. [...] dá trabalho à PROGEP, agora se eu ingressar com uma ação a PROGEP não está nem ai em termos de serviço, porque vai para a AGU, só que queremos, nesse sentido, de Estado Democrático de Direito, é puxar a gestão, exatamente, para compartilhar esses problemas. Não estamos abrindo mão de nossa competência de judicializar e negociar [...] com boa fé, do jeito que eu lhe disse eu fiz [...] como estamos dizendo, fiz a ação, mas discutimos antes de protocolar, estamos juntando mais elementos, algo foi esclarecido. Puxamos uma negociação com o Reitor em exercício e foi ela que gerou essa reunião aqui. Era muito fácil se eu tivesse entrado com a ação, o Professor [...] estava aqui? Não estaria. Nós estaríamos aqui? Não. Mas, estamos exercitando a nossa capacidade de emancipação como pessoas, nós somos gente e pensamos. Nós não somos bichos, não somos coisa, nós pensamos. [...] Nessa primeira perspectiva, vamos [...] sempre começar pela negociação, dando trabalho à Administração ou não, e, se ela negar, entramos com a ação.”[10]
Nesse passo, conforme a Constituição de 1988, a ordem econômica encontra-se fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa e tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, com observância de princípios como a função social da propriedade e a busca do pleno emprego.
Assim, nos termos da Constituição de 1988, a ordem econômica é fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados princípios como a função social da propriedade e a busca do pleno emprego[11]. No mesmo sentido, a ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais[12]. Tudo com foco no fundamento maior da República Federativa do Brasil, a dignidade da pessoa humana[13], em um Estado Democrático de Direito, reconhecendo-se a Democracia como direito fundamental de quarta dimensão, que deve considerar o pluralismo de ideias (político)[14] como prioritário na construção de uma sociedade mais livre, justa e solidária[15], o que se dá quando há legitimação de meios participativos de solução de conflitos, tais como a negociação coletiva nas relações de trabalho.
Quanto à negociação na Administração Pública, diante dos defensores da intangibilidade do princípio da indisponibilidade do interesse e dos bens públicos, exatamente, com base em custos financeiros com as ações judiciais, o Poder Público normatizou a possibilidade de negociação. Assim, a conciliação judicial encontra-se prevista e incentivada pelo Ordenamento Jurídico da República Federativa do Brasil, sendo marca da emancipação humana, das partes e grande colaboradora do Poder Judiciário, marcando-se, especialmente a celeridade e a economicidade processuais, como disposto pelo Código de Processo Civil:
Art. 125. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, competindo-lhe:
[...]
IV - tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes.
[...]
Art. 277. O juiz designará a audiência de conciliação a ser realizada no prazo de trinta dias, citando-se o réu com a antecedência mínima de dez dias e sob advertência prevista no § 2º deste artigo, determinando o comparecimento das partes. Sendo ré a Fazenda Pública, os prazos contar-se-ão em dobro. (Redação dada pela Lei nº 9.245, de 26.12.1995)
§ 1º A conciliação será reduzida a termo e homologada por sentença, podendo o juiz ser auxiliado por conciliador.(Incluído pela Lei nº 9.245, de 26.12.1995)
[...]
Art. 449. O termo de conciliação, assinado pelas partes e homologado pelo juiz, terá valor de sentença.
[...]
Art. 475-N. São títulos executivos judiciais: (Incluído pela Lei nº 11.232, de 2005)
[...]
III – a sentença homologatória de conciliação ou de transação, ainda que inclua matéria não posta em juízo; (Incluído pela Lei nº 11.232, de 2005)[16]

A legalidade e a economicidade as recomendam negociação quando o Direito estiver ao lado da pretensão do administrado. Nestes termos, a Lei nº 9.469/1997 (dispõe sobre a intervenção da União nas causas em que figurarem, como autores ou réus, entes da administração indireta; regula os pagamentos devidos pela Fazenda Pública em virtude de sentença judiciária):
Art. 1o O Advogado-Geral da União, diretamente ou mediante delegação, e os dirigentes máximos das empresas públicas federais poderão autorizar a realização de acordos ou transações, em juízo, para terminar o litígio, nas causas de valor até R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais). (Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009)
[...]
Art. 1o-A.  O Advogado-Geral da União poderá dispensar a inscrição de crédito, autorizar o não ajuizamento de ações e a não-interposição de recursos, assim como o requerimento de extinção das ações em curso ou de desistência dos respectivos recursos judiciais, para cobrança de créditos da União e das autarquias e fundações públicas federais, observados os critérios de custos de administração e cobrança.  (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)
[...]
Art. 1o-B.  Os dirigentes máximos das empresas públicas federais poderão autorizar a não-propositura de ações e a não-interposicão de recursos, assim como o requerimento de extinção das ações em curso ou de desistência dos respectivos recursos judiciais, para cobrança de créditos, atualizados, de valor igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), em que interessadas essas entidades na qualidade de autoras, rés, assistentes ou opoentes, nas condições aqui estabelecidas. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)
[...]
Art. 2o  O Procurador-Geral da União, o Procurador-Geral Federal e os dirigentes máximos das empresas públicas federais e do Banco Central do Brasil poderão autorizar a realização de acordos, homologáveis pelo Juízo, nos autos do processo judicial, para o pagamento de débitos de valores não superiores a R$ 100.000,00 (cem mil reais), em parcelas mensais e sucessivas até o máximo de 60 (sessenta).       (Redação dada pela Lei nº 12.716, de 2012)
[...]
Art. 5º A União poderá intervir nas causas em que figurarem, como autoras ou rés, autarquias, fundações públicas, sociedades de economia mista e empresas públicas federais.
Parágrafo único. As pessoas jurídicas de direito público poderão, nas causas cuja decisão possa ter reflexos, ainda que indiretos, de natureza econômica, intervir, independentemente da demonstração de interesse jurídico, para esclarecer questões de fato e de direito, podendo juntar documentos e memoriais reputados úteis ao exame da matéria e, se for o caso, recorrer, hipótese em que, para fins de deslocamento de competência, serão consideradas partes.[17]

A solicitação, também, se justifica em face do disposto na Portaria do Ministério da Fazenda nº 75, de 22 de março de 2012 (Dispõe sobre a inscrição de débitos na Dívida Ativa da União e o ajuizamento de execuções fiscais pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional) que dispensa a inscrição da dívida ativa:
Art. 1º Determinar:
I - a não inscrição na Dívida Ativa da União de débito de um mesmo devedor com a Fazenda Nacional de valor consolidado igual ou inferior a R$ 1.000,00 (mil reais); e
II - o não ajuizamento de execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais).[18]
           
 A negociação, com transação por parte da Administração Pública Federal, inclusive, tem sido reconhecida como de grande economicidade para o Estado, como destacado pelo Superior Tribunal de Justiça, ao louvar o papel negocial que, em alguns momentos, a Advocacia Geral da União (AGU) tem assumido, como pode ser destacado em:
Programa da AGU reduz o número de recursos no STJ e contribui para desafogar a Justiça
Um problema recorrente do Poder Judiciário tem sido minimizado pela atuação da Advocacia-Geral da União. Entre julho de 2012 e setembro de 2014, o Programa de Redução de Litígios e de Aperfeiçoamento da Defesa Judicial da União provocou a extinção de 30.393 processos – uma economia de cerca de R$ 23 milhões somente no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A cada recurso não interposto, uma decisão judicial também deixou de ser proferida. Somadas as desistências e abstenções de recursos nos Tribunais Regionais Federais e no STJ, a atuação dos órgãos da Procuradoria-Geral da União (PGU) evitou que o STJ tivesse de proferir 79.862 decisões judiciais. Uma grande contribuição para desafogar a Justiça.
Antecedentes
Estudo estatístico da Coordenação-Geral de Gestão Judicial da PGU mostra que, nos anos de 2010 e 2011, 84% dos acórdãos proferidos pelo STJ nos recursos interpostos pela União lhe foram desfavoráveis. Em relação aos agravos regimentais, o índice de insucesso foi ainda maior, 96%.
O programa foi concebido a partir da constatação de que o prolongamento da tramitação de recursos considerados inviáveis, além de contribuir para o estrangulamento da Justiça e para o aumento do custo da máquina judiciária, compromete a credibilidade da União perante o Poder Judiciário e impede que seus esforços sejam voltados ao aperfeiçoamento de teses de defesa em ações tidas como relevantes.
Primeira geração
A primeira geração do programa, que foi planejado para ser desenvolvido em cinco fases, foi direcionada à atuação da Procuradoria-Geral da União no STJ. O passo inicial foi identificar os casos de natureza processual e de direito material com maior percentual de inadmissibilidade ou negativa de provimento dos recursos. Depois, foram elaborados pareceres com sugestões para adoção de medidas adequadas à solução de cada caso, conforme as suas peculiaridades.
Os resultados foram satisfatórios. De acordo com relatório do Departamento de Assuntos do Pessoal Civil e Militar da PGU (DCM/PGU), no período de julho de 2012 a setembro de 2014, a União absteve-se de interpor 10.138 recursos contra decisões e acórdãos proferidos pelo STJ. Diferente do que acontecia antes da instituição do programa, a maioria das abstenções (74%) foi efetivada após a decisão monocrática. Somente 26% ocorreram depois de prolatado o acórdão.
No mesmo período, a União desistiu de interpor 537 recursos. O relatório destacou que desse total, 318 desistências ocorreram antes mesmo de qualquer pronunciamento do STJ.
TRFs
A segunda geração do programa visou à atuação das Procuradorias-Regionais da União nos Tribunais Regionais Federais (TRFs). Entre julho de 2012 e setembro de 2014, foram registradas 17.990 abstenções e 1.510 desistências de recursos. Em consequência disso, as procuradorias evitaram, até a última instância, a interposição sequencial de 81.900 novos recursos nos respectivos processos – 20.475 nos próprios TRFs e 61.425 no STJ.
Especificamente em relação às abstenções, a estatística revela que, após a instituição da segunda geração do programa, o número de abstenções chegou a superar o número de interposição de recursos.
A iniciativa de implantar o Programa de Redução de Litígios e de Aperfeiçoamento da Defesa Judicial da União trouxe mudanças significativas, sobretudo a edição de normas e súmulas, tanto do Supremo Tribunal Federal quanto do STJ, indicando a ausência de pressupostos de admissibilidade dos recursos da União.
Antes da sua instituição, a PGU jamais desistia de recorrer em qualquer ação. Não havia autorização para a adoção dessa medida.[19]

