Descompassos
sobre a liberação de dirigente sindical servidor público no Brasil e
descumprimento dos Direitos Humanos
(ARTIGO PUBLICADO COMO CAPÍTULO DE LIVRO DE EVENTO INTERNACIONAL)
(ARTIGO PUBLICADO COMO CAPÍTULO DE LIVRO DE EVENTO INTERNACIONAL)
Clovis Renato Costa Farias*
Sumário: 1. Contexto interpretativo constitucional sobre o
direito de organização, greve e negociação no serviço público; 2. Força
normativa dos tratados internacionais ratificados e descompassos na aplicação
da Convenção nº 151 da OIT quanto a liberação; 3. Jurisprudência em
amadurecimento quanto a liberação sem compensação; 4. Conclusões.
Resumo: O presente escrito aborda a questão da liberação dos
servidores dirigentes de entidades sindicais de servidores públicos, na
atualidade, após a ratificação da Convenção nº 151 da Organização Internacional
do Trabalho (OIT), que tem dispositivo expresso que demarca a viabilização das
atividades sindicais também durante a jornada de trabalho. Matéria de grande
relevância pelas dificuldades pelas quais está passando o Brasil e a postura
mitigadora de direitos adotada pelo atual Presidente da República, como
política de governo, que impõe redução drástica de direitos conquistados pelos
trabalhadores na administração pública, em especial, pelo fato de exigir maior
participação dos dirigentes em negociações e ações em defesa dos servidores, o
que não pode ser feito com ônus do servidor eleito dirigente ou representante,
sob pena de ineficácia das normas constitucionais e internacionais ratificadas
que versam sobre o direito de organização, negociação e greve no serviço
público. Para tanto, aborda-se o contexto interpretativo constitucional sobre o
direito de organização, greve e negociação no serviço público nacional,
destacando-se nuances sobre a força normativa dos tratados internacionais sobre
direitos humanos ratificados pela República Federativa do Brasil, bem como os
descompassos na aplicação da Convenção nº 151 da OIT quanto a liberação. Por
fim, aborda-se a jurisprudência em amadurecimento quanto a liberação sem
compensação e a omissão recorrente de fundamentação abrangendo a Convenção nº
151 ora em plena vigência e eficácia.
- Contexto interpretativo constitucional sobre o direito de organização, greve e negociação no serviço público
As dificuldades de realização do
Estado Democrático de Direito (art. 1º, caput,
Constituição de 1988), em consonância com os Direitos Humanos, na República
Federativa do Brasil, são robustas e demarcam a falta de maturidade quanto à
efetividade da dignidade da pessoa humana, em especial, no tocante à manutenção
e incentivo de entidades instigadoras do diálogo social nas relações laborais,
sindicatos, federações, confederações e centrais sindicais.
Em termos específicos, os direitos de
sindicalização, greve e negociação encontram-se dispostos na Constituição de
1988, expressamente, no art. 37, incisos VI e VII (“é garantido ao servidor público civil o direito à livre associação
sindical”; “o direito de greve será
exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica”),
respectivamente. De tais direitos decorrem a filiação, a representação e os
direitos congêneres.
Contexto sentido na atualidade pela
“Reforma” Trabalhista (Lei nª 13.467/2017), mitigadora de direitos sociais,
pela ampliação dos casos de assédio moral nas relações de trabalho, por medidas
instigadoras do desrespeito aos direitos dos trabalhadores, tais como a
extinção do Ministério do Trabalho, firmada pela Medida Provisória nº 870, de
1º de janeiro de 2019, que estabelece a organização básica dos órgãos da
Presidência da República e dos Ministérios. Algo que vem sendo ampliado para os
servidores com a reforma da previdência, a proposta de lei de avaliação
institucional periódica, com possibilidade de despedida e a promessa de perda
da estabilidade pelo atual chefe do Poder Executivo.
Marco severo encontra-se
manifestado junto aos servidores públicos, principalmente após a declaração de
constitucionalidade de prestação de serviços por empresas interpostas
(terceirização)[i]
em atividades meio e fim dos órgãos e empresas, das ameaças de perda da
estabilidade, da reforma previdenciária, dentre outras medidas que impõem um
diálogo com as entidades sindicais representantes dos trabalhadores.
Cotidiano que clama pelo
desenvolvimento e ampliação da negociação coletiva, realizada com a necessária
participação da organização dos trabalhadores na Administração Pública, por
meio de seus representantes. Enseja agenda de trabalho e incontáveis mesas de
debate com os órgãos do Poder Público em suas mais variadas feições centralizadas,
desconcentradas e descentralizadas, conforme adotado pelo modelo administrativo
brasileiro.
Tal necessidade de negociação
por meio de representantes se torna mais urgente em face da falta de
normatização sobre o direito de greve dos servidores públicos civis, ora
funcionando precariamente por decisão do STF[ii] que
aplica em descompasso a legislação aplicada na iniciativa privada, com
alterações jurídicas que inviabilizam o direito de greve no serviço público.
Mitiga-se o direito de greve em vários aspectos, conforme destacado por Gérson
Marques[iii], em
diversos casos inviabilizando tal direito fundamental.
No passo de desconstrução, o
STF seguiu com decisões lesivas aos direitos dos servidores públicos, retirando
qualquer possibilidade de movimentos paredistas para diversas categorias[iv]. Conforme
a decisão, servidores públicos que exercem atividades relacionadas à manutenção
da ordem pública e à segurança pública, à administração da Justiça, que exercem
atividades indelegáveis, inclusive as de exação tributária e à saúde pública,
são privados do exercício do direito de greve em razão da conservação do bem
comum.
Pior, em termos coletivos, com
forte mitigação dos poderes advindos da negociação e da greve, o STF, no Recurso Extraordinário (RE) 693456, julgado em 27.10.2016,
decidiu que a administração pública deve fazer o corte do ponto dos servidores
públicos grevistas, como regra, admitindo a compensação dos dias parados
mediante acordo, sem viabilizar negociação ampliativa para fins de dispensa dos
dias parados. Para o STF o desconto não poderá ser feito somente quando o
movimento paredista tiver sido motivado por conduta ilícita do próprio Poder
Público.
É cristalina a pressão
vergastante dos direitos dos servidores públicos nas últimas gestões, com
agravamento progressivo, dando-se a urgência da atuação dos representantes dos
trabalhadores eleitos para os mandatos sindicais, além das ações judiciais, por
vias extrajudiciais e negociação para garantia da melhoria das condições de
trabalho e manutenção dos postos laborais de forma qualitativa. O que impõe a
liberação, com ônus para a administração e sem necessidade de compensação, sob
pena de perecimento maior dos direitos fundamentais e humanos, uma vez que há
grande demanda de atividades políticas, de campo, gestão e negociação
permanente. Porém, tal direito reconhecido tem sido robustamente descumprido,
com comprometimento da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, Constituição
de 1988) e Declaração Universal dos Direitos Humanos.
A Declaração Universal dos Direitos
Humanos[v], adotada
após a constatação das afrontas à humanidade geradas por determinados governos antes
e durante a Segunda Guerra Mundial, considera, em seu Preâmbulo, ser essencial
que os direitos humanos sejam protegidos pelo império da lei, para que o ser
humano não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a
opressão. Ainda, que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros
da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da
liberdade, da justiça e da paz no mundo.
Quadro em que se engendram as
principais finalidades do movimento sindical e da proteção ao direito de
organização, negociação e proteção aos representantes dos trabalhadores, com
ênfase exemplar a ser dada pela Administração Pública da República Federativa
do Brasil, ora signatária do tratado internacional sobre direitos humanos acima
mencionado. Item demarcado no Artigo 23, item 4, da Declaração Universal dos
Direitos Humanos de 1948, ao dispor que “todo
ser humano tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção
de seus interesses”.
