Os Ministérios Públicos Federal (MPF) e Estadual (MPE) de
Mato Grosso do Sul ingressaram com ação civil pública na 1ª Vara Federal de
Coxim (MS) para suspender a instalação de empreendimentos hidrelétricos no
entorno do Pantanal até a realização de estudo sobre o impacto cumulativo das
atividades. Atualmente, há 126 empreendimentos instalados ou em vias de
instalação e 23 estudos de inventário em análise.
A ação direciona-se contra União, Estados de Mato Grosso
do Sul e de Mato Grosso, Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Empresa
de Pesquisa Energética (EPE), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Instituto do Meio Ambiente do Mato
Grosso do Sul (Imasul).
Danos irreversíveis - Pesquisas científicas alertam sobre
os riscos da instalação de empreendimentos hidrelétricos na Bacia do Alto
Paraguai (BAP). Segundo os pesquisadores, se as hidrelétricas, mesmo as de
pequeno porte - chamadas de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) -, forem
instaladas na BAP, o ciclo das cheias no Pantanal será alterado, provocando
efeitos negativos em todo o bioma, que depende do pulso natural das inundações
para ter vida.
Sem o devido estudo do impacto acumulado das atividades e
de medidas eficazes para evitar o colapso do sistema, danos irreversíveis podem
ser causados ao meio ambiente e às mais de 4 mil famílias que dependem
exclusivamente da Bacia para sobreviver. Reflexos ainda devem ser sentidos no
turismo, na agricultura e na pesca, além de prejuízos a sítios arqueológicos da
região.
Individual x Cumulativo - Atualmente, licenças ambientais
são fornecidas a cada empreendimento hidrelétrico de forma individualizada.
Contudo, para o Ministério Público, em um bioma complexo e sensível como o
Pantanal, não basta somar os impactos individuais, é preciso analisá-los em
conjunto, considerando toda a Bacia do Alto Paraguai.
Para que os impactos simultâneos sejam considerados, o
Ministério Público solicita que a Justiça determine a realização de uma
Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) em toda a BAP, incluindo os estados de
Mato Grosso do Sul e de Mato Grosso. O estudo deve ter como base um
bibliografia especializada e contar com a participação de setores científicos e
da sociedade civil organizada.
O pedido de liminar, se aceito pela Justiça, deve
suspender todos os processos de licenciamento ambiental dos empreendimentos
hidrelétricos, no estágio em que se encontrarem, até que o estudo do impacto
cumulativo seja finalizado e suas conclusões aplicadas.
Para o MP, a via judicial foi a única forma de obrigar os
órgãos ambientais a realizar a Avaliação Ambiental Estratégica e prevenir
futuros danos. Três audiências públicas, diversas recomendações e ofícios foram
encaminhados pelo órgão ministerial às instituições estaduais e federais de
meio ambiente, mas as medidas restaram-se insuficientes para que ações
concretas fossem realizadas.
Exploração energética crescente - Nos últimos anos,
apesar de reiterados alertas sobre possíveis efeitos negativos da exploração
energética no planalto que circunda o Pantanal, novas licenças ambientais foram
concedidas. Em 2008, 115 empreendimentos estavam projetados, hoje são 126 - um
aumento de 8,5%.
Já em relação à potência instalada na BAP, entre os anos
de 2003 e 2011 houve um incremento de 120% na exploração hidrelétrica da Bacia.
A capacidade saltou de 499 MW em 2003 para 1.200 MW no ano passado. Do total de
empreendimentos, 75% correspondem a Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) -
usinas com potência dentre 1 e 30 MW.
E a tendência é que os empreendimentos hidrelétricos
continuem sendo instalados, principalmente os de pequeno porte. Mudanças institucionais
e regulamentares da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) alteraram o
conceito de PCHs e têm estimulado a proliferação de empreendimentos de
"menor impacto" - de até 10 mil kwW.
Incentivos financeiros e tributários têm sido fornecidos
aos empreendedores e chegam a isentá-los do pagamento de compensação financeira
pela energia elétrica produzida. Para o Ministério Público, fracionar o
aproveitamento de potenciais hidrelétricos leva à fragilização da tutela
ambiental e, por isso, medidas emergenciais devem ser realizadas.
"O nível de exploração dos recursos hídricos da
Bacia, aliado à dinâmica acelerada de expansão dos aproveitamentos
hidroenergéticos da BAP, revelam ainda mais a indispensabilidade de se buscar
clareza e segurança quanto aos parâmetros para a adequada utilização dos
recursos ambientais no Pantanal e no planalto que o circunda".
Prevenção contra danos - Na ação judicial, o Ministério
Público reforça que os diversos empreendimentos hidrelétricos representam
prejuízos desconhecidos e sem medida, "o que por si só seria motivo
suficiente para arguir a necessidade de suspensão dessas atividades".
"Admitir a continuidade da expansão do setor
elétrico na Bacia na qual está inserido o Pantanal, sem o adequado estudo de
impactos cumulativos de empreendimentos hidrelétricos, é ato contrário à lei e
à Constituição, capaz de ferir de morte um dos biomas mais notáveis do
mundo", alerta o MP.
Na ação judicial, o Ministério Público busca que o Ibama,
o Imasul e a Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Estado de Mato Grosso
(SEMA/MT) sejam obrigados a condicionar os futuros licenciamentos ambientais à
Avaliação Ambiental Estratégica, que deve ser realizada pela Empresa de
Pesquisas Energéticas - ligada ao Ministério de Minas e Energia.
Quanto os empreendimentos em funcionamento, o MP quer que
as Licenças de Operação, quando renovadas, considerem expressamente as novas
exigências decorrentes da AAE.
Patrimônio Nacional e da Humanidade - O Pantanal, situado
na Bacia do Alto Paraguai, constitui a maior planície alagável do mundo. No
Brasil, ele está localizado entre estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e
abrange também parte da Bolívia e do Paraguai.
A característica mais marcante da Bacia é a relação entre
planalto e planície, que influencia a paisagem e a biodiversidade de uma das
regiões mais importantes do planeta. O pulso regular das cheias é o principal
fenômeno que rege o seu funcionamento ecológico. É a sazonalidade destas cheias
que dita a diversidade da biota presente neste território, permitindo a
constante renovação dos organismos ali presentes.
O Pantanal foi declarado Patrimônio Nacional pela
Constituição Brasileira de 1988. No âmbito internacional, ele é considerado
Patrimônio da Humanidade e Reserva da Biosfera pela Organização das Nações
Unidas para Educação, Ciência e Cultura - UNESCO, desde 2000.
Referência processual na Justiça Federal de Coxim:
000052124.2012.4.03.6007
Fonte: MPF
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