Desse modo, há um cenário jurídico propiciador da negociação coletiva, a qual chega a ser, via de regra, imposto pelo Legislador/Estado, para as relações públicas e privadas, mas que ainda carece de efetividade, uma vez que, apesar de se tratarem de normas detentoras de eficácia, ainda falta a realização social e a legitimação pelos principais atores em tais relações, especialmente, por parte dos que se encontram em posição de ‘superioridade’ nas relações laborais, à revelia do Ordenamento Jurídico, com perecimento da emancipação humana e, consequentemente, da sociedade.
Pior, os gestores (públicos ou privados) têm se arvorado da situação de domínio econômico/financeiro, da aproximação do Estado (bancadas maiores no Congresso Nacional), da existência de alguns sindicatos de trabalhadores descumpridores de seu papel de defesa ou sem força representativa, para flexibilizar a já carente de efetividade normatização de proteção dos trabalhadores, bem como manejando esforços no sentido de deslegitimar os instrumentos negociados autonomamente pelos sindicatos, permitindo-se a positivação de normas que precarizam as relações, contrariando suas finalidades. Em tudo, defende-se e divulga-se a ideia de que o econômico não pode discutido pela via da negociação ou pela via política, criando-se um patamar prático que contraria as noções basilares que norteiam a sociedade.
3. O caso da greve dos servidores Técnico Administrativos em Educação (TAE) e a postura avessa à negociação assumida pela Administração Pública
3.1. Falta de negociação como foco dos conflitos e a postura antidemocrática do Estado
A categoria dos Servidores Técnico Administrativos em Educação (TAE) da Universidade Federal do Ceará, reconhecidos como a ala dos servidores públicos federais que recebe os menores valores de vencimentos do funcionalismo público federal e a que enfrenta diversas arbitrariedades por parte dos administradores, diante das diversas mesas apenas formais de negociação (chamadas de “enrolação” pelo obreiros) com o Governo Federal, sem êxito diante da postura inarredável dos gestores na concessão de melhorias para os trabalhadores, teve de paralisar suas atividades na greve de 2014.
A pauta central se deu em face do descumprimento de diversos itens do acordo firmado com o Governo Federal em 2011 (última greve) e das diversas precarizações das condições de trabalho, os quais se somaram à lutas históricas como a paridade nas decisões dos órgãos colegiados de coordenação das instituições públicas de ensino superior, uma vez que há hercúlea disparidade entre os TAE e os docentes.
Aderiu-se, no Ceará, à greve nacional instalada, reivindicando-se, também, as pautas locais, de modo que passaram a surgir atos democráticos e pacíficos com o intuito de reabrir os canais de negociação, com melhoria das propostas na pauta local e nacional. Assim, foi o caso da instalação histórica do Comando Local de Grave embaixo das mangueiras diante da Reitoria, onde ocorrem as assembleias, palestras e ajuntamento tradicional da categoria, em local que não afeta de modo algum o funcionamento da UFC, bem como o trancamento, por algumas horas, dos portões que dão acesso às dependências da Reitoria (19 de maio/2014), sem caráter de permanência, mas tão somente de  fazer pressão para a construção democrática na reabertura das negociações junto ao governo federal.
Fez-se o equilíbrio entre os direitos fundamentais (Trabalho – art. 5º, XIII, CF/88 x Greve – art. 37, VII, CF/88), de mesma hierarquia e em aparente colisão no ato, os quais deveriam ser, com razoabilidade (bom senso), equilibrados, diante da impossibilidade de atingimento do núcleo essencial dos direitos constitucionais no Neoconstitucionalismo, mas que foi grotescamente combatido, com uma decisão liminar, sem ouvir os trabalhadores, que os privou do direito de manifestação e reunião. Tudo em uma situação que deveria ter propiciado dos gestores uma postura de abertura democrática para o diálogo, o que, em nenhum momento ocorreu, em face do senso distorcido dos atuais administradores, que seguem um padrão nacional antidemocrático, acorreu-se logo ao Poder Judiciário que, também, agiu com parcialidade irrazoável.
Ademais, a obstrução dos portões da Reitoria estava prevista para curto espaço de tempo e teve o intuito de instigar a Gestão Superior da UFC, cujo  Reitor é  presidente da Associação Nacional de Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES) com assento no Governo Federal, a chamar uma negociação da pauta nacional do comando de greve,  o que se comprova pela inexistência de resistência por parte dos manifestantes, bem como pela constatação de inexistência de obstrução por ocasião do cumprimento do mandado, como comprovado na Certidão do Oficial de Justiça nos autos da Ação de Reintegração de Posse nº 0802381-28.2014.4.05.8100, que tramitou na 8ª Vara da Seção Judiciária Federal do Ceará[20].
Os manifestantes respeitaram o direito de trabalhar dos gestores e servidores, sendo obstaculizado, durante a manifestação, o funcionamento pleno da Universidade com relação ao trabalho ostensivo durante o horário programado. A postura negocial do sindicato dos trabalhadores ficou demarcada, inclusive, pelo fato de uma servidora que pretendia autorizar o pagamento das bolsas dos estudantes ter podido adentrar na Reitoria, com a permissão do Comando Local de Greve, evitando-se prejuízos quanto à prazos para a UFC, mas os gestores máximos não se dispuseram a negociar.
Provou-se o caráter antidemocrático da Reitoria, quanto ao diálogo, de modo que não procurou em nenhum momento o Comando Local de Greve para negociar o ocorrido, permanecendo no pedestal da indiferença que gerou a greve. Em descompasso com o ânimo do Ordenamento Jurídico brasileiro, que prima pela negociação e emancipação coletiva nas relações de trabalho, o que atende ao Princípio da Legalidade ao qual deve se submeter, os gestores recorreram logo ao Poder Judiciário, parcela do Poder do Estado.
Recorreu-se, de plano, ao Judiciário, já tendo ingressado com a petição inicial às 11h08min, do dia 19 de maio (dia do ato), ou seja, nem sequer houve procura de contato telefônico com os manifestantes ou com o agravante para compreender o ocorrido, seus objetivos e sua dimensão, indo contra os anseios contemporâneos por Democracia e pelas soluções extrajudiciais de conflitos. Repise-se que a própria legislação pátria impõe nas questões de greve a prova de negociação prévia, o comum acordo, a busca das vias extrajudiciais, o que não tem sido seguido pela Administração da UFC.
Em termos processuais, a peça inicial da ação proposta pela Procuradoria da UFC não possuía sequer qualificação adequada para a parte autora, diante da pressa em acionar o Judiciário, nem qualquer documentação comprovatória ou o representante da instituição para o ato, o que não foi avaliado pela decisão. Ademais, em muitos momentos se referia a outra instituição de ensino, o que foi, simplesmente, absorvido pelo Estado na “prestação jurisdicional”. A ação já estava pronta e protocolada já no início do ato, na manhã do dia 19, de forma que às 14h56min a decisão foi publicizada, sem avaliar as condições da ação, e o oficial cumpriu o mandado por volta das 17h, quando a instituição já se encontrava sem qualquer obstrução, uma vez que o ato já tinha chegado ao fim e a UFC quedou-se inerte sem negociar. Mais grave, o oficial de justiça ainda ordenou a desocupação do espaço de instalação do Comando Local do gramado embaixo das mangueiras diante da Reitoria, espaço histórico dos servidores de uso ornamental pela universidade.
Outrossim, diante de tal contexto, a petição inicial solicitou a desobstrução das vias de acesso da Reitoria e do Campus Benfica, reiterando em diversos momentos que “não se pretende, com a presente medida judicial impedir o sindicato e os grevistas de estarem postados à porta dos prédios e instalações desta universidade”, mas a decisão do Poder Judiciário foi mais além, contrariando, também, o Ordenamento Jurídico, ao impor a ‘desocupação’ imediata, com aparato policial se preciso fosse, para retirar os grevistas do local, com desinstalação compulsória do Comando Local de Greve das sombras das mangueiras diante da Reitoria (espaço não utilizado para nenhuma finalidade na instituição). Houve um distanciamento, ainda maior, do ideal de negociação coletiva, de Estado Democrático de Direito e de emancipação com tentativa de solução direta pelas partes envolvidas, destacando-se que o processo foi encerrado, sem qualquer audiência ou tentativa de conciliação por parte do magistrado e a Administração negou todos os pedidos de retorno do Comando Local de Greve para seu local.
A decisão gerou lesão grave e de difícil reparação aos movimento democrático, uma vez que fragilizou o direito de greve, reunião e manifestação, de modo que impôs, sob pena de multa e força policial o afastamento dos trabalhadores em greve da Reitoria e do Campus Benfica, com indescritível impacto no movimento e na credibilidade do sindicato. Impôs-se, ademais, a retirada das faixas, materiais da greve e das instalações do Comando Local de Greve do Pátio da Gestão da UFC (local de uso apenas estético para a instituição), ferindo diversas liberdades sindicais, normas constitucionais e tratados internacionais, como será demonstrado no mérito do presente agravo.
A divergência clara entre os pedidos, a decisão inicial e o mandado foi rechaçada pelo magistrado que asseverou não haver obscuridade, contradição ou omissão, o que o fez com vasta argumentação sobre a possibilidade ‘fungibilidade dos pedidos’, em clara decisão extra petita. Veja-se, o sindicato utilizou-se de instrumento de pressão para abrir a negociação, não houve abertura por parte da gestão e a decisão impôs o afastamento total dos servidores em greve de todos os espaços da Reitoria e Campus do Benfica, locais históricos de instalação do Comando Local de Greve, agravou a situação em dissonância com os contornos apresentados para negociação coletiva nos conflitos trabalhistas esposados no tópico anterior.
3.2. Estado se distancia do Direito e da Democracia
Além das disparidades da decisão judicial, mantida pelo magistrado, com prejuízos inefáveis para o Direito Coletivo e para o Estado Democrático de Direito, tal juiz sequer detinha competência (poderes) para proferir a decisão, uma vez que, diante das decisões do STF sobre greve no serviço público, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região deveria ter sido o órgão competente para julgar o interdito proibitório (Ação de Reintegração de Posse) em face de servidores públicos federais em paralisação, para assegurar a continuidade dos serviços (MI nº 708 do STF)[21] e PET nº 7884 do STJ[22], o que impõe a nulidade da decisão e dos demais atos.
Caso tal incompetência tivesse sido reconhecida, haveria obediência à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), nos Mandados de Injunção que garantiram o exercício do direito de greve aos servidores públicos, como se pode notar na MI 670/ES, julgado em 25/10/2007:
EMENTA: [...] 6. DEFINIÇÃO DOS PARÂMETROS DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL PARA APRECIAÇÃO DO TEMA NO ÂMBITO DA JUSTIÇA FEDERAL E DA JUSTIÇA ESTADUAL ATÉ A EDIÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA PERTINENTE, NOS TERMOS DO ART. 37, VII, DA CF. FIXAÇÃO DO PRAZO DE 60 (SESSENTA) DIAS PARA QUE O CONGRESSO NACIONAL LEGISLE SOBRE A MATÉRIA. MANDADO DE INJUNÇÃO DEFERIDO PARA DETERMINAR A APLICAÇÃO DAS LEIS Nos 7.701/1988 E 7.783/1989. 6.1. Aplicabilidade aos servidores públicos civis da Lei no 7.783/1989, sem prejuízo de que, diante do caso concreto e mediante solicitação de entidade ou órgão legítimo, seja facultado ao juízo competente a fixação de regime de greve mais severo, em razão de tratarem de "serviços ou atividades essenciais" (Lei no 7.783/1989, arts. 9o a 11). 6.2. Nessa extensão do deferimento do mandado de injunção, aplicação da Lei no 7.701/1988, no que tange à competência para apreciar e julgar eventuais conflitos judiciais referentes à greve de servidores públicos que sejam suscitados até o momento de colmatação legislativa específica da lacuna ora declarada, nos termos do inciso VII do art. 37 da CF. 6.3. Até a devida disciplina legislativa, devem-se definir as situações provisórias de competência constitucional para a apreciação desses dissídios no contexto nacional, regional, estadual e municipal. Assim, nas condições acima especificadas, se a paralisação for de âmbito nacional, ou abranger mais de uma região da justiça federal, ou ainda, compreender mais de uma unidade da federação, a competência para o dissídio de greve será do Superior Tribunal de Justiça (por aplicação analógica do art. 2o, I, "a", da Lei no 7.701/1988). Ainda no âmbito federal, se a controvérsia estiver adstrita a uma única região da justiça federal, a competência será dos Tribunais Regionais Federais (aplicação analógica do art. 6o da Lei no 7.701/1988). Para o caso da jurisdição no contexto estadual ou municipal, se a controvérsia estiver adstrita a uma unidade da federação, a competência será do respectivo Tribunal de Justiça (também por aplicação analógica do art. 6o da Lei no 7.701/1988). As greves de âmbito local ou municipal serão dirimidas pelo Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal com jurisdição sobre o local da paralisação, conforme se trate de greve de servidores municipais, estaduais ou federais. 6.4. Considerados os parâmetros acima delineados, a par da competência para o dissídio de greve em si, no qual se discuta a abusividade, ou não, da greve, os referidos tribunais, nos âmbitos de sua jurisdição, serão competentes para decidir acerca do mérito do pagamento, ou não, dos dias de paralisação em consonância com a excepcionalidade de que esse juízo se reveste.[23]

