Há a ortodoxia do ‘Progresso
do Peregrino’, onde aquele período é esquadrinhado em busca de pioneiros
precursores do Estado do Bem-Estar Social, progenitores de uma Comunidade
Socialista ou (mais recentemente) precoces exemplares de relações industriais
racionais. Cada uma dessas ortodoxias tem uma certa validade. Todas contribuíram
para o nosso conhecimento. Discordo das duas primeiras porque tendem a
obscurecer a atuação dos trabalhadores, e o grau com que contribuíram com
esforços conscientes, no fazer-se da história. Discordo da terceira porque lê a história à luz de preocupações
posteriores, e não como de fato ocorreu. Apenas
os vitoriosos (no sentido daqueles cujas aspirações anteciparam a evolução
posterior) são lembrados. O becos sem saída, as causas perdidas e os próprios
perdedores ao esquecidos.
Estou tentando resgatar o pobre tecelão de malhas, o meeiro
luddita, o tecelão do ‘obsoleto’ tear
manual, o artesão ‘utópico’ e mesmo o iludido seguidor de Joanna Southcott, dos
imensos ares superiores de condescendência da posteridade. Seus ofícios e
tradições podiam estar desaparecendo. Sua hostilidade frente ao novo
industrialismo podia ser retrógrada. Seus ideais comunitários podiam ser
fantasiosos. Suas conspirações insurreicionais podiam ser temerárias. Mas eles
viveram nestes tempos de aguda perturbação social, e nós não. Suas aspirações
eram válidas nos termos de sua própria experiência; se foram vítimas acidentais
da história, continuam a ser, condenados em vida, vítimas acidentais.
Não deveríamos ter como único critério de julgamento o fato
de as ações de um homem se justificarem, ou não, à luz da evolução posterior.
Afinal de contas, nós mesmos anão estamos no final da evolução social. Podemos
descobrir, em algumas das causas perdidas do povo da Revolução Industrial,
percepções de males sociais que ainda estão por curar. Além disso, a maior
parte do mundo ainda hoje passa por problemas de industrialização e de formação
de instituições democráticas, sob muitos aspectos semelhantes à nossa própria
experiência durante a Revolução Industrial. Causas que foram perdidas na Inglaterra poderiam ser ganhas na Ásia ou
na África.
[...] a classe é uma
formação tanto cultural como econômica, tive o cuidado de evitar
generalizações para além da experiência inglesa.
(THOMPSON, Eduard P. A formação da classe operária inglesa. Parte
I - A árvore da liberdade. 3v. Coleção Oficinas da História. Tradução:
Denise Bottmann. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. p. 09-14)
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