"Na realidade não existe a divisão de exterior e interior.
Trata-se de um processo, de um movimento unitário, e quando se compreende o exterior, está-se também compreendendo o interior. Mas, infelizmente, separamos, dividimos a vida em fragmentos: exterior, interior, bom, mau etc. Assim como dividimos o mundo em nacionalidades, com as conseqüentes
aflições e guerras, assim também dividimos a nossa existência em interior e exterior. Essa se me afigura a pior coisa que se pode fazer: fracionar a existência em diferentes fragmentos.
Aí é que reside a contradição, contradição em que quase todos nós nos vemos enredados e, portanto, em conflito." (Krishnamurti, A importância da transformação, p. 9)
"A mente que teme não pode, evidentemente, ter paz. Só quando total
e completamente livre do mêdo, torna-se a mente apta a observar, investigar.
Um dos nossos maiores problemas é a violência, não só no exterior, mas também no interior. A violência não é apenas física, pois toda a estrutura da psique está baseada na violência. Êsse esforço incessante, êsse constante ajustamento
a um padrão, a perene busca do prazer e, por conseguinte, o desejo de evitar tudo o que causa dor, pondo-se de parte a capacidade de olhar, observar o que é - tudo isso faz parte da violência. A agressividade, a competição, a constante comparação entre o que é e o que deveria ser - tudo isso, sem dúvida, são formas de violência."
(KRISHNAMURTI, A importância da transformação, p. 9)
"Só é possível ver quando o pensamento não está funcionando. Se estais à espera de alguma coisa, de não-sei-o-quê, esta expectativa vos está impedindo de escutar; a idéia, o conceito, o conhecimento vos impede de observar. Se olhais uma flor, uma árvore, uma um pássaro, o que quer que seja, vossa reação imediata é de dar-lhe nome; de gostar ou não gostar da coisa, po-la numa categoria e arquivá-la na memória. E cessastes de olhar.
É possível olhar, ver, sem essa atividade mental? A atividade mental é sempre pensamento, na forma de idéia, de memória; por conseguinte, não há percepção direta. Não, sei se já observastes vosso amigo, vossa esposa ou marido, olhando-o simplesmente. Sempre olhais ou escutais a outrem com
infortúnios, insultos etc. Não estais, em verdade, escutando, ouvindo.
(...)
É possível o homem libertar-se dêsse condicionamento, não num futuro distante, porém instantâneamente? Foi por isso que perguntei se temos possibilidade de libertar de todo a mente, esvazia-la, para que se torne uma coisa nova. Se isso não se realizar, ficaremos perenemente entregues ao sofrimento, ao medo.
(...)
É possível o homem que vive há tantos séculos, há milhões de anos, que tem seguido a senda da violência, aceitando a guerra com maneira de vida, tanto no cotidiano como no campo de batalha - é possível um homem transformar-se de todo e começar a viver de maneira completamente diferente?
Feita a pergunta, quem responderá a ela? Pretendeis procurar alguém que vos dê a resposta - um guru, um sacerdote, um psicólogo - ou estais esperando que o orador responda? Se se faz corretamente a pergunta, a resposta está nela contida; mas, muito poucos de nós já fizeram tal pergunta. Aceitamos a norma da vida, e alteração dessa norma exige abundante energia. Estamos vinculados a certos dogmas, certas crenças, certas atividades, como norma da vida. Estamos comprometidos, e temos medo de alterar a norma, pois não sabemos o que dessa mudança resultará.
(...)
Não há autoridade, nem guru, nem sacerdote que possa responder a tal pergunta; e alcançar o ponto em que psicologicamente não dependemos de ninguém, é o primeiro e, provavelmente, o último passo que temos de dar. Então, libertada de todas as suas agitações, estará a mente habilitada a descobrir se há uma realidade não construída pelo pensamento. (...)
Temos de responder àquela pergunta e, também, de responder a pergunta 'O que é a morte?'. Uma sociedade, um ente humano que não compreende o que é a morte não saberá o que é a vida, nem saberá o que é o amor. O mero aceitar ou rejeitar de uma coisa que não seja produto do pensamento, é bastante infantil, falta de madureza; mais se desejamos investigá-la a sério, temos de lançar as bases da virtude, a qual nada tem que ver com a moralidade social. Temos de compreender a natureza do prazer; não, negar ou aceitar o prazer, porém compreender sua natureza, sua estrutura. E, ainda, precisamos estar livres do medo e, por conseguinte, ter a mente completamente livre do descontentamento e do desejo de mais experiência." (Krishnamurti. A importância da transformação, p. 12-15)
"Nós não queremos paz. A respeito dela falamos interminàvelmente, mas, para termos paz, temos de viver pacificamente. Isso significa que não deve haver competição, ambição, divisão em nacionalidades, preconceitos de cor. Como não vivemos pacificamente, há guerras (...). Em verdade, estamos educando nossos filhos para morrerem, serem mortos no escritório, na família
ou no campo de batalha, e a isso chamamos viver."
