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sábado, 27 de julho de 2019

Em busca da sabedoria (Nilakantham Siri Ram)




Prefácio e esclarecimentos

"Há, também, uma importante contribuição para os estudantes do yoga, no artigo "As Três Sendas em Uma", ao enfatizar que é necessário existir, no aspirante à Sabedoria, uma harmonia entre o Janana-Yoga (sabedoria), o Karma-Yoga (ação) e .
o Bakti-Yoga (devoção). Não são três caminhos separados, mas aspectos que devem ser desenvolvidos simultaneamente, pois Yoga é equilíbrio, como nos diz o Bhagavad-Gitã." (5)
"Todas as coisas passam como um sonho. Mas mesmo a vida terrena pode ser um sonho de paz e beleza". (6)
"A paz é o estado feliz, natural do homem e de todos os filhos da Natureza''.
''Se nossas vidas estão estagnadas é porque não há fluir de interesse para os outros, não há comunhão com a vida ao
nosso redor, nossas relações com os outros são parciais e amplamente sem vida"." (192)

Capítulo I - Em busca da sabedoria

"No Diálogo que aborda a morte de Sócrates, Platão explica que o verdadeiro filósofo encontra a morte como a um amigo e não como a um inimigo, porque compreende a natureza da mudança que a morte causa. É uma mudança natural e feliz. A atitude de alguém em relação à morte depende de sua compreensão da vida, cuja real natureza é inseparável da verdade com relação à morte." (11)
"Sabedoria significava, antigamente, o verdadeiro pensar, não meramente com relação a determinados assuntos abstraídos da vida, porém com relação a tudo que pertence à vida da pessoa. A sabedoria foi considerada como algo mais
valioso que a pessoa pode possuir, constituindo verdadeira fonte de sua felicidade. A felicidade raramente combina com riquezas ou poder. Ocasionalmente podemos encontrar uma pessoa que está numa situação de autoridade ou que possui grande riqueza ou até mesmo governa um reino, e, ainda assim, é um filósofo, mas tal pessoa é uma raridade. Normalmente, muitas riquezas signiâcam muitos problemas; uma preocupação contínua que distrai a mente e o interesse da pessoa das coisas mais importantes a perceber, compreender ou perseguir." (12)
"Há um enunciado, em um dos Diálogos de Sócrates, que diz que a sabedoria é a única moeda verdadeira pela qual todas as coisas deveriam ser trocadas. Vale a pena trocar tudo que se possa ter até por um pouco de sabedoria apenas. E compreendia-se que a sabedoria não precisa ser totalmente divorciada do prazer ou da alegria - que foi o erro em que muitas pessoas incorreram, especialmente na Índia. Elas procuravam formas de
automortificação, a fim de alcançarem a verdade que se encontrava dentro delas próprias. Alegria moderada - usando a palavra em um sentido especial, no espírito certo e com a qualidade certa - tem o seu lugar na vida. Isso não significa que é preciso alegrar-se dentro de limites artificialmente estabelecidos pela
própria pessoa." (12)
"Contudo, o filósofo não procura o prazer; ele aceita o prazer suavemente quando se Ihe apresenta. Na vida há tanto o prazer como a dor. E é pouco realista e mesmo fútil abandona-los ou coloca-los à parte, mas a nossa atitude em relação a ambos pode mudar completamente, e este é o tipo de mudança que ocorre na pessoa que pode ser considerada como verdadeiro filósofo. A sabedoria é relacionada àquilo que é bom e não àquilo que é aprazível, e estes são de duas naturezas diferentes. Constantemente os confundimos. Muitos há que pensam que
aquilo que é aprazível é bom e se puderem ter o máximo de prazer, todo o tempo, então naturalmente para eles isto constituirá o bem supremo. Trata-se de uma grande falácia que precisa ser
compreendida." (13)
"É somente a sabedoria que, purificando assim a natureza da pessoa um pensamento que também encontramos no Bhagavad-Gita, onde dela se fala como o maior meio de purificação - possibilita à pessoa visualizar o "ser real'' como foi
chamado, isto é, a fonte da verdade.
Diz-se que o verdadeiro filósofo tem a sua mente fixa no "ser real''; isto é unicamente o que Ihe interessa." (14)
"Se você foge pela porta dos fundos, enfrentará o problema novamente em alguma outra roupagem, nesta vida ou numa outra vida; a tarefa é apenas adiada. Este foi todo o conceito subjacente ao dharma na Índia. Uma pessoa tem que cumprir o seu dharma, sejam quais forem as dificuldades da sua situação e sejam quais forem os desprazeres envolvidos. Pode-se ver a verdade desse ensinamento à luz das leis da natureza, quando as compreendemos verdadeiramente." (14-15)
"Existem centenas de maneiras de errar, porém apenas uma maneira de agir acertadamente. O homem sábio pode permanecer com o mundo, compreendendo a importância do trabalho que aqui pode realizar, mas ele não tem objetivos mundanos. Isso distingue o filósofo do ignorante, ignorante não dos fatos comuns da vida, mas das verdades essenciais. Aquele que objetiva alcançar a sabedoria, que poderia ser caracterizada como divina porque se originou do céu, não atribui muita importância à grandeza humana, o tipo de grandeza que geralmente é realçada pelas pessoas. O objetivo de ser grande surge do prazer de comparar-se com outros e achar-se de alguma foma superior ao seu nível. Deveríamos tentar libertar-nos da ideia de querermos ser grandes em comparação com outros, fazendo com que pareçam pequenos.
Existe sempre um aparente paradoxo na atitude daquele que procura trilhar o caminho espiritual. Ele não evita o prazer; ele não tem medo de desfrutar a brisa fresca quando ela sopra, mas ao mesmo tempo ele não anseia por prazer de qualquer espécie. Ele está preparado para morrer a qualquer momento, mas não deseja apressar o acontecimento. Embora a sua mente esteja fixada naquilo que poderia ser chamado o ser verdadeiro, a verdade última, ainda assim ele é um amante de todo o conhecimento. Este enunciado precisa, todavia, ser compreendido corretamente. Não significa que ele sofre de uma sede de mais e mais conhecimento sobre tudo e todas as coisas. Isso seria uma espécie de tortura, uma existência muito sofrida, como o é a sede por qualquer outra sensação. Significa que na relação da pessoa com o conhecimento existe uma qualidade de amor com determinado desapego. Quando acontece de encontramos algum tipo de conhecimento com relação a algo pequeno ou grande, o aceitamos de bom grado; há um sentimento de aceitação e interesse na direção desse conhecimento.
Em Platão, esta descrição de um filósofo é bastante interessante: ele é um espectador da totalidade do tempo e da existência. Em outras palavras, ele possui uma visão universal, interessa-se por tudo, sem, no entanto, envolver-se. Isso não significa que ele não se preocupa como os demais que são afetados, mas sim que não está envolvido a ponto dos fatos pode-
rem perturba-lo.
(15-16)
"Existe uma frase sânscrita, "Eu-Sabedoria", Jnãna-Átmã, que também é descrita como Eu-Testemunha. A menos
que haja um determinado grau de desapego, de modo que o Eu não se envolva com suas reações, não há possibilidade de se obter uma verdadeira visão das coisas, porque as reações
pessoais sempre obscurecem a visão e o julgamento da pessoa. Para compreender aquilo que se observa, sejam eventos que
se realizam no palco do mundo sobre os quais lemos todos os dias ou eventos na esfera da vida pessoal, e agir corretamente, a pessoa precisa ser capaz de olhar para essas coisas sem tomar
partido e sem qualquer elemento de uma forma de pensar com desejo. É preciso ter um espírito de busca imparcial e livre para
chegar à verdade com relação a qualquer coisa. Se determinado ponto de vista for expresso, ele não deverá ser imediatamente aceito ou rejeitado, mas primeiramente terá de ser considerado. É apenas ao restringir-se suficientemente e ao parar para considerar sem rejeição ou aceitação impacientes, que a pessoa
poderá conhecer a verdade subjacente. Inicialmente, deve ser: permitido atravessar o portal de nossas mentes e encontrar um lugar na antessala antes de que o julgamento possa ser emitido.
(16-17)
"Um ponto importante em relação a uma pessoa que busca a sabedoria é que ela terá de abster-se completamente de qual-
quer tipo de sofisma." (17)
"Existem pessoas que têm um discurso inteligente, habilidoso e persistente, visando afirmar o que dizem. O que realmente desejam defender não é a verdade, mas apenas uma verdade aparente, algo plausível. Isso é o que fazem tantos advogados. Eles sabem que há verdade no outro lado, mas querem firmar a sua própria argumentação e usam todo recurso intelectual, recorrem a todos os pontos técnicos possíveis, precedentes e assim por diante, a fim de poderem defender aquilo que desejam. Não acho que seria bom para qualquer pessoa
engajar-se neste tipo de arte." (17)