Observe-se que eventual ameaça aos bens do empregador/administrador no curso de movimento paredista não constitui questão de natureza possessória, mas mero desdobramento do exercício do direito de greve. Em verdade, entende-se que sequer a ação possessória seria cabível para discutir matéria que envolva o direito de greve, uma vez que não há qualquer intenção de turbação, esbulho ou qualquer receio com relação à posse ou à propriedade dos bens, especialmente, quando se trata da coisa pública, a qual é impossível ser convalidada em nome do interesse público e seus bens afetados.
A decisão deveria ter sido tornada sem efeito, com reconhecimento de sua nulidade diante da incompetência do juízo, mas, parece ter havido claudicância no cumprimento complexo das normas, mas o TRF-5ª Região, manifestou-se como se segue:
“É temerário suspender a decisão impugnada em juízo de cognição sumária, sem o estabelecimento do contraditório, necessário à exata compreensão da controvérsia. Ademais, o provimento judicial ora combatido não se mostrou abusivo ou flagrantemente ilegal, tendo o magistrado dado aos fatos e à lei razoável interpretação.
[...]
Por fim, por força do art. 109, da Constituição Federal, aos juízes federais compete processo e julgar as causas em que entidade autárquica (a exemplo do autor, UFCE) for interessada na condição de autora, ré, assistente ou oponente, não havendo que se falar, portanto, na competência desta Corte Regional para processar e julgar o presente feito.
[...]
Diante do exposto, não atribuo efeito suspensivo e converto o agravo de instrumento em agravo retido.”[24]