Em teor idêntico, Convenção Americana
sobre Direitos Humanos (Assinada na Conferência Especializada Interamericana
sobre Direitos Humanos, San José, Costa Rica, em 22 de novembro de 1969),
dispõe no artigo 16 (liberdade de associação), item 1, que “Todas as pessoas têm o direito de associar-se
livremente com fins ideológicos, religiosos, políticos, econômicos,
trabalhistas, sociais, culturais, desportivos ou de qualquer outra natureza”.
Sendo claro que tal associação subentende a necessidade de representantes a
disposição para a proteção coletiva. Como destaca Gomes e Gacek:
O papel exercido pelo movimento sindical foi
imprescindível para o nascimento de uma legislação internacional, e, inclusive,
influenciou a estrutura tripartite, traço marcante da OIT. Nessa perspectiva, é
que se vislumbra a importância atribuída à liberdade de sindicalização na OIT,
hoje, não mais somente como um direito do trabalhador, mas, como parte
integrante dos direitos humanos fundamentais (ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES
UNIDAS, 1948).[vi]
Realidade que vem sendo agravada pelo
descumprimento do disposto na Convenção nº 151 da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), que trata sobre o Direito de Sindicalização e Relações de
Trabalho na Administração Pública, norma supralegal, que vem tendo seus efeitos
abruptamente reduzidos por normas hierarquicamente inferiores anteriores à
ratificação, em 2010, tais como a Lei nº 8.112/90, e infralegais, como a
Instrução Normativa nº 02 do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão
(MPOG), que impedem a liberação do servidor dirigente sindical e impõem,
conforme autorização da chefia, a compensação, inviabilizando o desenvolvimento
do trabalho de representação e negociação sindical, como será apresentado.
2. Força normativa dos tratados internacionais
ratificados e descompassos na aplicação da Convenção nº 151 da OIT quanto a
liberação
Conforme
a doutrina e a jurisprudência pátrias, há duas teorias robustas que discutem a
força normativa dos tratados internacionais sobre direitos humanos, sendo uma
ampliativa dos direitos fundamentais, inserindo como equivalentes às normas
constitucionais os tratados internacionais sobre direitos humanos ratificados,
nos termos do art. 5º, § 2º, da Constituição[vii] de
1988 (Bloco de Constitucionalidade), independente da forma de internalização; a
segunda, predominante após decisão do STF, dispõe que somente equivalem às
normas constitucionais os tratados internacionais sobre direitos humanos quando
seguida a forma disposta no art. 5º, § 3º, da Constituição[viii] de
1988, restando os que não cumprirem o disposto no § 3º mencionado a posição de
supralegalidade[ix].
Em
ambos os casos os tratados internacionais sobre direitos humanos se sobrepõem
às normas legais, as quais não podem oferecer qualquer oposição ou
contrariedade. A Convenção da OIT é um tratado multilateral aberto à
ratificação dos Estados-membros, conforme Sussekind[x],
após ratificada, o Estado, como sujeito de direito Internacional, fica obrigado
a cumpri-la.
Relevante
destacar que o caráter hierárquico e de direito fundamental de tais tratados
impõem rigor no cumprimento, conforme Bonavides, “direitos fundamentais, em rigor, não se interpretam;
concretizam-se”[xi].
No
caso da liberação dos servidores dirigentes sindicais para o exercício de suas
atividades há dispositivo na Convenção nº 151 da Organização Internacional do
Trabalho, ratificada em Decreto Legislativo nº 206 de 2010, um tratado
internacional sobre direitos humanos que garante expressamente que os
servidores representantes possam cumprir rápida e eficientemente as suas
funções, quer durante as suas horas de trabalho, quer fora delas, verbis:
PARTE
II - PROTEÇÃO DO DIREITO DE ORGANIZAÇÃO
Artigo
4
1.
Os trabalhadores da Administração
Pública devem usufruir de uma proteção adequada contra todos os atos de
discriminação que acarretem violação da liberdade sindical em matéria de
trabalho.
[...]
PARTE
III - GARANTIAS A SEREM CONCEDIDAS ÀS ORGANIZAÇÕES DE TRABALHADORES DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Artigo
6
1. Devem ser concedidas garantias aos
representantes das organizações reconhecidas de trabalhadores da Administração
Pública, de modo a permitir-lhes cumprir rápida e eficientemente as suas
funções, quer durante as suas horas de trabalho, quer fora delas.
[...]
PARTE
VI - DIREITOS CIVIS E POLÍTICOS
Artigo
9
Os
trabalhadores da Administração Pública devem usufruir, como os outros
trabalhadores, dos direitos civis e
políticos que são essenciais ao exercício normal da liberdade sindical, com
a única reserva das obrigações referentes ao seu estatuto e à natureza das
funções que exercem.
A
Convenção nº 151 da OIT tem normas de natureza auto-aplicáveis, uma vez que
suas disposições não requerem, para sua aplicação, leis complementares nos
países que as ratificaram, não podendo, porém, prejudicar as condições mais
favoráveis ao trabalhador, que vigorem no direito interno, seguindo-se as
lições de Sussekind[xii].
Contudo,
a administração tem apresentado entraves para mitigar a eficácia da Convenção
nº 151, alegando a necessidade de norma de hierarquia inferior para o efetivo
cumprimento, o que se encontra em descompasso jurídico em manifesto caráter
protelatório.
Normas
de eficácia plena, tais como regras dispostas no art. 6º, item 1, da Convenção
151 da OIT encontra-se eficazes e impõem o cumprimento imediato, seja
administrativamente ou por via judicial.
A necessidade de uma conjunção hermenêutica
para aplicação da liberação para as atividades, como garantia da liberdade
sindical dos servidores públicos, já encontra interpretações lesivas à
Convenção nº 151, tomando como base dispositivos de normas hierarquicamente
inferiores e historicamente anteriores, tais como a Lei nº 8.112/90 (dispõe
sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias
e das fundações públicas federais) e o Decreto nº 1.590, de 10 de agosto de
1995 (dispõe sobre a jornada de trabalho dos servidores da Administração
Pública Federal direta, das autarquias e das fundações públicas federais, e dá
outras providências). Contexto que contraria o sistema normativo e o
ordenamento jurídico pátrio.
Apesar
da garantia de que os servidores representantes possam cumprir rápida e
eficientemente as suas funções, quer durante as suas horas de trabalho, quer
fora delas (art. 6º, 1, C. 151/OIT), a administração tem ignorado o texto
supralegal e aplicado o disposto na Lei 8.112/90, dificultando as liberações,
impondo compensações, de regra inviáveis, com espeque nos artigos seguintes:
Art. 81.
Conceder-se-á ao servidor licença:
[...]
VII - para desempenho de mandato classista.
[...]
Art. 92. É assegurado ao servidor o direito à
licença sem remuneração para o desempenho de mandato em confederação,
federação, associação de classe de âmbito nacional, sindicato representativo da
categoria ou entidade fiscalizadora da profissão ou, ainda, para participar de
gerência ou administração em sociedade cooperativa constituída por servidores
públicos para prestar serviços a seus membros, observado o disposto na alínea c
do inciso VIII do art. 102 desta Lei, conforme disposto em regulamento e
observados os seguintes limites:
Somente
garante a licença para o exercício do mandato classista, sem compensação, no
caso de afastamento total do servidor de suas atividades, sem ônus para a
administração, sem remuneração para o obreiro e com perdas consequentes na
carreira, inviabilizando o efetivo exercício da representação sindical e a
negociação coletiva (art. 92, Lei nº 8.112). Relevante, destacar que, ainda que
o servidor se submeta a tal regime prejudicial a sua carreira e finanças
alimentares, a administração pública federal, somente libera, conforme o art.