"Um homem que visa adquirir ou alcançar a sabedoria, deve preocupar-se apenas com a verdade e não estar interessado em enganar as pessoas ou confundi-las, mesclando os fatos e formando um caso. Todas essas formas de decepcionar a outros ou a si mesmo terão de ser completamente eliminadas da própria natureza antes que possam ser descritas
como verossímeis." (17)
"Aquele que procura ser um ocultista precisa ser verdadeiro em seu próprio pensamento, especialmente na maneira com que considera as pessoas, bem como em seu comportamento exterior. Nele deveria haver o amor pela verdade e por nada senão pela verdade." (17-18)
"...mas há unha propensão acentuada em todos nós de enganarmos a nós próprios e também de seguirmos o tipo de pessoa que mais nos agrada: assim, deveríamos culpar a nós próprios e não apenas aos outros." (18)
"Há também esta declaração análoga em que o filósofo convida o homem a viver de acordo com a natureza. Isto refere-se
àquela natureza fundamental, que é a natureza na sua pureza naquele seu aspecto em que se encontra o reflexo do pensamento divino." (18)
"Quando atingimos determinado estado de compreensão, se todo o ser estiver pleno de amor por uma outra pessoa ou pelas pessoas em geral, o amor na sua verdadeira natureza - encontraremos que
toda a música perde força em comparação com este estado." (18)
"Existe sempre o perigo, em qualquer espécie de regozijo, de ficarmos totalmente absorvidos, não nos conscientizando do que está nos acontecendo e de que tipo de resposta estamos criando em relação àquilo que nos regozija. O regozijo ou a alegria têm a tendência de tragar a mente, envolvendo-a em um turbilhão por eles criado. Todos sabem que ao vivenciarem uma sensação prazeirosa, desejando senti-la cada vez mais acentuadamente, nela tomam-se cada vez mais profundamente imersos. Se, no momento de regozijo, houver qualquer chamamento para o dever, por mais urgente que seja, a pessoa sentirá uma tendência a não atender ao chamado. Isso mostra que de alguma forma somos inibidos em nossa disposição de reagirmos. Existe esse tipo de perigo no prazer de toda a espécie. Não precisamos ter aversão ao prazer, mas deveríamos examinar-nos na medida em que nos entregamos ao prazer.
A sabedoria que reside na alma é a melhor e mais nobre música, porque nela há uma qualidade de harmonia presente apenas no melhor tipo de música. Ela tem também o poder de produzir harmonia em todas a nossas expressões e ações." (21)
"Portanto, se realmente compreendermos, teremos de agir de acordo." (21)
"Evidentemente, "à luz do Eu Superior" significa objetivamente com serenidade,
sem qualquer tipo de condenação ou justificação próprias, uma tentativa desapaixonada e objetiva de ver as coisas como são.
Todos nós que somos teósofos deveríamos estar constantemente examinando nossas próprias atitudes, motivos, a maneira como falamos e agimos e todo o tipo de reações internas que se processam até mesmo sem nosso conhecimento. É apenas desta maneira que podemos atingir a verdade ou obter
aquela transformação que é denominada a senda. Trilhar a senda significa produzir uma mudança total, e isso pode ser realizado apenas através da própria inteligência livre, do ser objetivo com relação a si mesmo, e de nenhuma outra maneira. Para ser objetivo, toma-se necessário estar consciente de tudo que se realiza interiormente." (22)
"A verdadeira forma de ocultismo não é algo exótico, revestido de fantasias, como muitas pessoas imaginam que seja. Desde os tempos mais remotos tem sido uma ciência que se ocupa com os fatos ou com a verdade. A imaginação é uma coisa, e os fatos são algo diferente. Mas esta ciência específica também se ocupa com a vida e a consciência, e é somente quando a vida da pessoa está baseada na verdade que ela adquire o aspecto de sabedoria. A sabedoria não pode ser separada da vida; quando ela encontra o seu caminho na vida, esta começa a mostrar uma nova qualidade, um novo brilho e beleza diferentes daquilo que comumente se obtém.
A verdade não admite compromissos, embora o comportamento de uma pessoa possa fazê-lo. Convenções e oportunidades também variam de acordo com as circunstâncias. Poderemos estar unidos dentro de um espaço limitado." (23)
"É fácil sucumbir aos grilhões de qualquer ilusão prazeirosa, imaginando-a verdadeira.
O que fundamentalmente causa a ilusão é a busca daquilo que proporciona prazer, daquilo que gratifica em qualquer nível que seja. Gostamos de aceitar algo mental ou fisicamente por proporcionar prazer, por ser conveniente fazê-lo ou por ser um
pensamento confortante; é adequado a nossa foma habitual de pensar por assim dizer. Compreender a verdade não é a mesma coisa que assenhorar-se de uma ideia, e ater-se a ela com fervor. A mente é facilmente subomada pelo prazer. Com frequência damos prazer a alguma pessoa, a fim de conseguir que ela faça o que queremos que faça. Esta é uma prática que evidencia resultados em toda parte. A mente concordará voluntariamente com o doador do prazer. Portanto, é necessário sermos rigorosos conosco no que tange ao vivenciar a verdade - e esta é uma base necessária para o ocultismo." (24-25)
"Viver uma vida de verdade não consiste meramente em falar a verdade. Pretender ser aquilo que não somos é tão corruptivo quanto a inverdade no discurso. Em nosso coração precisa reinar o amor genuíno pela verdade. Somente podemos ser integralmente verdadeiros se valorizarmos a verdade e atribuirmos importância a ela em nossa vida e pensamento, ou então precisamos estar tão plenos de amor que não podemos nutrir o menor desejo de enganar. Quando vivemos uma vida de verdade, começamos a amar o próprio sentimento de sermos verdadeiros, e toda a nossa natureza assume uma forma que
se harmoniza com a verdadeira natureza das coisas. O mero conhecimento não criará esta harmonia. O amor pelo conhecimento não é o mesmo que o amor pela verdade, sem a qual não há possibilidade de sabedoria." (28)
"Qualquer glorificação, que não se origine de um sentimento real pela pessoa e apreço pelas suas qualidades, é apenas um truque de feitiçaria e produz hipnotismo de massa, como foi o caso na Rússia, na Alemanha e outros lugares. A bolha, por mais colorida que ela possa augurar-se em detemtinada ocasião, eventualmente terá que romper-se e depois haverá desilusão e uma forte reação àquilo que se realizou anteriormente." (28)
"O que conta é o sentimento ou o espírito de amor dentro da pessoa e isso é o que ajuda os demais. Eu não sei a extensão
do bem de "fingir uma virtude, se você não a tem''. Podemos satisfazer-nos facilmente com o fingimento e não atentar para a realidade. Se o substituto opera bem, por que preocupar-nos em encontrar a peça genuína? A palavra "Deus" é um substituto comum para o Deus Real ou Realidade Última." (29)
"A partir de um ponto de vista, um símbolo é uma sombra, e a luz está por trás do homem que está olhando." (29)
"Pensar em algo considerando-o ser espiritual é uma coisa, e realmente ser espiritual sem nisso pensar de modo algum, e algo inteiramente diferente. Um homem, que é conscientemente espiritual, não pode ser espiritual na realidade." (31)
"Mas um homem que verdadeiramente renunciou a determinadas coisas não terá
prazer em chamar qualquer atenção àquele fato." (31)
"Para nos aproximarmos ainda mais do ceme da questão: quando usamos a palavra ''amor'' em relação a outro, será que realmente amamos, ou apenas achamos que amamos aquele outro?
Existe uma grande distinção entre pensar que amamos e amar de fato. Meramente ensaiar a ideia do amor e usufruir o prazer que causa, não traz o amor, é apenas um exercício. Mas somos tão capazes de nos iludirmos, pensando que amamos toda a humanidade, até mesmo quando não amamos os indivíduos que a compõem. Precisamos traçar uma distinção clara entre aquilo que é real ou verdadeiro e aquilo que é apenas focado pela mente." (31)
"O espírito necessário nunca pode ser ostentado, exibido permanentemente ou divulgado de nenhuma maneira. Ninguém pode dele obter dinheiro. Tais distinções podem abranger todos os campos da vida, todas as nossas atividades e pensamentos. Será apenas quando a mente estiver suficientemente alerta para perceber essas distinções, para separar a luz da escuridão, que ela poderá chegar na verdade das coisas.
Constitui a grande assertiva dos instrutores espirituais que podemos conhecer a verdade absoluta e não apenas argumentar a seu respeito, chegar a ela através do raciocínio, ponderar sobre ela ou postula-la. Podemos connhecê-la, assim como conhecemos a nós próprios." (32)
"Precisamos ser muito cuidadosos em cada etapa para ver que estamos prosseguindo no caminho da verdade, que é também o caminho do verdadeiro amor, não nos satisfazendo com ilusões com relação a nós próprios ou com a natureza das coisas porque elas são confortante ou agradáveis." (33)

