A Corte Especial do Superior Tribunal de
Justiça (STJ), seguindo o voto da relatora da ação penal, ministra Laurita Vaz,
recebeu nesta quarta-feira (5) denúncia contra um desembargador federal do
Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5). Ele é acusado de ser, juntamente
com sua mulher, o mandante do assassinato do radialista Nicanor Linhares,
ocorrido em 2003.
A relatora considerou que a acusação deixa
clara a existência de desavenças entre acusado e vítima, decorrentes dos
diferentes interesses políticos locais, notoriamente conflitantes. A ministra
considerou que os depoimentos colhidos no inquérito servem como elementos
indiciários das ameaças de morte, aptos a subsidiar a tese da acusação.
“A
versão do Ministério Público Federal encontra respaldo nos relatos até aqui
referidos, os quais, em juízo prelibatório, tornam verossímil a acusação”,
asseverou a ministra. Para a magistrada, estes testemunhos, aliados ao cenário
delineado pela denúncia permitem concluir que há “fundados indícios da
animosidade existente entre denunciado e vítima, bem como das sérias ameaças
lançadas contra sua vida”.
“Neste
momento processual, não se estão buscando provas cabais e perfeitas, mas
elementos indiciários que possam justificar o recebimento da denúncia, ou seja,
justa causa para a ação penal”, explicou Laurita Vaz. Conforme a relatora, a
Corte Especial analisa a admissibilidade da acusação, sem a exigência da
dissecação total das provas colhidas, tampouco a instauração de amplo
contraditório, a fim de se proceder a juízo definitivo sobre a verdade dos
fatos.
Histórico
Em 2004, o Ministério Público Federal requereu
a instauração de inquérito contra o desembargador federal e sua mulher, à época
prefeita da cidade onde o crime ocorreu, Limoeiro do Norte (CE). Em 10 de março
de 2008, o MPF ofereceu a denúncia. O relator à época era o ministro Hamilton
Carvalhido, atualmente aposentado. Em 25 de março de 2011, o ministro deu-se
por impedido. Em 15 de abril do mesmo ano, os autos foram redistribuídos à
ministra Laurita Vaz.
O crime teria como motivação desavenças
políticas, iniciadas no ano 2000, entre o radialista, a esposa do desembargador
e o próprio magistrado. Nicanor seria um crítico da administração da
ex-prefeita e apoiaria a oposição. Segundo a denúncia, o desembargador teria
ameaçado de morte o radialista em mais de uma oportunidade, inclusive com
agressões físicas e invadindo, armado, a rádio em que a vítima trabalhava.
Também um deputado a quem o radialista apoiava
teria recebido notícia da encomenda da morte do aliado dias antes do crime.
Nicanor não teria acreditado que o atentado se daria antes de 2004, ano de
eleições municipais.
A defesa alegou, entre outros pontos, que a
acusação seria baseada em provas falhas, falsas ou irreais. Juntou documentos
em mais de seis volumes nos autos. O desembargador disse que tinha “apenas
desafeição” pela vítima, que se estabeleceu por simples defesa emocional da
esposa. Em 12 de março de 2012, a defesa juntou acórdão de apelação criminal
que confirmou a absolvição do sargento do Exército a quem a denúncia atribui o
papel de ter contratado, a mando do casal, os pistoleiros que executaram o crime.
Os autos foram encaminhados ao MPF em 26 de
março de 2012 para manifestação. Em 12 de setembro, foram conclusos à ministra
Laurita Vaz, que pautou o processo para a sessão de 21 de novembro passado. O
julgamento foi adiado para 5 de dezembro a pedido da defesa.
Em 29 de novembro, a defesa ainda juntou
certidão que atesta a absolvição da esposa pela 1ª Vara da Comarca de Limoeiro
do Norte, tendo em conta a decisão que absolveu o suposto contratante dos
pistoleiros.
Preliminar
Em uma das preliminares arguidas, a defesa
sustentou que seria impossível subsistir a acusação contra o desembargador,
tendo em vista a absolvição, com trânsito em julgado, do sargento inicialmente
apontado como o intermediário na contratação dos pistoleiros, a mando do magistrado.
Pediu o reconhecimento da “insubsistência da acusação”.
O ponto foi rejeitado por unanimidade pela
Corte Especial. “Malgrada a possibilidade de incongruência entre os
julgamentos, em decorrência da absolvição do acusado de intermediar a
contratação dos executores do homicídio, há de se observar a especial
peculiaridade dos julgamentos realizados pelo tribunal do júri, composto por
juízes leigos, pessoas do povo, cujo veredicto é soberano e, por isso, não
guarda relação de dependência com o julgamento dos coautores ou partícipes”,
ressaltou a ministra Laurita Vaz.
Para a relatora, da soberania do veredicto do
júri popular “podem decorrer situações que, eventualmente, fujam da lógica
ordinária, com a possibilidade de coexistência de decisões conflitantes, mas
que o ordenamento jurídico admite, por se cuidar de decisão soberana e
independente, tomada por juízes leigos, de quem não se exigem as razões de
decidir”, completou.
A ministra ainda destacou que três réus em
ações penais sobre o mesmo crime já foram condenados a penas que variam de oito
a 26 anos de reclusão.
Afastamento
Com o recebimento da denúncia, a Corte
Especial ainda deliberou sobre o afastamento do desembargador do exercício do
cargo no TRF5. A maioria da Corte acompanhou a proposta da ministra Laurita
Vaz, para quem há “notória incompatibilidade do exercício da atividade
jurisdicional com a séria acusação irrogada ao réu”.
No entanto, não tendo sido alcançado o quórum
qualificado de dois terços dos ministros, o réu permanecerá no cargo. A Corte
Especial é formada pelos 15 ministros mais antigos do Tribunal.
O número deste processo não é divulgado em
razão de sigilo judicial.
Fonte: STJ
Nenhum comentário:
Postar um comentário