Por
Priscylla Joca*, de Montreal, para Combate Racismo Ambiental
Em
Montreal, entre 29 de maio e 1 de junho, haverá, pela primeira vez no Canadá,
uma sessão do Tribunal Permanente dos Povos (TPP) a fim de julgar a atuação da
indústria de mineração canadense na América Latina. Os organizadores e participantes desse TPP,
exercendo a solidariedade internacional, demostram estar cientes de que a
degradação ambiental afeta a todo o Planeta, e que, portanto, é necessária a
busca da construção de uma sociedade socio-ambiental e economicamente mais
justa para canadenses e outros povos da Terra. E o que isso tem a ver com o
Brasil?
A empresa
brasileira de mineração, Vale, 2a maior do mundo, é uma das maiores empresas de
mineração no Canadá e atua também na América do Sul. Em 2012 foi eleita pelo
“Public Eye Awards” a pior empresa do mundo. Motivo? O modo como suas operações
e atividades impactam direitos humanos e ambientais. Contudo, há ainda outros
aspectos, que chamam a atenção do Brasil para o TPP Canadá.
75% das
empresas de mineração de todo o mundo estão registradas no Canadá. Segundo a
Due Process of Law Foundation (DPLF), essas empresas são responsáveis por 80%
das atividades de mineração na América Latina[i], onde existem cerca de 1246
empresas em funcionamento[ii]. Dessas, “aproximadamente 120 empresas canadenses
de mineração estão estabelecidas atualmente no [Brasil] – 55 em exploração, 45
em equipamentos e 20 em serviços – e com investimentos previstos de US$ 8
bilhões até 2014”[iii].
Um exemplo
é a Belo Sun Mining, atuante no estado do Pará e que pertence ao grupo
canadense Forbes & Manhattan Inc. Outras empresas atuam ou estudam a
possibilidade de atuação em diversas regiões do Brasil: Luna Gold, no nordeste;
Yamana Gold, Bahia e Goiás; Colossus Minerals, Pará; Lara Exploration, Ceará;
Kinross, Minas Gerais; dentre muitas outras.
Graves
danos e impactos socioambientais e violações de direitos humanos vêm sendo
reportados nos locais em que essas empresas atuam. Na 149ª edição da Comissão
Inter-Americana de Direitos Humanos (Washington, 2013) foi problematizada a
operação das empresas canadenses em países como Brasil, Chile e Peru.
O Brasil
estaria em 3º lugar no mundo em conflitos ambientais tendo a mineração como uma
das principais causas[iv]. Entre aqueles registrados pelo “Mapa de Conflitos
Envolvendo Injustiça Ambiental e Saúde no Brasil”[v], temos o que envolve a
Kinross e a população de Paracatu, Minas Gerais, que vem sofrendo com a
poluição e contaminação das águas e do solo e violações dos direitos à saúde e
ao meio ambiente equilibrado.
Outro
exemplo são os impactos que podem ser provocados pela Belo Sun na Volta Grande
do Xingu, prejudicando indígenas e ribeirinhos que habitam a região [vi].
Segundo Carlos Frederico Marés e Kerlay Arbos, a mineração em terras indígenas
causa “o deslocamento compulsório, a ocorrência de doenças, violência contra os
membros da tribo, principalmente mulheres e crianças, disseminação da população
indígena e muitas vezes a morte”[ vii].
É nesse
contexto que está na pauta do Congresso Nacional brasileiro a votação do Novo
Código de Mineração, cuja proposta vem sendo vista com desconfiança por
ambientalistas. Clarissa Reis Oliveira destaca que “existem vários envolvidos
(…) na proposta (…), mas protagonistas eu diria que são os governos e as
empresas. (…) fica ‘de fora’ quem deveria ser o principal protagonista de toda
e qualquer decisão política, a sociedade”[viii]. As empresas citadas podem ser
compreendidas como as nacionais e as transnacionais, inclusive aquelas sediadas
no Canadá.