Capítulo 3 - Liberdade de opostos

"A expressão "Caminho do Meio", usada nos ensinamentos budistas, foi interpretada como um caminho da vida que evita os excessos do ascetismo e da automortificação de um lado, e a indulgência na busca de prazeres na luxúria, de outro. Possivelmente Buda referiu-se às condições que havia na Índia no Seu tempo e usou a expressão principalmente com referência a elas. Mas ela é susceptível de um significado muito
mais amplo. Os extremos mencionados representam um par de opostos. O Gitã menciona outros e fala no transcender de todos os pares de opostos. Cada oposto em qualquer par realmente produz o outro. Este fato é destacado por Platão em um dos Diálogos. Uma pessoa que irá a um extremo, após algum tempo, tenderá a deslocar-se ao extremo oposto. A partir de uma ação violenta, que com certeza experimentar-se-á, surgirá uma repercussão que levará na direção oposta. Com efeito, cada oposto sutilmente oculta a natureza do outro." (34)
"Na história, todas as revoltas justificam-se apenas pelo seu êxito. Se você falhar, você é o traidor; se você tiver êxito, você é o pioneiro, o pai da nação, o libertador, o grande herói. Estes títulos são outorgados aos homens que se revoltam com êxito e não àqueles que defendem uma causa até mesmo quando todas as probabilidades forem contrárias e sem qualquer perspectiva de sucesso.com frequência as forças revoltosas, ao terem êxito, estabelecem uma tirania própria com relação ao povo em geral, verifica-se nada além de uma troca de senhores, talvez com um sistema diferente, mas com a mesma ditadura que antes reinava.
O fato é que toda a natureza é governada pela lei de ação e reação, e todas a leis com as quais estamos familiarizados são mecânicas. A natureza, movida por este jogo mecânico, está sujeita a forças alternantes e contrárias; e assim também é a natureza humana. Cada partícula elementar que foi descoberta tem sua contraparte ou oposto. As forças que constituem estas partículas parecem estar sujeitas às mesmas leis mecânicas.
Mas, profundamente no homem, há uma natureza que não sofre do jogo de opostos - esta é uma distinção fundamental entre aquela natureza que pode ser chamada espiritual e a natureza nele atualmente tão evidente que se modela no jogo de forças no campo da matéria. A natureza humana que reflete a mente do homem, como a vemos, pode ser governada pelas leis
da matéria, da ação, que é de fato reação, ou ela pode refletir a natureza do Espírito. Essas são as duas possibilidades. Uma
delas vivenciamos na nossa ignorância, mas há também a outra possibilidade que torna a vida totalmente diferente para aquele que a compreende.
Os opostos na natureza têm o seu lugar, mas existem também opostos aparentes que são na verdade complementares, como masculino e feminino, forças positivas e negativas, emoção e intelecto, terra e céu. Espírito e matéria constituem um par deste tipo. São opostos enquanto a verdadeira relação entre eles não for percebida, e as forças que representam não estiverem harmonizadas naquela natureza do homem que tem algo de
ambos. Quando aquela natureza toma-se harmonizada, ela age com um equilíbrio que é uma mescla de opostos aparentes." (35-36)
"A natureza em que se mesclam perfeitamente é a natureza espiritual." (36)
"Para obter a verdadeira compreensão de algo, será necessário olhar para os fatos envolvidos, evitando ideias que são meras projeções a partir de uma base de ignorância." (37)
"A verdade no interior da pessoa significa que há sempre ação livre, não forçada, oriunda da própria inteligência e da vontade livre, isto é, sem jamais envolver-se ou estar sujeita a forças que obrigam ou determinam as ações da pessoa." (37)
"A natureza do Espírito ou a natureza espiritual permanece sempre livre." (37)
"Krishnaji fala de uma natureza da mente e do coração que é vulnerável, à qual se refere como sendo sensível ao toque
mais leve, não opondo qualquer resistência. Ela é sintonizada de uma forma tão bela que responde a cada vibração e de nada impede a entrada. Poderíamos pensar que, neste caso, em breve, desgastar-se-á ou se confundira com impulsos contrários. Mas como não há resistência, toda onda que surge a atravessa e nunca é detida. A eletricidade, até mesmo nas voltagens mais elevadas, não afeta o seu meio condutor se não houver qualquer resistência. Se alguém for ferido ou ofendido por alguma coisa que aconteça ou por alguma observação que Ihe seja feita, ou a seu respeito, é porque existe nele um eu que resiste e ressente-se. Mas é possível chegar a uma condição
interna em que a pessoa não é ferida de modo algum. Ela então será tanto vulnerável como invulnerável, por mais paradoxal que isso possa parecer. Aquilo que imaginamos ser o eu, o eu próprio, é um sentimento sombrio e difuso, difícil de localizar, que surge de uma condição de estar encerrado, de encontra-se em um invólucro, no qual todas as reações estão confinadas e que, portanto, permanecem existindo, na maior parte, de forma subconsciente, submetendo-se a permutações e combinações. O fato de que isso ocorre pode ser compreendido por qualquer um de nós, desde que se observe a si mesmo cuidadosamente.
Este eu é uma entidade ilusória, que guarda muitas forças de naturezas variadas e contrárias e dá origem ao jogo de opostos. Ela divide uma natureza, que do contrário seria homogênea, em seções que variam reciprocamente. O Gita descreve uma estrutura da mente, um estado de espírito, que não é assim dividido e que é "igual em relação a amigo e inimigo'', "o mesmo na honra ou na desonra", "entre o êxito ou o fracasso". Comumente, quando encontramos o êxito,
prosseguimos alegremente e ficamos exultantes e felizes, mas, quando encontramos problemas e derrotas, ficamos acabrunhados e deprimidos. No entanto, pode-se estar num estado de
equilíbrio, que se origina da pura simplicidade de aceitar o que quer que seja e em fazer o que vale a pena ser feito em qualquer circunstância. É um estado da mente e do coração de extraordinária beleza o que encara as coisas dessa maneira." (38-39)
"Esta equanimidade ou igualdade de espírito é descrita pelo Gitã como "Yoga" -- na verdadeira acepção da palavra um estado unificado. E é este estado unificado que é o estado verdadeiramente natural em que a unidade do Espírito obtém e manifesta suas potencialidades e hamonia." (39)
"O Gitã fala da liberdade dessas reações que são prazeres e desprazeres, paixões, avidez, ódio e inveja. Quando as rea-
ções cessam de existir, há um espírito de igualdade no coração das pessoas, boa vontade comum, preocupação e consideração em relação a todos, o elevado e o usual, o simples e o erudito e
assim por diante. A natureza em que se manifesta esta mesma atitude é a natureza verdadeiramente espiritual.
O homem espiritual pode possuir o conhecimento tanto da ciência como do ocultismo (este último também é" uma ciência), mas ele carregara este conhecimento suavemente como
se existisse e ao mesmo tempo não existisse." (40)
"O conhecimento do mundo com todos os elementos desagradáveis nos homens,
a impolidez, a corrupção, as tentações oferecidas e aceitar e acima de tudo a brutalidade, poderiam parecer incompatíveis com o amor que se associaria a um coração puro e inocente.
Contudo, pode haver tal amor juntamente com o conhecimento, e é a natureza na qual ele reina supremo que é a natureza
espiritual. É uma natureza que responde à verdade em tudo, ou, para usar outra palavra, que neste contexto é sinônimo de
verdade, à beleza nelas inerente. A resposta mais natural àquilo que é belo, não apenas à beleza exterior de uma pessoa, mas também à beleza interior, à luz nela oculta, é o amor. Quando se
reage ao vulgar, como muitas pessoas parecem fazer atualmente, quando a resposta está com os impulsos físicos de luxúria, também acentuados na atualidade, essa é a resposta do eu. A resposta pura é de uma natureza diferente, que é uma natureza de autonegação.
Em um estado de negação absoluta na própria pessoa, que é a negação do eu, a ação que se instala surge livremente, a partir da verdade que então se manifesta em lugar do eu. A sua ação é como aquela do artista perfeito que conhece instintivamente por onde traçar as linhas. Da mesma maneira sabe-se então aquilo que está certo e aquilo que não está; a pessoa expressará em seu trabalho uma disciplina natural inata que consiste em evitar aquilo que é grosseiro ou prejudicial, aquilo que é desproporcional ou não belo. A partir do estado de negação surge uma energia positiva que possui grande inteligência ou sentido inato. É a energia do "Eu Uno" do pensamento filosófico indiano. Aquele Eu Uno está só porque não tem outro a acompanha-lo. Estando só, está sempre puro e não afetado por qualquer coisa que possa surgir e com ele estabelecer contato. Na natureza daquele Eu ou a natureza do estado negativo, não há divisão, nenhum conflito. Por não ser afetado, está para sempre isento das contrariedades e desequilíbrios dos opostos." (40-41)
"Pode parecer paradoxal que um estado de liberdade possa conter dentro de si o segredo da correção absoluta, bem como a perfieição. Isso ocorre assim porque compreendemos a liberdade em um sentido que não é liberdade real, uma condição que não está sujeita à atração ou a repulsão. Nesta condição, a ação
está de acordo com uma lei inata que em um indivíduo é a lei do seu ser. É uma lei que, entre os componentes daquele ser,
sempre mantém um estado de harmonia. O nosso conceito de perfieição também incorpora, de forma consciente ou inconsciente, essa harmonia que é a manifestação de uma unidade na
diversidade." (41-42)

