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quinta-feira, 12 de maio de 2016

Denúncia: CIDH apresenta caso sobre o Brasil à Corte IDH


Washington, D.C. - A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) apresentou à Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) o caso 12.879, Vladimir Herzog e outros, a respeito do Brasil.
O caso está relacionado com a responsabilidade internacional do Estado do Brasil pela prisão arbitrária, tortura e morte do jornalista Vladimir Herzog, ocorrida em uma dependência do Exército em 25 de outubro de 1975 durante a ditadura militar, e pela contínua impunidade dos fatos, em virtude de uma Lei de Anistia promulgada durante a ditadura.
A Comissão estabeleceu que o jornalista Vladimir Herzog foi emprisionado, torturado e morto por agentes do Estado enquanto em custódia em uma depêndencia do Exército. A CIDH indicou que esses atos ocorreram em um marco de graves violações de direitos humanos ocoridas durante a ditadura, e de maneira particular dentro de um padrão sistemático de ações repressivas contra o Partido Comunista do Brasil (PCB), onde dezenas de militantes foram presos e torturados; e pelo menos 12 jornalistas foram detidos por sua militância ou suspeita de militância no PCB. A CIDH determinou que o Brasil é responsável pelas violações dos direitos à liberdade, integridade e vida do jornalista.

Da mesma maneira, a Comissão considerou que as ações do Estado buscaram impedir a militância política de Vladimir Herzog, assim como seu exercício jornalístico, e se manifestaram na forma de restrições ilegítimas de seus direitos à liberdade de expressão e liberdade de associação com fins políticos. Ademais, as violações tiveram um efeito dissuasor e intimidador para outros jornalistas críticos ao regime militar e companheiros de trabalho, e também para a coletividade de pessoas que militavam no Partido Comunista Brasileiro ou simpatizavam com o seu ideário.

No relatório de mérito, a Comissão recomendou determinar, na jurisdição de direito comum, a responsabilidade criminal pela prisão arbitrária, tortura e assassinato de Vladimir Herzog, por meio de uma investigação judicial completa e imparcial dos fatos nos termos do devido processo legal, a fim de identificar os responsáveis por tais violações e puni-los penalmente; e publicar os resultados dessa investigação. A CIDH também indicou que no cumprimento da presente recomendação, o Estado deveria considerar que tais crimes de lesa-humanidade são inanistiáveis e imprescritíveis. Ademais, a CIDH solicitou o Estado a adotar todas as medidas necessárias para garantir que a Lei Nº 6.683/79 (Lei de Anistia) e outras disposições do direito penal, como a prescrição, a coisa julgada e os princípios da irretroatividade e do non bis in idem (direito de não ser julgado duas vezes pelo mesmo crime), não continuem representando um obstáculo para a persecução penal de graves violações de direitos humanos, a exemplo do presente caso. Também urgiu o Estado a outorgar uma reparação aos familiares de Vladimir Herzog, que inclua o tratamento físico e psicológico, e a celebração de atos de importância simbólica que garantam a não repetição dos crimes cometidos no presente caso e o reconhecimento da responsabilidade do Estado pela prisão arbitrária, tortura e assassinato de Vladimir Herzog, e pela dor de seus familiares. E finalmente, a Comissão solicitou ao Brasil reparar adequadamente as violações de direitos humanos, tanto no aspecto material, quanto moral.
A Comissão Interamericana submeteu o caso à Jurisdição da Corte em 22 de Abril de 2016, porque o Estado Brasileiro não cumpriu com as recomendações contidas no Relatório de Mérito. A Comissão submeteu à jurisdição da Corte as ações e omissões estatais ocorridas ou que continuaram a ocorrer após 10 de Dezembro de 1998, data da aceitação da competência contenciosa da Corte pelo Estado do Brasil. Os atos que foram submetidos a Corte Interamericana incluem violações à Convenção Americana de Direitos Humanos e à Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, derivadas da atuação das autoridades estatais no marco do processo aos direitos humanos relacionados com a violação à integridade dos familiares de Vladimir Herzog como consequência da uma situação de impunidade e negação ao acesso a justiça.
Esse caso oferece uma oportunidade para que a Corte Interamericana amplie e consolide sua jurisprudência sobre alcance e conteúdo das obrigações estatais em matéria de investigação e reparação de graves violações de direitos humanos praticados por agentes do Estado durante a ditadura militar. Em particular, a Corte Interamericana poderá reafirmar sua jurisprudência sobre a incompatibilidade com a Convenção Interamericana pela aplicação da Lei da Anistia, e de figuras legais como a prescrição ou coisa em julgado nestes casos. A Corte Interamericana poderá analizar e se pronunciar sobre os obstáculos diversos, que na prática, tem impedido a implementação total e efetiva dos estândares interamericanos sobre essas matérias no contexto brasileiro.
Por outro lado, a Corte Interamericana poderá analisar os efeitos prejudiciais ao exercício do direito à liberdade de expressão no geral como consequência da impunidade e falta de reparação adequada em casos de violência contra jornalistas identificados em certos setores políticos no contexto determinado pelo relatório de mérito.
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.
No. 61/16
Fonte: http://www.oas.org/pt/cidh/prensa/notas/2016/061.asp