No caso apresentado, a greve de 2014 dos Técnicos Administrativos em Educação (TAE), houve excepcional reconhecimento pelo Tribunal da decisão lesiva, ainda que abrindo mão de competências. A própria Primeira Turma havia se manifestado em decisão recente, de forma contrária, quando avocou para si tal competência, como pode ser notado na decisão da Primeira Turma do TRF-5ª Região, Petição - PET4379/AL, Processo nº 00079063820114058000, que teve como relator o Desembargador Federal Manoel Erhardt, julgado em 04/04/2013, código do documento nº 324305:
PROCESSUAL CIVIL. INTERDITO PROBITÓRIO. GREVE DE SERVIDORES DA JUSTIÇA DO TRABALHO. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO TRF. FIM DA PARALISAÇÃO. FALTA DE INTERESSE. EXTINÇÃO.
1. O TRF é o órgão competente para julgar o interdito proibitório em face de servidores públicos federais em paralisação, para assegurar a continuidade dos serviços (MI nº 708 do STF) e PET nº 7884 do STJ).
2. Cabível a medida contra a perturbação da posse, quando dos fatos e provas a medida se faz necessária para impedir que a greve dos servidores públicos federais injustamente perturbe exercício de atividade que se faz viável, utilizando-se da posse.
3. O presente interdito proibitório tinha o escopo de evitar a turbação nos prédios da Justiça do Trabalho, diante da ameaça oriunda de movimento grevista. Mas, encerrado este, verifica-se a perda do objeto do pedido, restando prejudicada a sua apreciação.
4. Extinção do processo sem resolução de mérito, com base no art. 267, VI, do CPC, tendo em vista o encerramento há meses do movimento paredista dos servidores da Justiça do Trabalho da 19ª Região.[25]

          
Entrementes, o Sistema de Freios e Contrapesos quedou sem qualquer força, com a compreensão distorcida dos detentores do Poder no Estado, que, no caso, passou longe do Democrático de Direito. Coalisão entre os “Poderes” (funções da Soberania) do Estado ou visão desfocada sobre o papel do Estado, é impossível saber ao certo, mas os atos foram prejudiciais à Democracia e deslegitimadores do próprio Poder Público, situações que representam clara crise institucional que paira pelo Brasil.
Algo que não é novo no cenário nacional, quanto aos conflitos existenciais internos do Estado, como pode ser destacado dos trechos seguintes manifestados por ex Presidentes do Supremo Tribunal Federal e pela Corregedora Nacional do Poder Judiciário no Conselho Nacional de Justiça (CNJ):
“BRASÍLIA — O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, criticou duramente a atuação do Congresso Nacional nesta segunda-feira, em palestra dada a estudantes de Direito de uma faculdade privada em Brasília. Segundo o ministro, o Congresso é dominado pelo Executivo e se notabiliza por sua ineficiência e incapacidade de deliberar. Afirmou ainda que os partidos no Brasil são de mentirinha, sem preocupação programática, e que seus líderes querem apenas o poder pelo poder. Disse também que a Câmara é composta em grande parte por parlamentares que não representam a população. Horas depois, o ministro divulgou nota dizendo que não teve intenção de criticar o Parlamento.
O problema crucial brasileiro, a debilidade mais grave do Congresso brasileiro é que ele é inteiramente dominado pelo Poder Executivo. O Congresso não foi criado para única e exclusivamente deliberar sobre o poder executivo. Cabe a ele a iniciativa da lei. Temos um órgão de representação que não exerce em sua plenitude o poder que a Constituição lhe atribui, que é o poder de legislar — disse ele, lembrando que a maioria das leis aprovadas são de autoria do Executivo. [...]”[26]
“[...] Do outro lado, a corrente vencedora defendeu a plena autonomia do CNJ sob pena de esvaziar as atribuições do órgão responsável pelo controle externo do Judiciário. "Até as pedras sabem que as corregedorias não funcionam quando se trata de investigar seus pares", disse o ex-presidente do Supremo e do conselho, Gilmar Mendes. "O CNJ não pode ser visto como um problema. É uma solução, para o bem do Judiciário", afirmou Carlos Ayres Britto.
O ministro Joaquim Barbosa chegou a dizer que, diante das "situações escabrosas" reveladas pelo conselho, houve uma reação corporativa. A AMB, autora da ação em pauta, é a principal associação de juízes do país.”[27]
“SÃO PAULO - A corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon, que causou polêmica ao afirmar que no Judiciário existem "bandidos de toga", criticou a aposentadoria compulsória como forma de punição a juízes no Brasil. Em entrevista na noite de segunda-feira ao programa "Roda Viva", da TV Cultura, Eliana disse que o maior problema da Justiça está nos tribunais e não na primeira instância.[28]

Como visto, o próprio TRF-5ª Região negou sua competência e manteve os poderes do magistrado na decisão mencionada contra os trabalhadores sem, sequer, ter sopesado questões fundamentais como a negociação coletiva, o Estado Democrático ou assumir postura de conciliador, como disposto nas normas próprias. Ao final, julgou-se prejudicado o agravo de instrumento que se insurgia contra a decisão de primeira instância, em face do juiz, meses depois, ter julgado o mérito, com manutenção total da decisão ora analisada.
3.3 Dos direitos desrespeitados em espécie
No caso analisado no presente artigo, para confirmar a postura antidemocrática do Estado, os manifestantes tinham direitos fundamentais de greve (art. 37, VII, CF/88), reunião (art. 5º, XVI, CF/88) e manifestação (art. 5º, IV, CF/88), estando a decisão com impacto profundo nos manifestantes e no movimento. Ainda, feriu-se o Devido Processo Legal (art. 5º, LIV, da CF/88), por não fundamentar as decisão juridicamente quanto ao julgamento extra petita (art. 93, IX, CF/88) e os artigos 128 e 460 do Código de Processo Civil (julgamento extra petita), conforme transcrito acima.
Ademais, a submissão a solicitação ao Reitor para que seja realizada reunião no ambiente dos trabalhadores (servidores da UFC), contraria os Enunciados nºs 131, 132, 137, 139, 144 do Comitê de Liberdade Sindical do Conselho de Administração da Organização Internacional do Trabalho (OIT)[29], assim como viola as liberdades sindicais “a proibição de afixação de cartazes, nos quais se expressem os pontos de vista de uma central sindical, é uma restrição inaceitável do exercício das atividades sindicais”, conforme o Enunciado nº 467, também da Recompilação do Comitê de Liberdades Sindicais da OIT.
Impôs-se, ademais, a retirada das faixas, materiais da greve e das instalações do Comando Local de Greve do Pátio da Gestão da UFC (local de uso apenas estético para a instituição), ferindo diversas liberdades sindicais, normas constitucionais e tratados internacionais, com crescente desmoralização do Sindicato, da diretoria e dos trabalhadores em greve, já com diversas desistências e críticas aos que pretendem aderir ao movimento.
Impunha-se ao magistrado na tomada de decisões o respeito ao Devido Processo Legal, nos termos do art. 5º, LIV, da Constituição de 1988:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

Contudo, a decisão concedeu algo diverso do solicitado, uma vez que a parte autora tratou de ‘desobstrução’ e destacou a concordância com a permanência do movimento pacífico do Comando Local de Greve nas instalações da Reitoria (item 18 da petição inicial e item 1 do pedido), lugar historicamente ocupado exercendo, conjuntamente, o direito de greve, o que atenta contra o disposto nos arts. 128 e 460 do Código de Processo Civil, verbis:
Art. 128. O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte.
[...]
Art. 460. É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que Ihe foi demandado.
Parágrafo único. A sentença deve ser certa, ainda quando decida relação jurídica condicional.

A decisão se fundou, quanto à reintegração, em causa de pedir diversa da consignada na inicial, considerando que analisou o caso de ‘desobstrução’ concedendo ‘desocupação’ (mandado judicial), o que não foi retificado pela via dos embargos de declaração. Destaque-se que nunca se pretendeu permanecer permanentemente no bem, mas realizar ato de manifestação, temporário, durante uma greve legítima, não podendo a reintegração chegar a tais efeitos de desocupação, desacreditando a fundo a liberdade de manifestação e fragilizando, indevidamente, o direito de greve. 
Outrossim, o prolator da decisão se utilizou de uma tese individual que chama de ‘princípio da fungibilidade do pedido’, sem fundamentação constitucional, legal, jurisprudencial ou doutrinária para tal possibilidade, pretendendo justificar o julgamento para além do pedido, sem considerar os problemas gerados para o movimento e para as normas vergastadas, contrariando o art. 93 da Constituição de 1988, verbis:
Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:
[...]
IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;[30]

Ressalte-se já ser extremamente controvertida a aplicação de ações possessórias contra movimentos sociais e greves em geral, uma vez que não há ânimo de permanência na propriedade ou viabilidade de convalidação da propriedade no caso em tela. A decisão pareceu utilizar-se de consciência ligada ao direito de propriedade no Direito das Coisas em si, sendo inadequada para os movimentos sociais. Ainda mais gravoso é o julgamento além do pedido sob o pálio de infundado ‘princípio da fungibilidade do pedido’ para o direito de manifestação, reunião e greve, como se pode notar do trecho da decisão agravada após os embargos:
“No meio jurídico é público e notório, em face do pacífico entendimento na literatura jurídica e na jurisprudência, de que nos interditos possessórios - gênero que alberga as ações de manutenção, reintegração e de interdito proibitório - se sujeitam ao princípio da fungibilidade do pedido.
Assim, se for solicitada a manutenção de posse e o juiz, verificando que não houve turbação nem esbulho, pode conceder o interdito proibitório. Assim, por exemplo, tendo havido esbulho, pode o juiz conceder a reintegração de posse e assim por diante. O mesmo se aplica ao oficial de justiça quando em cumprimento de um mandado de manutenção de posse ou de reintegração de posse.”[31]

