A
repressão sobre a atuação dos defensores
A imagem
de manifestantes e jornalistas agredidos tem se repetido e se banalizado desde
junho do ano passado. Enquanto continuam a sofrer abusos policiais e prisões
arbitrárias, os advogados tornam-se um alvo cada vez mais comum durante
protestos, acuados pela Polícia Militar, pela mídia e até por integrantes da
Ordem dos Advogados do Brasil.
Alguns
foram agredidos pela polícia e hostilizados por colegas em delegacias durante o
protesto do sábado 22 em São Paulo, o segundo neste ano contra a Copa do Mundo.
Conforme o movimento Advogados Ativistas, defensores foram impedidos de se
aproximar dos manifestantes e de observar as detenções quando a polícia fez um
cordão em volta de mais de duas centenas de manifestantes, presos por
amostragem. Um deles, Luiz Guilherme Ferreira, chegou a ter seu celular levado
por um policial. Até o momento não o recuperou. O grupo ainda diz que outros
foram vítimas dos mesmos cassetetes empunhados contra manifestantes e
jornalistas, sem distinção de profissão ou classe.
A polícia
paulista tomou outras atitudes para dificultar o trabalho de advogados, entre
elas a dispersão dos manifestantes presos. No último protesto contra a Copa, as
253 detenções aconteceram no centro da cidade, próximas à Estação Anhangabaú do
Metrô. Mas os detidos foram levados a sete distritos policiais em diferentes
bairros, distantes até cinco quilômetros uns dos outros. Vários foram levados a
distritos que normalmente não funcionam no sábado à noite, horário de plantão.
Em consequência, os advogados tiveram mais dificuldade de atender os detidos
diante de policiais que sonegam informações.
De acordo
com Thiago Melo, advogado do Instituto de Defensores de Direitos Humanos, o
mesmo problema acontece no Rio de Janeiro. “Para você ficar sabendo a qual
delegacia o detido foi conduzido, é um trabalho muito grande. A viatura roda
pela cidade, fora da circunscrição que deveria ir. Tem gente presa no Rio e
conduzida a São Gonçalo.”
O cerco
não é novidade. Rodolfo Valente, advogado do Movimento Passe Livre de São
Paulo, teve dificuldades para acessar um distrito no primeiro protesto do mês de
junho de 2013. O advogado também foi agredido pela PM no Grajaú, extremo da
zona sul da cidade, quando tentava se informar sobre detidos durante
manifestação contra o corte de linhas de ônibus em outubro do ano passado.
A atuação
da polícia contra os defensores extrapola a sua ação ostensiva. Valente foi
intimado a depor no Departamento Estadual de Investigações Criminais, que
investiga manifestantes de diversos atos. O advogado e os outros militantes do
movimento decidiram não comparecer, sob a alegação do exercício do “direito
constitucional de ficar em silêncio”. “No meu caso específico, sou advogado
atuante nesse inquérito policial e, para além do direito ao silêncio, tenho a
prerrogativa legal de me recusar a depor.” Os investigadores do Deic perguntaram,
durante os depoimentos, quem paga os advogados, uma tentativa de identificar
quem estaria “por trás” dos protestos.
Integrantes
da OAB-SP não têm cooperado. O grupo Advogados Ativistas diz ter sido
intimidado por integrantes da Ordem no último protesto. Representantes da OAB
estariam nos distritos em busca de advogados empenhados na “cooptação da
clientela”, série de práticas ilegais para atrair clientes. “Era só uma
emboscada para intimidar,” diz Brenno Tardelli, do Advogados Ativistas.
Marcos da
Costa, presidente da OAB de São Paulo, nega que a atitude tenha sido autorizada
pela Ordem. “Recebemos reclamações e estamos apurando. A OAB, nas delegacias,
tenta fazer com que as prerrogativas da profissão sejam cumpridas.” Costa
também disse que uma comissão vai acompanhar os advogados nos próximos
protestos para evitar “que haja algum tipo de desrespeito à atividade
profissional.”
No Rio de
Janeiro, a mídia soma-se aos obstáculos para os advogados. Apesar de não ser
uma prática ilegal, o fato de Melo trabalhar no gabinete do deputado estadual
Marcelo Freixo, do PSOL, ganhou destaque nos veículos da Rede Globo na semana
após a morte do cinegrafista Santiago Andrade. A defesa de manifestantes feita
pelo DDH, entre os quais adeptos da tática black bloc, serviu de pretexto para
ameaças anônimas feitas por telefone. “É como se essa defesa significasse um
apoio a um eventual crime. Quando, na verdade, o delito ainda não está nem
firmado como uma verdade pela Justiça”, diz Melo. “Além disso, o próprio
Judiciário tem se manifestado e afirma que as prisões são arbitrárias. Não sou
eu, é o Poder Judiciário que chega a essa conclusão.”
Na
interpretação de Melo, há uma criminalização dos advogados em curso, parte de
uma estratégia deliberada para desmobilizar os protestos. “Há um empenho de se
romper qualquer vínculo de apoio, solidariedade e até de observação, de fazer
um isolamento dos manifestantes.”
por Piero
Locatelli
Fonte:http://www.cartacapital.com.br/revista/789/advogados-sem-defesa-8244.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário