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quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Liberdade Sindical e representação coletiva: o papel dos Comandos Locais, da Diretoria Sindical nas representações UFC, Unilab e UFCA

Clovis Renato Costa Farias*



                                            
O presente estudo analítico parte de inquietações geradas na greve dos Técnico Administrativos em Educação (TAE), em 2016, quanto a representação estadual do SINTUFCE (Sindicato dos Trabalhadores na UFC, Unilab e UFCA), três instituições federais de ensino, autônomas, e as competências dos Comandos Locais de Greve.

I.                  Representatividade do Sindicato e  do Comando Local de Greve
De início, esclarece-se que a existência de um CLG (Comando Local de Greve), formado de modo democrático e pluralista atende ao Estado Democrático de Direito (art. 1º, I, CF/88), mas possui limitações jurídicas em suas competências e, consequentemente, em no desempenho de suas funções, em especial, por não deter personalidade jurídica e não ter sido a opção principal de representação da categoria pelo Legislador, nem pela Organização Internacional do Trabalho, que centram a representatividade, de regra nas entidades sindicais.
Dispõe a Convenção nº 87 da OIT (Liberdade Sindical e Proteção ao Direito de Sindicalização), art. 2º, que os trabalhadores e os empregadores, sem distinção de qualquer espécie, terão direito de constituir, sem autorização prévia, organizações de sua escolha, bem como o direito de se filiar a essas organizações, sob a única condição de se conformar com os estatutos das mesmas. Tais organizações (sindicatos, confederações e centrais sindicais no modelo brasileiro), devem ter o direito de elaborar seus estatutos e regulamentos administrativos, de eleger livremente seus representantes, de organizar a gestão e a atividade dos mesmos e de formular seu programa de ação, conforme o art. 3º, a aquisição de personalidade jurídica por parte das organizações de trabalhadores e de empregadores, suas federações e confederações, não poderá estar sujeita a condições de natureza a restringi-las (art. 7º).
Quanto aos servidores públicos, a OIT regulamentou na Convenção nº 151 (Direito de Sindicalização e Relações de Trabalho na Administração Pública), que devem ser concedidas aos representantes das organizações reconhecidas de empregados públicos facilidades para permitir-lhes o desempenho rápido e eficaz de suas funções, durante suas horas de trabalho ou fora delas.
A Constituição de 1988, na República Federativa do Brasil, reconhece a representação da categoria pelo sindicato, como pode ser destacado no art. 8º, III:
“Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:
[...]
III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;
[...]
VI - é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho;” (grifou-se)
            Para o Ordenamento Jurídico Brasileiro, como regra, cabe ao sindicato a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas, bem como é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho.
Em caso de greve, atende-se a Lei de Greve (Lei nº 7.783, de 28 de junho de 1989, que dispõe sobre o exercício do direito de greve, define as atividades essenciais, regula o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, e dá outras providências), aplicável aos servidores públicos nos termos de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar os Mandados de Injunção (MIs) nºs 670, 708 e 712, a qual dispõe que o direito de greve deve ser exercido na forma estabelecida nesta Lei (art. 1º, parágrafo único da Lei de Greve). Decisão que perdura até a omissão legislativa do Congresso Nacional em regulamentar a matéria, conforme determina o artigo 37, inciso VII, da Constituição Federal, perdurar.
A entidade sindical deve seguir a vontade da assembleia geral (art. 4º, da Lei de Greve) e conforme seu estatuto, nos termos do art. 4º, § 1º, da norma em comento, o estatuto da entidade sindical deverá prever as formalidades de convocação e o quórum para a deliberação, tanto da deflagração quanto da cessação da greve.
Conforme a legislação pertinente, somente na falta de entidade sindical a assembleia geral dos trabalhadores interessados deliberará para escolher negociador representante coletivo, constituindo comissão de negociação (Comando de Greve ou Comissão de Negociação), como se pode destacar do art. 4º, § 2º, da Lei de Greve:
“Art. 4º Caberá à entidade sindical correspondente convocar, na forma do seu estatuto, assembleia geral que definirá as reivindicações da categoria e deliberará sobre a paralisação coletiva da prestação de serviços.
§ 1º O estatuto da entidade sindical deverá prever as formalidades de convocação e o quórum para a deliberação, tanto da deflagração quanto da cessação da greve.
§ 2º Na falta de entidade sindical, a assembleia geral dos trabalhadores interessados deliberará para os fins previstos no "caput", constituindo comissão de negociação.” (grifou-se)
Para tanto, apesar de legítima a formação dos Comandos Locais de Greve ou outras formações congêneres para fins de negociação, cabe ao sindicato tal defesa e representação, vislumbrando-se possiblidades de ampliação de competências, em caso de previsão expressa e clara nos estatutos respectivos.
            Tomando-se como exemplo o Estatuto do SINTUFCE, veja-se o artigo 2º, I, II, III, X e XI, litteris:
“Art. 2º - O SINTUFCe tem por objetivos e prerrogativas:
I – Defender continuamente os direitos da categoria;
II – Representar, perante autoridades administrativas e jurídicas, os interesses gerais da categoria e os interesses individuais de seus sindicalizados;
III- Celebrar convenções e acordos coletivos;
[...]
X – Lutar pela defesa das liberdades individuais e coletivas, pelo respeito à justiça social, pelos direitos fundamentais dos homens e mulheres e pelo fim de toda e qualquer forma de exploração e opressão;
XI – Avançar na unidade da classe trabalhadora, lutando por sua independência econômica, política e organizativa;”