A Recompilação de Decisões e dos Princípios do Comitê de Liberdade Sindical do Conselho de Administração da Organização Internacional do Trabalho (OIT), cuja função consiste em contribuir para a efetiva aplicação dos princípios gerais da liberdade sindical, que constitui uma das garantias primordiais da paz e da justiça social, dispõe que:
103. O respeito das garantias processuais não é incompatível com um processo equitativo e rápido; pelo contrário, uma delonga excessiva pode ter efeito intimidatório nos dirigentes envolvidos, com repercussão no exercício de suas atividades.
[...]
106. A falta de garantias de um processo judicial regular pode envolver abusos e ter como resultado que dirigentes sindicais acabem vítimas de decisões infundadas. Além disso, pode criar um clima de insegurança e de temor susceptível de influir no exercício dos direitos sindicais.
107. As garantias de um processo judicial regular não só devem estar expressas na legislação, mas ser também aplicadas na prática.
[...]
112. Em vários casos, o Comitê tem solicitado dos governos o envio integral do teor das sentenças proferidas e sua fundamentação.[32]

Sobre a competência do Comitê de Liberdade Sindical da OIT, destaca Gérson Marques no Parecer do Ministério Público do Trabalho (Processo nº 1904-86.2010.5.07.0001. Sindicato dos Policiais Federais no Estado do Ceará/SINPOF-CE - Ceará: Ministério Público do Trabalho/Procuradoria Regional do Trabalho da 7ª Região, fev/2011): 
O referido Comitê internacional lançou o Verbete nº 08, segundo o qual quando leis nacionais, mesmo as interpretadas por tribunais superiores, firam os princípios da liberdade sindical, o Comitê é competente para examinar as leis, dar orientações e oferecer assistência técnica da Organização para harmonizar as leis com os princípios da liberdade sindical definidos na Constituição da OIT e nas convenções aplicáveis. Isto deu ensejo a que, em 02/11/2009, as Centrais Sindicais do Brasil formulassem queixa perante o Comitê, em face da Justiça do Trabalho, do Ministério Público do Trabalho e do Ministério Público do Estado de São Paulo, por entenderem que a atuação destas instituições quanto às contribuições ou taxas assistenciais estabelecidas em acordos ou convenções coletivas de trabalho ofendem a liberdade sindical (caso nº 2739).

Para acirrar ainda mais a questão fundamental que envolve basicamente os direitos de greve, manifestação e reunião, a decisão nos embargos de declaração destacou-se:
“No entanto, se a parte embargante deseja apenas que seja garantido aos trabalhadores o direito a instalação do comando local da greve, o local onde, segundo disse, historicamente ocorrem as assembleias da categoria, que fica nos domínios da UFC, deve procurar o Reitor da aludida entidade e proceder a correspondente solicitação”.[33]
A decisão impôs a solicitação ao Reitor para que fossem realizadas as reuniões, violando plenamente o Direito de Reunião, que integra as Liberdades Sindicais, de modo que o direito das organizações profissionais celebrar reuniões para examinar questões profissionais, sem prévia autorização e sem ingerência das autoridades, constitui elemento fundamental à liberdade de associação, e as autoridades públicas deveriam abster-se de toda intervenção que possa limitar esse direito ou obstacularizar seu exercício legal (Enunciado nº 130). É o que se pode destacar dos enunciados da Recompilação de Decisões e dos Princípios do Comitê de Liberdade Sindical do Conselho de Administração da Organização Internacional do Trabalho (OIT), verbis:
131. O direito de greve e o direito de organizar reuniões sindicais são elementos essenciais do direito sindical, razão pela qual as medidas tomadas pelas autoridades para fazer respeitar a legalidade não deveriam ter como efeito impedir os sindicatos de organizar na ocasião de conflitos do trabalho.
132. Os trabalhadores devem poder gozar do direito de manifestação pacífica para defender seus interesses profissionais.
[...]
137. As autoridades só deveriam recorrer à força pública quando a ordem pública se achasse realmente ameaçada. A intervenção da força pública deve guardar a devida proporção com a ameaça da ordem pública que se procura controlar, e os governos deveriam providenciar para que as autoridades competentes recebessem instruções adequadas com o objetivo de eliminar o perigo que implicam os excessos de violência quando se trata de controlar manifestações capazes de alterar a ordem pública.
[...]
139. A autorização para fazer reuniões e manifestações públicas, que constituem importante direito sindical, não deve ser negada arbitrariamente.
[...]                   
144. Enquanto os sindicatos devem observar as disposições legais para a manutenção da ordem pública, as autoridades públicas devem abster-se de qualquer ingerência que reduza o direito dos sindicatos de organizar e realizar reuniões com plena liberdade.[34]

Outro ponto grave na decisão foi a ação do oficial de justiça, confirmada pelo magistrado ao manifestar-se sobre os embargos de declaração, seguindo ordens do Vice Reitor da Universidade Federal do Ceará, ao ordenar a retirada do Comando Local de Greve e de todo o material, como se pode observar da certidão e da decisão:
Decisão do magistrado: “Destarte, fez bem o senhor oficial de justiça ao fazer com que o patrimônio público da UFC retornasse ao poder e gerenciamento da direção da entidade. Ademais, por certo o oficial de justiça, no cumprimento do mandado, foi, no local, acompanhado de um representante da UFC que, se tivesse notado algum exagero, teria atuado e posteriormente comunicado a este Juízo, o que não ocorreu.”
Certidão do Oficial de Justiça: [...] CERTIFICO ADEMAIS QUE falei por telefone com o Procurador-Chefe da UFC, Dr. Paulo Antônio, o qual não estava ciente da autorização de permanência dos manifestantes no terreno lateral da reitoria, o que levou a presente Oficiala de Justiça, por cautela, retornar à tarde, quando encontraria pessoalmente a autoridade responsável pela Reitoria, no caso o Vice-Reitor, Dr. Henry. Acrescento ainda que todos os fatos foram relatados ao Procurador da UFC, Dr. Ronaldo. Às 14:45 horas, retornei à Reitoria da UFC juntamente com o Oficial de Justiça Roger Lins, onde encontramos o Vice-Reitor, Prof. Dr. Henry Campos, o qual solicitou que fôssemos dialogar mais uma vez com os manifestantes, informando que a Reitoria aceitaria que os grevistas permanecessem no terreno lateral da Reitoria, porém que fosse retirado todo o material do movimento (barracas, cadeiras, som, mesas, faixas, etc). Imediatamente, dirigimo-nos até o local do movimento paredista onde esclarecemos as condições impostas pela Autora, as quais foram acatadas pelos manifestantes que retiraram todos os objetos relacionados ao movimento, permanecendo as pessoas de forma mansa e pacífica.[35]

