Foi divulgada essa semana uma Escritura Pública de União
Poliafetiva que, de acordo com a tabeliã de notas e protestos da cidade de
Tupã, interior de São Paulo, Cláudia do Nascimento Domingues, pode ser
considerada a primeira que trata sobre uniões poliafetivas no Brasil. Ela,
tabeliã responsável pelo caso, explica que os três indivíduos: duas mulheres e
um homem, viviam em união estável e desejavam declarar essa situação
publicamente para a garantia de seus direitos. Os três procuraram diversos
tabeliães que se recusaram a lavrar a declaração de convivência pública.
"Quando eles entraram em contato comigo, eu fui averiguar se existia algum
impedimento legal e verifiquei que não havia. Eu não poderia me recusar a
lavrar a declaração. O tabelião tem a função pública de dar garantia jurídica
ao conhecimento de fato", afirma.
Ela conta também que se sentiu bastante a vontade para
tornar pública essa união envolvendo três pessoas, já que havia um desejo comum
entre as partes, se tratava de pessoas capazes, sem envolvimento de nenhum
menor e sem litígio. "Internamente não havia dúvida de que as três pessoas
consideravam viver como entidade familiar e desejavam garantir alguns direitos.
Minha dúvida é com as questões externas à relação. Não há legislação que trate
sobre o assunto. A aceitação envolve a maturação do direito. Nesse caso, foi
preciso atribuir o direito a partir de um fato concreto. Será que haverá algum
questionamento?" reflete.
Para a vice-presidente do Instituto Brasileiro de
Família, IBDFAM, Maria Berenice Dias, é preciso reconhecer os diversos tipos de
relacionamentos que fazem parte da nossa sociedade atual. "Temos que
respeitar a natureza privada dos relacionamentos e aprender a viver nessa
sociedade plural reconhecendo os diferentes desejos", explica.
Maria Berenice não vê problemas em se assegurar direitos
e obrigações a uma relação contínua e duradoura, só por que ela envolve a união
de três pessoas. "O princípio da monogamia não está na constituição, é um
viés cultural. O código civil proíbe apenas casamento entre pessoas casadas, o
que não é o caso. Essas pessoas trabalham, contribuem e, por isso, devem ter
seus direitos garantidos. A justiça não pode chancelar a injustiça",
completa.
A escritura
"Os declarantes, diante da lacuna legal no
reconhecimento desse modelo de união afetiva múltipla e simultânea, intentam
estabelecer as regras para garantia de seus direitos e deveres, pretendendo
vê-las reconhecidas e respeitadas social, econômica e juridicamente, em caso de
questionamentos ou litígios surgidos entre si ou com terceiros, tendo por base
os princípios constitucionais da liberdade, dignidade e igualdade." A
frase retirada da Escritura Pública Declaratória de União Poliafetiva resume
bem o desejo das partes em tornar pública uma relação que consideram familiar e
de união estável. A partir dessa premissa, a escritura trata sobre os direitos
e deveres dos conviventes, sobre as relações patrimoniais bem como dispõe sobre
a dissolução da união poliafetiva e sobre os efeitos jurídicos desse tipo de
união.
A partir da união estável, a escritura estabelece um
regime patrimonial de comunhão parcial, análogo ao regime da comunhão parcial
de bens estabelecido nos artigos 1.658 a 1.666 do Código Civil Brasileiro.
Nesse caso, eles decidiram que um dos conviventes exercerá a administração dos
bens. Dentre os direitos e deveres dos conviventes está a assistência material
e emocional eventualmente para o bem estar individual e comum; o dever da
lealdade e manutenção da harmonia na convivência entre os três.
Fonte: IBDFAM
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