92 mencionado, de dois a oito servidores, conforme a proporção seguinte:
I - para entidades com até 5.000 (cinco mil)
associados, 2 (dois) servidores;
II - para entidades com 5.001 (cinco mil e um) a
30.000 (trinta mil) associados, 4 (quatro) servidores;
III - para entidades com mais de 30.000 (trinta mil)
associados, 8 (oito) servidores.
Número
inadequado para a quantidade de servidores públicos federais no Brasil, que
conta com 1.183.712 (um milhão, cento e oitenta e três mil, setecentos e doze)
vínculos de servidores ativos.[xiii]
Descompasso crítico, em especial, diante das diversas problemáticas
apresentadas na justificativa deste escrito, que impõem negociação constante.
Agravado pela quantidade exaustiva de situações nos órgãos centrais e
difundidos na descentralização com as fundações públicas com personalidade
jurídica de direito público, autarquias e congêneres.
Algo
que se agrava em razão da regra geral, com imposição de compensação, somente para
situações excepcionais e a critério da chefia imediata, como se pode notar:
Art. 44, Parágrafo único. As faltas justificadas decorrentes de caso
fortuito ou de força maior poderão ser compensadas a critério da chefia
imediata, sendo assim consideradas como efetivo exercício.
Acinte,
também, pela imposição do ponto eletrônico de controle central dos servidores,
conforme o Decreto nº 1.867, de 17 de abril de 1996 (dispõe sobre instrumento
de registro de assiduidade e pontualidade dos servidores públicos federais da
Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, e dá outras
providências):
Art. 1° O registro de assiduidade e pontualidade dos
servidores públicos federais da Administração Pública Federal direta,
autárquica e fundacional será realizado mediante controle eletrônico de ponto.
Nos
termos da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, Lei nº 12.376, de
2010, art. 2º, “não se
destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou
revogue”, ressaltando-se que a Convenção nº 151 da OIT[xiv], pertence
a hierarquia superior às leis nacionais, foi introduzida no ordenamento após a
Leis 8.112/90 e encontra-se como norma supralegal, ao dispor que devem ser
concedidas garantias aos representantes das organizações reconhecidas de
trabalhadores da Administração Pública, de modo a permitir-lhes cumprir rápida
e eficientemente as suas funções, quer durante as suas horas de trabalho, quer
fora delas (art. 6º, item 1, C. 151 OIT),
revogou o art. 92 da Lei 8.112/90 que veda a liberação sem ônus, uma vez que é
incompatível com a Convenção nº 151 da OIT, nos termos do art. 2º, § 1º, da
Lei nº 12.376/2010:
§ 1o A lei posterior revoga a
anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou
quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.
A Convenção
nº 151 foi devidamente ratificada em 15/06/2010, após ter sido firmada pelo
Chefe de Estado (Presidente da República), internalizada pelo Decreto
Legislativo nº 206, de 07/04/2010 - DOU 08/04/2010, promulgada pelo Decreto nº
7.944, de 06/03/2013 - DOU 07/03/2013, como tem normas regra em seu texto, tais
como o art. 6º, item 1, ora em comento, é autoaplicável, não carecendo de mais
normas para sua eficácia. É cristalino o art. 5º, §§ 2º e 3º, da Constituição:
§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não
excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos
tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
§ 3º - Os tratados e convenções internacionais sobre direitos
humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois
turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes
às emendas constitucionais.
Do direito
constitucional à sindicalização do servidor público civil, decorre a liberação
daqueles sindicalizados do comparecimento ao trabalho, para participarem de
fóruns ou discussões sindicais, sem qualquer prejuízo de seus direitos
funcionais, assim como de tal direito fundamental decorre o direito à liberação
das funções para os dirigentes, sem ônus para os trabalhadores. A participação
dos representantes sindicais disposta na Convenção nº 151, conforme Arruda, “não gera prejuízo ao funcionamento da
máquina administrativa, até porque, ao permitir aos servidores uma maior
participação e envolvimento nas decisões das questões que lhes são
correspondentes”[xv].
Também
contrariando a Convenção nº 151 da OIT, Instrução Normativa nº 2, de 12 de
setembro de 2018, do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e
Gestão/Secretaria de Gestão de Pessoas (MPOG)[xvi],
dispõe:
Art. 36. Poderá haver a liberação do servidor
público para participar de atividades sindicais, desde que haja a compensação
das horas não trabalhadas.
Tal
artigo é incompatível com a Convenção nº 151, de modo que a União Federal
deveria ter avançado com a liberação dos servidores, uma vez que a participação
não gera prejuízo ao funcionamento da máquina administrativa, até porque, ao
permitir aos servidores uma maior participação e envolvimento nas decisões das
questões que lhes são correspondentes, estar-se-á contribuindo para o preceito
internacional de promoção
da coesão social, conforme disposto por
Afonso e Casali[xvii].
Ao
invés de conceder garantias aos representantes das organizações reconhecidas de
trabalhadores da Administração Pública, de modo a permitir-lhes cumprir rápida
e eficientemente as suas funções, quer durante as suas horas de trabalho, quer
fora delas (art. 6º, 1, C. 151), o artigo 36 da IN nº 02/2018 do MPOG dá
caráter de discricionariedade, conveniência e oportunidade, ao chefe imediato
para a participação de atividades sindicais. Em tal contexto, contraria
herculeamente o princípio da legalidade (art. 37, caput, da
Constituição de 1988), subverte o ordenamento jurídico e fere o sistema
normativo, devendo ser declarado nulo de pleno direito.
Realidade
que tem gerado forte assédio moral e condutas anti sindicais por parte de
chefes nas instituições, bem como pela natureza permanente das negociações em
um universo tão extenso de servidores, implicando em situação não decorrente de
caso fortuito ou força maior.
Até
o momento da escrita desta reflexão, somente se encontrou um caso estadual,
dentre os vinte e seis estados e o Distrito Federal da RFB, com visão mais
madura acerca da problemática ora abordada, o Parecer
nº 16.721/16 da Procuradoria do Estado do Rio Grande do Sul:
[...] a participação dos servidores em assembleias e atividades
sindicais com a dispensa do cumprimento da carga horária, deve ser autorizada
quando efetivamente exigir a presença de integrantes outros da categoria que
não sejam os representantes sindicais. Como dito, em se considerando haver
diversos servidores afastados para desempenho de mandato classista, com a
percepção da remuneração pelos cofres públicos, dedicando-se integralmente aos
interesses da categoria que representam, somente as atividades sindicais que
não possam ser exclusivamente pelos líderes classistas exercidas é que
justificam a liberação de servidores nos termos do aludido dispositivo legal.
Assim é que não cabe ao sindicato simplesmente comunicar à
Administração Superior do órgão que os servidores participarão de tal ou qual ato, mas, sim, deve, com antecedência, justificar a necessidade da presença de servidores outros que não sejam os licenciados para exercício de mandato classista, como ocorre quando a categoria precisa aprovar em assembleia o encaminhamento de determinados projetos de lei ( de reajuste, de condições de trabalho, de plano de carreira, etc), negociados entre os representantes sindicais e o Governo.
Administração Superior do órgão que os servidores participarão de tal ou qual ato, mas, sim, deve, com antecedência, justificar a necessidade da presença de servidores outros que não sejam os licenciados para exercício de mandato classista, como ocorre quando a categoria precisa aprovar em assembleia o encaminhamento de determinados projetos de lei ( de reajuste, de condições de trabalho, de plano de carreira, etc), negociados entre os representantes sindicais e o Governo.