No mesmo passo, no art. 4º do Estatuto do SINTUFCE, não concede direitos ao sindicalizado de representar a categoria, mas votar e ser votado, participar das assembleias, apresentar sugestões e recorrer, quando necessário, das decisões dos representantes.
Ademais, não se insere nos órgãos do SINTUFCE, art. 7º do Estatuto, qualquer comissão representativa alheia ao sindicato, em caso de greve, sendo reconhecidas com membros não necessariamente integrantes da diretoria: o Congresso, a Assembleia Geral e o Conselho de Representantes (incisos I, II e III).
A própria Assembleia Geral, art. 13 do Estatuto, somente tem previsão estatutária de criação de órgãos externos (comissões e grupos de trabalho) de acordo com os interesses do SINTUFCE (decisão da diretoria colegiada). Assim como, o Conselho de Representantes possui competências limitadas (art. 21 do Estatuto do SINTUFCE).
Eventuais Comandos de Greve ou Comissões de Negociação, podem ir ganhando legitimidade com o tempo e aplicações históricas viáveis, atendendo ao Princípio Democrático, mas suas competências não podem chocar com as da entidade sindical, dispostas no estatuto respectivo e o estatuto não pode contrariar a Lei ou a Constituição. Sendo relevante, em caso de existência de tais órgãos extrasindicais, que haja inserção obrigatória de representantes do sindicato, bem como que os instrumentos negociais firmados sejam firmados pelos representantes eleitos diretores sindicais, sob pena de nulidade.
O papel de tais comissões, de outro modo, é essencial e reconhecido legalmente em caso de inexistência de sindicato representante, como regra. Porém, existindo sindicato, este é ente de representação superior a quaisquer outros Conselhos, devendo atender ao seu Estatuto, que submete, durante sua vigência, inclusive, a Assembleia Geral dos Trabalhadores, que tem competência limitada estatutariamente.
Desse modo, nos termos do art. 4º da Lei de Greve, cabe a entidade sindical correspondente convocar, na forma do seu estatuto, assembleia geral que definirá as reivindicações da categoria e deliberará sobre a paralisação coletiva da prestação de serviços.

II.              Representação estadual, composição de percentuais mínimos e deliberações locais conforme a instituição em que os servidores estejam vinculados
Tomando-se como exemplo os Técnico Administrativos em Educação da UFC, Unilab e UFCA, representados pelo SINTUFCE, historicamente, tem sido constituído um Comando Local de Greve, de regra situado em Fortaleza, uma vez que a UFCA e a UNILAB são de criação recente.
Contudo, diante da autonomia universitária, art. 207 da Constituição de 1988, decorrente da independência formal da UFCA e UNILAB, já implantadas, bem como atendendo-se aos imperativos da lei de greve, decisões do STF sobre a representação em negociação permanente sobre questões locais de greve, como percentuais mínimos, por exemplo, e da lógica de prestação sinalagmática dos serviços que pressupõe direitos e obrigações entre os trabalhadores subordinados e o chefes/patrões detentores do poder diretivo na prestação laboral, há autonomia do Comando Local de Greve em cada uma das instituições.
Situação que não afasta a possibilidade da vinda de representantes para participarem de um Comando Estadual de Greve, para decidir questões gerais, uma vez que a greve dos TAE, em regra decorre de motivos e com negociação nacionais, o que se aplica a representação de membros do Estado do Ceará para a representação nacional, para debate das questões nacionais. Restando, contudo, a autonomia dos comandos locais, formados nas próprias instituições federais de ensino (IFES), para decidirem as questões locais, uma vez que negociam com gestores distintos, cabendo ao sindicato cumprir tais decisões, caso sejam tomadas em Assembleia Geral dos Trabalhadores, devidamente convocada nos termos do Estatuto do SINTUFCE.
Ademais, para que se evite conflitos, a criação de tais instituições extrasindicais deve estar registrada em regulamento próprio, previamente elaborado e de acordo com os limites impostos pela legalidade (Constituição, Lei e Estatuto), para evitar tratamentos desiguais e posturas arbitrárias, de modo que, em caso de não regulamentação, o caminho mais sólido a ser seguido é o da previsão estatutária do sindicato e a legislação referente à autonomia das IFES.
Em termos exemplificativos, no caso do SINTUFCE, dada a ausência de regimento próprio para dispor sobre as competências do Comando de Greve, a não previsão estatutária e a existência, de fato, do Comando de Greve, observa-se que, quando formado o Comando de Greve por IFE, este tem autonomia em relação ao Comando Geral de Greve, uma vez que decorre da natureza autônoma da IFE e da subordinação dos servidores a ela vinculados, cabendo ao sindicato cumprir as decisões tomadas em assembleia geral dos trabalhadores, por instituição federal de ensino onde os servidores prestem seus serviços.

