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quinta-feira, 6 de outubro de 2022

PASÁRGADA (Maria da Paz)


Eu já vivi muitas vidas numa mesma vida


Do sítio ao pequeno Distrito, no sertão agreste cearense

De Fortaleza a São Paulo, uma desafiadora jornada...

São Paulo, há 30 anos a minha trilha


De menina, no pequeno Distrito, a TV preto e branco era 

comunitária, guardada a sete chaves em uma sala na praça

E tinha hora certa para ser ligada e desligada pelo senhor

que tinha a chave


E a geladeira era um grande pote de água fresca no corredor 

da casa


No pequeno Distrito, tinha local próprio para banho

Simples e pequenas cabanas, feitas de pau a pique


A prima Laerte era a líder do nosso bando

Mal o dia de sábado raiava e ela já seguia mata adentro com 

suas pupilas: eu, Ednalba, Evanalba e Valdecira


Sábado era dia de lavar roupa no rio

Era dia de pescar piaba e camarão no riacho

E a sobremesa eram as frutas silvestres, que a gente comia 

no alto das árvores

Parecíamos umas primitivas macacas!


E com a nossa fome de adolescente vivendo em um mundo 

de privação, comíamos tudo o que víamos pela frente, desde 

que não fosse veneno

Laerte tinha faro fino!

Até nas abelhas nós bulíamos

Coitadas, se defendiam como podiam

Deixavam nossos olhos inchados


A maioria de nossos objetos era feita por nossas próprias 

mãos, com o barro da terra, os galhos e os frutos das árvores


Toda essa tecnologia de hoje era impensável nos distantes 

dias da minha infância alegre e triste no sertão


Triste porque vivia separada dos meus irmãos

E com tenros 10 anos era dona de casa, cuidava de mim 

mesma e dos avós, Seu Chico Xavier e Dona Chiquinha


Eu olhava o cenário externo e me sentia prisioneira em um 

mundo estranho


Criei meu próprio ninho interno

Nas asas da imaginação para ele eu sempre voava

Era a minha Pasárgada!

Lá não havia seca, não havia tristeza!

Era tudo colorido!!!


No meu mundo inventado, eu era uma fada que tocava 

harpa, dançava e rodopiava


O tempo passou...

Tudo foi modificado...

Os cenários mudaram...


Mas eu ainda volto à minha Pasárgada

Ao meu ninho de sonhos

Ao meu conto de fadas

É lá que me alimento para enfrentar os desafios da vida!


Que sorte a minha poder voltar sempre à minha Pasárgada!

Lá espio ao longe Manuel Bandeira entre seus reis e 

rainhas!


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