Gize-se que a comunicação prévia à Administração pela entidade
classista acerca da natureza do evento, de modo a que possa a Direção Superior do órgão avaliar se se trata efetivamente de atividade sindical para poder, então, autorizar a liberação de servidores em número conveniente à manutenção do serviço, não representa interferência do Poder Público nos órgãos de classe, mas, sim, propicia a harmonização do exercício da liberdade sindical com as necessidades administrativas, preservando-se, assim, o interesse público.
classista acerca da natureza do evento, de modo a que possa a Direção Superior do órgão avaliar se se trata efetivamente de atividade sindical para poder, então, autorizar a liberação de servidores em número conveniente à manutenção do serviço, não representa interferência do Poder Público nos órgãos de classe, mas, sim, propicia a harmonização do exercício da liberdade sindical com as necessidades administrativas, preservando-se, assim, o interesse público.
Conforme a Procuradoria do RS,
tal liberação deve ser compatibilizada com o princípio da continuidade dos
serviços públicos e deverá, necessariamente, ser justificada. Veja o que o parecer nº
16.721/16 da Procuradoria Geral do Estado do Rio Grande do Sul diz sobre o tema:
Tem-se, então, ser imprescindível a comunicação prévia do
Sindicato à Administração Superior do órgão, com antecedência mínima de 72 horas, aplicando-se, aqui, analogicamente, a Lei de Greve, com a devida justificativa da necessidade de participação de servidores outros que não os líderes sindicais licenciados.
Sindicato à Administração Superior do órgão, com antecedência mínima de 72 horas, aplicando-se, aqui, analogicamente, a Lei de Greve, com a devida justificativa da necessidade de participação de servidores outros que não os líderes sindicais licenciados.
Em caso de autorização de participação de servidores em
assembleias ou atividades sindicais, com fundamento no inciso XVI do art. 64, da LC nº 10.098/94, deverá ser assegurada a continuidade da prestação do serviço público, conforme ajuste entre os servidores e a chefia do setor, devendo ser registrado no ponto a falta justificada e apresentado comprovante de comparecimento fornecido pelo sindicato ou associação, em que certificada, ainda, a duração do evento.
assembleias ou atividades sindicais, com fundamento no inciso XVI do art. 64, da LC nº 10.098/94, deverá ser assegurada a continuidade da prestação do serviço público, conforme ajuste entre os servidores e a chefia do setor, devendo ser registrado no ponto a falta justificada e apresentado comprovante de comparecimento fornecido pelo sindicato ou associação, em que certificada, ainda, a duração do evento.
Poderá o gestor, eventualmente, autorizar a participação de
servidores em atividades outras que não se enquadrem nas hipóteses do inciso XVI do art. 64 do Estatuto, mediante o devido cumprimento da carga horária e sem prejuízo de suas atribuições.
servidores em atividades outras que não se enquadrem nas hipóteses do inciso XVI do art. 64 do Estatuto, mediante o devido cumprimento da carga horária e sem prejuízo de suas atribuições.
Gize-se que o direito à participação em assembleias e atividades
sindicais não se restringe aos servidores filiados às entidades. Contudo,
quanto aos servidores não filiados, o afastamento deve ser restrito aos eventos
que não exijam tal condição.
Embora não haja previsão legal quanto ao número ou à
periodicidade das atividades ou assembleias sindicais, deve-se observar o princípio da razoabilidade e as circunstâncias históricas e sociais, a fim de que não se configure o abuso do exercício da liberdade sindical em detrimento do cumprimento dos deveres funcionais.
periodicidade das atividades ou assembleias sindicais, deve-se observar o princípio da razoabilidade e as circunstâncias históricas e sociais, a fim de que não se configure o abuso do exercício da liberdade sindical em detrimento do cumprimento dos deveres funcionais.
Em seguimento oposto, por exemplo, a
Universidade Federal do Ceará (UFC), autarquia federal vinculada a União
Federal, Nota Técnica nº 575/2018, impõe a necessidade de compensação de tais
horas até o mês posterior a falta para que os valores respectivos não sejam
descontados. Ampliando ainda mais o fosso entre as normas, a postura da
administração, as necessidades e a efetivação do Estado Democrático de Direito
(art. 1º, Constituição de 1988).
Está clara a desídia do Poder Público e a
necessidade de aprofundamento da luta sindical pelos servidores, como destacado
por Melo, Auditora-Fiscal do Trabalho, sobre a ratificação da Convenção nº 151
da OIT:
[...]
se as nossas entidades sindicais não pressionarem o governo federal, embora
este saiba da importância e premência da regulamentação da negociação coletiva,
esta continuará sendo uma bandeira de luta da classe dos trabalhadores públicos
e o Calcanhar de Aquiles para qualquer avanço nos seus direitos sociais.[xviii]
Quanto
aos demais estados, municípios e União Federal, impõe-se uma postura mais firme
da República Federativa do Brasil no cumprimento dos tratados internacionais
sobre direitos humanos e no aprimoramento do Estado Democrático de Direito,
garantindo a liberação dos servidores representantes sindicais, em número
suficiente, ainda que nos horários de trabalho, sem ônus financeiro ou de
compensação de jornada ao obreiro, nos termos da Convenção nº 151 da OIT.
3. Jurisprudência em amadurecimento quanto a
liberação sem compensação
Após a intensificação da cobrança de controle eletrônico[xix] de
frequência aos servidores públicos civis da União, o problema da liberação tem
ganho corpo nas demandas judiciais, uma vez que, via de regra, a administração
pública federal se recusa a reconhecer a possibilidade da liberação sem
compensação dos representantes eleitos para as entidades de classe, conforme
apresentado no tópico anterior.
Agrava-se a questão pela definição de posição da União[xx], em
2018, quanto a obrigatoriedade de compensação e discricionariedade da chefia
imediata, ensejando casos de assédio moral, inclusive. Mantendo a União postura
antissocial que contraria a Constituição e os tratados internacionais sobre
direitos humanos.
Destaque-se que a justiça comum detém a competência para
processar e julgar as questões envolvendo demandas entre os servidores
estatutários e a administração pública, dada inconstitucionalidade parcial
declarada pelo Supremo Tribunal Federal[xxi] no
art. 114, I, da Constituição de 1988, que dispunha ser a Justiça do Trabalho
competente para processar e julgar tais dissídios. O que gera mais problemas e
divergências, pela falta de trato com as questões que envolvem matéria
sindical.
Decisões com posicionamentos restritivos foram sendo
construídas sobre a matéria como a proferida pelo Superior Tribunal de Justiça
(STJ), no Recurso em Mandado de Segurança (RMS) nº 19.703-SC, Relator o
Ministro Castro Meira, julgado em 14/03/2006, data anterior à ratificação da
Convenção nº 151 da OIT:
[...] se é certo que o direito de
livre associação sindical está assegurado expressamente na Constituição
Federal, conforme previsto em seu artigo 8º, e que não é dado às autoridades
públicas intervir de modo a entravar o seu exercício, também o é que não se
mostra razoável aceitar a prática irrestrita e descompromissada desse direito.
Diversas decisões sequer mencionam a Convenção nº 151,
restringindo-se à normatização estatal, como pode ser notado em decisão do Plenário
do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe (TJSE), Mandado de Segurança (MS)
nº 201600118062, relator Desembargador Ricardo Múcio Santana de Abreu Lima, publicada
em 23/03/2017:
MANDADO DE SEGURANÇA. SINDICATO. LICENÇA SINDICAL. REMUNERAÇÃO.
RAZOABILIDADE, EFICIÊNCIA E FINALIDADE. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ORDEM CONCEDIDA PARCIALMENTE POR MAIORIA. CUSTAS EX
LEGE. SEM HONORÁRIOS. O STF e o STJ já
estabeleceram que a norma constitucional
estadual pode assegurar aos servidores públicos estaduais dirigentes sindicais
o afastamento do exercício do cargo, sem prejuízo da remuneração e das
vantagens inerentes ao cargo público. Por consequência, pode a norma estabelecer que o afastamento
se dará SEM REMUNERAÇÃO, conforme disposto na Lei Federal nº 8.112/1990 que
rege o funcionalismo público federal. A disposição do art. 278, da Constituição Estadual permite o afastamento
de servidor público para o exercício de mandato classista, sem prejuízo de
direitos e vantagens pessoais. No que se refere à remuneração, a Constituição
Estadual deve ser aplicada somente aos servidores estaduais, sendo legal a
disposição do art. 83 da Lei Municipal de Laranjeiras nº 493/1994 que foi
alterada pela Lei 1075/2015, devendo a licença para afastamento do exercício de
mandato classista, no Município de Laranjeiras, sem efetivada SEM REMUNERAÇÃO.