III – Conclusões
Cabe ao sindicato a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas, bem como é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho.
Eventuais Comandos de Greve ou Comissões de Negociação, podem ir ganhando legitimidade com o tempo e aplicações históricas viáveis, atendendo ao Princípio Democrático, mas suas competências não podem chocar com as da entidade sindical, dispostas no estatuto respectivo e o estatuto não pode contrariar a Lei ou a Constituição. Sendo relevante, em caso de existência de tais órgãos extrasindicais, que haja inserção obrigatória de representantes do sindicato, bem como que os instrumentos negociais firmados sejam firmados pelos representantes eleitos diretores sindicais, sob pena de nulidade.
O papel de tais comissões, de outro modo, é essencial e reconhecido legalmente em caso de inexistência de sindicato representante, como regra. Porém, existindo sindicato, este é ente de representação superior a quaisquer outros Conselhos, devendo atender ao seu Estatuto, que submete, durante sua vigência, inclusive, a Assembleia Geral dos Trabalhadores, que tem competência limitada estatutariamente.
A lógica de prestação sinalagmática dos serviços que pressupõe direitos e obrigações entre os trabalhadores subordinados e os chefes/patrões detentores do poder diretivo na prestação laboral, impõe que haja autonomia do Comando Local de Greve em cada uma das instituições.
Quando formado o Comando de Greve por IFE, este tem autonomia em relação ao Comando Geral de Greve, uma vez que decorre da natureza autônoma da IFE e da subordinação dos servidores a ela vinculados, cabendo ao sindicato cumprir as decisões tomadas em assembleia geral dos trabalhadores, por instituição federal de ensino onde os servidores prestem seus serviços.



Clovis Renato Costa Farias*: Advogado Sindical. Doutorando em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC), bolsista da CAPES/CNPq. Vencedor do Prêmio Nacional em Direitos Humanos da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA), Troféu 'Cilindro de Ciro', Placa de Reconhecimento da Coordenadoria Nacional de Liberdades Sindicais do Ministério Público do Trabalho (CONALIS) e do Fórum das Centrais Sindicais no Ceará (FCSEC), medalha dos 80 anos da GLMECE, medalha Cavaleiros de York. Membro Vice Tutor do GRUPE (Grupo de Estudos e Defesa do Direito do Trabalho e do Processo Trabalhista), do Grupo de Estudos Boaventura de Sousa Santos no Ceará, no Curso de Ciências Sociais da UFC, e da ATRACE. Editor e elaborador da página virtual de difusão cultural: Vida, Arte e Direito (vidaarteedireito.blogspot.com/), do Periódico Atividade - ISSN 2359-5590 (vidaarteedireitonoticias.blogspot.com/) e do Canal Vida, Arte e Direito (www.youtube.com/user/3mestress). Autor do livro: 'Desjudicialização: conflitos coletivos do trabalho'.  Graduado em Letras pela Universidade Federal do Ceará (2003), em Direito pela Universidade de Fortaleza (2008), especialista em Direito e Processo do Trabalho  (RJ), mestre em Direito Constitucional (Mestrado em Direito da UFC). Tem experiência como Professor de Literatura, Direito e Processo do Trabalho, Sociologia Jurídica, Direito Constitucional, Mediação e Arbitragem, Direito Sindical, tendo atuado em cursinhos, cursos de graduação, pós-graduação em Direito, nas áreas trabalhista, processual e constitucional; é Advogado (OAB 20.500) de organizações sindicais de trabalhadores e partidos políticos,  mediador coletivo, Vice Presidente da Comissão de Direito Sindical da OAB/CE. Foi Chefe da Assessoria Jurídica do Procurador Chefe do Ministério Público do Trabalho/PRT-7ª Região (2009-2011), Secretário Regional Adjunto do MPT, Chefe do Gabinete do Procurador Chefe/PRT, Assessor Jurídico da Secretaria de Cultura do Ceará (Constituinte Estadual da Cultura e Plano Estadual do Livro), conciliador pelo TJCE/CNJ e orientador no Projeto Cidadania Ativa/UNIFOR, orientador do Escritório de Direitos Humanos da UNICHRISTUS - Projeto Comunidade e Direitos Sociais, membro do Comitê Gestor de Grandes Eventos (SRTE/MTE), delegado eleito da Conferência Nacional do Emprego e Trabalho Decente (OIT/MTE), delegado eleito da UNE (47º CONUNE), secretário geral do Sindicato dos Advogados no Estado do Ceará (Sindace).

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