Identicamente, violou as liberdades sindicais “a proibição de afixação de cartazes, nos quais se expressem os pontos de vista de uma central sindical, é uma restrição inaceitável do exercício das atividades sindicais”, conforme o Enunciado nº 467, da Recompilação do Comitê de Liberdades Sindicais da OIT, o que agrava o teor da decisão: “Enunciado 467. A proibição de afixação de cartazes, nos quais se expressem os pontos de vista de uma central sindical, é uma restrição inaceitável do exercício das atividades sindicais.”
Destaque-se, ainda, nos termos do art. 6º, I, da Lei de Greve[36] (Lei nº 7.783, de 28 de junho de 1989 - aplicável ao serviço público conforme decisões do STF nos Mandados de Injunção nºs 670, 708 e 712), que são assegurados aos grevistas, dentre outros direitos o emprego de meios pacíficos tendentes a persuadir ou aliciar os trabalhadores a aderirem à greve.
Nesse passo, deveria ter ocorrido o reconhecimento do julgamento extra petita e o desrespeito de normas constitucionais, bem como equiparadas às fundamentais (Direitos Humanos em Tratados Internacionais ratificados – Convenção nº 151 da OIT[37]), com consequente reconhecimento da nulidade da decisão interlocutória e reforma da decisão pelo Tribunal  para afastar a desocupação dos servidores dos locais não utilizados para as atividades desenvolvidas pela UFC e de quaisquer constrições que impeçam os trabalhadores de exercerem plenamente a Liberdade Sindical, como o de instalação do Comando Local de Greve nas áreas da UFC.
3.4. Da violação de Tratado Internacional sobre Direitos Humanos (equivalência às normas constitucionais – art. 5º, § 3º, da CF/88), de normas constitucionais e legais
A decisão do Poder Judiciário, ao conceder liminar sem ouvida da parte contrária, com decisão englobando objeto diverso do pretendido, a qual tem se perenizado e fragilizado robustamente o direito de greve, reunião e manifestação, tornou-se perene, sem qualquer tentativa de conciliação, o processo foi concluído e o sindicato penalizado, também, financeiramente. Todos os efeitos da decisão foram sentidos pelos trabalhadores que se submetam às vontades do gestor (Reitor) que lhes promoveu a ação, impedindo-lhes de realizarem suas reuniões em local completamente inutilizado pela UFC (abaixo das mangueiras em frente da Reitoria), em momento tão delicado como o da greve, em que os direitos fundamentais estão em constante tensão e não podem zerados, de nenhuma parte.
Direitos fundamentais que estavam em tensão, os quais deveriam ter sido harmonizados, com o cumprimento máximo de ambos e sem a possibilidade de ‘zerar’ (tornar completamente inefetivo) algum, foram julgados sem razoabilidade, impondo-se um dos lados em contexto que agravou as distâncias da Democracia pela via negocial, quando deveria estar sendo otimizada.
O que se somou à postura da Reitoria, ao propor ação judicial sem tentativa de diálogo com o movimento reivindicatório, violando os direitos fundamentais e tratados internacionais sobre direitos humanos, como a Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)[38], equiparados às normas constitucionais:
Art. 5º. [...] § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.
Ademais, houve total desrespeito aos direitos fundamentais de greve (art. 37, VII, CF/88), reunião (art. 5º, XVI, CF/88) e manifestação (art. 5º, IV, CF/88) e à Convenção nº 151 da OIT, com impacto profundo nos manifestantes e no movimento.
No caso da ação da greve, respeitou-se o direito de trabalhar dos gestores e servidores, sendo obstaculizado, durante a manifestação, o funcionamento pleno da Universidade com relação ao trabalho ostensivo durante o horário programado. O que foi mencionado tópicos acima sobre a permissão da entrada de servidora para o pagamento das bolsas dos estudantes, evitando-se prejuízos para a instituição e para a comunidade. Os objetivos foram profundamente contrariados com violação às liberdades sindicais, diante da decisão agravada, a que exorbitou quanto aos poderes do Estado em casos de manifestação, reunião e greve, de modo que pretendia-se, dentre outras demandas a reabertura do diálogo local e nacional.
Provou-se o caráter antidemocrático da Reitoria quanto ao diálogo, de modo que não se procurou em nenhum momento o Comando Local de Greve para negociar o ocorrido, permanecendo no pedestal que gerou a greve. Relembre-se a Lei de Greve (aplicável aos servidores pela jurisprudência pacífica do STF), art. 6º, I (“São assegurados aos grevistas, dentre outros direitos: [...] I - o emprego de meios pacíficos tendentes a persuadir ou aliciar os trabalhadores a aderirem à greve”).
Nesse passo, impõe a Convenção 151 da OIT para os conflitos coletivos envolvendo os trabalhadores na administração pública, que devem ser tomadas medidas adequadas às condições nacionais para encorajar e promover o desenvolvimento e utilização dos mais amplos processos que permitam a negociação das condições de trabalho entre as autoridades públicas interessadas e as organizações de trabalhadores da função pública ou de qualquer outro processo que permita aos representantes dos trabalhadores da função pública participarem na fixação das referidas condições (art. 7º)[39].
Ainda, impõe que a resolução dos conflitos surgidos a propósito da fixação das condições de trabalho será procurada de maneira adequada às condições nacionais, através da negociação entre as partes interessadas ou por um processo que dê garantias de independência e imparcialidade, tal como a mediação, a conciliação ou a arbitragem, instituído de modo que inspire confiança às partes interessadas (art. 8º), como se pode observar:
ARTIGO 7 - Quando necessário, devem ser tomadas medidas adequadas às condições nacionais para encorajar e promover o desenvolvimento e utilização dos mais amplos processos que permitam a negociação das condições de trabalho entre as autoridades públicas interessadas e as organizações de trabalhadores da função pública ou de qualquer outro processo que permita aos representantes dos trabalhadores da função pública participarem na fixação das referidas condições.
PARTE V - Resolução dos conflitos
ARTIGO 8 - A resolução dos conflitos surgidos a propósito da fixação das condições de trabalho será procurada de maneira adequada às condições nacionais, através da negociação entre as partes interessadas ou por um processo que dê garantias de independência e imparcialidade, tal como a mediação, a conciliação ou a arbitragem, instituído de modo que inspire confiança às partes interessadas.
PARTE VI - Direitos civis e políticos
ARTIGO 9 - Os trabalhadores da função pública devem beneficiar, como os outros trabalhadores, dos direitos civis e políticos que são essenciais ao exercício normal da liberdade sindical, com a única reserva das obrigações referentes ao seu estatuto e à natureza das funções que exercem.[40]
No mesmo sentido, a Recompilação de Decisões e dos Princípios do Comitê de Liberdade Sindical do Conselho de Administração da Organização Internacional do Trabalho (OIT), cuja função consiste em contribuir para a efetiva aplicação dos princípios gerais da liberdade sindical, que constitui uma das garantias primordiais da paz e da justiça social, dispõe que:
11. Todo governo está obrigado a honrar plenamente os compromissos assumidos com a ratificação de convenções da OIT.
[...]
17. Os direitos sindicais, à semelhança dos demais direitos humanos fundamentais, devem ser respeitados qualquer que seja o grau de desenvolvimento do país em causa.
[...]
34. O Comitê tem considerado que o sistema democrático é fundamental para o exercício dos direitos sindicais.[41]

Destaque-se que a postura da Universidade Federal do Ceará nas últimas três greves (2007/2012/2014) foi ajuizar ações possessórias, esquivando-se do diálogo por ocasião das manifestações.
O próprio cabimento de ações possessórias como a proposta contra o agravante é contraditória em âmbito nacional e internacional, como destacado em diversas obras e jurisprudências que relacionam os interditos proibitórios à prática de assédio processual, uma vez que as decisões, sem ouvida da parte contrária, fragilizam o direito de greve, como destacado por Cortez:
O ministro Augusto César Leite de Carvalho no artigo “Direito Fundamental de Greve e Interdito proibitório”, na coletânea “Direitos Coletivos do Trabalho na Visão do TST”, sintetiza: “Faz algum tempo que os empresários usam o dissídio de greve, especialmente aquele em que buscam a declaração de abusividade do movimento grevista, e, também os interditos proibitórios como fórmulas engenhosas de refrear a reivindicação obreira porventura aparelhada pela greve. /../ Além de serem improváveis as hipóteses de cabimento do interdito proibitório em meio à greve, o aspecto de por ele se sublimar um interesse de menor estatura jurídica (o de posse), hipostasiado pela intenção de enfraquecer um direito fundamental (o de greve), recomenda uma postura criteriosa e firme na admissibilidade da ação possessória /.../”.
Entendemos que a constante utilização deste tipo de ação, para colocar os trabalhadores submissos diante de atitudes de coerção, acaba provocando a descrença de que a greve é um direito legítimo dos trabalhadores lutarem em prol de seus interesses de classe e caracteriza, a nosso juízo, uma atitude de assédio (moral) processual.
No assédio processual o principal bem jurídico violado é o próprio exercício, pela parte, do seu direito de ação, uma vez que estará sendo utilizada de maneira abusiva ou distorcida pelo único objetivo de tolher, na hipótese dos interditos, o direito material dos trabalhadores e do sindicato (sujeitos assediados) de decidir e encaminhar a greve sem ameaças, pressões ou, ainda, sem impedimentos que somente estariam legitimados quando efetivamente constatada a prática de atos abusivos, pelos grevistas, em decorrência da inobservância das normas previstas na lei de greve.
[...]
A expressão “assédio processual” tem avançado na doutrina sob o enfoque da teoria do dano moral. Os poucos autores sobre o tema, seja numa (espécie do gênero assédio) ou noutra hipótese (espécie do gênero dano moral) opina que no assédio processual [...]
Outros especialistas defendem que o assédio processual não se caracteriza somente pelo “conjunto de atos processuais temerários, infundados ou despropositados com o intuito de: procrastinar o andamento do feito, evitar o pronunciamento judicial, ou enganar o Juízo, mas impedir o cumprimento ou a satisfação de um direito materialmente reconhecido, impingindo constrangimentos à parte adversa”.
Nesta última linha de raciocínio o próprio Poder Judiciário seria, também, uma vítima do agressor, em razão da prática de um dano coletivo cometido com intenção de desacreditá-lo perante a sociedade. É agir de forma a gerar descrença a democrática ideia de acesso à Justiça que, por sua vez, não se confunde com acesso ao poder Judiciário.[42]