No que se refere ao número de servidores
que podem ser afastados, mesmo sem remuneração, é necessário que se analise o
contingente de servidores da classe abrangida pelo sindicato cessionário para
que haja razoabilidade e não seja violado o princípio da eficiência do serviço
público. Cuidando-se de entidade sindical que envolve 29 municípios é
razoável que seja cedido UM (01) Guarda Municipal por município integrante do
sindicato, até o máximo de 03 (três), em tempo integral, ou 06 (seis) em termos
de 50% (cinqüenta por cento) da jornada de trabalho. No caso do Município de
Laranjeiras, a licença se dará SEM REMUNERAÇÃO, por força de Lei municipal.
Apesar da decisão ter sido favorável aos servidores no caso, ao dispor
que “pode a norma estabelecer que o
afastamento se dará SEM REMUNERAÇÃO, conforme disposto na Lei Federal nº
8.112/1990 que rege o funcionalismo público federal”, quedou a decisão em
prejuízo aos dirigentes em geral, pecando por não ter aplicado dispositivos da
Convenção nº 151 da OIT, ora defendido (Art. 6º, 1¸in fine)[xxii].
A ausência de fundamentação adequada com relação ao tratado
internacional ora em estudo, permeia as decisões recentes, como na Primeira
Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF01), AP/RN nº
00038737620104013400, relator Jamil Rosa de Jesus Oliveira, publicada em
10/09/2018:
ADMINISTRATIVO.
SERVIDOR PÚBLICO. MANDADO DE SEGURANÇA. DISPENSA DE SERVIDOR DA RECEITA
FEDERAL. PARTICIPAÇÃO EM ATIVIDADE SINDICAL. PORTARIAS Nº 1.143/2008 E Nº
2.266/2009 DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL. REQUISITOS CUMPRIDOS. APELAÇÃO E
REMESSA OFICIAL DESPROVIDAS. [...] A Constituição
de 1988 assegura, em seu art. 8º, o direito à livre associação sindical e o
desempenho de atividades sindicais. Contudo, o afastamento do servidor
público de suas atividades para o exercício de mandato sindical imprescinde de
previsão legal, tendo a Lei 8.112/90 previsto, em seu art. 92, a licença de
servidor público nos casos de desempenho de mandato em entidade sindical ou
associativa, mas sem a remuneração. 3. A Receita
Federal do Brasil editou a Portaria nº 1.143/2008, estabelecendo normas para concessão de dispensa de ponto de servidor da
Carreira de Auditoria da Receita Federal para participação em eventos
promovidos por entidades representativas de classe, prevendo como requisito,
no § 2º de seu art. 2º, apenas a
necessidade de apresentação da programação mensal de atividades específicas da
diretoria, no mês anterior à sua realização, com as limitações posteriores da
Portaria RFB nº 2.226/2009, que estatuiu o
prazo 60 (sessenta) dias úteis, por ano, para servidor que esteja no exercício
de mandato, em cargo de direção de natureza nacional participar de eventos
realizados pela entidade sindical. 4. As Portarias nº 1.143/2008 e nº
2.266/2009 não restringiram a liberação do servidor somente a eventos que se
destinassem ao aperfeiçoamento do servidor público, nem mesmo que se devesse
ser levada em conta a sua relevância pela Administração Pública, porque a
finalidade era beneficiar a atividade sindical. 5. Apelação e remessa oficial
desprovidas.
Na decisão acima, o Tribunal deixa clara a possibilidade de liberação do dirigente, com ônus para a administração,
por meio de normas infralegais (portarias), mas não se arvora em destacar a
previsão na Convenção nº 151 da OIT. Destacava a norma em tela dois requisitos criados pela portaria, a
saber, comunicação prévia do evento à Coordenação Geral de Gestão de Pessoas e
o requerimento de liberação de servidores em quantidade condizente com a
prevista, algo que foi disposto em outra ação sobre a matéria, julgada pela A
Segunda Turma do TRF-1ª Região, AP/RN: 00274069820094013400, relator João Luiz
de Sousa, publicado em 05/07/2018, destacou-se:
ADMINISTRATIVO.
MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. PARTICIPAÇÃO DE FORMAÇÃO SINDICAL.
SINDICATO. LEGITIMIDADE ATIVA. DISPENSA DE PONTO. 1. A jurisprudência tem
entendido ser desnecessária autorização expressa dos filiados de sindicato para
ajuizamento de ação em defesa de direito da categoria, quando existir
permissivo genérico contido no estatuto da entidade. Precedentes deste Tribunal
(AC 2007.38.00.021898-2 / MG; APELAÇÃO CIVEL Relator(a) DESEMBARGADOR FEDERAL
FRANCISCO DE ASSIS BETTI Relator Convocado JUIZ FEDERAL CÉSAR CINTRA JATAHY
FONSECA (CONV. ) Data da Decisão; 18/10/2017, e-DJF1 DATA:10/11/2017) 2. À
época dos fatos esposados na narrativa vestibular já existia regulamentação
vigente para a dispensa de servidores: a Portaria RFB nº 1.143, de 14 de julho
de 2008. O regramento apresentava exigências que foram devidamente satisfeitas
pelo apelado, quais sejam: comunicação
prévia do evento à Coordenação Geral de Gestão de Pessoas e o requerimento de
liberação de servidores em quantidade condizente com a prevista no art. 3º
da citada Portaria (fl. 67). 3. Apelação desprovida.
As decisões mencionadas, por estarem com fundamentação que
desconsidera a existência da Convenção nº 151 da OIT, pautam-se em normas
anteriores a ratificação, infelizmente reforçam o artigo 92 da Lei 8.112/90 que
assegura ao servidor o direito à licença sem remuneração para o desempenho de
mandato classista. Assim, no inteiro teor das decisões em tela destaca-se que se
trata de desconto na remuneração do servidor para participação em atividades
sindicais, e não propriamente exercer mandato. Em determinados trechos
ressaltam que “não obstante a ausência de
previsão legal para a dispensa de servidores com pagamento de remuneração”,
reduzindo-se robustamente a aplicação do ordenamento jurídico, considerando-se
a Convenção nº 151 da OIT.
Contudo, a jurisprudência é omissa quanto a questão, com consequente
ampliação dos problemas no Estado Democrático de Direito. Há necessidade de
proteção do direito a participação sindical, de forma ampla sem ônus para o
servidor, identificando como imperativo que a administração pública adote ações
compatíveis com a convenção 151 da OIT.
Nos casos de controle de ponto no órgão da administração, deve ocorrer
o abono de sua frequência, a ser registrada como falta justificada, desde que
haja prévio requerimento do sindicato indicando quais dirigentes precisaram
comparecer a atividade sindical.