Capítulo 4 - A beleza da virtude
"Na escola de pensamento Mahãyãna do Budismo setentrional, o caminho da virtude era identificado com a verdadeira sabedoria, bem como com a ação de autossacrifício; foi concebido como sendo marcado por sete portais, cada um dos quais exigia determinado tipo de desenvolvimento, representando um aspecto da perfeição humana e tendo suas
raízes em uma natureza incorrupta e incorruptível presente no âmago de cada ser humano. A chave para o primeiro por-
tal, conforme é explicado na obra A Voz do Silêncio, de H. P. Blavatsky, é Dãna, uma palavra sânscrita, traduzida por ela como "caridade e amor imortal". Literalmente a palavra significa doação, mas é uma doação sem reservas, com o coração e também com as mãos. A menos que a viagem seja realizada a partir de uma motivação pura de altruísmo, do desejo
de devotar-se à felicidade e à iluminação de cada ser humano e ao bem de cada criatura viva, não poderá ser empreendida
de forma alguma. O coração e a mente da pessoa precisam primeiramente sintonizar-se com o coração e a mente de todos os seres vivos." (44-45)
"... como a expressão espontânea e livre de uma natureza ou ser básico puro que se encontra em cada homem, uma natureza que é incorrupta e, de fato, incomiptível. Quando aquela natureza passa a agir, a forma pela qual age é em si mesma o caminho da virtude." (46)
"Quando a virtude for assim compreendida, como uma expressão totalmente livre e espontânea de uma natureza existente em todos nós, ao menos potencialmente não haverá vontade envolvida. A vontade somente surge quando a ação da pessoa,
precisar estar direcionada de acordo com determinado conceito ou imagem; e esta vontade surge do próprio condicionamento e inclinações. Não se trata de vontade livre no real sentido. Podem tornar-se em formas de autoasserção e teimosia egoístas. Com frequência trata-se apenas de insistência e obstinação cegas. Não é a vontade inata nos movimentos livres da vida. A energia que surge de qualquer forma de condicionamento é mecânica
em sua ação e uma resultante de forças induzidas. Não é a energia da natureza espiritual, sempre original e incondicionada, agindo de forma total e não parcial, livre ou espontaneamente,
e também inteligentemente, porque não atua de acordo com um padrão mecânico.
A virtude em ação - sem ação não há virtude -- não erra nem por excesso ou defeito. É por isso que se tem falado de
sua senda como o justo meio-termo. A natureza que é incorrupta sabe por instinto aquilo que é certo em ação e pensamento, e age de acordo, como um mestre em artes sabe como formar uma curva de beleza e o faz com um instinto certeiro.
Ele sabe exatamente onde a linha deve ser colocada, quais os pontos que ela terá de atravessar. Na natureza pura incondicionada existe tal instinto, que se revela na maneira de sua ação, bem como na natureza dos resultados atingidos. A maneira é tão importante, e pode ser até mais importante do que o resultado concreto perceptível. Porque a maneira como a pessoa age transmite a maneira como sente; ela irradia uma
determinada qualidade, como o tom e a inflexão da voz ao produzir uma música em compasso que deve permanecer sem
falhas até o fim.
A energia da natureza incondicionada age livremente, e ao fazê-lo, cria um padrão ou forma que é sempre uma forma de harmonia, e podem existir inúmeras formas assim. Não age de acordo com algum padrão impositivo - não haverá liberdade em tal ação - mas a sua livre ação assume a forma que expressa a qualidade de harmonia inata naquela natureza que sempre age como um todo, jamais perdendo sua unidade." (47-48)
"...base de sensibilidade e vida, e vida significa mudança a cada momento." (49)
"Toda beleza que vemos ao nosso redor, nas coisas externas a nós, nada mais é do que reflexos imperfeitos da beleza que reside no interior." (51)
"Mas quando tudo o que se conota pela palavra "eu" -- ambição, exaltação, luxúria, engano e assim por diante - desaparece, então, como um ceu límpido, a natureza da alma aflora com as suas belas qualidades. Mesmo se apenas uma dessas qualidades for realizada com perfeição, tadas as demais a acompanharão, pois todas surgem do mesmo estado de ser sempre indivisível, e cada uma envolve as demais. É possível dizer que a humildade é a mãe de todas as virtudes ou que o amor, em seu sentido mais belo, constitui a virtude fundamental, ou que deve existir uma qualidade de inocência ou pureza na pessoa, como uma base primária. Mas
não é necessário cultiva-las uma após a outra. Na realidade, elas não podem ser cultivadas no sentido de serem copiadas de um modelo. Pode-se compreender aquele estado de ser em que todas essas e outras virtudes estão presentes.
(51-52)
"A virtude não é como o conhecimento comum, que pode ser transmitido através de palavras. Encontra-se na mesma categoria que o gosto, um sentimento para com o belo, além de outros dons inatos
que não podem ser ensinados. Eles precisam ser aprendidos por outros meios. Quando houver amor no sentido real, criando um acordo solidário ou um estado de comunhão entre duas pessoas, digamos, entre uma mãe e o seu filho, aquilo que está no coração da mãe pode então ser transmitido para a criança." (52)
"Toda a ação da natureza espiritual tem o encanto e o frescor da espontaneidade. A virtude tem esse encanto. É como uma flor sempre nova. A ação da natureza espiritual não é apenas integralmente voluntária; ela é também irrestrita. Ela se doa completamente. A beleza da virtude está em tal doação. Existe uma natureza muito profunda dentro de nós que se exterioriza apenas quando o terreno estiver desimpedido para ela. Aquela natureza permanece a mesma, e é atemporal em sua qualidade, mas é capaz de uma variedade de ação infinita. Todo modo e forma de sua ação constituem uma forma
de beleza; quando se expressam na conduta da pessoa, também constituem uma forma de virtude." (53)

Capítulo 5 - Psique e intelecto

"Somente quando aquilo que é chamado de verdade, ou seja, a nossa apreensão desta verdade, deixa de satisfazer, que
há o início de uma busca mais além. Naturalmente também podemos permanecer com uma ideia ou crença falsas por um tempo muito longo, porém não para sempre. A desilusão inevitavelmente virá. Aquela condição ou natureza de uma pessoa que a predispõe para aquela ideia, como uma maneira de racionalizar ou satisfazer algum impulso pessoal oculto, inevitávelmente pedirá cada vez mais indulgência ou procurará outras coisas que prometem satisfação, porque um anseio profundo, pela sua própria natureza, é atendido apenas temporariamente, porém nunca é satisfeito, em caráter final, por aquilo que busca." (55)
"A mente, assim como o pensamento e o instinto ou a intuição, não combinam.
Foi dito que a mente é ''a assassina do real" porque tem uma tendência, enquanto ainda se encontra sob a influência de forças que não controla ou compreende, de ficar pensando que está atendendo às suas inclinações, obliterando as próprias
percepções. Suprime o real e projeta ideias que ocupam lugar do real. Reage de acordo com o seu condicionamento." (55)
"É através dessas construções, das tortuosidades específicas que se desenvolvem, que ela suprime o real e perde a capacidade de distingui-lo.
Podemos considerar a mente, que é essencialmente um instrumento do pensamento, como autossuficiente para a descoberta da verdade. Porém, sem o auxílio da faculdade que percebe, ela pouco pode fazer. Ela tem conseguido fazer certas descobertas notáveis no campo da ciência na base das percepções através dos sentidos, auxiliados por instrumentos, mas quando se trata de emoções humanas, finalidades ou relacionamentos, a mente, longe de descobrir a verdade, quer descobrir
ou confirmar apenas aqueles fatos que atenderão às suas predileções. A verdade, nos seus aspectos mais sutis e profundos,
onde assume um significado dificilmente imaginado por nós, não é alcançada através do pensamento, mas se revela para a faculdade ou faculdades que melhor percebem ou apenas per-
cebem quando a mente está tranquila Infelizmente." (56)
"A mente funciona na base da memória, mas até mesmo para depreender itens importantes dela, é preciso que esteja relativamente quieta." (56)
"A mente humana está quase que totalmente imersa, na atualidade, em coisas materiais, com todas as obstruções e pressões que elas criam." (57)
"Nem a apreciação da verdade nem a intensa felicidade que preenche o ser, quando se encontra num estado de amor,
podem ser prejudiciais à liberdade. O que surge no caminho da liberdade é apego, é sempre o apego a uma sensação, em
qualquer nível que seja, que se considere como prazer a ser procurado ou mantido." (58)
"A natureza do homem tem sido dividida em intelectual, espiritual e material, mas também podemos divida-la em espiritual, psíquica e física, considerando o intelecto como operando em formas diferentes em todos esses níveis." (59)
"É na relação com o mundo físico, inflexível, que se obtém o treinamento necessário em objetividade, ou seja, em ver as coisas como elas são. Podemos ter uma inclinação para sonhar, porém somos sempre despertos dos nossos sonhos, sejam diurnos ou noturnos, pelos fatos duros da vida." (59)
"A vida é realmente rica quando se está aberto às influências da natureza, respondendo à natureza e à beleza de todas as coisas com que se depara, inclusive os sentimentos humanos.
Mas pode-se estar aberto e mesmo assim não ser superado pelas influências a que estamos expostos, abertos sem prejudicar
a própria liberdade ou integridade. Se tudo o que acontece A uma pessoa, tudo que a impressiona, deixa uma marca permanente então toda a natureza da pessoa será de tal modo modificada e coberta que praticamente nada pemtanece de sua condição original. Se aquela condição puder ser comparada com um fluido transparente em descanso, aquilo que for impresso ou absorvido Ihe dará uma coloração ou deixará um depósito no fundo que o toma endurecido, opaco e escuro e não mais aberto à luz. A natureza psíquica, que age no seu automatismo como se fosse uma entidade por si mesma, pode transformar-se em uma
figura sinistra, carregada de todas as influências que acumulou como uma pedra em movimento que reuniu muito do limo em degeneração.
A mente que ficou mesclada com as inflluências que são ativas na natureza psíquica, precisa sair dessa condição, o casulo ou teia na qual ficou aprisionado, e poderá fazer isso na medida em que ganha detemlinado grau de objetividade em rela-
ção à sua própria condição. É apenas quando a mente se liberta das sensações e emoções nas quais fica presa em um estado de não percepção, que ela reconquista o caráter de Manas, puro e
simples. Somente então ela é verdadeiramente ela mesma e não
algo diferente em que se tenha tornado. A pessoa que atingiu esta liberdade nela própria não deixa de ser humana, incapaz
de emoções ou sentimentos. A natureza psíquica não é eliminada, porém transformada, de maneira que ela começa a vibrar com uma liberdade que não havia experimentado previamente, manifestando uma qualidade tão diferente de sua condição anterior quanto um céu límpido o é de um céu coberto de nuvens. Enquanto a mente se encontrar sob a oscilação de esperanças, desejos e sonhos, centralizados nela mesma, a sua atividade é como o movimento de um sonâmbulo." (61)
"Não podemos evitar ter sentimentos, tampouco as ideias com eles relacionadas. O homem é constituído de tal maneira que seria um ser truncado e sem vida senão as tivesse. O que
está errado em sua vida é a fonte da qual elas surgem, a base das ilusões. Reside nele a capacidade de vivenciar os sentimentos mais belos, os desejos mais puros, intuições da verdade, todos surgindo daquela mesma base que denominamos natureza psíquica, porém em seu estado incorrupto, um estado em
que se toma espiritual. A mente que foi anteriomaente ativa em conjunção com ela, produzindo ilusões, transforma-se em uma inteligência pura e com ela se mescla em cada ponto, como a luz pode misturar-se com as cores. A consciência espiritual que então a permeia, ou encontra-se em um estado de comunhão, tem a qualidade em que há uma mescla de verdade ou realidade e beleza. A mente vê verdadeiramente mas também poetica-
mente, porque vê a verdade que está na alma elas coisas, uma verdade que está bem além do alcance da mente limitada,
orgulhosa que não tem as visões que outros dizem ter, e que sofre, como pode pensar, das ilusões de que eles sofrem.
A natureza psíquica pode também refletir aquela verdade no seu próprio nível e nas suas próprias cores, mas apenas o faz
quando passou pela transformação e purificação necessárias, quando deixou de projetar a partir de seu condicionamento particular. A música ilustra de uma maneira notável os diferentes
aspectos, bem como os modos de sua ação." (62-63)
"A virada no sentido da espiritualidade que deveria suceder à passagem pelo ponto mais baixo, dificilmente é visível, exceto em pequenos sinais aqui e acolá que são como ínfimos feixes de luz em um céu normalmente cinzento ou escuro, e que anunciam um novo dia.
Deve haver alguns que são os arautos de uma nova era que testemunharão uma nova cultura, diferente da atual. Foi com esta esperança que o movimento teosófico veio à existência. (...) Todo o objetivo da Sociedade é de realizar uma mudança fundamental na vida e na visão do homem. A natureza desta mudança precisa ser compreendida por nós e transmitida para o mundo como um todo. Todos os objetivos da Sociedade, e o
seu nome especificamente, apontam na direção desta mudança." (64-65)
"Em todos nós precisa haver a aurora de um novo sentido, uma nova percepção, sem a qual não é possível transformar a Fraternidade em uma realidade ou encontrar a senda que conduz ao objetivo mais almejável para todos nós, seja sob
o nome de paz, felicidade, verdade ou qualquer outro." (65)

