Carta Aberta da ANAMATRA
Defender a independência
funcional da Magistratura na aplicação da Lei 13.467/2017, relativa à reforma
trabalhista. O argumento foi levado pela vice-presidente da Anamatra, Noemia
Porto, e pela diretora de Cidadania e Direitos Humanos da entidade, Luciana Conforti,
aos participantes da 107ª Conferência Internacional do Trabalho, evento
promovido pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), em Genebra, até o
dia 8 de junho.
Estrutura da ONU |
Uma das ocasiões em que a carta
foi entregue aconteceu nesta quinta (31/5), durante reunião promovida pela
Confederação Latino-Americana e Caribe dos Trabalhadores e das Trabalhadoras
Estatais (CLATE). O encontro teve por objetivo debater “O Futuro do Trabalho no
Serviço Público”, tema que se insere na temática da Conferência e reuniu
diversas representações de trabalhadores, empregadores e governos de países
latino-americanos.
A Carta Aberta denuncia que, a
partir da aprovação da Lei 13.467/2017, os magistrados e magistradas do
trabalho passaram a sofrer inúmeras tentativas de intervenção na sua
independência judicial e frequentes ataques, inclusive no âmbito parlamentar e
pela mídia, havendo até mesmo ameaças de extinção da Justiça do Trabalho, caso
não aplicassem o novo texto de forma literal. “A independência judicial, no
entanto, constitui um dos primados de um sistema de justiça que se possa
considerar democrático e consentâneo com o compromisso de realização das normas
de proteção dos direitos humanos, inclusive dos direitos humanos trabalhistas”,
pontua o documento.
A vice-presidente da Anamatra
manifestou-se na reunião e destacou os resultados do 19º Conamat, principal
congresso da Magistratura do trabalho brasileira, ocorrido em maio deste ano em
Belo Horizonte, especialmente em dois aspectos. Primeiro, quanto ao livre
exercício da função jurisdicional em sua forma plena, que contempla a
prerrogativa de aplicação do Direito mediante a interpretação da norma em
conjunto com as regras e princípios constitucionais e suas hierarquias, assim
como em concordância harmônica com os tratados e convenções internacionais de
que o Brasil seja parte. Segundo, no que pertine à importância e necessidade de
existência da Justiça do Trabalho no Brasil como órgão do Poder Judiciário
essencial ao funcionamento do sistema de Justiça e para a pacificação dos
conflitos, reequilibrando as desigualdades sociais existentes.
Na avaliação de Noemia Porto, a
Carta Aberta repercutiu na representação tripartite de outros países que
observaram com preocupação os movimentos que visam a fragilizar o sistema de
justiça no Brasil. “É dever da Anamatra publicizar, debater e denunciar todas
as formas e os instrumentos que tenham por finalidade agredir a independência
judicial, seja mediante ameaças de extinção da Justiça do Trabalho, seja por
matérias da mídia que classificam pejorativamente a atuação da Magistratura.
Defender a independência técnica dos juízes e das juízas é o mesmo que defender
a democracia e o Estado de Direito”. Durante a reunião, representantes da
Aliança Internacional para uma Ampla Proteção dos Trabalhadores que protegem os
recursos, a transparência e a eficácia do Estado, afirmaram que denúncias sobre
agressões à independência judicial têm vindo de diversos países.
Na mesma linha, a diretora de
Cidadania e Direitos Humanos, Luciana Conforti, defende que “o tema da
independência de atuação institucional, compromissária da Constituição e das
normas internacionais, revela-se sensível para os organismos internacionais. De
fato, o funcionamento independente das instituições, livres de quaisquer ameaças,
é vista como fundamental para coibir desequilíbrios e a permanência das
desigualdades, aspectos centrais para a qualidade da democracia brasileira”.
“Short list” - O Brasil está na
“short list” da OIT, rol dos dos 24 casos mais graves que Organização investigará
por violação a normas internacionais do trabalho. O ingresso do país, decidido
durante a 107ª Conferência, explica-se pelos entraves impostos pela reforma
trabalhista ao direito de sindicalização e de negociação coletiva, previstos na
Convenção nº 98. Clique aqui e saiba mais.