Do direito constitucional à associação do servidor público civil
decorre a liberação daqueles sindicalizados do comparecimento ao trabalho, para
participarem de fóruns ou discussões sindicais, sem qualquer prejuízo de seus
direitos funcionais. Referida dispensa, de forma abrangente, restringe-se à
dirigentes e delegados sindicais, conforme decidido pelo Tribunal de Justiça do
Espírito Santo, Recurso nº 100090009224, que teve como relator o Desembargador
Carlos Roberto Mignone, julgado em 04/05/2009, publicado em 08/06/2009
destacou:
RECURSO
ADMINISTRATIVO SINDICATO DE SERVIDOR PÚBLICO CIVIL - ASSEMBLÉIA GERAL - ABONO
DE FREQUÊNCIA - INDICAÇAO DE DIRETORIA - DIREITO DE ASSOCIAÇAO - AUSÊNCIA DE
PREJUÍZO - RECURSO IMPROVIDO - 1. Do
direito constitucional à associação do servidor público civil, decorre a
liberação daqueles sindicalizados do comparecimento ao trabalho, para
participarem de foruns ou discussões sindicais, sem qualquer prejuízo de seus
direitos funcionais, entretanto, tal deferência depende de seleção pela
entidade sindical a que pertença, sob pena de liberação indiscriminada aos
sindicalizados estabelecer conflito entre mencionado direito com o dever também
constitucional de eficiência da atividade estatal (CF., art. 8º). Ademais,
segundo entendimento doutrinário referida dispensa, de forma abrangente,
restringe-se à dirigentes e delegados sindicais.2. Recurso improvido.
No caso acima, percebe-se a utilização soft law¸ estando o direito internacional postado em tratados
internacionais sobre direitos humanos como norte interpretativo, uma vez que os
textos da Convenção nº 151 e da Recomendação nº 159, da Organização
Internacional do Trabalho, são ambos de 1978, abordando as relações de trabalho
na administração pública. Os quais somente passaram a direito cogente, hard law, após internalizados no
ordenamento jurídico pátrio pelo Decreto Legislativo nº 206, de 2010. A decisão
se mostra madura e reflete bom paradigma para a atualidade, podendo ser
respaldada, na atualidade, pelo disposto na Convenção nº 151 da OIT.
Após a ratificação da Convenção nº 151, o Conselho Nacional de
Justiça, instado a se manifestar sobre o tema, no
Pedido de Providências nº 000664-70.2014.2.00.0000, oferecido pelo SINDJUS
contra a Direção do Foro Central da Comarca de Porto Alegre em função do Ofício
Circular nº 01/2014-DF, proferiu decisão relevante para fins de liberação. Estabeleceu,
no caso, a importância de apresentação de comprovante fornecido pelo
sindicato ou associação, em que certificada a duração do evento.
“O presente pedido de providências objetiva, em suma, a
cassação do Ofício Circular nº 01/2014, do Exmo. Juiz Diretor
do Fôro Central da Comarca de Porto Alegre (TJ-RS), que
tem o seguinte teor:
cassação do Ofício Circular nº 01/2014, do Exmo. Juiz Diretor
do Fôro Central da Comarca de Porto Alegre (TJ-RS), que
tem o seguinte teor:
“Senhores Magistrados, Escrivães e Servidores:
Informamos que a eventual participação em atividade sindical
dos servidores que não detêm cargo eletivo deverá ser precedida de autorização do magistrado titular da unidade na qual estiver lotado o servidor.”
Informamos que a eventual participação em atividade sindical
dos servidores que não detêm cargo eletivo deverá ser precedida de autorização do magistrado titular da unidade na qual estiver lotado o servidor.”
Posteriormente, em 27 de fevereiro de 2014, o ato
administrativo foi alterado e novamente publicado com os
seguintes termos:
administrativo foi alterado e novamente publicado com os
seguintes termos:
“Senhores Magistrados, Escrivães e Servidores:
Em retificando, em parte, os termos do Ofício-Circular n.01/2014 DF, datado de 08/01/2014, o comparecimento dos servidores lotados nesta Comarca de Porto Alegre, nas assembleias convocadas pelas suas entidades de classe, ficará condicionada, para eventual abono de falta, apenas, e tão somente, à comprovação por parte do interessado do seu comparecimento, através de documento firmado e fornecido pelo sindicato ou associação pertinente.”
Em retificando, em parte, os termos do Ofício-Circular n.01/2014 DF, datado de 08/01/2014, o comparecimento dos servidores lotados nesta Comarca de Porto Alegre, nas assembleias convocadas pelas suas entidades de classe, ficará condicionada, para eventual abono de falta, apenas, e tão somente, à comprovação por parte do interessado do seu comparecimento, através de documento firmado e fornecido pelo sindicato ou associação pertinente.”
Depreende-se da leitura dos atos
editados e das informações prestadas pelo Tribunal local, a preocupação em
manter a ordem dos trabalhos desenvolvidos pelos serviços judiciários e evitar
abusos. Isso porque a ausência de servidor(es) sindicalizado(s) do ambiente
regular de trabalho, sem que haja qualquer controle, pode gerar prejuízo ao
andamento dos serviços, em detrimento dos seus usuários e destinatários finais.
Não se divisa, no ato impugnado,
qualquer intento de obstaculizar a atividade sindical. Observo que esse ato é
inclusive destinado apenas a regular a “participação em atividade sindical
dos servidores que não detêm cargo eletivo” - (sublinhei), isto é, dos
servidores em geral, não ocupantes de funções diretivas na entidade sindical
que lhes representa. Quanto aos servidores
detentores de cargo eletivo, são eles usualmente dispensados de suas atividades
para dedicação exclusiva à atividade sindical, independentemente de
autorização.
De outra parte, destaque-se que o tribunal requerido admitiu
o abono de falta ao trabalho de servidor não ocupante de
cargo eletivo para participação em assembleias, mediante
comprovação de comparecimento, por meio de “documento
firmado e fornecido pelo sindicato ou associação pertinente”.
o abono de falta ao trabalho de servidor não ocupante de
cargo eletivo para participação em assembleias, mediante
comprovação de comparecimento, por meio de “documento
firmado e fornecido pelo sindicato ou associação pertinente”.
A manutenção do ato do
Tribunal pelo CNJ, no caso acima, viabilizando a participação nas assembleias
convocadas pelas entidades de classe, condicionada, para eventual abono de
falta, apenas, e tão somente, à comprovação por parte do interessado do seu
comparecimento, através de documento firmado e fornecido pelo sindicato ou
associação pertinente, apesar de não tratar da Convenção nº 151 da OIT,
representa avanço na discussão, podendos ser utilizada como paradigma.
Por estes motivos, não é
crível obstar o bom desempenho das funções dos dirigentes sindicais
desautorizando o seu comparecimento a assembleias e atividades sindicais sobre
pena de cometimento de conduta anti sindical, atentatória as disposições
previstas na Convenção 151 da OIT.
Portanto, desde que a necessidade de
ausência do dirigente sindical para participar de assembleia ou atividade
sindical seja previamente comunicada pelo Sindicato respectivo, deve a chefia
imediata anotar tal falta como justificada, desde que comprovado o efetivo
comparecimento ao evento, não podendo haver quaisquer descontos na sua
remuneração.
Observa-se que a exigência de
compensação tem por consequência o desconto remuneratório caso não observada, o
que vem em prejuízo do direito à liberdade sindical e ao interesse público,
como entendeu recentemente o Tribunal Regional Federal da 1ª Região Ação
Cautelar nº 0027406-98.2009.4.01.3400, relator Desembargador João Luís de
Sousa, publicado no Diário da Justiça eletrônico de 05/07/2018:
[...]
Sabendo-se que os vencimentos dos servidores públicos apresentam
natureza alimentar, não devem ser favorecidas interpretações ou analogias que
se prestem a fazer descontos em tal remuneração e, além disso, desestimulem o
exercício do direito (constitucionalmente posto) à liberdade sindical.
Embora a União aduza que a reunião sindical a que compareceriam os
servidores não teria finalidade de satisfação do interesse público, urge
consignar que o favorecimento do direito à liberdade sindical configura, em si
mesmo, realização do interesse público.
[...]
Assim, considerando a previsão
constitucional ao direito à livre associação sindical, reprisado pela Lei n.
8.112/90, tem-se que a IN nº 02/2018 afigura-se desarrazoada e afrontosa ao
princípio da liberdade sindical, ao impor a compensação.
