Capítulo escrito por Clovis Renato Costa Farias na Obra “Carta
de Liberdades Sindicais”, publicada pelo Ministério Público do Trabalho em
2016, organizada pelo Prof. Dr. Gérson Marques. ISBN nº 978-85-67589-28-2
A negociação coletiva é
imprescindível à efetivação da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III,
Constituição) inserida nas relações de trabalho, em especial, para equilibrar a
divergência de interesses entre os gestores e os demais servidores públicos.
Divergência decorrente, em regra,
dos interesses da coletividade que necessita robustamente dos serviços
prestados pelo Poder Público e da recorrente má aplicação e, por vezes,
ausência de recursos financeiros suficientes para uma prestação eficiente.
A estrutura da República
Federativa do Brasil no Estado Democrático de Direito impõe o atendimento mais
amplo possível pelos órgãos da Administração Pública, estando a cargo dos
“poderes” a distribuição e aplicação de tais recursos.
A escassez de aportes financeiros
recai diretamente sobre os servidores públicos, os quais, não raro,
encontram-se assoberbados de atividades por falta de pessoal adequado para
atender à demanda e sobrevivendo de seus vencimentos, os quais são,
constantemente defasados pela inflação.
Emergem em tais relações, também,
as condutas contrárias à moralidade, as perseguições pessoais, o assédio moral
e sexual, decorrentes da relação de trabalho.
A hierarquia e a subordinação dão
margem a descompassos que tendem a tornar o ambiente de trabalho, por vezes,
nocivo à saúde mental e física dos servidores.
Em tal contexto, a ação
individual direta pelos servidores é algo ineficiente e passível de pessoalizar
e agravar conflitos. Torna-se essencial a participação das entidades representativas,
com as garantias dos líderes eleitos por seus pares, para a negociação coletiva
em defesa da manutenção e conquista de condições de trabalho mais dignas.
A realização de mesas de
negociação periódicas, com emprego da boa fé pelas partes, considerando
efetivamente as propostas apresentadas pelos trabalhadores, emerge como um
instrumento legítimo para a minoração dos conflitos internos e a melhoria da
prestação de serviços à comunidade.
A busca de soluções negociadas
coletivamente atende aos princípios de legalidade, da impessoalidade, da
moralidade, da publicidade e da eficiência. Para tanto, é garantido ao servidor
público civil o direito à livre associação sindical, bem como o direito de
greve (art. 37, Constituição).
Quanto à legalidade estrita e ao
ânimo do Estado em legitimar as mesas de negociação coletiva no Serviço
Público, além dos dispositivos constitucionais, o Decreto nº 7.944, de 6 de
março de 2013, promulgou a Convenção nº
151 da Organização Internacional do Trabalho, que dispõe sobre as Relações de
Trabalho na Administração Pública.
A liberdade sindical, o
reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva e o fortalecimento do
diálogo social estão inseridos entre os quatro objetivos estratégicos da OIT na
compreensão sobre Trabalho Decente.
Apesar do estímulo normativo
pátrio e internacional, a efetivação de tais medidas ainda está claudicante,
carecendo de compreensões mais realizadoras. Materialização que deve tomar como
base o caráter fundamental dos tratados internacionais sobre Direitos Humanos
(art. 5º, §§ 2º e 3º, Constituição), funcionando como equivalentes às normas
constitucionais os dispositivos da Convenção nº 151/OIT.
É o que tem ocorrido com decisões
recentes do Supremo Tribunal Federal que dispõem que o direito à negociação
coletiva é restrito aos trabalhadores da iniciativa privada, de modo que
entende violar a Constituição Federal norma que confere tal direito aos
servidores públicos (p. ex. MI 4398 AgR/DF, publ. 17-09-2015).
Tal entendimento robustece a
relevância do Verbete 05, ora comentado, de modo que tem sido possível
encontrar posições contraditórias no Estado rumo ao incentivo à negociação
coletiva.
Foi o caso da greve dos
servidores do Ministério da Cultura, em 2014, quando o Superior Tribunal de
Justiça impôs que a Administração Pública promovesse, em data delimitada pelo
Poder Judiciário, uma reunião com os dirigentes das entidades de classe
acionadas para o imediato restabelecimento do diálogo e o avanço das tratativas
com vistas ao fim do impasse.
Quanto a melhor aplicação dos
dispositivos da Convenção nº 151/OIT, no Brasil, art. 7º, “devem ser tomadas
medidas adequadas às condições nacionais para encorajar e promover o
desenvolvimento e utilização plenos de mecanismos que permitam a negociação das
condições de trabalho entre as autoridades públicas interessadas e as
organizações de trabalhadores da Administração Pública ou de qualquer outro
meio que permita aos representantes dos trabalhadores da Administração Pública
participarem na fixação das referidas condições”.
Ademais, conforme o art. 8º/Conv.
151 OIT, “a solução de conflitos surgidos em razão da fixação das condições de
trabalho será buscada de maneira adequada às condições nacionais, por meio da
negociação entre as partes interessadas ou por mecanismos que dêem garantias de
independência e imparcialidade, tais como a mediação, a conciliação ou a
arbitragem, instituídos de modo que inspirem confiança às partes interessadas.”
Outrossim, nos termos da
Recomendação nº 159/1978 da OIT sobre as relações de trabalho na administração
pública, em caso de negociação das condições de trabalho, os indivíduos ou
órgãos competentes para negociar em nome da autoridade pública, e os
procedimentos para pôr em prática as condições de trabalho estabelecidas, devem
ser previstos pela legislação nacional ou por outros meios apropriados.
A perspectiva da normatização de
tais relações ainda está distante de uma aplicação eficiente, em especial pela
não priorização de tais institutos e do caráter antidemocrático ainda arraigado
no Poder estatal.
Demarca-se, assim, a relevância
do consenso entre os diversos segmentos laborais que participaram da elaboração
do presente verbete, uma vez que há uma necessidade cada vez maior de
entendimento entre os atores nas relações de trabalho, minorando os efeitos
alienantes e a noção de mais valia, também, adequada a coisa pública e seus
obreiros.
Com a concretização dos termos do
Verbete 05 viabiliza-se a otimização do Estado Democrático de Direito, a
Dignidade da Pessoa Humana, os valores sociais do trabalho e a melhoria no serviço prestado aos interessados, humanizando,
conjuntamente, a prestação laboral.
(Clovis
Renato Costa Farias)
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