Guy Rider (Diretor Geral da OIT) e Clovis Renato (Assessor Técnico na OIT) |
O Comitê de Aplicação
de Normas inseriu, novamente, o Brasil na “lista suja”, após denúncia, defesa e
análise do caso, na 108ª Conferência Internacional do Trabalho, na Suíça.
Na Conferência
Internacional, seguindo-se à leitura do relatório dos técnicos da OIT que
analisaram o caso Brasil, houve a intervenções da representação dos
trabalhadores, empregadores e governo, bem como de 47 países integrantes da OIT
sobre o caso.
Ao final, com o
julgamento, houve a aceitação da denúncia com recomendações ao Estado parte. Verificaram-se
indícios de inexistência de tripartismo real, em desatendimento à Convenção nº
98 da OIT, de modo foi solicitado ao governo brasileiro que continuasse a analisar,
em cooperação e em consonância com as organizações mais representativas dos
empregadores e dos trabalhadores, o impacto das reformas e decidir se são
necessárias adaptações adequadas.
Ainda, como forma de
comprovar à OIT a existência de tripartismo efetivo, o Comitê impôs ao Brasil
que preparasse, em consulta com as organizações de empregadores e trabalhadores
mais representativas, um relatório a ser submetido ao Comitê de Peritos, para
posterior análise da entidade internacional.
O Governo Brasileiro,
presente na ocasião da divulgação dos resultados, reagiu contra o sistema
tripartite e o multilateralismo, desconsiderando o representante brasileiro
que, tanto a inclusão na “lista suja” quanto o relatório final de conclusão são
tomados por consenso tripartite e conforme relatório dos peritos da OIT.
A insurgência do
Brasil se deu por querer demonstrar, sem sucesso, o cumprimento integral das
normas da OIT, o respeito ao movimento sindical e aos trabalhadores, de modo
que apresentou tese de que a “Reforma trabalhista”, com a Lei nº 13.467/2017 e
normas subsequente, veio a aprimorar as relações de trabalho em atendimento das
normas internacionais. Para o governo, a questão estaria encerrada, nacional e
internacionalmente, e, a contragosto, terá de reabrir a discussão se quiser ser
considerado um país cumpridor dos pactos internacionais junto à OIT.
O Brasil segue em
observação até o cumprimento das recomendações, a serem analisadas nas próximas
conferências, a partir de 2020. Caso se confirme a inexistência de tripartismo
e o descumprimento da recomendação sobre a Convenção nº 98 da OIT, podem
ocorrer penalidades.
A Constituição da
OIT, após a reforma de 1946, não estabelece especificamente as sanções que
devem ser aplicadas aos Estados-membros, mas estipula, art. 33, que “Se um Estado-Membro não se conformar, no
prazo prescrito, com as recomendações eventualmente contidas no relatório da
Comissão de Inquérito, ou na decisão da Corte Internacional de Justiça, o
Conselho de Administração poderá recomendar à Conferência a adoção de qualquer
medida que lhe pareça conveniente para assegurar a execução das mesmas
recomendações.”
Não há um rol
taxativo de sanções, mas a inobservância das obrigações internacionais impostas
pela OIT costuma ensejar “Advertência” por parte da Conferência aos
descumpridores de suas normas. Em regra, trata-se de sanção de ordem moral, com
impactos sociais e econômicos em âmbito internacional.
Em termos históricos,
o mecanismo sancionatório de ordem moral tem se mostrado bastante eficaz, como destaca
Süssekind (Direito internacional do trabalho, LTr, 2006, v.2, p. 1552), uma vez
que os delegados governamentais procuram defender os seus países das acusações
ou dúvidas arguidas sobre o descumprimento das referidas obrigações e da
divulgação internacional de seus países na lista de descumpridores. Algo que
ocorreu na 107 e na 108 CIT, com clara movimentação da Missão Brasileira na ONU
e do Secretário de Trabalho e Previdência, representantes do Brasil.
Há, ainda, a
possibilidade de a Conferência representar o Brasil à ONU, uma vez que o
Estado, de forma grave ou reiteradamente, encontra-se em desacordo e violando as
obrigações contraídas internacionalmente. Viola a Constituição da OIT e se
expõe a aplicação de outras sanções pelas Nações Unidas, conforme disposto nos
artigos 5º e 6º da Carta das Nações Unidas:
“Artigo 5º. O membro
das Nações Unidas contra o qual for levada a efeito qualquer ação preventiva ou
coercitiva por parte do Conselho de Segurança poderá ser suspenso do exercício
dos direitos e privilégios de membro pela Assembleia Geral, mediante
recomendação do Conselho de Segurança. O exercício desses direitos e
privilégios poderá ser restabelecido pelo Conselho de Segurança.
Artigo 6º. O membro
das Nações Unidas que houver violado persistentemente os princípios contidos na
presente Carta poderá ser expulso da Organização pela Assembleia Geral mediante
recomendação do Conselho de Segurança.”
De acordo com a Carta
da ONU, a Assembleia Geral é o órgão encarregado de discutir e fazer
recomendações sobre qualquer questão dentro das finalidades da ONU; considerar
princípios gerais de cooperação na manutenção da paz e segurança
internacionais; elaborar recomendações sobre a solução pacífica de qualquer
litígio internacional; aprovar o orçamento da ONU; e eleger os membros não-permanentes
do Conselho de Segurança da ONU. Entidade que pode aprofundar a questão, caso o
Brasil resolva não cumprir a recomendação do Comitê de Aplicação de Normas da
OIT.
Ficou claro no
contexto que para os 183 países que integram a OIT, o descumprimento de normas
pelos estados que firmam tratados gera impactos econômicos e concorrência
desleal, viabilizando instabilidade econômica internacional e prejudicando os
países que mantêm seus pactos, conforme acordado na OIT. Algo confirmado pela
votação e consenso entre empregadores, trabalhadores e governos que inseriram o
Brasil na “lista suja”, maculando a imagem do governo e, também, prejudicando o
desenvolvimento nacional.
Clovis Renato Costa Farias
(Advogado, Professor Universitário, Assessor Técnico na OIT, membro do GRUPE e da EXCOLA)
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