( Krishnamurti, A importância da transformação, p. 56)
"Onde há amor, não há sofrimento, para o próximo, para o homem a vosso lado ou à vossa frente. Onde está o amor, está terminado o sofrimento, não há adoração do sofrimento." ( Krishnamurti, A importância da transformação, p. 56)
"É assim que funcionamos em cada dia da nossa vida. Adoramos o êxito. As revistas estão cheias de histórias de êxitos, e desde o momento em que começamos a ir para a escola até à morte, estamos a comparar, a lutar, em incessante conflito, porque há uma divisão, uma contradição entre aquêle que compara e aquilo com que êle se compara. Pela comparação pensamos que compreendemos, mas na realidade não compreendemos."
(Krishnamurti, A importância da transformação, p. 57)
"O viver sem comparação exige enorme inteligência e sensibilidade, porque não há então exemplo, não há alguma coisa que deveria ser, não há ideal, não há herói. Começamos com o que realmente é; e para compreender o que é não há
nenhuma necessidade de comparação. Quando comparamos, destruímos a que é. É o que acontece quando comparamos
um menino com seu irmão mais velho, muito inteligente; se o fazemos, destruímos o menino mais novo. É isso o que estamos sempre fazendo. Estamos a lutar, a lutar por quê, psicologicamente? Para pâr fim à violência? Para têrmos mais experiência? Pâr fim à violência é entrar diretamente em contato com ela, dentro em vós mesmo, e isso não se pode fazer se há um ideal, como o da não violência ou da paz. Esse oposto cria conflito, mas, se sois capaz de olhar a violência, completamente, com atenção total, não há então conflito, nem luta. Ela termina. São os ideais absurdos, extravagantes que estão a destruir o contato direto com a realidade."
(Krishnamurti, A importância da transformação, p. 57)
"Só há um problema político: a unidade humana. Mas, não haverá possibilidade de estabelecer-se a união da humanidade, enquanto houver nacionalidades e exércitos: enquanto não houver um governo único, nem democrático, nem
republicano, nem laborista; enquanto não nos interessarem verdadeiramente os entes humanos - não importa se vivam na
Rússia, na Índia, na China ou na Inglaterra. Temos agora a possibilidade de fornecer alimento, teto e roupa a toda a população da Terra, mas não o estamos fazendo, e bem sabeis por que razões: nacionalidades, preconceitos religiosos etc. etc."
(Krishnamurti, A importância da transformação, p. 58)
"Dissemos que o que se faz necessário é uma mente nova, e não uma nova técnica, um novo método, uma nova filosofia, ou uma nova droga. E essa mente nova não nascerá se não soubermos morrer para
tudo o que é velho, morrer completamente, esvaziar a mente de todo o passado. Então, não necessitrareis de nome nenhum para aquela coisa; vós a estareis vivendo; sabereis então o que é a bem-aventurança. Neste mundo em que estamos vivendo, tão cheio de caos, só a mente inocente é capaz de resolver estes problemas, e não a mente complicada."
(Krishnamurti, A importância da transformação, p. 58-59)
"Já olhastes uma árvore, a beleza do por do Sol, sem observador nenhum? De ordinário, quando olhais uma coisa, que
sucede realmente? Vossas lembranças acodem aos borbotões. ''Ah! que maravilhoso poente contemplei outro dia na Califórnia; 'aquela luminosidade da montanha!''. Ou o por do Sol
vos absorve inteiramente e, temporariamente, ficais em silêncio.
Nesse silêncio vos lembrais daquele prazer e dizeis: ''Eu gostaria de repeti-lo'' tal como o prazer sexual. É isso o que
acontece: a coisa se torna uma repetição, porque nela pensais, desejais repetir aquele prazer; e nessa armadilha ficais aprisionado.
Mas, para olharmos realmente uma árvore, ou as dobras de uma montanha o pensamento como memória tem de cessar." (Krishnamurti, A importância da transformação, p. 82)
"Quando sabeis que amais, quando o sabeis como observador, como uma entidade que ama alguma coisa - uma árvore, uma mulher, um homem, uma criança - isso é amor? Dividimos o amor em divino e mundano, sexual e não sexual,
numa coisa sublime ou numa coisa absurda. Vivemos fragmentados. Essa existência fragmentária é a maldição de nossa vida. A vida é um movimento total e não um movimento fragmentário, em conflito com outro fragmento. Para se compreender o movimento total, o causador da fragmentação deve achar de
existir." (Krishnamurti, A importância da transformação, p. 83)
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