No TPP
Canadá, as empresas estão sendo acusadas de violar os direitos fundamentais dos
povos na América Latina, com especial atenção para o direito à vida e ao
ambiente saudável, o direito à autodeterminação dos povos e o direito à plena
cidadania. Já o Estado do Canadá está sendo acusado de contribuir com essa
violação de direitos sustentando a indústria de mineração através de
determinados mecanismos e favorecendo o contexto de impunidade dessas empresas.
Ver a denúncia AQUI e a acusação AQUI.
Os
conflitos ambientais ligados à mineração que ocorrem no Brasil apresentam profundas
semelhanças com os que se passam em outros países da América Latina. Assim, o
resultado desse Tribunal Permanente dos Povos pode fortalecer movimentos
sociais, organizações da sociedade civil e pesquisadores no Brasil que se
organizam em torno da luta por justiça ambiental em casos relacionados a
conflitos provocados por empresas de mineração canadenses.
A fim de
obter maiores informações sobre o tribunal pode-se consultar o site TPP Canadá
, acessar a página do facebook TPP Canadá ou enviar email para
tpp.canada@gmail.com. O site conta com uma versão em espanhol e parte em
português. A programação completa do TPP Canadá
está disponível AQUI.
-
*
Priscylla Joca é Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal do
Ceará. Colaboradora do Coletivo Flor de Urucum – Assessoria em Direitos
Humanos, Comunicação e Justiça. Integrante da Rede Nacional de Advogados e
Advogadas Populares no Ceará (RENAP-CE). Pesquisadora em Direitos Humanos
ligada ao Instituto de Pesquisa Direitos e Movimentos Sociais. Mora atualmente
em Montreal, Canadá. E está é sua primeira colaboração para Combate Racismo
Ambiental, envolvendo a realização do TPP.
Referências:
[i]Informação
disponível em:
<http://www.noticiasdemineracao.com/storyview.asp?storyid=801819027§ionsource=s&highlight=empresas>.
Acesso em 21 Mai. 2014.
[ii]
Informação disponível em:
<http://www.ihu.unisinos.br/noticias/511233-canada-tem-1246-projetos-de-
mineracao-ativos-na-america-latina>. Acesso em 21 Mai. 2014.
[iii]
Afirmação feita por Diane Ablonczy, à época Ministra das Relações Exteriores do
Canadá. Informação disponível em:
<http://www.canadainternational.gc.ca/brazil-bresil/highlights-faits/2012/parcerias.aspx?lang=pt>.
Acesso em 21 Mai. 2014.
[iv]Informação
disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/03/140321_disputas_ambientais_mdb.shtml>.
Acesso em 21 Mai. 2014.
[v]
Informação disponível em:
<http://www.conflitoambiental.icict.fiocruz.br/index.php?pag=ficha&cod=219>.
Acesso em 21 Mai. 2014.
[vi]
Informação disponível em: <http://www.observatoriodopresal.com.br/?p=3647>.
Acesso em 21 Mai. 2014.
[vii]
MARÉS, Carlos Frederico; ARBOS, Kerlay Lizane. A jurisprudência internacional
sobre mineração em Terras Indígenas: uma análise das decisões da Corte
Interamericana de Direitos Humanos. Disponível em
<http://www.revistas.ufg.br/index.php/revfd/article/view/9925>. Acesso em
21 Mai. 2014.
[viii]
OLIVEIRA, Clarissa Reis. Em entrevista a IHU-Online disponível em
<http://racismoambiental.net.br/2013/11/quem-e-quem-novo-codigo-de-mineracao-em-debate-entrevista-especial-com-clarissa-reis-oliveira/>.
Acesso em 21 Mai. 2014.
Fonte:
http://racismoambiental.net.br/2014/05/combate-especial-tribunal-popular-no-canada-tpp-julgara-a-atuacao-da-industria-de-mineracao-canadense-na-america-latina/
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