Relato de
uma sessão realizada em Arouca, por
António Costa e Manuel Brandão Alves (publicado no jornal Discurso Directo).
Subordinada
a estas questões, realizou-se no auditório
do Geopark, no passado sábado,
dia 5 de Abril, uma sessão de esclarecimento e debate.
A sessão foi
organizada pela IAC – Iniciativa para uma Auditoria Cidadã à Dívida – e contou
com a presença dos seguintes oradores,
investigadores e activistas da IAC:
* Drª Isabel
Castro – ex deputada de ”Os Verdes”;
* Prof.
Doutor José Maria Castro Caldas – investigador de Centro de Estudos Sociais da
Universidade de Coimbra;
* Prof.
Doutor José Reis – Director da Faculdade de Economia de Coimbra.
A
apresentação da IAC e dos oradores, e a moderação da Sessão, foram feitas pelos
nossos conterrâneos, Prof. Doutor Manuel
Brandão Alves e Dr. António Costa, respectivamente.
O número
significativo de presentes e a participação activa no debate demonstraram o interesse pelo tema da “dívida” e das suas consequências sobre a vida de cada um e
sobre a vida do país.
Os
intervenientes realizaram exposições muito sugestivas e esclarecedoras, que
permitiram aos presentes obter uma compreensão mais completa e aprofundada
sobre a questão da dívida, do que a que habitualmente é transmitida, quer pelos
meios de comunicação social, quer pela maioria dos actores políticos das mais
variadas famílias.
Em
particular, foi abordada a questão da
natureza da dívida, tendo sido apresentados dados quantitativos sobre a sua
origem e evolução. Foi sublinhado que, até 2008 (início da crise financeira), o
peso da dívida pública portuguesa não era muito diferente da de outros países
da União Europeia e que foi a partir dessa data que se verificou uma forte
aceleração do seu peso no PIB. Esse aumento de peso não ficou tanto a
dever-se ao acréscimo da dívida primária, mas antes ao montante dos juros, que
aumentaram exponencialmente em razão das taxas especulativas que passaram a ser
exigidas ao nosso país. Em 2011
realizou-se uma nova aceleração, agora consequência do empréstimo contraído
junto da Troika, melhor dizendo, junto das instituições que esta representa.
Na sequência
destas considerações, tornou-se compreensível quão distorcida é
a afirmação de que a actual situação dos portugueses é uma consequência dos
seus desmandos de comportamento (andaram a gastar acima das suas
possibilidades!). Com efeito, sendo verdade que uma parte do consumo e do
investimento realizado foi feito à custa crédito contraído, não é menos verdade
que as instituições creditícias incitavam à realização de operações de crédito
arriscadas, não se vendo porque é que o risco deve ser imputado só a quem foi
financiado e não a quem financiou. Para além disso, é bem conhecido que se
vivia num clima de enorme liquidez (abundância de dinheiro) a nível
internacional, que suscitava a realização de operações arriscadas.
Se é verdade
que esse risco existiu nas operações de consumo e de investimento real, muito
mais verdade é que as grandes operações de financiamento se realizaram em
produtos financeiros, ditos inovadores, que com o desencadear da crise arrastaram
enormes prejuízos para as instituições financeiras que, na ausência de
regulação financeira adequada, se organizaram de modo a transferir os seus
prejuízos para quem se encontrava, ou poderia vir a encontrar, em situação de
maior debilidade.
Na actual
situação do país, e apesar dos anúncios de descompressão da situação económica
e financeira, foi mostrado que é incontornável ponderar os riscos e as
vantagens, da manutenção ou, em alternativa, da reestruturação da dívida.
Trata-se de caminhos que, com frequência, são mostrados como vias únicas e
inquestionáveis. A exposição realizada mostrou que seguir por um ou outro dos
caminhos não é indiferente para o presente e futuro dos portugueses dependendo
a opção tomada, finalmente, dos pressupostos políticos e ideológicos dos
responsáveis das decisões em causa.
Através das
exposições realizadas, mostrou-se, com clareza que as decisões relativas à
dívida, que têm vindo a ser tomadas, não podiam deixar de ter consequências
gravosas sobre o dia-a-dia dos portugueses com menores rendimentos, como todos
vemos em nosso redor, mas igualmente sobre uma das conquistas mais emblemáticas
do pós-guerra e, em Portugal, do 25 de Abril, que foi a construção do Estado
Social. O Estado Social não pode ser considerado como uma benesse oferecida aos
que têm menores rendimentos, mas antes como uma consequência da afirmação e
garantia dos direitos humanos e sociais universais, da igualdade de género e da
sustentabilidade ambiental.
A
participação no debate foi muito interessante e animada. Para além de questões
em torno das apresentações feitas pelos especialistas (como, por exemplo, sobre
quem são os culpados pela dívida e quais as consequências do não pagamento da
dívida), levantaram-se outras interrogações em torno do Estado Social e dos
riscos que uma eventual saída do euro poderá colocar.
Do conjunto
do debate tirou-se a conclusão de que, apesar
da oportunidade da sua realização, muitas outras questões paralelas ou
derivadas mereciam iniciativas idênticas. Houve, inclusive, quem sugerisse
que se viessem a realizar sessões com características equivalentes. Trata-se de
um sinal inequívoco de que as pessoas não estão alheadas da discussão dos
problemas que tem consequências sobre as suas vidas ou as vidas dos seus
concidadãos.
Finalmente:
“a dívida é pública ou é privada?”. Depois de toda a discussão realizada, a
resposta é a de que à dívida lhe têm vestido uma
roupagem de “pública” mas, de facto, ela não é mais do que fazer pagar pelos
poderes públicos os desmandos dos poderes privados.
E, ainda: “o
pagamento da dívida arrasta a destruição do país?”. Foi questão que não houve
oportunidade de abordar com a profundidade que seria desejável. No entanto,
ficou claro que aquilo que é observável na vida dos portugueses não pode deixar
de se observar na vida do país.
Fonte:
http://auditoriacidada.info/article/d%C3%ADvida-%C3%A9-p%C3%BAblica-ou-privada-o-pagamento-da-d%C3%ADvida-arrasta-destrui%C3%A7%C3%A3o-do-pa%C3%ADs-0
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