Relembre-se que, no caso da Guerrilha do Araguaia, a CIDH definiu:
ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS
Comissão Interamericana de Direitos Humanos
Demanda perante a Corte Interamericana
de Direitos Humanos
Caso 11.552
Julia Gomes Lund e outros
(Guerrilha do Araguaia)
Contra a República Federativa do Brasil
[...]
32.    Em 31 de outubro de 2008 a Comissão Interamericana aprovou o Relatório de Mérito No. 91/08 de 31 de outubro de 2008.  Neste concluiu 
que o Estado brasileiro deteve arbitrariamente, torturou e desapareceu os membros do PCdoB e os camponeses listados no parágrafo 94 deste Relatório. Além disso, a CIDH conclui[u] que, em virtude da Lei 6.683/79 (Lei de Anistia), promulgada pelo governo militar do Brasil, o Estado não levou a cabo nenhuma investigação penal para julgar e sancionar os responsáveis por estes desaparecimentos forçados; que os recursos judiciais de natureza civil com vistas a obter informação sobre os fatos não foram efetivos para garantir aos familiares dos desaparecidos o acesso à informação sobre a Guerrilha do Araguaia; que as medidas legislativas e administrativas adotadas pelo Estado restringiram indevidamente o direito ao acesso à informação desses familiares; e que o desaparecimento forçado das vítimas, a impunidade dos seus responsáveis, e a falta de acesso à justiça, à verdade e à informação afetaram negativamente a integridade pessoal dos familiares dos desaparecidos. Por outro lado, a Comissão Interamericana decid[iu] que não [era] necessário se pronunciar sobre a suposta violação do artigo 12 da Convenção, visto que a mesma est[ava] subsumida nas violações à integridade pessoal dos familiares dos desaparecidos. Em conseqüência, a Comissão Interamericana conclui[u] que o Estado é responsável pelas seguintes violações de direitos humanos:
-        Artigos I, XXV e XXVI da Declaração Americana; e Artigos 4, 5 e 7 da Convenção Americana, em conexão com o Artigo 1.1 do mesmo instrumento em detrimento das vítimas desaparecidas;
-        Artigo XVII da Declaração Americana e Artigo 3 da Convenção Americana, em detrimento das vítimas desaparecidas, em relação com o Artigo 1.1 da Convenção;
-        Artigos I da Declaração Americana e Artigo 5 da Convenção Americana, em conexão com o Artigo 1.1 do mesmo instrumento, em detrimento dos familiares dos desaparecidos;
-        Artigo 13 da Convenção Americana, em conexão com o Artigo 2 do mesmo instrumento internacional, em detrimento dos familiares dos desaparecidos;
-        Artigo XVIII da Declaração Americana, e Artigos 8.1 e 25 da Convenção Americana, em relação com os Artigos 1.1 e 2 do mesmo Tratado, em detrimento das vítimas desaparecidas e seus familiares, em virtude da aplicação da lei de anistia a estes desaparecimentos forçados; e
-        Artigo XVIII da Declaração Americana, e Artigos 8.1 e 25 da Convenção Americana, em relação com o Artigo 1.1 do mesmo Tratado, em detrimento das vítimas desaparecidas e seus familiares, em virtude da ineficácia das ações judiciais não-penais interpostas no marco do presente caso.