Participantes - A mesa da reunião
conta com a participação, entre outros, dos seguintes representantes: Julio D.
Fuentes-Presidente CLATE, Luc Coorteck-Presidente del Consejo de Administración
OIT y Miembro de la Comisión de Alto nivel de la OIT s/El futuro del Trabajo,
Rosa Pavanelli-Secretaria General de la Internacional de Servicios
Públicos-ISP, María Helena André-Directora de ACTRAV/OIT, Matias
Cremonte-Presidente de la Asociación Argentina de Abogados Laboralistas y Vicepresidente
de la Asociación Latinoamercana de Ab. lab., Altagracia Jimenez
Puello-CONATE/CASC-Rep. Dominicana y Presidenta Alterna de la CSA, Sergio
Arnaud-Director de RRII-CSBP(Brasil) y Secretario General adjunto CLATE, Raquel
Gonzales-Secretaria General del Grupo de Trabajadores OIT y Representante
permanente de la CSI en Ginebra e Victor Baez Mosqueira-Secretario General de
la CSA/CSI.
Ofício do Ministro do Trabalho à
OIT sobre a Lista Suja
Brasília, 28 de maio de 2018
Ao Senhor
GUY RYDER
Diretor Geral da Organização
Internacional do Trabalho Genebra - Suíça
Assunto: 107ª Reunião da
Conferência Internacional do Trabalho da OIT. Trabalhos do Comitê de Peritos.
Possível exame do caso brasileiro na Comissão de Aplicação de Normas
Senhor Diretor,
Ao cumprimentá-lo pelo excelente
trabalho à frente da OIT, gostaria de externar-lhe preocupações com o exame de
alguns aspectos da reforma trabalhista realizado pelo Comitê de Peritos bem
como com a recente inclusão do Brasil na lista longa de casos a serem potencialmente
examinados pela Comissão de Aplicação de Normas da OIT (CAN) durante a IOT
Conferência Internacional do Trabalho.
2. Como sabe, o Relatório do
Comitê de Peritos (CEACR) deste ano trouxe algumas considerações críticas sobre
a reforma trabalhista brasileira, em atenção a demanda de centrais sindicais
brasileiras. Incomoda-me que o CEACR tenha realizado exame da situação
brasileira "fora do ciclo regular" sem justificação objetiva,
transparente e adequada para tanto. O Brasil apresentou memórias sobre a aplicação
da Convenção 98, na "lei e na prática", ainda em 2016, devendo ser
chamado a apresentar novo relatório apenas em 2019, para posterior avaliação do
CEACR.
3. Embora exista previsão para o
CEACR avaliar casos de países fora do ciclo regular de memórias, resta evidente
não terem sido respeitados os critérios desenvolvidos pelo Comitê para tanto,
uma vez que, à luz do teor dos comentários dos próprios peritos sobre o caso
brasileiro, não haveria motivo para a urgência. Ademais, como a reforma trabalhista
entrou em vigor em novembro de 2017, não transcorreu intervalo de tempo
suficiente para o CEACR analisar a nova legislação "na prática", o
que é parte inafastável de seu mandato. As observações baseiam-se, de outra
sorte, em especulações abstratas sobre o possível alcance e consequências de
alguns dispositivos da nova legislação, as quais, se nada significam na falta
de análise circunstanciada de sua aplicação, dão margem a um uso
político-ideológico do caso brasileiro já a partir de sua inclusão no relatório.
4. A eventual inclusão do Brasil
na lista curta durante o prazo para que o Governo apresente sua reação aos
comentários do CEACR (a vencer em 1 0 de setembro) constitui, por sua vez,
pré-julgamento sobre os objetivos e impactos da reforma, de forma contrária aos
melhores princípios e práticas de direito, mesmo em contextos não estritamente
judiciais como o da CAN. Tal pré-julgamento se torna ainda mais grave no atual
contexto eleitoral, vindo a servir, caso o Brasil seja incluído na lista curta,
e qualquer que seja a conclusão final da CAN a respeito, como instrumento para
uso midiático no Brasil e politização indevida da própria OIT. Registre-se que
de nenhuma das Ações Diretas de Inconstitucionalidade em relação à reforma que
se encontram em tramitação junto ao Supremo Tribunal Federal versa sobre os
pontos levantados pelas centrais ao Comitê. Mais de dois terços delas, por
outro lado, versam sobre o fim da contribuição sindical obrigatória, o que
parece ser a principal preocupação das centrais sindicais, assim como a
principal justificativa para os ataques ao Governo.