Capítulo 6 - A natureza extraordinária da vida

"Na obra Mahatma Letters diz-se de forma muito desnuda que o Espírito é a vifa indivisa. Se assim for, então aquilo que é chamado Espírito não é uma abstração, porém uma realidade, cuja natureza pode ser vivenciada dentro da própria pessoa. A
relação entre Matéria e Espírito, que é expressa naquela mesma obra como sendo apenas dois lados da mesma coisa, ou seja, o Elemento ou Substância una da qual tudo o mais no universo é derivado, é uma relação de vida e contém em si mesma todas as qualidades que a vida pode exibir. A vida é uma energia que se polariza em Espírito e Matéria. A matéria nós percebemos, mas a natureza do espírito é compreendida e vivenciada apenas em nossa consciência." (66-67)
"Em cada forma viva, em cada organismo individual, existe uma unidade e existe uma diversidade." (67)
"A Matéria, que é capaz de divisão, diferenciação e combinações, evidentemente fornece a forma, enquanto que o Espírito, que é a vida indivisa, possui qualidades que confere à energia atuante através da forma e que, por sua vez, expressa, em cada caso, aquele aspecto de sua natureza que pode transparecer através da forma. Podemos assim ver que vastas perspectivas de possibilidades abrem-se a partir desta visão." (68)
"Quando a vida, no seu aspecto de consciência, revela-se em um ser humano, o amor aparece e se manifesta, e da mesma maneira que a vida tem um aspecto que é comum e outro que é incomum, o amor também tem dois aspectos similares. O amor comum é do tipo que mais encontramos no mundo, e é em grande parte uma questão de gosto, alegria e posse. Mas há também amor que é extraordinário. A diferença realmente está entre qualidades que são baseadas na matéria e aquelas que são puramente espirituais.
Aquele princípio no homem que é chamado de Manas, grosseiramente traduzido por mente, pode ser baseado tanto na matéria quanto no espírito." (71)
"É possível viver em condições de matéria, como todos nós fazemos, sem nos tomamos sujeitos a suas pressões e influências insidiosas, sem nos submetermos a um processo de materialização ou degradação em nós mesmos. Por isso não precisamos concluir que a matéria é necessariamente má ou grosseira em qualquer sentido depreciativo." (73)
"A natureza de Manas, que é um aspecto da consciência ou um modo de sua ação, consiste em ver o pormenor, a parte. Ela observa as diferenças entre uma coisa e outra nas suas propriedades, movimentos, ação, relações e assim por diante. O cientista realiza isso de maneira notável. Mas quando ele deseja compreender a natureza de algo que é um todo, ele o julga a partir do que conhece das partes." (73)
"De acordo com o ensinamento oculto, em cada ponto no espaço há matéria e em cada ponto há também Espírito. Uma partícula de poeira é matéria, mas ali também há Espírito. Eles coexistem, ambos são eternos, unos e autoexistentes, mas em cada ponto o significado, a beleza, a maravilha que é manifestada pertence ao Espírito. É o Logos, na antiga acepção grega, presente em cada ponto no fluxo da vida, que dá a direção naquele ponto para o processo evolutivo subsequente. A matéria existe como meio de expressão." (75)
" Este é o ápice de significado que uma coisa pode possuir. Basta você olhar para ela e ela transmite sua beleza para você e isso é perfeitamente suficiente, ela não precisa realizar nada além disso. O fato que isso existe e que você o sabe é suficiente. O "significado", então, reside na natureza inata de um fenômeno ou objeto. Não é algo a ser construído pela mente. Cada fenômeno, cada pessoa e coisa têm uma qualidade que confere à mente que está realmente aberta. Cada pintura ou quadro, se for uma verdadeira obra de arte, possui uma beleza que irradia." (76)

