O sábado, tradicionalmente reservado ao descanso, foi de trabalho intenso e negociações acirradas nas comissões da 113ª Conferência Internacional do Trabalho (CIT), que segue até 13 de junho em Genebra. Representantes de governos, trabalhadores e empregadores de 187 países prolongaram os debates até a noite, refletindo a complexidade e a importância dos temas em pauta para o futuro do trabalho global.
Diálogo social e negociação tripartite: o coração da OIT
O ambiente da OIT é único: aqui, o diálogo social é mais do que um princípio, é a base do processo de elaboração das normas internacionais. Cada decisão nasce do confronto aberto, mas respeitoso, entre as três bancadas – trabalhadores, empregadores e governos –, que negociam cada cláusula, buscam consenso e, muitas vezes, enfrentam impasses que exigem habilidade diplomática e disposição para o compromisso. O desafio é enorme: transformar interesses divergentes em acordos que possam ser aplicados globalmente, respeitando realidades nacionais e garantindo direitos universais.
Comissão sobre Trabalho em Plataformas: impasse e resistência
Na Comissão Normativa sobre Trabalho Decente na Economia de Plataformas, o sábado foi marcado por tensão e pouca margem para avanços. Os trabalhos se estenderam até as 20h, com a promessa de retomada na segunda-feira. O grande desafio está nas cláusulas mais sensíveis da possível Convenção, que seguem em destaque por falta de consenso. Governos como EUA, China e Suíça, alinhados à bancada dos empregadores, têm dificultado o progresso, questionando pontos essenciais, como a responsabilização das plataformas pelas condições de trabalho e direitos dos trabalhadores de aplicativos. O receio de criar obrigações claras e a resistência em admitir mecanismos de cobrança por violações são os principais entraves.
As manobras para postergar decisões são evidentes: além de estender os debates até tarde, empregadores e seus aliados tentam evitar a votação formal, apostando no cansaço e na busca de consenso absoluto para enfraquecer propostas mais robustas. O objetivo é claro: impedir que se estabeleça um responsável direto pelas mazelas enfrentadas por quem trabalha em aplicativos, mantendo o status quo de informalidade e insegurança.
UNTA - Representação dos trabalhadores de Angola presente na CIT OIT
Comissão de Riscos Biológicos: busca por consenso
Na Comissão de Riscos Biológicos, os trabalhos se encerraram às 18h40, também sem consenso sobre as cláusulas mais delicadas da futura Convenção. O esforço é para alinhar definições, critérios de proteção e obrigações dos empregadores diante do avanço de ameaças biológicas no ambiente de trabalho. O debate é técnico, mas também político, pois envolve custos, responsabilidades e a necessidade de resposta global após experiências recentes como a pandemia de covid-19
Comissão sobre Trabalho Informal: protagonismo brasileiro
A Comissão sobre Trabalho Informal encerrou seus trabalhos no sábado por volta das 14h, com destaque para as intervenções da bancada dos trabalhadores brasileiros. Foram abordadas as dificuldades e avanços no setor do vestuário, mostrando como a informalidade afeta milhões de pessoas e a urgência de políticas para promover a formalização e a proteção social.
Comissão de Aplicação de Normas: caso Belarus em foco
Na Comissão de Aplicação de Normas, o sábado foi reservado a uma sessão especial sobre o caso de Belarus, com mais de 40 inscritos para uso da palavra. Uma proposta polêmica de excluir sindicatos apoiados pelo governo de Belarus das discussões foi levantada, gerando alerta sobre os riscos de criar precedentes perigosos para a representatividade sindical na OIT.
Negociação intensa e reuniões de bancada
Entre as sessões das comissões, as bancadas tripartites realizaram reuniões privativas de alinhamento, essenciais para definir estratégias e posições em cada tema. A delegação brasileira esteve presente em todas as atividades, com participação ativa das centrais sindicais CSB, UGT, NCST, CTB, Força Sindical e CUT, além de representantes do governo e dos empregadores. O engajamento coletivo reflete o compromisso do Brasil com o diálogo social e a defesa de avanços concretos para os trabalhadores.
Desafios do consenso: entre avanços e bloqueios
O sábado extraordinário da CIT escancarou os desafios do modelo de negociação da OIT. O consenso, buscado como ideal, muitas vezes é usado como ferramenta de bloqueio, especialmente quando bancadas poderosas preferem a paralisia à mudança. Ainda assim, o processo continua: cada sessão, cada debate, cada intervenção aproxima a comunidade internacional de soluções mais justas e equilibradas para o mundo do trabalho.
Enquanto as luzes se apagavam nos corredores da OIT às 20h, o sentimento era de cansaço, mas também de determinação. O trabalho recomeça na segunda-feira, com a esperança de que o diálogo social, marca registrada da OIT, seja capaz de transformar impasses em avanços históricos para milhões de trabalhadores ao redor do mundo.
Clovis Renato Costa Farias
Advogado e Prof.Es.Ms.Dr.Direito
Assessor Técnico/Consultor Juridico
113ª CIT OIT
Advogado e Prof. Dr. Pós Graduação
Membro do GRUPE e do ILAW
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