Naturalmente, recomenda-se que a
requisição de dirigentes sindicais para comparecimento em tais atividades seja
sempre dosada de forma a tentar minorar ao máximo os prejuízos para a prestação
dos serviços públicos, bem como tal requisição deve se dar em periodicidade
condizente com tal preceito.
4. Conclusões
Conforme observado, há forte clima de
instabilidade relacionado aos direitos e conquistas dos servidores públicos na
República Federativa do Brasil, impondo atuação ostensiva das entidades de
classe, como forma de efetivação do Estado Democrático de Direito, a qual impõe
a participação efetiva dos representantes sindicais, com consequente
necessidade de liberações sem ônus para os dirigentes.
A Convenção
nº 151 foi devidamente ratificada em 15/06/2010, após ter sido firmada pelo
Chefe de Estado (Presidente da República), internalizada pelo Decreto
Legislativo nº 206, de 07/04/2010 - DOU 08/04/2010, promulgada pelo Decreto nº
7.944, de 06/03/2013 - DOU 07/03/2013, como tem normas regra em seu texto, tais
como o art. 6º, item 1, ora em comento, é autoaplicável, não carecendo de mais
normas para sua eficácia. Preenche-se todos os requisitos dispostos no art. 5º,
§§ 2º e 3º da Constituição de 1988.
O art. 6º, item 1, da Convenção nº
151 OIT, revogou o art. 92 da Lei 8.112/90 que veda a liberação sem ônus, uma
vez que é incompatível com a Convenção nº 151 da OIT, nos termos do art. 2º, §
1º, da Lei nº 12.376/2010. Assim, nos termos do artigo da Convenção ora
mencionado, devem ser concedidas garantias aos representantes das organizações
reconhecidas de trabalhadores da Administração Pública, de modo a permitir-lhes
cumprir rápida e eficientemente as suas funções, quer durante as suas horas de
trabalho, quer fora delas.
Do direito constitucional à
associação do servidor público civil, decorre a liberação daqueles
sindicalizados do comparecimento ao trabalho, para participarem de fóruns ou
discussões sindicais, sem qualquer prejuízo de seus direitos funcionais, assim
como de tal direito fundamental decorre o direito à liberação das funções para
os dirigentes, sem ônus para os trabalhadores.
O Poder Judiciário ainda não traçou
análises consistentes acerca da aplicação da Convenção nº 151 da OIT, mas tem
aceito, inclusive, que normas infraconstitucionais como portarias possam
garantir a liberação dos servidores para participação em atividades sindicais,
conforme a jurisprudência apresentada.
Falta interesse político por parte do
Estado para o cumprimento da Convenção da OIT, bem como apreciação específica
pelo Poder Judiciário, inclusive, para fins de dar tratamento igualitário
dentro do Pacto Federativo, uma vez que diversas constituições estaduais, leis
estaduais e municipais liberam servidores dirigentes sindicais em número
proporcional a representação com ônus para a administração e demais servidores
para a participação das atividades e eventos sindicais, conforme demonstrado.
Urge que sejam tomadas providências
urgentemente, em especial, por via extrajudicial e negocial para que se agilize
o cumprimento do art. 6º, item 1, da Convenção nº 151 da Organização
Internacional do Trabalho, bem como alteradas as instruções normativas e
contrárias à tal tratado internacional sobre direitos humanos ratificado pela
República Federativa do Brasil.
Bibliografia
AFONSO, Túlio Tayano; CASALI, Rodrigo Guedes. Práticas sindicais,
negociação coletiva e a Convenção n. 151 da OIT. Fls. 95-108. In: SILVA,
Clarissa Sampaio; GOMES, Ana Virginia Moreira. [ORG]. A Convenção n. 151 da OIT
sobre o Direito de Sindicalização e Negociação na Administração Pública -
Desafios na Realidade Brasileira.
ARRUDA, Kátia Magalhães. Prefácio. In: SILVA, Clarissa
Sampaio; GOMES, Ana Virginia Moreira. [ORG]. A Convenção n. 151 da OIT sobre o
Direito de Sindicalização e Negociação na Administração Pública - Desafios na
Realidade Brasileira.
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São
Paulo: Malheiros, 1998.
GACEK, Stanley A.; GOMES, Ana Virginia Moreira. A garantia
do direito à negociação coletiva no serviço público pela Organização
Internacional do Trabalho. In: SILVA, Clarissa Sampaio; GOMES, Ana Virginia
Moreira. [ORG]. A Convenção n. 151 da OIT sobre o Direito de Sindicalização e
Negociação na Administração Pública - Desafios na Realidade Brasileira. Acesso
em 11.01.2019.
GÉRSON MARQUES, Francisco G. M. de Lima. O Supremo
Tribunal Federal na crise institucional brasileira. São Paulo: Malheiros, 2009.
MELO, Carmem Cenira Pinto Lourena. A Autoaplicabilidade da
Convenção 151 da OIT. In:
https://www.sinait.org.br/arquivos/artigos/Artigo_127.pdf.
SUSSEKIND, Arnaldo. O Brasil e a organização internacional
do trabalho. In:
https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/93665/009_sussekind.pdf?sequence=1.
*Clovis Renato
Costa Farias. Graduado em Letras e Direito. Doutor em Direito pela
Universidade Federal do Ceará (UFC), advogado, membro do GRUPE e da Excola,
professor universitário. Currículo Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?metodo=apresentar&id=K4212473Z8
[i] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). Arguição por Descumprimento de
Preceito Fundamental (ADPF) nº 324 e o Recurso Extraordinário (RE) nº 958252.
Julgamento em 30.08.2018.
[ii] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). Mandados
de Injunção (MIs) 670, 708 e 712, julgado em 25.10.2007.
[iii] GÉRSON MARQUES, Francisco G. M. de Lima.
O Supremo Tribunal Federal na crise institucional brasileira. São Paulo:
Malheiros, 2009.
[iv] EMENTA: RECLAMAÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO.
POLICIAIS CIVIS. DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE. SERVIÇOS OU ATIVIDADES PÚBLICAS
ESSENCIAIS. COMPETÊNCIA PARA CONHECER E JULGAR O DISSÍDIO. ARTIGO 114, INCISO
I, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIREITO DE GREVE. ARTIGO 37, INCISO VII, DA
CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. LEI N. 7.783/89. INAPLICABILIDADE AOS SERVIDORES
PÚBLICOS. DIREITO NÃO ABSOLUTO.
RELATIVIZAÇÃO DO DIREITO DE GREVE EM RAZÃO DA ÍNDOLE DE DETERMINADAS ATIVIDADES
PÚBLICAS. AMPLITUDE DA DECISÃO PROFERIDA NO JULGAMENTO DO MANDADO DE
INJUNÇÃO N. 712. ART. 142, § 3º, INCISO IV, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.
INTERPRETAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO. AFRONTA AO DECIDIDO NA ADI 3.395. INCOMPETÊNCIA
DA JUSTIÇA DO TRABALHO PARA DIRIMIR CONFLITOS ENTRE SERVIDORES PÚBLICOS E ENTES
DA ADMINISTRAÇÃO ÀS QUAIS ESTÃO VINCULADOS. RECLAMAÇÃO JULGADA PROCEDENTE. 1. O
Supremo Tribunal Federal, ao julgar o MI n. 712, afirmou entendimento no
sentido de que a Lei n. 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de
greve dos trabalhadores em geral, é ato normativo de início inaplicável aos
servidores públicos civis, mas ao Poder Judiciário dar concreção ao artigo 37,
inciso VII, da Constituição do Brasil, suprindo omissões do Poder Legislativo.
