Levantamento inédito do Tribunal de Contas dos Municípios
revela o abandono em centenas de obras de prefeituras. São 443 ações em r$
160,4 milhões, que não serão concluídas sem novos gastos
Abandonado
há mais de dois anos, canteiro de obras de uma creche em Pindoretama – Região
Metropolitana de Fortaleza – ganhou ares de lenda junto à população local. Em
meio a estruturas largadas à ferrugem, materiais que desapareceram da noite
para o dia, salas cobertas de entulho e paredes entregues ao tempo e às chuvas,
difícil é acreditar que ali foi investido R$ 1,2 milhão. Se parece paradoxal, o
valor ainda é mínimo diante do quadro geral do desperdício no Ceará: apenas nos
últimos dez anos, foram R$ 160,4 milhões injetados em obras jamais concluídas –
e que até hoje seguem abandonadas.
A
informação integra relatório inédito do Tribunal de Contas dos Municípios
(TCM-CE) sobre desperdício de recursos no Estado, obtido com exclusividade pelo
O POVO. Pelo balanço, são 443 ações paradas, todas em equipamentos que não
deverão ser concluídos sem novos investimentos. Entre problemas mais
recorrentes, está a construção e reforma de escolas (68), de postos de saúde
(60) e asfaltamentos (84) – ação que beneficia mobilidade e saneamento.
A
pesquisa, que será apresentada nesta terça-feira no XVI Simpósio Nacional de
Auditoria de Obras Públicas (Sinaop), aponta que a maioria dos abandonos
ocorreu entre 2009 e 2012. Segundo o levantamento, seguem como principais
motivos de paralisação de obras problemas de projeto e execução (86), falta de
recursos (74) e questionamentos legais (66).
O maior
vilão levantado ainda é o abandono por parte de empresas, responsável por 107
dos canteiros parados. Em alguns casos, uma mesma empresa foi responsável por
esgotar oito obras diferentes. Já na origem dos recursos, a maior parte do
dinheiro desperdiçado vinha do governo federal, chegando a R$ 123,8 milhões
(75% do total).
Prejuízos
e desperdício
Simbólico,
o abandono da creche em Pindoretama segue a estatística. Segundo a Prefeitura,
a obra – iniciada em abril de 2012 e com prazo de um ano para conclusão – foi
abandonada pela empresa ainda na gestão passada. A administração afirma que
emprega recursos para tentar “reativar” a obra, que já teve estrutura
prejudicada pelo abandono. Sem conclusão, poços d’água se formaram no interior
da creche e muitas das ferragens, expostas, já apodreceram.
No momento
da visita da reportagem, informada previamente à Prefeitura, grupo de cerca de
cinco operários estava na obra, removendo entulho do telhado da creche.
Moradores do entorno, no entanto, afirmaram que movimentação era atípica,
estando a obra abandonada há meses.
Entre
moradores da localidade Brisa de Pindoretama – próximo à obra –, o sentimento é
de descrença. “Ninguém sabe onde foi parar esse dinheiro, e ninguém acredita
que saia do papel”, diz a dona de casa Simone dos Santos, 51. No minúsculo
barraco onde vive com outras cinco pessoas, duas crianças estão hoje sem
estudar pela ausência de vagas em creches.
“A obra
estava quase concluída, aí abandonam e deixa tudo ficar podre. Agora ninguém
acredita mais que saia”, diz Nayane dos Santos, 18. Mãe de dois filhos em idade
escolar, ela conta que, assim como diversas mães da região, dependia da conclusão
da creche para as crianças.
Em
Itaitinga, obra de um Posto de Saúde e de uma Academia de Saúde, ambas orçadas
em mais de R$ 120 mil e paralisadas há um ano, também prejudicam a população.
“O pior é quando os filhos têm problema, e não temos o que fazer”, diz a dona
de casa Maria do Carmo, 53.
Fonte: http://www.opovo.com.br/app/opovo/dom/2014/05/17/noticiasjornaldom,3252259/um-canteiro-sem-obras.shtml
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