5. No que concerne a aspectos de
fundo, permito-me sublinhar que o texto da Convenção 98, em vários
dispositivos, faz referência às "condições nacionais" para as
obrigações que estabelece. Os comentários do CEACR não levam em conta, nesse
contexto, a extensão e a qualidade — provavelmente únicas no mundo — da
proteção constitucional que o Brasil oferece aos direitos trabalhistas.
6. Tampouco procede a análise do
CEACR ao invocar os "trabalhos preparatórios" da Convenção 154 em
apoio à sua interpretação de que, à luz da Convenção 98, acordos coletivos s '
podem prever ampliação de beneficios previstos em lei, já que durante os
trabalhos preparatórios se concluiu apenas que negociações de condições mais
benéficas deveriam ser permitidas, não havendo proibição, por outro lado, a
negociações que levassem a situações distintas do que está previsto em lei.
7. Usar os trabalhos
preparatórios à Convenção 154 para interpretação do sentido de provisões da
Convenção 98, em si, já causa preocupação, de vez que constitui claro desvio do
que seriam os métodos mais usuais de interpretação. Leitura literal do texto da
Convenção 98, em contrapartida, não deixa dúvida de que seu sentido é promover
negociações livres e irrestritas, precisamente o que a reforma buscou
assegurar, sem descurar, contudo, de um conjunto amplo de proteções legais cuja
derrogação foi expressamente afastada pelo legislador.
8. Em suma, a forma enviesada e
parcial como a reforma brasileira foi examinada pelo Comitê de Peritos, bem
como a eventual inclusão do Brasil na lista curta da Comissão de Normas
representam, na minha avaliação, forte golpe na legitimidade e credibilidade
dos trabalhos técnicos realizados pelo Comitê de Peritos, impactando também na
própria avaliação geral da Organização, que sempre mereceu o mais profundo
respeito do Governo e dos atores sociais.
9, Esperamos poder continuar
contando com a cooperação da OIT, e de seu Secretariado, no desenvolvimento de
trabalhos de notável qualidade técnica e grande impacto social, sem que os
elevados propósitos que inspiraram a criação da Organização sejam desvirtuados
pelo jogo político-ideológico que alguns atores querem transferir a esse foro.
Atenciosamente,
Helton Yomura, Ministro de Estado
do Trabalho
Ao Senhor
Helton Yomura
Exmo. Sr. Ministro de Estado do
Trabalho da República Federativa do Brasil
Assunto: 107ª Reunião da
Conferência Internacional do Trabalho da OIT
Senhor Ministro,
Ao cumprimentá-lo, gostaríamos de
externar lhe preocupações com o exame de alguns aspectos da sua correspondência
ao Diretor Geral da Organização Internacional do Trabalho, em Genebra, Suíça,
por ocasião da 107º Sessão da Conferência Internacional do Trabalho da
Organização Internacional do Trabalho.
2. Como sabe, o Relatório do
Comitê de Peritos (CEACR) deste ano trouxe algumas considerações críticas sobre
a reforma trabalhista brasileira, em atenção à “demanda de Centrais Sindicais”
de nosso país.
2.1. Incomoda-nos que o Brasil,
pelo Ministério do Trabalho, sem justificação objetiva, pretenda valer-se de
Relatório e de suas memórias sobre a aplicação da Convenção nº 98, na lei e na
prática, aludindo à sua situação jurídico-trabalhista de 2016, quando é certo
que as profundas alterações impostas à organização sindical e à legislação
trabalhista brasileira foram levadas a efeito por meio da Lei nº 13.467, de 13
de julho de 2017. Assim, não nos parece razoável o governo pretender escusar-se
ver a legislação nacional tecnicamente apreciada por pretender atribuir
exclusividade ao procedimento ordinário de Reclamação com fundamento em
relatório fundado em norma formalmente revogada, desprezando a possibilidade do
procedimento de controle extraordinário.
