Em decisão unânime e inédita em questão de ordem, a
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou pedido de
desistência de um recurso especial que já estava pautado para ser julgado. Na
véspera do julgamento, as partes fizeram acordo e protocolaram a desistência.
A relatora,
ministra Nancy Andrighi, ressaltou que o recurso especial de autoria da Google
Brasil Internet Ltda. trata de questão de interesse coletivo em razão do número
de usuários que utilizam os serviços da empresa, da difusão das redes sociais
virtuais no Brasil e no mundo e de sua crescente utilização em atividades
ilegais. Por isso, a ministra sugeriu à Turma que o julgamento fosse realizado.
A ministra
manifestou profundo aborrecimento com a desistência de processos depois que
eles já foram analisados e estão prontos para ir a julgamento, tendo em vista a
sobrecarga de trabalho dos magistrados. "Isso tem sido constante aqui. A
gente estuda o processo de alta complexidade, termina de fazer o voto e aí vem
o pedido de desistência", lamentou.
A ministra
reconhece que o pedido tem amparo no artigo 501 do Código de
Processo Civil (CPC):
"O recorrente poderá, a qualquer tempo, sem a anuência do recorrido ou dos
litisconsortes, desistir do recurso." Ela entende que o direito de
desistência deve prevalecer como regra. Mas, verificada a existência de
relevante interesse público, o relator pode, mediante decisão fundamentada,
promover o julgamento.
Nova
realidade
A ministra
considerou que o referido dispositivo deve ser interpretado à luz da realidade
surgida após da criação do STJ, 15 anos após a edição do CPC. "Infere-se
que o julgamento dos recursos submetidos ao STJ ultrapassa o interesse
individual das partes envolvidas, alcançando toda a coletividade para a qual
suas decisões irradiam efeitos", afirmou Nancy Andrighi.
Além disso, o
ministro Sidnei Beneti afirmou que o artigo 501 do CPC foi concebido em um período em que não
havia número tão elevado de processos, sendo necessário atualizar sua
interpretação.
O ministro Massami
Uyeda lembrou que, nos casos dos recursos repetitivos, a Corte Especial do STJ
já decidiu que, uma vez pautados, não poderá haver desistência em razão do
interesse público envolvido. Para ele, essa interpretação privilegia os
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois a sociedade aguarda
posicionamento da mais alta corte infraconstitucional.
O ministro Beneti
ressaltou que, mesmo com o julgamento de mérito, nada impede que haja a
homologação do acordo entre as partes. "A tese aproveita a toda sociedade
e o acordo fica válido individualmente entre os contendores da demanda
judicial", explicou. A ministra Nancy Andrighi espera mais um efeito: que
as partes e advogados pensem melhor antes de recorrer.
Apesar de rejeitar
a desistência, a Turma transferiu o julgamento para a sessão seguinte porque o
advogado de apenas uma das partes estava presente. O outro precisava ser
intimado.
REsp 1308830
Fonte: STJ
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