Capítulo 7 - Atenção, interesse e amor

"Quanto mais se observa a natureza humana em seus diferentes aspectos, as mudanças por que passa, e os seus diferentes modos de agir, mais se compreende que a transformação
mais maravilhosa que pode vir para uma pessoa apenas poderá concretizar-se através do amor, mas terá que ser um amor em que não há elemento de posse ou de busca por si mesmo. Se tal amor estiver presente, todas as outras virtudes e graças ou virão ou provar-se-ão nele incluídas; e este amor regenera as pessoas desde as raízes do ser, como nenhuma outra força pode fazê-lo." (78)
"O amor não é um mero gostar. O que o amor é, em verdade, não "pode ser decidido através do pensamento, através do raciocínio baseado em quaisquer premissas conhecidas; e, se aquilo que imaginamos ser o amor existe por determinada razão ou em consequência de algum motivo presente em nossas mentes, então, não se trata do verdadeiro amor, que terá de surgir livremente, por si mesmo, não estando suscetível a qualquer processo de coerção ou de indução, empregado pela própria pessoa ou por outros.
Quando uma pessoa está amando, ela tem um interesse profundo e intenso no objeto de seu amor. Portanto, será que pode ser argumentado que onde há interesse haverá amor? O interesse poderá surgir a partir de vários motivos. Pode significar a busca de proveito, poder ou prazer, quando estaria funcionando de maneira contrária ao amor, e estes motivos podem sutilmente funcionar desapercebidos. Mas, se for interesse sem qualquer motivação do eu, sem apego ao prazer através dele
experimentado, então estes interesse e amor puros naturalmente coexistiriam e, mais do que isso, tomar-se-iam unidos e misturar-se-iam." (79)
"Esforço, tensão e cansaço existem apenas para o meio material. Quando aquela consciência estiver plenamente desperta e atuar com a sua capacidade inerente, haverá atenção plena ou total, e esta atenção, por sua vez, pode revelar
muitos fatos com relação a todas as coisas que a rodeiam, não percebidas anteriormente, bem como profiindezas ocultas nela mesma. Nesta atenção ou ação não há divisão da consciência em duas seções, uma sendo a própria ação, e a outra, subjacente àquela ação, um eu formado por experiência prévia, dirigindo,
impulsionando ou inibindo, conforme possa atender às suas finalidades.
Atenção, interesse e amor são todas palavras-chave que significam uma grande abrangência de ações que existem no
momento que denominamos o presente, e revela maravilhosos novos significados que existem até mesmo nas coisas que parecem lugares-comuns; elas constituem, em diferentes graus, uma luz que emana da natureza da consciência." (81)
"Quando há amor, ele ilumina a natureza interna do objeto de amor, revelando a amabilidade nela oculta, à semelhança da bela estátua dentro do bloco de mámore que o escultor, se for um gênio, percebe antes de libertar. Porém, o poder de ver esta beleza e a ela responder manifesta-se apenas na medida em que a própria consciência libera-se das ingerências de um eu que muda o seu caráter, porque este eu se configura como um centro que puxa ou empurra vários pontos ao seu redor, afastando-os ou aproximando-os de si, e distorce as atividades daquela consciência durante o pperíodo em que não está desperta. Ou, para usarmos um outro símile igualmente aplicável, a consciencia individual terá que desaprender-se completamente do sedimento acumulado de experiências passadas, as quais, carregadas em suas águas límpida, que do contrário estariam livres e fluidas, mudam sua qualidade e natureza, impedindo seu fluxo e impondo-lhes as suas próprias reações e propriedades que, em linguagem simples, são a ambição, a inveja e assim por diante." (81-82)
"Nisso nada deve haver que modifique a sua ação ou decisão, exceto uma inteligência pura ou qualquer sentido inato
como um sentido de harmonia que possa existir na natureza intrínseca da vida e da consciência, as quais são de fato dois
aspectos de uma mesma realidade. É uma condição puramente negativa e pode coexistir com um estado de alerta pronto para a ação. Sejam quais forem as formas positivas de ação que dela possam surgir, surgirão espontaneamente, em hamlonia ou unidade completa com aquela base negativa, não restringindo a sua liberdade ou modificando o seu todo e condição não fragmentada." (82)
"... sutil natureza espiritual, porém tudo sem o menor toque de busca por si mesmo. Este espírito de doação ..." (83)
"Nessa negatividade existem proflindezas de paz e de silêncio, plenas de um sentido de unidade e de outros entendimentos que constituem a verdade em um sentido vital." (83)
"Muitos instrutores religiosos e éticos enfatizaram a importância da dedicação sincera, bem como da ponderação, até mesmo na realização de atos comuns como os que são necessários para fazer girar a roda da vida, ou atos que surgem de um espírito desinteressado e altruísta." (83)
"Não existe nada grande ou pequeno, seja em relação ao próprio treinamento da pessoa, à entidade subjetiva, ao conhecedor e ao realizador, ou nas obras da natureza. Aquilo que chamamos infinitesimal ou vasto, apenas o é na escala das nossas percepções e capacidades limitadas." (84)
"A atenção é expansiva, mas quando é acorrentada ao eu, ela não pode ir longe; perde a sua ritmicidade natural que é proporcional ao interesse que se sente. Quando não estiver assim amarrada - e esta amarra poderá ser muito sutil e elástica - retira-se a pessoa completamente do seu eu. Portanto, o trabalho que é realizado apenas pelo amor ao trabalho ou "pela glória de Deus" -- um Deus que é desconhecido e nada tem a ver com o eu - sem qualquer objetivo pessoal, não satisfazendo qualquer impulso pessoal, sempre traz um sentido interno de renovação e tranquilidade." (85)
"J. Krishnamurti frequentemente fala da importância de ouvir com atenção total as pessoas que vêm nos falar, ouvir a natureza e também os nossos próprios pensamentos e impulsos internos. Este ouvir está dentro de nossa capacidade e pode acompanhar a observação também com atenção completa." (85)
"Geralmente ouvimos meio distraídos, seja em conversa pessoal ou em um debate, talvez pensando, até mesmo enquanto estamos aparentemente ouvindo, naquilo que nós queremos dizer. Mas é apenas quando a mente não estiver preocupada, quando não estiver oprimida, movendo-se em sua rotina, revolvendo suas próprias ideias, que ela poderá dar o tipo de atenção que pode nos manifestar a riqueza inerente da vida.
Se tentamos ouvir todos os sons que possam estar no ar em uma determinada ocasião, sejam os ruídos do trânsito, o som de alguém que está falando ou algo que está caindo no chão, ou o zunir de insetos, podemos estar conscientes de todos esses sons simultaneamente se a mente estiver desimpedida - o que mostra que a atenção não precisa ser um ato positivo limitado, mas que a sua natureza essencial é aberta e inclusa. Assim tam-
bém ocorre com a observação." (86)
"Mas também pode ser entendida como verdade ou conhecimento atingido em um estado de escuta interior com a mente e o coração abertos, porém com atenção total; em outras palavras, pode ser verdade extemada por uma voz que emana do silêncio absoluto dentro de nós." (86)
"Esta qualidade é compreendida no amor ou na verdadeira devoção que constitui realmente o amor unidirecionado com
uma intensa atração para o belo e outros atributos como nobreza, dignidade e assim por diante, que estão presentes no objeto
do amor." (87)
"Foi dito que o amor transforma aquele que ama à semelhança daquele que é amado. É um amor que pode ser tão profundo e real e íntimo quanto o amor daquele que ama; não obstante, não pode ser perfeito, ou amor em verdade absoluta, a menos que esteja isento de qualquer expectativa ou desejo de possuir como é a nossa contemplação da beleza da natureza no pôr do sol." (87 - Siri Ram)
"O amor, assim como a devoção
precisa surgir por si mesmo; e surgirá quando não houver impedimento, porque faz parte da riqueza da vida..." (
"A verdadeira devoção não é exigida ou obtida por meio coercitivos. Passar pelos movimentos da devoção, mesmo adotando a postura de uma entrega completa como muitas pessoas o fazem, não evocará a realidade da devoção, embora possa iludir o homem que assim procede; assim como um abraço físico
embora um sinal de afeto ou de amor, não pode por si mesmo evocar a realidade do amor. O amor, assim como a devoção
precisa surgir por si mesmo; e surgirá quando não houver impedimento, porque faz parte da riqueza da vida, capacidade para a qual reside potencialmente nas profundezas do coração humano, sendo que a palavra ''coração'' marca o lado mais profundo e mais sensível do homem. A consciência de uma pessoa quando está livre para expandir-se, e não fechada como quando está centrada em si mesma, floresce sozinha. O que significa essa
florescência, a sua alegria e beleza. é experimentado no amor, mesmo assim como o conhecemos.
Quando uma árvore está em flor, a vida
naquela árvore está ativa na mais bela forma. Da mesma maneira, pode haver a florescência espontânea de uma natureza de extraordinárias sutileza e sensibilidade profundamente no homem, à qual podemos aplicar a palavra "alma". Esta natureza é então revelada como constituindo em sua unidade o homem real, e tudo o mais é apenas um invólucro exterior. O florescer desta natureza, cuja
beleza então se manifesta em todo o pensamento, sentimento e ação, realiza-se apenas em uma atmosfera de liberdade dentro de si, de cada elemento que possa estar no seu caminho e impedir a harmonia inata daquele processo. Se uma flor desconhecida nasce do solo de nossa mente e coração, e nela brotam as mais delicadas pétalas, na realidade, se a consciência assumir a forma daquela flor, nada pode haver naquele solo que não possa prestar-se àquele processo, que não possa tornar-se parte daquela harmonia em evolução. Isto significa que todo
elemento de rigidez, desigualdade ou irregularidade em nossa condição interna precisa ser eliminado. Deve haver a
máxima flexibilidade do espírito e da mente, de modo que haja a possibilidade, em cada momento, de compreender o padrão daquela flor desconhecida, mas também suficiente firmeza em cada momento, para que a sua forma possa manter-se em posição, uma firmeza que consiste essencialmente em uma condição de não ser afetado por forças que podem procurar desvia-la. Este é um
símile material e precisa ser traduzido em termos psicológicos adequados que descrevem as condições do coração e da mente. Quando assim traduzido, isto apenas poderá significar uma renúncia total ao eu, uma condição que está liberta de todas as contradições ou pares de opostos. Quando não houver eu que obstrua, causando estes opostos, o campo estará totalmente aberto e limpo, e será um campo de cognição e sensibilidade
puras." (88-89)
"Quando assim traduzido, isto apenas poderá significar uma renúncia total ao eu, uma condição que está liberta de todas
as contradições ou pares de opostos. Quando não houver eu que obstrua, causando estes opostos, o campo estará totalmente aberto e limpo, e será um campo de cognição e sensibilidade puras." (89)


