Existe atualmente uma
tentação generalizada em se supor que a classe é uma coisa.
[...] ‘Ela’, a classe operária, é tomada como tendo uma existência real, capaz
de ser definida quase matematicamente – uma quantidade de homens que s encontra
numa certa proporção com os meios de produção. Uma vez isso assumido, torna-se
possível deduzir a consciência de classe que ‘ela’ deveria ter (mas raramente
tem), se estivesse adequadamente consciente de sua própria posição e interesses
reais. Há uma superestrutura cultural, por onde esse reconhecimento desponta
sob formas ineficazes. Essas ‘defasagens’ e distorções culturais constituem um
incômodo, de modo que é mais fácil passar para alguma teoria substitutiva: o
partido, a seita ou o teórico que desvenda a consciência de classe, não como
ela e, as como deveria ser.
Mas um erro semelhante e diariamente cometido do outro lado
da divisória ideológica. Sob uma forma, é uma negação pura e simples. [...]
assume-se que qualquer noção de classe é uma construção pejorativa, imposta às
evidências. Nega-se absolutamente a existência da classe. Sob outra forma, e
por uma inversão curiosa, é possível passar de uma visão dinâmica para uma
visão estática de classe. ‘Ela’ – a classe operária – existe, e pode ser
definida com alguma precisão como componente da estrutura social. A consciência
de classe, porém, é algo daninho, inventado por intelectuais deslocados, visto
que tudo o que perturba a coexistência
harmoniosa de grupos que desempenham diferentes ‘papéis sociais’ (assim
retardando o crescimento econômico) deve ser lamentado como um ‘sintoma de
motim injustificado’. O problema consiste em determinar a melhor forma de
condicioná-‘la’, para que aceite seu papel social, e de melhor ‘tratar e
canalizar’ suas queixas.
Se lembrarmos que a
classe é uma relação, e não uma coisa, não podemos pensar dessa maneira. ‘Ela’ não existe, nem para ter um interesse
ou uma consciência ideal, nem para se estender como um paciente na mesa de
operações de ajuste. Tampouco podemos inverter as questões [..].
(THOMPSON, Eduard P. A formação da classe operária inglesa. Parte
I - A árvore da liberdade. 3v. Coleção Oficinas da História. Tradução:
Denise Bottmann. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. p. 09-14)
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