Em relação à decisão da Terceira Seção
do Superior Tribunal de Justiça, objeto da notícia "Presunção de violência
contra menor de 14 anos em estupro é relativa", esclarecemos que:
1. O STJ não institucionalizou a prostituição
infantil.
A decisão não diz respeito à
criminalização da prática de prostituição infantil, como prevista no Estatuto
da Criança e do Adolescente ou no Código Penal após 2009.
A decisão trata,
de forma restrita e específica, da acusação de estupro ficto, em vista
unicamente da ausência de violência real no ato.
A exploração
sexual de crianças e adolescentes não foi discutida no caso submetido ao STJ,
nem mesmo contra o réu na condição de "cliente". Também não se trata
do tipo penal "estupro de vulnerável", que não existia à época dos
fatos, assim como por cerca de 70 anos antes da mudança legislativa de 2009.
2. Não é verdade que o STJ
negue que prostitutas possam ser estupradas.
A prática de estupro
com violência real, contra vítima em qualquer condição, não foi discutida.
A decisão trata
apenas da existência ou não, na lei, de violência imposta por ficção normativa,
isto é, se a violência sempre deve ser presumida ou se há hipóteses em que
menor de 14 anos possa praticar sexo sem que isso seja estupro.
3. A decisão do STJ não viola a
Constituição Federal.
O STJ decidiu
sobre a previsão infraconstitucional, do Código Penal, que teve vigência por
cerca de 70 anos, e está sujeita a eventual revisão pelo STF. Até que o STF
decida sobre a questão, presume-se que a decisão do STJ seja conforme o
ordenamento constitucional. Entre os princípios constitucionais aplicados,
estão o contraditório e a legalidade estrita.
Há precedentes do
STF, sem força vinculante, mas que afirmam a relatividade da presunção de
violência no estupro contra menores de 14 anos. Um dos precedentes data de
1996.
O próprio STJ
tinha entendimentos anteriores contraditórios, e foi exatamente essa divisão da
jurisprudência interna que levou a questão a ser decidida em embargos de
divergência em recurso especial.
4. O STJ não incentiva a
pedofilia.
As práticas de
pedofilia, previstas em outras normas, não foram discutidas. A única questão
submetida ao STJ foi o estupro - conjunção carnal mediante violência ou grave
ameaça - sem ocorrência de violência real.
A decisão também
não alcança práticas posteriores à mudança do Código Penal em 2009, que criou o
crime de "estupro de vulnerável" e revogou o artigo interpretado pelo
STJ nessa decisão.
5. O STJ não promove a
impunidade.
Se houver
violência ou grave ameaça, o réu deve ser punido. Se há exploração sexual, o
réu deve ser punido. O STJ apenas permitiu que o acusado possa produzir prova
de que a conjunção ocorreu com consentimento da suposta vítima.
6. O presidente do STJ não
admitiu rever a decisão.
O presidente do
STJ admitiu que o tribunal pode rever seu entendimento, não exatamente a
decisão do caso concreto, como se em razão da má repercussão.
A hipótese, não
tendo a decisão transitado em julgado, é normal e prevista no sistema. O
recurso de embargos de declaração, já interposto contra decisão, porém, não se
presta, em regra, à mudança de interpretação.
Nada impede,
porém, que o STJ, no futuro, volte a interpretar a norma, e decida de modo diverso.
É exatamente em vista dessa possível revisão de entendimentos que o
posicionamento anterior, pelo caráter absoluto da presunção de violência, foi
revisto.
7. O STJ não atenta contra a
cidadania.
O STJ, em vista
dos princípios de transparência que são essenciais à prática da cidadania
esclarecida, divulgou, por si mesmo, a decisão, cumprindo seu dever estatal.
Tomada em dezembro
de 2011, a decisão do STJ foi divulgada no dia seguinte à sua publicação
oficial. Nenhum órgão do Executivo, Legislativo ou Ministério Público tomou
conhecimento ou levou o caso a público antes da veiculação pelo STJ, por seus
canais oficiais e de comunicação social.
A polêmica e a
contrariedade à decisão fazem parte do processo democrático. Compete a cada
Poder e instituição cumprir seu papel e tomar as medidas que, dentro de suas
capacidades e possibilidades constitucionais e legais, considere adequadas.
O Tribunal da
Cidadania, porém, não aceita as críticas que avançam para além do debate
esclarecido sobre questões públicas, atacam, de forma leviana, a instituição,
seus membros ou sua atuação jurisdicional, e apelam para sentimentos que, ainda
que eventualmente majoritários entre a opinião pública, contrariem princípios
jurídicos legítimos.
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