Capítulo 8 - O eu cambiante: sua evolução 


"É um fato assaz maravilhoso e extraordinário que todas as qualidades basicamente belas como humildade, simplicidade, pureza e outras que são inomináveis fundam-se em uma condição de mente e de coração. Igualmente, todos os vícios estão vinculados reciprocamente, sendo todos eles a progênie de autoasserção egoística e de desejo; constituem um grupo estreitamente associado, enquanto que as virtudes, consideradas separadamente, constituem uma única constelação.
É o desejo por aquilo que se quer e se gosta, ou busca possuir e reter, que nos torna tão autoassertivos. Mas será que não pode haver o movimento puro do coração, semelhante ao desejo embora não possamos denomina-lo desejo - que não tenha a sua origem no eu? Tal desejo, sem um eu que se vincula ao objeto desejado, possui a mesma qualidade que o amor. Surge de uma mudança no nosso coração, de uma inclinação da vontade,
que faz com que a beleza de algo, seja uma pessoa, um objeto, fenômeno ou ideia, flua dentro do coração. Tal movimento surge, não da memória de uma experiência precedente, como ocorre com o desejo comum, porém como uma qualidade que pertence ao livre fluxo da vida. A assertiva e o desejo que busca possuir andam juntos. Podemos não ter compreendido quão estreitamente estão ligados. Quanto mais exigências e impulsos a pessoa tiver, tanto mais dominadora e assertiva ela certamente
será. Quando digo ''eu quero isto", a ênfase, por mais inconsciente que seja, está centrada no eu." (90-91)
"A verdade, em um sentido abrangente é
tanto subjetiva quanto objetiva. Subjetivamente, é verdade no próprio ser, na sua natureza e na sua ação. Em relação a coisas externas, encontra-se no ver as coisas como elas são, não apenas sua aparência, os fatos crus sobre elas que não nos tocam profundamente, mas também aquelas formas internas ou ideais subjacentes a essa aparência. É a resposta ao ideal que está subjacente ao assim chamado real que evoca em nós
o senso de harmonia, embora até mesmo ver o fato como fato e compreender o seu lugar faça parte da resposta completa." (91)
"Quando se desperta para a existência
desta verdade dentro de si, os seus diferentes aspectos surgem em tantas formas de beleza, como estrelas em um céu do qual desapareceram as nuvens." (91)
"Todas as nuvens têm sua origem na terra, e as nuvens no nosso céu mental nascem do apego à sensação em várias formas. O apego a qualquer tipo de sensação, seja física ou emocional, traz consigo ardor e tensão. Pode haver algum grau de ardor ou de febre no sistema da pessoa, porém pode ser que não se perceba aquele fato quando a ele se ficou acostumado. Quando há apego a algo que causa prazer, haverá o impulso para segurar o objeto ou possuí-lo. Todo apego visa a uma sensação de prazer; o objeto ou a pessoa a ele vinculada constitui apenas o meio através do qual aquela sensação é obtida, substituída na medida em que as exigências o requerem. Não se pode realmente encontrar paz na vida, a paz que desce até às raízes do ser, a menos que se tenha eliminado da natureza toda tensão febril, o desejo por um ou outro tipo de satisfação, seja em ater-se às coisas, em possuí-las ou em construir mais e mais do
que seja que dê à pessoa um sentido de segurança." (92)
"As nuvens no nosso céu nasceram do solo da nossa natureza, isto é, a sua condição, porém, há o céu límpido além delas.
A pessoa que não teve nem mesmo um vislumbre momentâneo da natureza e da beleza daquele céu, nem mesmo acreditará que ele existe; se Ihe falarem a respeito, pensará que é algo fantasioso; existem apenas as nuvens." (92)
"Quando há o apego e o desejo que ele gera, haverá também frustração e infelicidade, porque aquilo que é desejado nem sempre é atingido; e até mesmo quando o é, depois de certo período de tempo, não nos dá a felicidade
que se espera. E há a reação ao seu gozo, a menos que seja um gozo puro sem qualquer vontade que insista na sua continuação ou retenção. Há frustração quando as esperanças ou não são realizadas ou não fornecem a satisfação que se esperava." (93)
"As vidas de tantas pessoas são inexpressivas e tristes não pela falta de acontecimentos interessantes e fenômenos, mas por causa de um pesado véu sob o qual as pessoas vivem e têm a sua existência. Pode-se viver em meio a um turbilhão de excitações, mas quando se desgasta a novidade de uma coisa após outra, a vida passa a ser inexpressiva, perde o seu impulso, e destitui-se de alegria; as excitações, então, apenas
somam para a infelicidade." (93)
"As memórias precísam necessariamente existir como impressões recebidas no passado, mas elas podem existir sem se transformarem em nuvens carregadas com reações que afetam o presente. Quando este é o caso, elas desaparecem do nosso horizonte sem obstruir a luz que flui de cima. É memória carregada com paixões, com anseios, ressentimentos e assim por diante, que cria os nossos
diferentes estados de humor..." (93)
"Pode-se ser agradecido pelo fato de que há, em dado momento, um fim para um processo que nada é senão um contínuo semear, na maioria das vezes produzindo lamento." (94)
"As nuvens que estiveram presentes, não mais em sua plenitude, ou terão de descarregar-se ou evaporarão e desaparecerão. São todas formadas por estágios no curso dos contatos com o mundo externo, e terão de chegar a um fim por etapas..." (94)
"Mas pode existir uma infinidade de formas de harmonia que podem surgir e aflorar à visão, quando nada existe para obstruir as nossas percepções, embora as verdades mais próximas da nossa compreensão devam ser entendidas inicialmente." (95)
"Tendo exaurido o mérito adquirido, o indivíduo retorna à Terra." (95)
"A transfotnnação do velho no novo torna-se possível porque o frescor e a beleza que surgem são inerentes à alma. Não é algo novo que é criado, e sim uma natureza que esteve presente, embora oculta, que é revelada e manifestada. A alma, na sua verdadeira natureza, não pode deteriorar-se - isto terá que ser considerado como um postulado - ela é um receptáculo, ou meio, das águas mais refeescantes da vida. É a mente que se deteriora e, naturalmente, também o corpo, influenciando a mente." (96)
"A natureza inerente da vida é uma natureza de frescor, de energia, de sensibilidade e beleza; ela precisa ser libertada, não adquirida." (97)
"Quando a mente está totalmente quieta, tendo renunciado a tudo de finalidade ou preocupação pessoal, e aquela outra natureza a ser vinculada com aquela palavra surge no próprio horizonte e se manifesta.
Retomamos à encamaçao com aquela natureza verdadeira e original repetida na criança, porém a nova entidade muito em breve fica obscurecida e toma-se muito semelhante às pessoas ao seu redor. Ela sucumbe às várias influências estranhas
à sua verdadeira natureza, em virtude da falta de percepção. Deveria ser possível para a pessoa atravessar os sucessivos estágios de sua vida sem sucumbir desta maneira, não passando pela metamorfose infeliz que se realiza na maioria dos casos." (97)
"Mas raro é o indivíduo que permanece não afetado, puro como um lírio em uma lagoa, mesmo em meio às impurezas e às algas em decadência. Ocasionalmente se pode ver um toque daquela qualidade em alguma pessoa excepcional, ao longo da
qual o mundo costuma passar como se nada representasse.
Qualquer idade pode ser bela em si mesma, sem dar origem a qualquer deterioração interior." (98)
"A vida está repleta de dificuldades e de problemas, porém em meio a eles e às contradições que se apresentam, tarefas e
responsabilidades, deve ser possível ter uma condição interior que manifeste a beleza de um Espírito que, à semelhança do sol quando nasce, atravessa os céus e se põe, lançando os seus raios em ângulos diferentes, porém soando em cada fase da
jornada a sua melodia apropriada." (99)
"A natureza renova as formas da vida em seus domínios de forma mecânica e periódica; a renovação é apenas uma fase
de um ciclo. Mas podemos renovar-nos definitivamente com a nossa livre inteligência; não a mente agitada e inventiva, porém uma inteligência que funciona em desapego e paz. Da mesma
maneira como o sol retira os seus raios da terra que escurece, nós podemos retirar o nosso interesse febril das condições que
criamos, incluindo tudo que a ele se atém, a condição em que estabelecemos com todas as nossas posses, posição e prazeres, em resumo, a formação psíquica complexa com a qual circundamos o verdadeiro ser interior. Deve ser possível, mesmo antes da nossa morte, penetrar nas proflindezas daquela consciência interior que anuncia paz e compreensão perfieitas, embora continuemos a fazer o que é necessário no mundo, nele não
perdendo o interesse, porém permanecendo em contato com seus povos, conscientes de suas preocupações e insensatez." (100)
"Diz-se que o Buda falou o seguinte: "Deixai de fazer o mal, aprendei a fazer o bem, limpai o vosso próprio coração. Esse é o ensinamento dos Budas." Podemos ser tocados profundamente por esta fraseologia simples, abrangendo uma profundidade tão extensa de significado. Quando a purificação se realizou, há também a simplicidade em nossas natureza e vida. As nuvens criam uma condição atmosférica complexa, mas,
quando esta desaparece, o céu afigura-se sereno e simples. Esta é realmente uma condição de estar livre de todos os elementos em nossa natureza que ocasionem decadência, que distorçam, que nos façam cair da simplicidade original para o esbanjamento em uma condição de estarmos dissolutos, desejando cada vez mais e mais, nunca estando satisfeitos cheios de autopiedade e de impulsos que parecem insaciáveis. É apenas em tal estado de coração e de mente que podemos realmente conhecer
a verdade que importa. Até então, qualquer verdade que imaginanaos conhecer será meramente exotérica, será apenas a casca
e não a semente, a aparência, e não a coisa real." (100-101)

