CIDH
apresenta caso sobre o Brasil à Corte IDH
Washington,
D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) apresentou à Corte
Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) o caso 11.566, Cosme Rosa
Genoveva, Evandro de Oliveira e outros (Favela Nova Brasília), a respeito do
Brasil.
O caso está
relacionado às execuções extrajudiciais de 26 pessoas – inclusive seis
meninos/meninas – por ocasião das operações policiais a que procedeu a Polícia
Civil do Rio de Janeiro, em 18 de outubro de 1994 e 8 de maio de 1995, na
Favela Nova Brasília. Essas mortes foram justificadas pelas autoridades
policiais com o levantamento de “autos de resistência à prisão”. Além disso, em
operação realizada em 18 de outubro de 1994, C.S.S. (15 anos de idade), L.R.J.
(19 anos de idade) e J.F.C (16 anos de idade) foram vítimas de tortura e atos
de violência sexual por parte de agentes policiais. A Comissão determinou que
esses fatos ocorreram num contexto e padrão de uso excessivo da força e
execuções extrajudiciais levadas a cabo pela polícia no Brasil, especialmente
no Rio de Janeiro. A Comissão concluiu ainda que o contexto em que ocorreram os
fatos do caso foi tolerado e, inclusive, patrocinado por instituições estatais.
A Comissão também estabeleceu que esse contexto inclui a falta de mecanismos de
prestação de contas e a situação de impunidade em que permanecem essas
violações. Com efeito, as investigações foram conduzidas com o objetivo de
estigmatizar e revitimizar as pessoas falecidas, uma vez que focalizaram sua
culpabilidade e não a verificação da legitimidade do uso da força. Tanto a
morte das 26 pessoas como os atos de tortura e violência sexual permanecem
impunes e, nesta data, as ações penais a respeito da maioria dos fatos do caso
– os atos de tortura e violência sexual na operação de 1994 e as mortes na
operação de 1995 – prescreveram no âmbito interno.
No Relatório
de Mérito, a Comissão recomendou ao Estado do Brasil que uma investigação
exaustiva, imparcial e efetiva das violações constatadas fosse conduzida por
autoridades judiciais independentes da polícia, com vistas a determinar a
verdade e punir os responsáveis, levando em conta o padrão de uso excesso da
força letal pela polícia e as possíveis omissões, atrasos, negligências e obstruções
na justiça provocadas por agentes do Estado, bem como garantir compensação
adequada e completa, eliminar imediatamente a prática de registrar
automaticamente as mortes cometidas pela polícia como “resistência à prisão” e
erradicar a impunidade da violência policial em geral, adaptando sua lei
interna, normas administrativas, procedimentos e planos operacionais. A CIDH
também recomendou a instituição de sistemas de controle e prestação de contas
internos e externos para tornar efetivo o dever de investigar, com uma
perspectiva de gênero e étnico-racial, todos os casos em que os agentes da
ordem utilizam a força letal ou a violência sexual, implementar planos de
modernização e profissionalização das forças policiais, regulamentar os
procedimentos policiais que envolvem o uso legítimo da força e treinar o
pessoal policial para o tratamento efetivo e eficiente das pessoas oriundas dos
setores mais vulneráveis da sociedade, inclusive crianças, mulheres e
residentes de favelas, buscando superar o estigma de que todos os pobres são
criminosos.
Em 19 de
maio de 2015, após múltiplas prorrogações concedidas e muitos esforços
envidados, a Comissão determinou que o Estado do Brasil não deu cumprimento às
recomendações constantes do Relatório de Mérito. Por conseguinte, a Comissão
Interamericana submeteu à Corte IDH as ações e omissões estatais que ocorreram
ou continuaram ocorrendo posteriormente a 10 de dezembro de 1998, data de
aceitação da competência da Corte IDH pelo Estado do Brasil. Isso inclui a
forma inadequada em que foram conduzidas as investigações, com o objetivo de
responsabilizar as vítimas falecidas, e não de cumprir a obrigação de verificar
a legitimidade do uso da força letal; o descumprimento dos deveres de devida
diligência e prazo razoável da investigação e punição da morte das 26 pessoas
no âmbito de ambas as operações policiais; bem como os atos de tortura e
violência sexual a que foram submetidas as três vítimas por ocasião da primeira
operação. Inclui ainda a omissão quanto à reabertura das investigações dos atos
de tortura e violência sexual a respeito dos quais incidiu a prescrição da ação
penal, apesar de se tratar de graves violações de direitos humanos.
Esse caso
oferece à Corte Interamericana a oportunidade de aprofundar sua jurisprudência em
relação à obrigação de investigar adequadamente mortes violentas decorrentes do
uso da força letal por parte de agentes estatais. Entre outros múltiplos
fatores de impunidade, a Corte poderá se pronunciar sobre o problema da
estigmatização das vítimas refletida nas investigações com o objetivo de
determinar a responsabilidade das pessoas falecidas em mãos de agentes estatais
por suposta “resistência à prisão” e não com a finalidade de determinar a
legitimidade do uso da força por parte dos agentes policiais. A Corte também
poderá se pronunciar sobre a aplicação da prescrição a fatos como os do
presente caso, levando em conta seu caráter de graves violações de direitos
humanos bem como o contexto em que ocorreram. A Corte poderá se pronunciar
ainda sobre o dever de investigar atos de tortura e violência sexual por
agentes policiais contra mulheres e, especialmente, meninas. Sobre esse último
ponto, a Corte também poderá se pronunciar sobre a aplicação da figura da
prescrição a atos de violência sexual qualificados como tortura.
A CIDH é um
órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo
mandado surge da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre os Direitos
Humanos. A Comissão Interamericana tem o mandato de promover a observância dos
direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA sobre o tema. A
CIDH está integrada por sete membros independentes, que são eleitos pela
Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sendo que eles não representam seus
países de origem ou residência.
No. 069/15
Fonte:
http://www.oas.org/pt/cidh/prensa/notas/2015/069.asp
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