O Relator Especial das Nações Unidas (ONU) para a Liberdade
de Opinião e de Expressão, Frank La Rue, e a Relatora Especial para a Liberdade
de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, Catalina
Botero, observaram com preocupação a forma pela qual algumas autoridades
estatais reagiram frente aos protestos sociais ocorridos nas Américas nos
últimos meses. Em geral, os participantes dos protestos se manifestaram de forma
pacífica, embora tenham sido relatados atos de violência. Nesse contexto, os
relatores especiais foram informados sobre dezenas de detenções, ameaças e
agressões que teriam sido cometidas contra jornalistas, comunicadores,
manifestantes e usuários de redes sociais que cobriam as manifestações.
Os
relatores especiais observam que no contexto de manifestações e situações de
alta conflitividade social, o trabalho de jornalistas e comunicadores e o livre
fluxo de informação por meios alternativos como as redes sociais são
fundamentais para manter a população informada sobre os acontecimentos; e
cumprem ao mesmo tempo um importante papel ao informar sobre a atuação do
Estado e da Força Pública ante as manifestações, prevenindo o uso
desproporcional da força e o abuso de autoridade.
Os ataques
contra jornalistas que cobrem essas situações violam tanto o aspecto individual
da liberdade de expressão — pois a eles se impede o exercício do direito de
buscar e divulgar informação, além de se provocar um efeito de amedrontamento—
como seu aspecto coletivo — pois se priva a sociedade do direito de conhecer a
informação que os jornalistas obtêm. Por esse motivo, as relatorias
reconheceram que, em virtude da importância do trabalho realizado pelos
jornalistas que cobrem essas situações, compete ao Estado oferecer-lhes o máximo grau de garantia para que cumpram sua função. Esse
dever não se limita a outorgar medidas concretas de proteção para os
comunicadores, mas também inclui a obrigação de criar as condições necessárias
para reduzir o risco do exercício da profissão nessas situações.
O Estado
tem o dever de garantir que os jornalistas e comunicadores que estejam
realizando trabalho informativo no contexto de uma manifestação pública não
sejam detidos, ameaçados, agredidos ou limitados de qualquer forma em seus
direitos por estar exercendo sua profissão. Seu material e ferramentas de
trabalho não devem ser destruídos ou confiscados pelas autoridades públicas.
Como se afirmou no pronunciamento sobre as agressões e detenções cometidas
contra jornalistas nos protestos de Occupy nos Estados Unidos, a proteção do
direito à liberdade de expressão exige que as autoridades assegurem as
condições necessárias para que os e as jornalistas possam cobrir fatos de
notório interesse público como os que se referem aos protestos sociais. As
restrições desproporcionais quanto ao acesso ao local dos fatos, as detenções e
a imputação de acusações pelo cumprimento dos trabalhos profissionais dos
repórteres violam o direito à liberdade de expressão. Cabe às autoridades
restabelecer as garantias afetadas e assegurar o pleno respeito do direito à
liberdade de expressão.
Os
relatores especiais observam que, para realizar seu trabalho de maneira
efetiva, os jornalistas devem ser vistos como observadores independentes e não
como potenciais testemunhas para os órgãos de justiça. Do contrário, os
jornalistas podem sofrer ameaças à sua segurança e à segurança de suas fontes.
Em situações de especial conflitividade social, a percepção de que podem ser
forçados a declarar não só limita a possibilidade do jornalista de ter acesso a
fontes de informação, mas também aumenta o risco de que se converta em alvo de
grupos violentos. Por outro lado, as autoridades não devem exigir de
jornalistas que demonstrem que as declarações de testemunhas divulgadas sobre
os fatos são exatas ou que provem perante um juiz a veracidade das denúncias
veiculadas.
O Estado
não deve proibir nem criminalizar as transmissões ao vivo dos fatos, e deve
abster-se de impor medidas que regulamentem ou limitem a livre circulação de
informação pela Internet e demais plataformas de comunicação. As autoridades
tampouco devem estigmatizar ou estereotipar os manifestantes e suas
reivindicações, evitando fazer generalizações com base no comportamento de
grupos específicos ou fatos isolados. Nesse sentido, as autoridades devem levar
em conta que os funcionários públicos têm uma posição de garante dos direitos
fundamentais das pessoas e que, portanto, suas declarações não podem constituir
formas de ingerência direta ou indireta nos direitos daqueles que pretendem
contribuir para a deliberação pública mediante a expressão e a divulgação de
informação. Esse dever se vê especialmente acentuado em situações de maior
conflitividade social, alterações da ordem pública ou polarização social ou
política, precisamente pelo conjunto de riscos que podem implicar para
determinadas pessoas.
A esse
respeito, os relatores especiais salientam que é fundamental que as autoridades
condenem energicamente as agressões contra jornalistas e comunicadores e atuem
com a devida diligência e celeridade no esclarecimento dos fatos e na punição
dos responsáveis. Os relatores especiais também observam que instruir
adequadamente as forças de segurança do Estado sobre o papel da imprensa em uma
sociedade democrática constitui um passo importante para prevenir a violência
contra jornalistas e trabalhadores de meios de comunicação em situações de
conflitividade social.
Os
direitos de reunião e liberdade de expressão, garantidos na Convenção Americana
sobre Direitos Humanos e no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos,
são fundamentais, e sua garantia é uma condição necessária para a existência e
o funcionamento de uma sociedade democrática. Um Estado pode impor limitações
razoáveis às manifestações com o objetivo de assegurar sua realização pacífica,
ou dispersar aquelas que se tornem violentas, desde que tais limitações sejam
regidas pelos princípios de legalidade, necessidade e proporcionalidade. Além
disso, a dispersão de uma manifestação deve justificar-se no dever de proteção
das pessoas, e devem utilizar-se as medidas mais seguras e menos lesivas para
os manifestantes. O uso da força em manifestações públicas deve ser excepcional
e em circunstâncias estritamente necessárias, em conformidade com os princípios
internacionalmente reconhecidos.
No. R
65/13
13 de setembro de 2013
Fonte:
Comissão Interamericana de Direitos Humanos
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