“A indiferença política das pessoas
A democracia liberal multipartidária
“representa” uma visão muito precisa da vida social na qual a política se
organiza em partidos que competem por meio de eleições para exercer o controle
sobre o estado legislativo e o aparato executivo etc. Deve-se sempre estar
ciente de que essa “moldura transcendental” nunca é neutra – ela privilegia
certos valores e práticas.
Essa não neutralidade torna-se palpável
nos momentos de crise ou indiferença, quando experimentamos a incapacidade do
sistema democrático de captar o que as pessoas de fato querem ou pensam – essa
incapacidade foi demonstrada por fenômenos anômalos como as eleições britânicas
de 2005: apesar da crescente impopularidade de Tony Blair (ele era
constantemente eleito a pessoa mais impopular do Reino Unido), não houve meio
de esse descontentamento encontrar uma expressão política efetiva.
Havia algo de obviamente problemático
nesse caso – não que as pessoas “não soubessem o que queriam”, mas, antes, a
resignação cínica as impediu de agir de acordo com essa vontade, de modo que o
resultado foi o estranho desencontro entre o que as pessoas pensavam e como
elas agiram (votaram).
Já Platão, em sua crítica à democracia,
mostrava-se totalmente ciente desse segundo tipo de corrupção; e essa crítica
também é claramente discernível no favorecimento jacobino da Virtude: na
democracia no sentido de representação e negociação da pluralidade de
interesses privados, não há espaço para a Virtude. É por esse motivo que, na
revolução proletária, a democracia tem de ser substituída pela ditadura do
proletariado.”
(ŽIŽEK, Slavoj. Democracia
corrompida - O potencial autêntico da democracia vem perdendo terreno hoje para
a ascensão de um novo capitalismo autoritário. In. Dossiê CULT: A
democracia e seus impasses, julho, 2012. p. 54)
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