Nesse passo, dispõe a Lei de Greve, art. 3º, aplicável aos servidores públicos nos termos da jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal (STF), somado ao disposto no art. 114, § 1º, da Constituição de 1988, que dispõe expressamente, como prévia à ação judicial a negociação coletiva (“Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros”), “Frustrada a negociação ou verificada a impossibilidade de recursos via arbitral, é facultada a cessação coletiva do trabalho.
A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), MS 13860/DF nº 2008/0215889-4, que teve como relator o Ministro Moura Ribeiro, julgado em 13/11/2013, publicado no DJe em 20/11/2013, ressalta a imperiosa necessidade de negociação prévia às ações próprias do direito fundamental de greve dos servidores públicos, como se pode notar:
Ementa; DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL - MANDADO DE SEGURANÇA - DIREITO DE GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO - EXIGIBILIDADE DOS REQUISITOS DA LEI Nº 7.783/89 - NÃO DEMONSTRAÇÃO DE PRÉVIA NEGOCIAÇÃO COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - DIREITO LÍQUIDO E CERTO - INEXISTÊNCIA DE PROVA PRECONSTITUÍDA - SEGURANÇA DENEGADA. 1. O direito de greve é garantido aos servidores públicos especificamente no art. 37, VII, da Constituição Federal, sendo-lhes aplicável, até que sobrevenha regramento próprio, a Lei nº 7.783/89 que regula a greve na iniciativa privada. 2. Segundo a jurisprudência desta Corte, os requisitos estabelecidos no art. 3º, da Lei nº 7.783/89, são aplicáveis também às greves de servidores públicos. 3. A não demonstração de esgotamento das vias negociais implica ausência de prova preconstituída do direito líquido e certo.4. Segurança denegada, prejudicado o agravo regimental anteriormente interposto.[43]
Foi claro o desrespeito aos Direitos Humanos, às normas constitucionais e legais, com a vedação das atividades essenciais à efetividade do direito de greve dos servidores na Universidade Federal do Ceará, especialmente diante da imposição de submissão ao gestor da instituição, com multas e gravames, ao arrepio completo da Liberdade Sindical.
4. Conclusões
No Brasil, segue-se padrões tradicionais antidemocráticos ora predominantes no Ocidente, há descompasso relacionado à Democracia, com desprezo do aprendizado histórico relacionado à pacificação social dos grupos em constante tensão.
O Estado em vez de amenizar a disparidade de interesses por parte da classe trabalhadora e dos empregadores/administradores, tem sido agente de possível retrocesso social, ao assumir postura idêntica aos empresários do Capital Privado, defendendo teses que afastam o Econômico da discussão política.
O que tem possibilitado, inclusive, a ocorrência de conflitos violentos nos locais de trabalho, registrada vastamente pela História, diante da grande insatisfação dos obreiros em determinados contextos, também, entre os próprios membros da categoria patronal, em face da redução dos custos de produção pelos empreendedores que praticam a mais valia ao arrepio dos direitos laborais, opostos pelos que desenvolvem suas atividades econômicas em ambientes de forte união dos trabalhadores e/ou fiscalização ostensiva pelo Estado com foco no aprimoramento das relações de trabalho e produção (dano moral coletivo/dumping social).
Em termos pragmáticos, a melhor via de solução tem sido a negociação coletiva quando legitimada no senso comum dos obreiros e da sociedade, com Poder Real, o qual vem sendo destruído com a utilização inadequada, especialmente, quanto ao afastamento de temáticas essenciais da discussão nas mesas, como os aspectos econômicos e democráticos.
Desse modo, há um cenário jurídico propiciador da negociação coletiva, a qual chega a ser, via de regra, imposto pelo Legislador/Estado, para as relações públicas e privadas, mas que ainda carece de efetividade, uma vez que, apesar de se tratarem de normas detentoras de eficácia, ainda falta a realização social e a legitimação pelos principais atores em tais relações, especialmente, por parte dos que se encontram em posição de ‘superioridade’ nas relações laborais, à revelia do Ordenamento Jurídico, com perecimento da emancipação humana e, consequentemente, da sociedade.
Pior, os gestores (públicos ou privados) têm se arvorado da situação de domínio econômico/financeiro, da aproximação do Estado (bancadas maiores no Congresso Nacional), da existência de alguns sindicatos de trabalhadores descumpridores de seu papel de defesa ou sem força representativa, para flexibilizar a já carente de efetividade normatização de proteção dos trabalhadores, bem como manejando esforços no sentido de deslegitimar os instrumentos negociados autonomamente pelos sindicatos, permitindo-se a positivação de normas que precarizam as relações, contrariando suas finalidades. Em tudo, defende-se e divulga-se a ideia de que o econômico não pode discutido pela via da negociação ou pela via política, criando-se um patamar prático que contraria as noções basilares que norteiam a sociedade.
Para demonstrar tal contexto, foram apresentadas nuances do último conflito coletivo entre os servidores Técnico Administrativos em Educação (TAE) e a Administração Pública (UFC), em que houve desrespeito às normas constitucionais, bem como às normas equiparadas às fundamentais (Direitos Humanos em Tratados Internacionais ratificados – Convenção nº 151 da OIT). Foi claro o desrespeito aos Direitos Humanos, às normas constitucionais e legais, com a vedação das atividades essenciais à efetividade do direito de greve dos servidores na Universidade Federal do Ceará, especialmente diante da imposição de submissão ao gestor da instituição, com multas e gravames, ao arrepio completo da Liberdade Sindical. Assim, demonstrando-se a essência dos motivos que levaram à falta de êxito do movimento paredista, declarado abusivo pelo STJ, com imposição de negociação coletiva por parte do governo federal, a qual continua a seguir apenas formalmente, uma vez que a Administração continua a não apresentar nada de concreto ou transacionar em nenhuma questão, ao arrepio da efetividade constitucional.
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____. Primeira Turma – Petição - PET4379/AL, Processo nº 00079063820114058000. Net: http://www.trf5.jus.br.


Sobre o autor: Clovis Renato Costa Farias

Doutorando em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC), bolsista da CAPES/CNPq. Vencedor do Prêmio Nacional em Direitos Humanos da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA), Troféu 'Cilindro de Ciro', Placa de Reconhecimento da Coordenadoria Nacional de Liberdades Sindicais do Ministério Público do Trabalho (CONALIS) e do Fórum das Centrais Sindicais no Ceará (FCSEC), medalha dos 80 anos da GLMECE, medalha Cavaleiros de York. Membro do GRUPE (Grupo de Estudos e Defesa do Direito do Trabalho e do Processo Trabalhista), do Grupo de Estudos Boaventura de Sousa Santos no Ceará, no Curso de Ciências Sociais da UFC, e da ATRACE. Editor e elaborador da página virtual de difusão cultural: Vida, Arte e Direito (vidaarteedireito.blogspot.com/), do Periódico Atividade - ISSN 2359-5590 (vidaarteedireitonoticias.blogspot.com/) e do Canal Vida, Arte e Direito (www.youtube.com/user/3mestress). Autor do livro: 'Desjudicialização: conflitos coletivos do trabalho'.  Graduado em Letras pela Universidade Federal do Ceará (2003), em Direito pela Universidade de Fortaleza (2008), especialista em Direito e Processo do Trabalho  (RJ), mestre em Direito Constitucional (Mestrado em Direito da UFC). Tem experiência como Professor de Literatura, Direito e Processo do Trabalho, Sociologia Jurídica, Direito Constitucional,Mediação e Arbitragem, Direito Sindical, tendo atuado em cursinhos, cursos de graduação, pós-graduação em Direito, nas áreas trabalhista, processual e constitucional; é Advogado (OAB 20.500) de organizações sindicais de trabalhadores e partidos políticos,  mediador coletivo, Vice Presidente da Comissão de Direito Sindical da OAB/CE. Foi Chefe da Assessoria Jurídica do Procurador Chefe do Ministério Público do Trabalho/PRT-7ª Região (2009-2011), Secretário Regional Adjunto do MPT, Chefe do Gabinete do Procurador Chefe/PRT, Assessor Jurídico da Secretaria de Cultura do Ceará (Constituinte Estadual da Cultura e Plano Estadual do Livro), conciliador pelo TJCE/CNJ e orientador no Projeto Cidadania Ativa/UNIFOR, orientador do Escritório de Direitos Humanos da UNICHRISTUS - Projeto Comunidade e Direitos Sociais, membro do Comitê Gestor de Grandes Eventos (SRTE/MTE), delegado eleito da Conferência Nacional do Emprego e Trabalho Decente (OIT/MTE), delegado eleito da UNE (47º CONUNE), secretário geral do Sindicato dos Advogados no Estado do Ceará (Sindace). 