Capítulo 9 - Encontrando a morte como a um amigo

"Quando Seus amigos entraram no cárcere, viram Sócrates esfregando a sua perna que acabara de ser liberta dos
grilhões. O ponto notável sobre sua conduta, quando encontrou os seus amigos, foi que ele não fez qualquer queixa; não havia o menor indício de lamento sobre sua própria condição; apenas teceu considerações sobre a extraordinária alternância e conexão entre o prazer e a dor na vida. Disse que até então tinha havido uma experiência de dor, mas agora que estava livre dos grilhões houve imediatamente prazer." (102)
"O que é verdadeiro pode ser considerado religioso, mas aquilo que está de acordo com a religião como ela se apresenta pode não ser verdadeiro." (104)
"Depois, Sócrates exorta seus amigos a adquirirem virtudes e sabedoria nesta vida. O momento de sua morte estava se
aproximando, mas ele continuava a falar de maneira natural e fácil como o fizera em qualquer outro dia de sua vida. Disse
ele: "0 filósofo autêntico é aquele cuja mente está direcionada para a verdade e a virtude." A palavra "filósofo", bem como a leva nada tem a ver com a sua habilidade e atividade intelectual; mas não era esta a visão de então. No signiâcado literal da palavra, filosofia é amor à verdade, e amor sempre implica ação. A verdade, se sua natureza for tal que evoque o amor, terá
de produzir uma mudança importante na pessoa, voltando o seu interesse das coisas dos sentidos, que são efêmeras, constituindo nada mais senão gozo e prazer, para as coisas nobres e autênticas. Este foi o antigo conceito de um filósofo. Como a sua mente está direcionada para a verdade e a sabedoria, o filósofo, disse Sócrates, é uma pessoa que "está disposta e pronta para morrer". Portanto, a morte não é mal recebida por ele." (106-107)
"Este foi o antigo conceito de um filósofo. Como a sua mente está direcionada para a verdade e a sabedoria, o filósofo, disse Sócrates, é uma pessoa que "está disposta e pronta para morrer". Portanto, a morte não é mal recebida por ele." (107)
"Porque a morte é bem-vinda e a mente é direcionada pelofilósofo para a verdade e a virtude..." (107)
"Outra colocação é muito mais compreensível, ou seja, quando a vida for vivida de forma adequada, direcionada para aquelas finalidades que constituem as finalidades da alma (não os desejos do corpo), então a filosofia ou "a vida de um filósofo nada mais é senão um longo ensaio para o processo da morte". (108)
"Sócrates adianta que as multidões, o povo em geral, ignoram o sentido no qual o filósofo recebe a morte. Não significa que ele deseja livrar-se do corpo, mas que ele tem um sentimento acolhedor em relação à morte. Tem este sentimento porque não atribui grande valor às gratificações dos
apetites físicos. A maioria dos homens estima o valor das coisas através do prazer que proporcionam, mas o objetivo do filósofo é o de libertar-se tanto quanto possível da dominação do corpo. Esforça-se para cultivar a alma, dando atenção
àqueles assuntos que são de interesse da alma como a verdade, a virtude e assim por diante. Ao proceder desta maneira, já se separou do seu corpo. E como abandonou todo o apego aos prazeres que se apresentam à pessoa através do corpo, a morte nada mais é senão uma saída por uma porta aberta." (108)
"Aquele que não se preocupa com os prazeres do corpo quase chega à morte." Pode-se usufruir os prazeres que surgem momentaneamente, mas não se deve deseja-los com ansiedade." (108)
"... antes que possa processar-se a fusão do espírito humano no Logos, o homem terá de libertar-se de seus laços ou apegos.
Para expressar a mesma verdade de outra forma: é realmente o abandono do passado da pessoa, de todos os apegos que dele surgem, que transforma o homem em um novo ser." (109)
"Transformar-se em um novo ser é estar limpo do passado, de modo que ele não
mais domina, obscurece ou dirige o presente.
Esta forma de morrer torna a vida realmente muito mais vital, menos embaraçada e oprimida, de maneira que todas as percepções são mais exatas, e a inteligência passa a ser intensa, concentrada e semelhante a uma chama. É em um estado de pureza interna que a pessoa atinge a mais alta qualidade no funcionamento de todos os aspectos do seu ser. Toda a substância em seu estado puro exibe a sua potência plena." (109)
Casualmente foi feita a afirmação de que a filosofia é a música de mais alta qualidade. Sócrates disse que tinha um sonho persistente no qual Ihe ordenavam dedicar-se à música, e como ele compreendia ser a filosofia a música mais elevada, estava dedicando-se à filosofa. O conceito de ser a filosofia a foma mais elevada de música toma-se mais claro à luz da afirmação feita anteriormente com relação à natureza da alma como sendo uma forma de harmonia." (109)
"A felicidade não deve ser confundida com prazer; ela se origina da pureza da mente e do coração e surge de forma natural; não precisamos procura-la de modo algum." (110)
"A essência, o objeto em si mesmo, apenas pode ser conhecido através da alma e jamais através dos sentidos.
Quando vivemos, nos aproximamos mais do conhecimento daquela essência ao não mantermos comunicação ou comunhão de espécie alguma com o corpo, exceto para as necessidades absolutas, isto é, quando deixamos de ser dependentes do corpo, influenciados pelos seus apetites, impulsos e paixões.
Em outras palavras, todo o esforço e estudo na filosofa, segundo a acepção antiga da palavra, implica na entrega e separação da alma do corpo, e isso pode ser tentado e logrado até mesmo enquanto a pessoa estiver vivendo neste mundo. Não é algo que precisa realizar-se por um processo da natureza, mas pode ser
atingido nela própria inteligência perspicaz da pessoa." (111)
"Quando há liberdade de dependência do corpo, quando esta mudança se realiza em sua plenitude, então a morte e a vida são a mesma coisa para o homem real, sendo o homem real a alma; não Ihe faz diferença se vive ou se morre. Isto também nos faz lembrar a frase contida no Gitã que diz que "Os Sábios não lamentam nem os vivos e nem os mortos"." (111)
"A alma usa o corpo como instrumento, sem a ele se apegar." (112)
"Ouça a canção da vida. A própria vida tem voz e nunca está silenciosa, aprenda dela a lição da harmonia." (113)
"É necessário ouvir com todo o ser, com todo o coração. Para fazer isso, deve-se põr de lado as preocupações, as ideias que se podem estar constantemente revolvendo na cabeça e que constituem uma barreira no contato imediato e direto com o verdadeiro e o real. Terá de prevalecer uma condição de silêncio para que possa ouvir aquilo que a vida tem a dizer, uma condição na qual não se projeta quaisquer ideias do depósito da memória. Aquilo percebido ou ouvido terá de sobressair-se de forma clara por si mesmo. J. Krishnamurti destaca que a ideia de impede de olharmos para a árvore e vê-la como realmente é. Toda ideia passa a ser um véu através do qual olhamos a realidade que ela representa." (114)
"Usamos a palavra vida em dois sentidos. Em um sentido, ela é tudo o que nos acontece, o panorama e os incidentes que
nos afetam. Estes também têm algo a dizer. Mas é no outro sentido, da corrente da vida que flui, seu movimento através de
cada criatura viva continuamente ocasionando mudanças tanto na vestidura material quanto na condição de sua consciência que a vida exterioriza sua mensagem. A sua ação reveste-se de
significado. Sem ação, não há vida.
Uma árvore é um objeto muito comum na natureza. Frequentemente tem grande dignidade e beleza. Quando está
florescendo, há algo de transcendental a envolver aquele fenômeno. Esta beleza, a qualidade transcendental, faz parte da
revelação da riqueza da vida, sua expressão. Mas podemos estar tão submersos em nossas maquinações, as ideias ocupando as nossas mentes, que falhamos em observar este fato. Assim
"Olha seriamente toda a vida que te circunda." Estando em seu centro, precisamos tomar-nos conscientes de nossa relação com ela. A vida em todas as suas formas, perfeitas ou imperfeitas, exprime, de forma clara ou fugaz, uma ideia divina profundamente dentro dela. Quando para ela estamos abertos, a nossa
própria vida não mais constitui algo isolado. Passa a surgir uma sensação de espaço dentro de nosso próprio ser, na direção de um movimento de expansão que abrange todos os demais.
Infelizmente, vivemos em uma condição de estarmos encerrados, exceto com relação àquilo que afeta o nosso eu pessoal. Há uma falta de um sentir genuíno, seja pelas pessoas ou coisas, exceto por aquilo que se origina de nossos próprios gostos e aversões. Há muito pouco sentimento para a vida no mundo moderno, que é organizado mais e mais para a satisfação dos anseios insaciáveis do homem. Na proporção da extensão em
que há concentração nas satisfações e indulgências egoístas, há cada vez menos consideração pelos outros. A mentalidade de usar e explorar tudo que vem ao nosso alcance não estabelece distinção entre formas animada e inanimada. Esta mentalidade desenvolveu-se a partir de uma relação entre a mente e o eu, na
qual o eu solicita sempre mais sensações e variedades de sensações, e a mente inventa formas de provê-las. Mas a sua ação conjunta elimina a capacidade para a existência de qualquer sentimento autêntico que não tenha motivo enraizado no eu. lsolamo-nos de todos os aspectos da vida, exceto dos materiais." (114-115)
"A vida é algo extraordinário, mas ignoramos, negamos ou suprimimos aquilo que é extraordinário nela e a respeito dela. Queremos a vida apenas como algo a ser usado. Esta atitude estende-se também aos seres humanos. Quanto mais as nossas próprias conquistas e prazeres absorvem o nosso tempo, capacidade e energia, necessariamente eles estarão em menor
disponibilidade para considerarmos as alegrias e dores de outras pessoas e criaturas.
Negamos à vida os seus direitos inerentes, a sua própria alegria e expressão. Cada coisa viva existe para o gozo de sua
vida, de seus movimentos, e não para nossa gratificação. O mínimo que por ela podemos fazer é nos abstermos de matar, a menos que matar passe a ser inevitável. Mas o que fazemos é infligir dor e sofrimento deliberadamente, exceto nos nossos animais de estimação. E, diante desta realidade, como podemos conhecer algo sobre a canção da vida? Quando não houver sentimento pela vida em geral, tampouco poderá haver para com os nossos próximos, exceto aqueles sentimentos que podemos demonstrar quando atendem aos nossos interesses próprios. Mas aquilo que se origina de
um impulso de autoindulgência, autoproteção ou autoaprímoramento não é sentimento verdadeiro." (116)
"No que tange aos seres humanos, é nas qualidades que não fazem parte dos níveis mecânicos da vida inteligência, amor, beleza e assim por diante que se encontrará o verdadeiro significado da vida." (117)

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