33.    Além disso, no seu Relatório de Mérito, a CIDH recomendou ao Estado
1.       Adotar todas as medidas que sejam necessárias, a fim de garantir que a Lei Nº 6.683/79 (Lei de Anistia) não continue representando um obstáculo para a persecução penal de graves violações de direitos humanos que constituam crimes contra a humanidade;
2.      Determinar, através da jurisdição de direito comum, a responsabilidade penal pelos desaparecimentos forçados das vítimas da Guerrilha do Araguaia, mediante uma investigação judicial completa e imparcial dos fatos com observância ao devido processo legal, a fim de identificar os responsáveis por tais violações e sancioná-los penalmente; e publicar os resultados dessa investigação. No cumprimento desta recomendação, o Estado deverá levar em conta que tais crimes contra a humanidade são insuscetíveis de anistia e imprescritíveis;
3.      Realizar todas as ações e modificações legais necessárias a fim de sistematizar e publicar todos os documentos relacionados com as operações militares contra a Guerrilha do Araguaia;
4.      Fortalecer, com recursos financeiros e logísticos, os esforços já empreendidos na busca e sepultura das vítimas desaparecidas cujos restos mortais ainda não hajam sido encontrados e/ou identificados;
5.      Outorgar uma reparação aos familiares das vítimas, que inclua o tratamento físico e psicológico, assim como a celebração de atos de importância simbólica que garantam a não repetição dos delitos cometidos no presente caso e o reconhecimento da responsabilidade do Estado pelo desaparecimento das vítimas e o sofrimento de seus familiares;
6.      Implementar, dentro de um prazo razoável, programas de educação em direitos humanos permanentes dentro das Forças Armadas brasileiras, em todos os níveis hierárquicos, e incluir especial menção no currículo de tais programas de treinamento ao presente caso e aos instrumentos internacionais de direitos humanos, especificamente os relacionados com o desaparecimento forçado de pessoas e a tortura; e
7.      Tipificar no seu ordenamento interno o crime de desaparecimento forçado, conforme os elementos constitutivos do mesmo estabelecidos nos instrumentos internacionais respectivos.
[...]
B.      Prova testemunhal
261.  A Comissão solicita à Corte que receba a declaração das seguintes testemunhas:
•        Victória Lavinia Grabois Olímpio, familiar de vítimas desaparecidas, quem oferecerá testemunho sobre o impacto em sua vida e de sua família pelo desaparecimento no Araguaia de Maurício Grabois (pai); André Grabois (irmão) e Gilberto Olímpio (esposo e pai do seu filho).  Declarará também sobre os esforços para obter verdade e justiça e os obstáculos enfrentados; entre outros aspectos relativos ao objeto e fim da presente demanda.
•        Laura Petit da Silva, familiar de vítimas desaparecidas e da pessoa executada, declarará sobre a identificação de sua irmã Maria Lucia Petit da Silva assim como sobre o impacto em sua vida e de sua família pela execução de sua irmã e o desaparecimento dos seus irmão Lúcio e Jaime; assim como os esforços para obter verdade e justiça e os obstáculos enfrentados; entre outros aspectos relativos ao objeto e fim da presente demanda.
•        Diva Soares Santana, familiar de vítimas desaparecidas e representante dos familiares na CEMDP, quem oferecerá testemunho sobre os esforços dos familiares dos desaparecidos para obter justiça, verdade e reparação, assim como para conhecer o paradeiro dos desaparecidos, entre eles sua irmã Dinaelza Santana Coqueiro e seu cunhado Vandick Reidner Pereira Coqueiro; assim como o impacto sofrido por ela e sua família diante dos fatos do caso; entre outros aspectos relativos ao objeto e fim da presente demanda.
[...]
X.      PETITÓRIO

