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terça-feira, 9 de julho de 2019

Brasil na “lista suja” dos países que descumprem normas da OIT

Guy Rider (Diretor Geral da OIT)
e Clovis Renato (Assessor Técnico na OIT)

O Comitê de Aplicação de Normas inseriu, novamente, o Brasil na “lista suja”, após denúncia, defesa e análise do caso, na 108ª Conferência Internacional do Trabalho, na Suíça.
Na Conferência Internacional, seguindo-se à leitura do relatório dos técnicos da OIT que analisaram o caso Brasil, houve a intervenções da representação dos trabalhadores, empregadores e governo, bem como de 47 países integrantes da OIT sobre o caso.
Ao final, com o julgamento, houve a aceitação da denúncia com recomendações ao Estado parte. Verificaram-se indícios de inexistência de tripartismo real, em desatendimento à Convenção nº 98 da OIT, de modo foi solicitado ao governo brasileiro que continuasse a analisar, em cooperação e em consonância com as organizações mais representativas dos empregadores e dos trabalhadores, o impacto das reformas e decidir se são necessárias adaptações adequadas.
Ainda, como forma de comprovar à OIT a existência de tripartismo efetivo, o Comitê impôs ao Brasil que preparasse, em consulta com as organizações de empregadores e trabalhadores mais representativas, um relatório a ser submetido ao Comitê de Peritos, para posterior análise da entidade internacional.
O Governo Brasileiro, presente na ocasião da divulgação dos resultados, reagiu contra o sistema tripartite e o multilateralismo, desconsiderando o representante brasileiro que, tanto a inclusão na “lista suja” quanto o relatório final de conclusão são tomados por consenso tripartite e conforme relatório dos peritos da OIT.
A insurgência do Brasil se deu por querer demonstrar, sem sucesso, o cumprimento integral das normas da OIT, o respeito ao movimento sindical e aos trabalhadores, de modo que apresentou tese de que a “Reforma trabalhista”, com a Lei nº 13.467/2017 e normas subsequente, veio a aprimorar as relações de trabalho em atendimento das normas internacionais. Para o governo, a questão estaria encerrada, nacional e internacionalmente, e, a contragosto, terá de reabrir a discussão se quiser ser considerado um país cumpridor dos pactos internacionais junto à OIT.
O Brasil segue em observação até o cumprimento das recomendações, a serem analisadas nas próximas conferências, a partir de 2020. Caso se confirme a inexistência de tripartismo e o descumprimento da recomendação sobre a Convenção nº 98 da OIT, podem ocorrer penalidades.
A Constituição da OIT, após a reforma de 1946, não estabelece especificamente as sanções que devem ser aplicadas aos Estados-membros, mas estipula, art. 33, que “Se um Estado-Membro não se conformar, no prazo prescrito, com as recomendações eventualmente contidas no relatório da Comissão de Inquérito, ou na decisão da Corte Internacional de Justiça, o Conselho de Administração poderá recomendar à Conferência a adoção de qualquer medida que lhe pareça conveniente para assegurar a execução das mesmas recomendações.”
Não há um rol taxativo de sanções, mas a inobservância das obrigações internacionais impostas pela OIT costuma ensejar “Advertência” por parte da Conferência aos descumpridores de suas normas. Em regra, trata-se de sanção de ordem moral, com impactos sociais e econômicos em âmbito internacional.
Em termos históricos, o mecanismo sancionatório de ordem moral tem se mostrado bastante eficaz, como destaca Süssekind (Direito internacional do trabalho, LTr, 2006, v.2, p. 1552), uma vez que os delegados governamentais procuram defender os seus países das acusações ou dúvidas arguidas sobre o descumprimento das referidas obrigações e da divulgação internacional de seus países na lista de descumpridores. Algo que ocorreu na 107 e na 108 CIT, com clara movimentação da Missão Brasileira na ONU e do Secretário de Trabalho e Previdência, representantes do Brasil.
Há, ainda, a possibilidade de a Conferência representar o Brasil à ONU, uma vez que o Estado, de forma grave ou reiteradamente, encontra-se em desacordo e violando as obrigações contraídas internacionalmente. Viola a Constituição da OIT e se expõe a aplicação de outras sanções pelas Nações Unidas, conforme disposto nos artigos 5º e 6º da Carta das Nações Unidas:
“Artigo 5º. O membro das Nações Unidas contra o qual for levada a efeito qualquer ação preventiva ou coercitiva por parte do Conselho de Segurança poderá ser suspenso do exercício dos direitos e privilégios de membro pela Assembleia Geral, mediante recomendação do Conselho de Segurança. O exercício desses direitos e privilégios poderá ser restabelecido pelo Conselho de Segurança.
Artigo 6º. O membro das Nações Unidas que houver violado persistentemente os princípios contidos na presente Carta poderá ser expulso da Organização pela Assembleia Geral mediante recomendação do Conselho de Segurança.”
De acordo com a Carta da ONU, a Assembleia Geral é o órgão encarregado de discutir e fazer recomendações sobre qualquer questão dentro das finalidades da ONU; considerar princípios gerais de cooperação na manutenção da paz e segurança internacionais; elaborar recomendações sobre a solução pacífica de qualquer litígio internacional; aprovar o orçamento da ONU; e eleger os membros não-permanentes do Conselho de Segurança da ONU. Entidade que pode aprofundar a questão, caso o Brasil resolva não cumprir a recomendação do Comitê de Aplicação de Normas da OIT.
Ficou claro no contexto que para os 183 países que integram a OIT, o descumprimento de normas pelos estados que firmam tratados gera impactos econômicos e concorrência desleal, viabilizando instabilidade econômica internacional e prejudicando os países que mantêm seus pactos, conforme acordado na OIT. Algo confirmado pela votação e consenso entre empregadores, trabalhadores e governos que inseriram o Brasil na “lista suja”, maculando a imagem do governo e, também, prejudicando o desenvolvimento nacional.
Clovis Renato Costa Farias
(Advogado, Professor Universitário, Assessor Técnico na OIT, membro do GRUPE e da EXCOLA)

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