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sábado, 14 de maio de 2016

Carta de Liberdades Sindicais: Verbete 20 – Tutela Coletiva nos Dissídios Coletivos: paridade de armas (Clovis Renato Costa Farias)


Capítulo escrito por Clovis Renato Costa Farias na Obra “Carta de Liberdades Sindicais”, publicada pelo Ministério Público do Trabalho em 2016, organizada pelo Prof. Dr. Gérson Marques. ISBN nº 978-85-67589-28-2

A tutela coletiva nas ações que envolvem a discussão sobre o aprimoramento das relações de trabalho devem partir do reconhecimento das entidades representativas e da legitimidade de seus atos. Em sua realização devem mitigar a desigualdade existente entre trabalhador e empregador na relação laboral (hipossuficiência social), ínsitas ao sistema capitalista de produção.
Desse modo, as movimentações coletivas   laborais (negociação, mediação, paralisação, conciliação, dissídio coletivo, etc.) devem ser garantidas para assegurar a legalidade e a paridade de armas entre as entidades, sob o balizamento da equidade e do socialmente aceitável.

Algo que deve envolver as ações extrajudiciais e a judicialidade, quando a participação do Estado, via Poder Judiciário, for provocada.
Destaque-se a compreensão de que “dissídios coletivos”, presente no verbete, traz em si a noção de que as relações que envolvam a discussão de direitos coletivos dos trabalhadores, tais como a formação de Acordo (ACT), Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) e greve, seus delineamentos e sua adequação ao ordenamento jurídico pátrio devem ser tratadas pelo instrumento processual Dissídio Coletivo, nos termos normatizados pelos parágrafos do art. 114 da Constituição de 1988, da CLT, das Leis nº 4.725/65 e nº 7.701/88.
Contextualização relevante diante da prática nacional recorrente que tem levado juízes de primeira instância a julgarem ações que não deveriam ser manejadas para tais fins no Processo do Trabalho, tais como o interdito proibitório. O que tem inviabilizado o direito de greve e frustrado diversos instrumentos legítimos de negociação e pressão dos trabalhadores, especialmente pela falta de razoabilidade nas tutelas concedidas. 
Tal posicionamento encontra-se demarcado pelo Supremo Tribunal Federal que editou a Súmula Vinculante nº 23, a qual dispõe que a Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar ação possessória ajuizada em decorrência do exercício do direito de greve pelos trabalhadores da iniciativa privada. Postura da qual se discorda, com o devido respeito.
Nesses termos, em sede de Dissídio Coletivo, as tutelas proferidas devem servir para assegurar a legalidade e a paridade de armas entre as entidades, sob o balizamento da equidade e do socialmente aceitável.
Para tanto, em caso de dissídio coletivo de natureza econômica, deve ser observada a Constituição para respeitar as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente. Ademais, somente deve ser aceita a proposição da ação em caso de comum acordo e o ingresso via Ministério Público somente deve ocorrer em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público. Neste último caso, quando a ação tiver de ser manejada pelo MPT, este deve agir com razoabilidade e primando pelo incentivo à negociação coletiva, para que se evite a intervenção intempestiva do Estado nas relações coletivas de trabalho, em descumprimento de outras normas fundamentais (art. 8º, III, CF/88).
No mesmo passo, em caso de concessão de tutelas em sede de dissídio coletivo de greve, deve-se primar pela observação do cumprimento, por ambas as partes, do disposto na legislação de greve. Assim, antes da concessão das tutelas, deve o Poder Judiciário primar pelo incentivo e respeito às negociações coletivas prévias, cumprindo as leis de greve quanto às relações obrigacionais ou à conciliação, evitando, ao máximo, as liminares sem ouvida da parte contrária, sob pena de malferir irreversivelmente o direito de greve e instigar a litigiosidade judicial.
Ademais, em caso de decisão relacionada ao afastamento dos movimentos reivindicatórios das proximidades da empresa, o Poder Judiciário deve tomar as devidas cautelas para não inviabilizar a pressão decorrente da visibilidade objetivada pelos trabalhadores. É imperativo que sejam evitadas decisões, recorrentes na contemporaneidade, que afastam em demasia os movimentos pacíficos dos locais de trabalho, com imposição de multas de grande vulto contra os sindicatos e membros da categoria.
Deve-se evitar tutelas que imponham a retirada das faixas e demais materiais de divulgação da greve e instalações dos comandos locais de greve das proximidades da empresa.  Decisões contrárias ferem diversas liberdades sindicais, normas constitucionais e tratados internacionais, com crescente desmoralização das entidades representativas, da diretoria e dos trabalhadores em greve.
A Recompilação de Decisões e dos Princípios do Comitê de Liberdade Sindical do Conselho de Administração da Organização Internacional do Trabalho (OIT), cuja função consiste em contribuir para a efetiva aplicação dos princípios gerais da liberdade sindical, que constitui uma das garantias primordiais da paz e da justiça social, dispõe que  “o respeito das garantias processuais não é incompatível com um processo equitativo e rápido; pelo contrário, uma delonga excessiva pode ter efeito intimidatório nos dirigentes envolvidos, com repercussão no exercício de suas atividades” (v. 103); “a falta de garantias de um processo judicial regular pode envolver abusos e ter como resultado que dirigentes sindicais acabem vítimas de decisões infundadas. Além disso, pode criar um clima de insegurança e de temor susceptível de influir no exercício dos direitos sindicais”.
Ainda, conforme a Recompilação, “o direito de greve e o direito de organizar reuniões sindicais são elementos essenciais do direito sindical, razão pela qual as medidas tomadas pelas autoridades para fazer respeitar a legalidade não deveriam ter como efeito impedir os sindicatos de organizar na ocasião de conflitos do trabalho” (v. 131); “os trabalhadores devem poder gozar do direito de manifestação pacífica para defender seus interesses profissionais” (v. 132); “as autoridades só deveriam recorrer à força pública quando a ordem pública se achasse realmente ameaçada” (v. 137); “a autorização para fazer reuniões e manifestações públicas, que constituem importante direito sindical, não deve ser negada arbitrariamente” (v. 139); “enquanto os sindicatos devem observar as disposições legais para a manutenção da ordem pública, as autoridades públicas devem abster-se de qualquer ingerência que reduza o direito dos sindicatos de organizar e realizar reuniões com plena liberdade” (v. 144).
Desse modo, torna-se de extrema relevância o verbete em comento, por haver recorrente mitigação dos direitos de greve e manifestação em grade parte das tutelas concedidas pelo Poder Judiciário na atualidade, as quais devem seguir, no mínimo, os balizamentos normativos nacionais e internacionais, conforme disposto acima, otimizando os direitos fundamentais.

(Clovis Renato Costa Farias)
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