258.  Com fundamento nos argumentos de fato e de direito expostos, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos solicita à Corte que conclua e declare que a República Federativa do Brasil é responsável por:

a.       violação dos direitos à personalidade jurídica, vida, integridade pessoal e liberdade pessoal (artigos 3, 4, 5 e 7), em conexão com o artigo 1.1, todos da Convenção Americana, em detrimento das 70 vítimas desaparecidas;
b.      violação dos direitos às garantias judiciais e à proteção judicial (artigos 8.1 e 25), em relação com os artigos 1.1 e 2, todos da Convenção, em detrimento das vítimas desaparecidas e seus familiares, assim como da pessoa executada e seus familiares, em virtude da aplicação da lei de anistia à investigação sobre os fatos;
c.       violação dos direitos às garantias judiciais e à proteção judicial (artigos 8.1 e 25), em relação com o artigo 1.1, todos da Convenção, em detrimento das vítimas desaparecidas e seus familiares, assim como da pessoa executada e seus familiares, em virtude da ineficácia das ações judiciais não penais interpostas no marco do presente caso;
d.      violação do direito à liberdade de pensamento e expressão (artigo 13), em relação com o artigo 1.1., ambos da Convenção, em prejuízo dos familiares das vítimas desaparecidas e da pessoa executada, em razão da falta de acesso à informação sobre o ocorrido; e
e.       violação do direito à integridade pessoal (artigo 5), em conexão com o artigo 1.1, ambos da Convenção, em detrimento dos familiares dos desaparecidos e da pessoa executada, pela violação e sofrimento gerados pela impunidade dos responsáveis, assim como pela falta de acesso à justiça, à verdade e à informação.

259.  Como consequência do anterior, a Comissão Interamericana solicita à Corte que ordene ao Estado:

a.       Adotar todas as medidas que sejam necessárias, a fim de garantir que a Lei Nº 6.683/79 (Lei de Anistia) não continue representando um obstáculo para a persecução penal de graves violações de direitos humanos que constituam crimes contra a humanidade;
b.      Determinar, através da jurisdição de direito comum, a responsabilidade penal pelos desaparecimentos forçados das vítimas da Guerrilha do Araguaia e a execução de Maria Lúcia Petit da Silva, mediante uma investigação judicial completa e imparcial dos fatos com observância ao devido processo legal, a fim de identificar os responsáveis por tais violações e sancioná-los penalmente; e publicar os resultados dessa investigação. No cumprimento desta recomendação, o Estado deverá levar em conta que tais crimes contra a humanidade são insuscetíveis de anistia e imprescritíveis;
c.       Realizar todas as ações e modificações legais necessárias a fim de sistematizar e publicar todos os documentos relacionados com as operações militares contra a Guerrilha do Araguaia;
d.      Fortalecer com recursos financeiros e logísticos os esforços já empreendidos na busca e sepultura das vítimas desaparecidas cujos restos mortais ainda não hajam sido encontrados e/ou identificados;
e.       Outorgar uma reparação aos familiares das vítimas desaparecidas e da pessoa executada, que inclua o tratamento físico e psicológico, assim como a celebração de atos de importância simbólica que garantam a não repetição dos delitos cometidos no presente caso e o reconhecimento da responsabilidade do Estado pelo desaparecimento das vítimas e o sofrimento de seus familiares;
f.       Implementar, dentro de um prazo razoável, programas de educação em direitos humanos permanentes dentro das Forças Armadas brasileiras, em todos os níveis hierárquicos, e incluir especial menção no currículo de tais programas de treinamento ao presente caso e aos instrumentos internacionais de direitos humanos, especificamente os relacionados com o desaparecimento forçado de pessoas e a tortura; e

g.      Tipificar no seu ordenamento interno o crime de desaparecimento forçado, conforme os elementos constitutivos do mesmo estabelecidos nos instrumentos internacionais respectivos.

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