“[...] Nenhum poder coercitivo global existente ou
concebível pode controlar diretamente todos os Estados de uma vez, nem mesmo o
poderio militar dos Estados Unidos, o mais forte que o mundo já viu e o mais
desproporcionalmente superior ao de qualquer rival em potencial. Em vista
disso, uma nova doutrina militar está se desenvolvendo nos Estados Unidos, que
pode representar uma tentativa de dominar esta complexa realidade e que está
ameaçando o mundo todo.
A administração Bush está desenvolvendo a doutrina da guerra
permanente, sem alvos ou objetivos identificáveis, e sem final. Somos
informados de que este tipo de guerra sem fim é necessária para confrontar
adversários sem Estado na ‘guerra contra o terrorismo’. Porém, como uma
estratégia de combate ao terrorismo não é muito convincente, provavelmente
agravará o problema que se propõe a resolver. Uma estratégia desse tipo não é
muito eficiente contra inimigos sem Estado.
Tem, no entanto, um sentido perverso ao lidar com o sistema
global de Estados na qualidade de um poder imperial cuja hegemonia depende, não
da captura de territórios ou da subordinação de colônias, mas do controle
cotidiano da economia global, administrada e implementada por Estados locais.
Como os militares estadunidenses não podem estar em todos os lugares ao mesmo
tempo, o melhor que o Estado americano pode fazer é manter sua imensa e
desproporcional força militar como um aviso constante, criando uma ameaça
permanente de guerra, com amostras regulares da guerra verdadeira e de seu
corolário: a crescente supressão da democracia e das liberdades civis.
A guerra contra o Iraque é, naturalmente, o exemplo típico
dessa doutrina militar. Seu objetivo não consistiu apenas em consolidar o
controle estadunidense sobre as reservas mundiais de petróleo, mas também em
fazer um ‘efeito demonstração’. Os Estados Unidos escolheram especialmente esta
guerra para enviar sua mensagem ao mundo sobre a hegemonia global americana,
não porque o Iraque representasse qualquer tipo de ameaça ao poder imperial ou
a qualquer de seus aliados, mas, pelo contrário, porque não havia nenhuma
ameaça significativa e os Estados Unidos podiam dar ao mundo o espetáculo de ‘choque
e pavor’ com um risco mínimo.
É verdade que a ocupação do Iraque parece estar revertendo
para a forma antiga de colonização direta. Mas, de um modo geral, a preferência
dos Estados Unidos – e de todo o imperialismo capitalista – é evitar o domínio
colonial direto e confiar na hegemonia puramente econômica, que é menos
custosa, menos arriscada e mais lucrativa. Não obstante a ocupação do Iraque, a
estratégia preferida ainda é manter a hegemonia econômica sem afundar no
domínio colonial direto e comandar a economia global através de Estados locais
complacentes. O inconveniente é que essa complacência não pode ser garantida e
o sistema global de múltiplos Estados pode ficar perigosamente instável. Em
conseqüência, esse grandioso – e freqüentemente contraditório – projeto
imperial tende a empurrar a potência imperial para aventuras militares e tende
a criar seus próprios imperativos territoriais.”
(WOOD, Ellen Meiksins. O
que é (anti)capitalismo?. Net: http://www.ifch.unicamp.br/criticamarxista/arquivos_biblioteca/critica17-A-wood.pdf. p. 47-48. Acesso em 09/março/2014)
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