DÉFICIT E
DÍVIDA PÚBLICA
Riscos de
transferência da Crise para o Brasil
Maria Lucia
Fattorell i[1]
Assistimos,
nos últimos dias, às crescentes mobilizações sociais que têm levado centenas de
milhares de pessoas às ruas, em toda a Europa, protestando contra as drásticas
conseqüências da crise da dívida pública que atinge fortemente a economia
européia e a vida de seus cidadãos.
Muito se comenta sobre a necessidade de pagar a
dívida e o remédio empregado pela Comissão Européia, juntamente com o FMI e o
Banco Central Europeu, é um amargo composto de medidas de ajuste fiscal:
reforma da previdência visando aumentar a idade para aposentadoria e reduzir
benefícios dos trabalhadores; demissão de milhares de servidores públicos;
corte de serviços públicos; aumento de tributos; privatizações, dentre outras.
Pouco se comenta que essa crise da dívida decorre
principalmente da crise do setor financeiro bancário deflagrada em 2008: os
maiores bancos internacionais do planeta corriam risco de quebra, devido ao
excesso de derivativos sem lastro e outros produtos financeiros sem respaldo e
sem valor algum – chamados de “ativos tóxicos[2]” pela grande mídia. Imensurável quantidade de sucessivas séries e mais séries desses papéis
podres criaram uma “bolha” que inundou o mercado financeiro mundial de
verdadeiro “lixo”.
A crise
atingiu primeiramente os grandes bancos norte-americanos, atolados desses
papéis podres. A emissão descontrolada de tais produtos financeiros foi
possibilitada porque os controles existentes, determinados pela SEC[3] – órgão
criado logo após a crise de 1929 e que desde então exercia o papel de controlar
a qualidade e autenticidade dos papéis negociados no mercado financeiro – foram
desrespeitados por diversas grandes instituições financeiras[4].
A quantidade de derivativos e papéis tóxicos
alcançou níveis tão elevados que o Presidente Barack Obama chegou a mencionar a
criação de “bad banks”, instituições que se prestariam a acatar volumes
expressivos desses papéis podres, realizando uma “faxina” para aliviar o
sistema financeiro americano[5]. Outra proposta
do presidente do FED norte-americano Ben Bernanke foi a criação de “big bad
banks”, ou “aggregator bank”, uma super instituição capaz de absorver
quantidades ainda maiores desses papéis podres.
A mesma
idéia surgiu também na Europa no início de 2009, conforme notícia divulgada
pelo jornal Financial Times[6]:
“Os ativos tóxicos de problemáticos bancos alemães
serão evacuados para “bad banks” sob um plano governamental, segundo o
Finantial Times.
Ao invés de instalar um “bad bank”
nacional, o governo alemão quer que os bancos organizem veículos individuais
para amparar seus ativos ilíquidos.”
É importante ressaltar que as instituições que
emitiram esses ativos tóxicos eram as maiores e mais importantes do mundo
financeiro internacional, porque estas eram justamente as que possuíam
credibilidade suficiente para ter seus próprios papéis acatados e negociados no
Mercado financeiro.
Apenas algumas dessas importantes
instituições chegaram a quebrar – Lehman Brothers, por exemplo – mas logo os Estados Unidos aprovaram plano de salvamento do sistema financeiro
que incluiu a estatização de parte do Citibank e outras transferências
bilionárias de recursos públicos para instituições do sistema financeiro
privado, a fim de salvá-las e impedir sua falência.
Destino
diferente tem sido enfrentado por inúmeros fundos de pensão, que passam por
grandes dificuldades[7], deixando trabalhadores completamente desamparados. Esse tema merece
atenção total no Brasil, tendo em vista os riscos de transferência de
ativos tóxicos para o País, ao mesmo tempo em que a União, estados e municípios
impulsionam a criação de fundos de pensão para servidores públicos.