2. Servidores públicos que exercem
atividades relacionadas à manutenção da ordem pública e à segurança pública, à
administração da Justiça --- aí os integrados nas chamadas carreiras de Estado,
que exercem atividades indelegáveis, inclusive as de exação tributária --- e à
saúde pública. A conservação do bem
comum exige que certas categorias de servidores públicos sejam privadas do
exercício do direito de greve. Defesa dessa conservação e efetiva proteção
de outros direitos igualmente salvaguardados pela Constituição do Brasil. 3.
Doutrina do duplo efeito, segundo Tomás de Aquino, na Suma Teológica (II Seção
da II Parte, Questão 64, Artigo 7). Não há dúvida quanto a serem, os servidores
públicos, titulares do direito de greve. Porém, tal e qual é lícito matar a
outrem em vista do bem comum, não será ilícita a recusa do direito de greve a
tais e quais servidores públicos em benefício do bem comum. Não há mesmo dúvida
quanto a serem eles titulares do direito de greve. A Constituição é, contudo,
uma totalidade. Não um conjunto de enunciados que se possa ler palavra por
palavra, em experiência de leitura bem comportada ou esteticamente ordenada.
Dela são extraídos, pelo intérprete, sentidos normativos, outras coisas que não
somente textos. A força normativa da Constituição é desprendida da totalidade,
totalidade normativa, que a Constituição é. Os servidores públicos são,
seguramente, titulares do direito de greve. Essa é a regra. Ocorre, contudo,
que entre os serviços públicos há alguns que a coesão social impõe sejam
prestados plenamente, em sua totalidade. Atividades das quais dependam a
manutenção da ordem pública e a segurança pública, a administração da Justiça
--- onde as carreiras de Estado, cujos membros exercem atividades indelegáveis,
inclusive as de exação tributária --- e a saúde pública não estão inseridos no
elenco dos servidores alcançados por esse direito. Serviços públicos
desenvolvidos por grupos armados: as atividades desenvolvidas pela polícia
civil são análogas, para esse efeito, às dos militares, em relação aos quais a
Constituição expressamente proíbe a greve [art. 142, § 3º, IV]. 4. No
julgamento da ADI 3.395, o Supremo Tribunal Federal, dando interpretação
conforme ao artigo 114, inciso I, da Constituição do Brasil, na redação a ele
conferida pela EC 45/04, afastou a competência da Justiça do Trabalho para
dirimir os conflitos decorrentes das relações travadas entre servidores
públicos e entes da Administração à qual estão vinculados. Pedido julgado
procedente. (Rcl 6568, Relator(a): Min.
EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 21/05/2009, DJe-181 DIVULG 24-09-2009
PUBLIC 25-09-2009 EMENT VOL-02375-02 PP-00736)
[v] ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração Universal dos Direitos Humanos - Adotada e
proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas (resolução 217 A III) em 10
de dezembro 1948. In: https://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10133.html.
Acesso em 01.01.2019.
[vi] GACEK, Stanley A.; GOMES, Ana Virginia
Moreira. A garantia do direito à negociação coletiva no serviço público pela
Organização Internacional do Trabalho. In: SILVA, Clarissa Sampaio; GOMES, Ana
Virginia Moreira. [ORG]. A Convenção n. 151 da OIT sobre o Direito de
Sindicalização e Negociação na Administração Pública - Desafios na Realidade
Brasileira. Acesso em 11.01.2019.
[vii] Art. 5º, § 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não
excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos
tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
[viii] § 3º Os tratados e convenções
internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do
Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos
membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004)
(Atos
aprovados na forma deste parágrafo: DLG nº 186, de 2008, DEC 6.949, de 2009,
DLG 261, de 2015, DEC 9.522, de 2018)
[ix] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). Recurso
Extraordinário nº 466.343-1 São Paulo, Tribunal Pleno, julgamento em
03.12.2008.
[x]
SUSSEKIND, Arnaldo. O Brasil e a organização internacional do trabalho. In:
https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/93665/009_sussekind.pdf?sequence=1.
Acesso em 11.01.2019.
[xi]
BONAVIDES, Paulo. Curso
de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 523.
[xii]
SUSSEKIND, Arnaldo. O Brasil e a organização internacional do trabalho. In:
https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/93665/009_sussekind.pdf?sequence=1.
Acesso em 11.01.2019.
[xiii] GOVERNO FEDERAL. Portal da Transparência.
In:
http://www.portaltransparencia.gov.br/servidores. Acesso em 04.01.2019.
[xiv] Ratificada em
15/06/2010, após ter sido firmada pelo Chefe de Estado (Presidente da
República), internalizada pelo Decreto Legislativo nº 206, de 07/04/2010 - DOU
08/04/2010, promulgada pelo Decreto nº 7.944, de 06/03/2013 - DOU 07/03/2013.
[xv] ARRUDA, Kátia Magalhães. Prefácio. In:
SILVA, Clarissa Sampaio; GOMES, Ana Virginia Moreira. [ORG]. A Convenção n. 151
da OIT sobre o Direito de Sindicalização e Negociação na Administração Pública
- Desafios na Realidade Brasileira. Acesso em 11.01.2019.
[xvi] Estabelece
orientação, critérios e procedimentos gerais a serem observados pelos órgãos e
entidades integrantes do Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal -
Sipec, quanto à jornada de trabalho de que trata o art. 19 da Lei nº 8.112, de
11 de dezembro de 1990, regulamentado pelo Decreto nº 1.590, de 10 de agosto de
1995 e pelo Decreto nº 1.867, de 17 de abril de 1996, que dispõem sobre o
controle de frequência, a compatibilidade de horários na acumulação remunerada
de cargos, empregos e funções, aplicáveis aos servidores públicos, em exercício
nos órgãos e entidades integrantes da Administração Pública Federal direta,
autárquica e fundacional
[xvii] AFONSO, Túlio Tayano; CASALI, Rodrigo
Guedes. Práticas sindicais, negociação coletiva e a Convenção n. 151 da OIT.
Fls. 95-108. In: SILVA, Clarissa Sampaio; GOMES, Ana Virginia Moreira. [ORG]. A
Convenção n. 151 da OIT sobre o Direito de Sindicalização e Negociação na
Administração Pública - Desafios na Realidade Brasileira. Acesso em 11.01.2019.
[xviii] MELO, Carmem Cenira Pinto Lourena. A
Autoaplicabilidade da Convenção 151 da OIT. In: https://www.sinait.org.br/arquivos/artigos/Artigo_127.pdf.
Acesso em 11.01.2019.
[xix] REPÚBLICA FEDERATIVA DO
BRASIL. Decreto nº 1.867, de 17 de abril de 1996, que dispõe sobre instrumento
de registro de assiduidade e pontualidade dos servidores públicos federais da
Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, e dá outras
providências. Art. 1º.
[xx] MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO,
DESENVOLVIMENTO E GESTÃO/SECRETARIA DE GESTÃO DE PESSOAS. Instrução Normativa
nº 2, DE 12 DE SETEMBRO DE 2018. Art. 36.
[xxi] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 3.395, relator
Ministro Cezar Peluso, j. 5-4-2006, P, DJ de 10-11-2006. Ementa: Competência.
Justiça do Trabalho. Incompetência reconhecida. Causas entre o poder público e
seus servidores estatutários. Ações que não se reputam oriundas de relação de
trabalho. Conceito estrito dessa relação. Feitos da competência da Justiça
comum. Interpretação do art. 114, I, da CF, introduzido pela EC 45/2004.
Precedentes. Liminar deferida para excluir outra interpretação. (...) O
disposto no art. 114, I, da CF não abrange as causas instauradas entre o poder
público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária.
[xxii] ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO
(OIT). Convenção nº 151. Artigo 6; 1. Devem ser
concedidas garantias aos representantes das organizações reconhecidas de
trabalhadores da Administração Pública, de modo a permitir-lhes cumprir rápida
e eficientemente as suas funções, quer durante as suas horas de trabalho, quer
fora delas.
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