3. Reconhece Vossa Excelência que
a Comissão de Peritos (CEACR) atuou segundo previsão expressa de apreciação de
casos de países fora do ciclo regular de memórias. Não poderia uma alteração
que afeta um país do significado e importância do Brasil, nação de cerca de 207
milhões de habitantes e 14 milhões de desempregados, ficar isenta de qualquer
apreciação da convencionalidade de sua profunda alteração jurídica por parte de
um organismo internacional do relevo e importância da OIT.
3.1. As alterações impostas não
podem ser tidas como “especulações abstratas”. Os efeitos concretos na
sociedade brasileira expressam-se no acréscimo imediato dos conflitos coletivos
de trabalho e a tentativa de imputar à análise da OIT um uso político
ideológico do caso brasileiro reverte contra o próprio governo, que se recusa à
apreciação técnico jurídica de suas regras por uma especulação abstrata do uso
político desse exame.
4. A inclusão do Brasil na lista
curta dos casos não impede a defesa do país no prazo que lhe foi assinado pelo
processo na Comissão de Peritos (CEACR). Longe de pré-julgamento, há uma
apreciação exauriente de aspectos não convencionais da modificação imposta pelo
especioso processo legislativo que deu luz à chamada Reforma Trabalhista
brasileira.
4.1. Não se confunda controle de
convencionalidade ou responsabilidade internacional pelo descumprimento de
normas internacionais com controle de constitucionalidade. A menção à ausência
de ações diretas de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal
revela notável confusão dos papéis institucionais do Judiciário brasileiro e da
Organização Internacional do Trabalho.
4.2. Não se confunda também,
ataque à atecnia, inconstitucionalidade e inconvencionalidade da reforma com o
que V. Exa. chama de “ataques ao Governo” brasileiro. O governo brasileiro não
está sob análise – para o seu próprio bem – de qualquer organismo
internacional. No entanto, os compromissos internacionais por desprezados podem
ser objeto de apreciação técnica e eficiente de controle, dentro de um quadro
de institucionalidade a ser respeitada, por órgãos internacionais integrantes
do Sistema ONU, como a OIT.
5. “Condições nacionais” a serem
observadas pela OIT não autorizam violações às convenções internacionais,
notadamente quanto ao secular princípio da progressividade das normas
trabalhistas.
6. “Situações distintas do que
está previsto em lei” em sede de negociação coletiva não permitem autorização
plena para a negociação puramente regressiva das garantias sociais.
7. O apego do Governo às “interpretações
literais” já nos permite solicitar um prudente silêncio interpretativo.
Negociações “livres e irrestritas” jamais tiveram o sentido de liberação de
negócios restritivos de direitos.
8. Impressiona também que o
Governo brasileiro queira estabelecer à OIT os melhores critérios de
interpretação de sua própria norma. Acusar o organismo de ensejar “forte golpe
na legitimidade e credibilidade dos trabalhos técnicos realizados pelo Comitê
de Peritos” autorizaria, houvesse na organização algum intuito político, a
redarguir questionando os conceitos de golpe, legitimidade e credibilidade do
governo brasileiro. Nesse âmbito de discussão, elevado, internacional e
técnico, não se deve chegar a tanto. Por isso, a ABRAT se exime de promover
qualquer adjetivação da nota de Vossa Excelência, que houve por bem apelar para
os termos “enviesada e parcial”.
9. Se o governo brasileiro supõe
que a OIT esteja sob a sua “avaliação geral”, comete o equivoco comparável ao
da pessoa sujeita ao controle que pretende, antes de respeitar a sua
apreciação, controlar o órgão controlador.
9.1. A ABRAT, assim, espera poder
continuar contando com a cooperação do Governo Brasileiro para com a OIT, sem
que os elevados propósitos do organismo internacional sejam desvirtuados pelo
jogo político, partidário e ideológico em que o Governo incide num ano
eleitoral.
Atenciosamente,
Delegação da Associação
Brasileira de Advogados Trabalhistas – ABRAT, em Genebra.
Roberto Parahyba de Arruda Pinto
Presidente
Alessandra Camarano Martins
Vice-presidente
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