Publicado
23/03/2017 11h59, última modificação 23/03/2017 12h02
O
presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho alerta
para os riscos das subcontratações de mão-de-obra
Na
noite da quarta-feira 22, como prometido pelo presidente da Câmara, Rodrigo
Maia (DEM-RJ), a terceirização irrestrita do trabalho foi aprovada. O PL 4302,
de 1998, foi aprovado com 231 votos favoráveis, 188 contrários e oito
abstenções, e agora depende apenas da sanção de Michel Temer.
Germano
Siqueira, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do
Trabalho (Anamatra), acredita que os deputados aprovaram "o pior projeto
possível", e faz um alerta: ele "pode servir de instrumento para o
nepotismo e o clientelismo" no setor público.
CartaCapital:
Quais são as consequências práticas para os trabalhadores?
Germano
Siqueira: Serão milhões de trabalhadores a não receber o que lhes é devido. Os
salários serão mais baixos, com pouca proteção jurídica, aumenta a
possibilidade de restringir férias e 13º, e cresce a quantidade de acidentes de
trabalho. Além disso, há aspectos absolutamente graves na área pública.
Esse
projeto diminuirá muito a quantidade de concursos públicos. Agora, nada impede
que o prefeito, governador, ou mesmo no âmbito da União, destine suas
atividades a empresas prestadoras de serviço terceirizado, como na Caixa
Econômica, no Banco do Brasil, e na Petrobras. Isso por si só já é um absurdo,
mas há outro maior: pode servir de instrumento para o nepotismo e o
clientelismo.
O
governador, o prefeito, o deputado, o vereador, podem, quando há uma contratação
intermediária desse tipo, colocar como terceirizados afilhados políticos e
parentes.
Na área
privada, ele amplia na atividade-meio e fim de forma discriminatória, porque um
contratado direto da empresa, com salário de mil reais, estará ao lado de outro
com salário inferior.
A
questão sindical também preocupa. Não foi definido nada sobre quem é o
sindicato que vai reger aquela categoria. Eles aprovaram o pior projeto
possível.
CC: De
que forma as novas regras de terceirização beneficiam os empregadores?
GS: Com
economia na iniciativa privada. Se eu tenho uma folha de pagamento que me custa
um milhão, após terceirizar ela vai custar 30% menos. Isso é lucro para a
empresa, com transferência de renda do trabalho para o capital.
CC:
Pode haver prejuízos para as empresas em longo prazo?
GS:
Pode, porque ao contrário do que se fala, não há segurança jurídica. A
quantidade de processos na Justiça do Trabalho com base nessa lei vai aumentar
muito, porque há vários pontos de inconstitucionalidade.
Se os
empregadores pensassem um pouco mais, também não aceitariam essa lei, mas temos
uma maioria no governo que é arrogante e não dialoga.
CC: A
terceirização vai de fato acelerar a economia e gerar empregos, como prometido?
GS: No
máximo ela vai gerar subempregos, como aconteceu em outros países. E também vai
rebaixar o poder de compra do mercado consumidor, o que, por consequência,
reduz a arrecadação previdenciária e tributária.
Se o
mercado consumidor, que é formado pela classe média trabalhadora, não pelo
grande empresariado, tem suas condições de renda rebaixadas, esse amplo mercado
consumidor será igualmente rebaixado.
O
grande recolhimento tributário do país, dos estados e municípios, é com cada
compra que se faz.
CC: A
aprovação da terceirização facilita a aprovação de outras reformas propostas
por Temer, como a da Previdência?
GS: Não
sei se facilitará, porque o placar ontem foi apertado, mas talvez os
brasileiros comecem a entender qual é o projeto que está em curso. Tomara que
fiquem mais atentos, porque o projeto é de perdas de direitos.
CC: O
que a aprovação dessa reforma indica sobre os rumos que o Brasil está tomando?
GS: São
rumos de desmonte do Estado de bem-estar social, que é um projeto político, uma
carta-compromisso firmada na Constituição de 1988. Mas o que se pretende agora
é desfigurar completamente essa Carta com a reforma constitucional ou por
projetos de lei.
Fonte:
https://www.cartacapital.com.br/economia/a-terceirizacao-no-setor-publico-pode-virar-nepotismo-e-clientelismo
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