[1] MARTINEZ, Fernando. Direito do Trabalho. São Paulo: LTr. 2010. p. 597-598.
[2] REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Constituição de 1988. Art. 1º, caput. Net: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em 15 de dez. 2014.
[3] Op. cit. 2. Art. 1º, IV.
[4] Op. cit. Constituição de 1988. 2. Art. 7º, XXVI.
[5] REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Lei nº 7.783, de 28 de junho de 1989 (Dispõe sobre o exercício do direito de greve, define as atividades essenciais, regula o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, e dá outras providências). Net: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7783.htm. Acesso em 15 de dez. 2014.
[6] LIMA, Francisco Gérson Marques de. O STF e a crise institucional brasileira - Estudos de casos: abordagem interdisciplinar de sociologia constitucional. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 582.
[7] Mandado de Injunção: Ação prevista nas normas jurídicas brasileiras para assegurar a efetividade de direitos fundamentais carentes de eficácia em face da inexistência de norma infraconstitucional, em razão de mora do Poder Legislativo, para lhes delimitar a operacionalização, a qual impõe ao Poder Judiciário que delineie um modo efetivo que garanta o direito até que o Poder competente entre em ação normatizando.
[8] Op. cit. LIMA, Francisco Gérson Marques de. p. 586.
[9] Os gestores, de regra, preferem que venham  as ações judiciais, uma vez que mandam tais ações diretamente para a Procuradoria Judicial, de modo que a propositura de ação judicial não provoca diretamente o administrador que sequer lê a ação, uma vez que outro órgão é responsável pelas respostas, o que fragiliza a postura negocial e os efeitos de pressão em face das ações judiciais, mantêm posturas arbitrárias da administração e mitiga o processo de emancipação humana no debate democrático das discussões das relações laborais. Algo que, também, sobrecarrega o Poder Judiciário, com ônus, social e financeiro, para o Estado e para a Sociedade, além de perecimento de direitos em questões que poderiam ser mais rapidamente resolvidas pela via negocial.
[10] SILVA, Fernando. Assembleia Geral Sintufce 11/11/2014. Net: https://www.youtube.com/watch?v=qHZluNhR-ZI. Acesso em 15 de dez. 2014.
[11] Op. cit. REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Constituição de 1988. Art. 170, III e VIII.
[12] Op. cit. REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Constituição de 1988. Art. 193.
[13] Op. cit. REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Constituição de 1988. Art. 1º, III.
[14] Op. cit. REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Constituição de 1988. Art. 1º, V.
[15] Op. cit. REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Constituição de 1988. Art. 3º, I.
[16] REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Net: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869.htm. Acesso em 15 de dez. 2014.
[17] REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997. Net: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9469.htm. Acesso em 15 de dez. 2014.

[18] PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. MINISTÉRIO DA FAZENDA. Portaria MF nº 75, de 22 de março de 2012 - Dispõe sobre a inscrição de débitos na Dívida Ativa da União e o ajuizamento de execuções fiscais pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Net: http://www.receita.fazenda.gov.br/legislacao/Portarias/2012/MinisteriodaFazenda/portmf075.htm. Acesso em 15 de dez. 2014.
[19] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Programa da AGU reduz o número de recursos no STJ e contribui para desafogar a Justiça. Net: www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/sala_de_noticias/noticias/Destaques/Programa-da-AGU-reduz-o-número-de-recursos-no-STJ-e-contribui-para-desafogar-a-Justiça. Acesso em 15 de dez. 2014.
[20] JUSTIÇA FEDERAL NO CEARÁ. 8ª Vara da Seção Judiciária Federal do Ceará - Ação de Reintegração de Posse nº 0802381-28.2014.4.05.8100. Net: http://www.jfce.jus.br/. Acesso em 15 de dez. 2014.
[21] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Mandado de Injunção nº 708. Net: http://www.stf.jus.br/. Acesso em 15 de dez. 2014.
[22] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Petição nº 7884. Net: www.stj.jus.br. Acesso em 15 de dez. 2014.
[23] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Mandado de Injunção nº 670/ES. Net: http://www.stf.jus.br/. Acesso em 15 de dez. 2014.
[24] TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO. Primeira Turma – Processo nº 0802386-03.2014.4.05.0000. Net: http://www.trf5.jus.br. Acesso em 15 de dez. 2014.
[25] TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO. Primeira Turma – Petição - PET4379/AL, Processo nº 00079063820114058000. Net: http://www.trf5.jus.br. Acesso em 15 de dez. 2014.
[26] SOUZA, André. O GLOBO. Joaquim Barbosa critica Congresso e diz que partidos brasileiros são de mentirinha. 20/05/2013. Net: http://oglobo.globo.com/brasil/joaquim-barbosa-critica-congresso-diz-que-partidos-brasileiros-sao-de-mentirinha-8441158. Acesso em 15 de dez. 2014.
[27] CASTRO, Gabriel; D'ELIA, Mirella. Supremo mantém autonomia do CNJ para investigar juízes. 02/02/2012. Net: http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/supremo-mantem-autonomia-do-cnj-para-investigar-juizes. Acesso em 15 de dez. 2014.
[28] FARAH, Tatiana. O GLOBO. Eliana Calmon reafirma que há ‘bandidos de toga’. 14/11/2011. Net: http://oglobo.globo.com/brasil/eliana-calmon-reafirma-que-ha-bandidos-de-toga-3241990. Acesso em 15 de dez. 2014.
[29] ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Recompilação do Comitê de Liberdades Sindicais da OIT. Net: http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/union_freedom/pub/liberdade_sindical_286.pdf. Acesso em 15 de dez. 2014.
[30] REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Constituição de 1988. Art. 93, IX. Net: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em 15 de dez. 2014.
[31] JUSTIÇA FEDERAL NO CEARÁ. 8ª Vara da Seção Judiciária Federal do Ceará - Ação de Reintegração de Posse nº 0802381-28.2014.4.05.8100. Net: http://www.jfce.jus.br/. Acesso em 15 de dez. 2014.
[32] ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Recompilação do Comitê de Liberdades Sindicais da OIT. Net: http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/union_freedom/pub/liberdade_sindical_286.pdf. Acesso em 15 de dez. 2014.
[33] JUSTIÇA FEDERAL NO CEARÁ. 8ª Vara da Seção Judiciária Federal do Ceará - Ação de Reintegração de Posse nº 0802381-28.2014.4.05.8100. Net: http://www.jfce.jus.br/. Acesso em 15 de dez. 2014.
[34] ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Recompilação do Comitê de Liberdades Sindicais da OIT. Net: http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/union_freedom/pub/liberdade_sindical_286.pdf. Acesso em 15 de dez. 2014.
[35] JUSTIÇA FEDERAL NO CEARÁ. 8ª Vara da Seção Judiciária Federal do Ceará - Ação de Reintegração de Posse nº 0802381-28.2014.4.05.8100. Net: http://www.jfce.jus.br/. Acesso em 15 de dez. 2014.
[36] REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Lei nº 7.783, de 28 de junho de 1989 (Dispõe sobre o exercício do direito de greve, define as atividades essenciais, regula o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, e dá outras providências). Net: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7783.htm. Acesso em 15 de dez. 2014.
[37] PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Convenção nº 151 da Organização Internacional do Trabalho - Convenção Relativa à Protecção do Direito de Organização e aos Processos de Fixação das Condições de Trabalho na Função Pública. Net:  http://portal.mte.gov.br/data/files/8A8181FA2C136B7A012C142C43615871/Conv_151,39492,7606134259.pdf. Acesso em 15 dez. 2014.
[38] PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Convenção nº 151 da Organização Internacional do Trabalho - Convenção Relativa à Protecção do Direito de Organização e aos Processos de Fixação das Condições de Trabalho na Função Pública. Net:  http://portal.mte.gov.br/data/files/8A8181FA2C136B7A012C142C43615871/Conv_151,39492,7606134259.pdf. Acesso em 15 dez. 2014.
[39] PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Convenção nº 151 da Organização Internacional do Trabalho - Convenção Relativa à Protecção do Direito de Organização e aos Processos de Fixação das Condições de Trabalho na Função Pública. Net:  http://portal.mte.gov.br/data/files/8A8181FA2C136B7A012C142C43615871/Conv_151,39492,7606134259.pdf. Acesso em 15 dez. 2014.
[40] Op. cit. Convenção nº 151 da OIT.
[41] ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Recompilação do Comitê de Liberdades Sindicais da OIT. Net: http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/union_freedom/pub/liberdade_sindical_286.pdf. Acesso em 15 de dez. 2014.
[42] CORTEZ, Rita. Os interditos proibitórios e a prática de assédio processual. Net: http://www.espacovital.com.br/publicacao-29495-os-interditos-proibitorios-e-pratica-assedio-processual. Acesso em 15 de dez. 2014.
[43] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Terceira Seção – Mandado de Segurança nº 13860/DF nº 2008/0215889-4. Net: www.stj.jus.br. Acesso em 15 de dez. 2014.

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