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quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

“Tudo o que era diretamente vivido tornou-se uma representação”


Aconteceu na última quinta-feira, 13, a segunda edição do mês de fevereiro do Cineclube Unifor, com exibição do documentário A Sociedade do Espetáculo (1973), dirigido e roteirizado por Guy Debord a partir de seu livro homônimo, escrito em 1967 e reproduzido quase na íntegra na narração off que se estende por todo o longa.
Construindo uma crítica social ferina a partir dos construtos teóricos de Karl Marx em Contribuição para a Crítica da Economia Política (1859), Debord vai além, expondo fatos que só se tornariam evidentes algumas décadas depois, já na sociedade de mercado da hipermodernidade: a adoção do espetáculo como forma social de abstração, o monopólio da aparência sobre a vida e o “assujeitamento” do indivíduo, que passa a ser mero espectador frente ao protagonismo da mercadoria.
Construído sob a forma de um discurso ilustrado por imagens em preto-e-branco artístico-performáticas, fabris, publicitárias e militares, a obra mostra com impressionante força plástica o fascismo velado da sociedade de consumo, ou, como quer Debord, do espetáculo, em que “tudo o que era diretamente vivido tornou-se uma representação” e “a própria insatisfação tornou-se uma mercadoria”.
A exibição foi seguida de debate com a socióloga Rosa da Fonseca, membro-fundador do movimento Crítica Radical, e Jorge Paiva, estrategista e líder intelectual do grupo. Ambos destacaram o pensamento de Guy Debord como norteador da ideologia do Crítica Radical após o que denominam como uma certa superação de Marx.
A inovação teórica inaugurada por Debord consistiria em uma leitura do capitalismo não mais do ponto de vista da luta de classes, mas a partir de uma crítica do sistema em suas categorias: dinheiro, mercadoria, trabalho etc. Dessa forma, o autor teria se antecipado à derrocada das revoluções socialistas ao sugerir que a possibilidade de superação positiva do capitalismo poder-se-ia dar unicamente a partir de uma ruptura radical com a parafernalha do sistema (algo que Marx e os bolcheviques jamais se propuseram a fazer).
Rosa da Fonseca enfatiza a realidade do dinheiro e do capitalismo como construções histórico-culturais, instâncias não-ontológicas, i.e. não inerentes ao homem, e que estão chegando ao seu limite – “o capitalismo é uma contradição em processo; a maior parte do capital que circula hoje no mundo é fictício, vive-se uma bolha”, afirma.

Em sua incitação à recusa da mediação das relações sociais pelo dinheiro, a socióloga chega a utilizar a metáfora da necessidade da ruptura da Matrix. Para Jorge Paiva, “o indivíduo encontra-se enfeitiçado pelo fetiche da mercadoria”, e isso o impede de enxergar o capital como uma abstração falsa e reificadora, da qual o homem prescindiu durante longos períodos de sua história.
Rosa, por fim, ao esgotamento socioeconômico iminente do capitalismo, lança a questão: “A humanidade vai sucumbir  junto com o sistema? Ou vamos por nossa criatividade à disposição de um novo modelo?”.
O Cineclube Unifor, sob coordenação do professor Márcio Acselrad, é uma atividade de extensão universitária formadora de plateias para o cinema, o diálogo e a crítica. Suas sessões, sempre acompanhadas de debate, ocorrem todas as quintas-feiras, às 13h30 na sala A da videoteca, e são gratuitas e abertas ao público.
Texto: Lia Martins
Ficha Técnica
Título Original: La société du spectacle
Ano: 1973
Direção: Guy Debord
Roteiro: Guy Debord
Gênero: documentário
Duração: 88 min.
Origem: França

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