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domingo, 6 de outubro de 2013

O grande legado do "ocupe Cocó"

Pondo de lado o mérito da questão, a polêmica em torno dos viadutos criou um clima auspicioso para o futuro de Fortaleza. Nunca antes na história dessa Capital, houve tamanho envolvimento de tantos cidadãos em torno de um complexo tema relacionado ao cotidiano urbano da cidade.
O debate (até aqui, oficialmente renegado) é virtuoso. Um marco. Antes, em 2010, a discussão que floresceu em torno do projeto para construir um estaleiro na praia do Titanzinho já sugeria que uma parte mais escolarizada da população não estava disposta a engolir os usuais pratos feitos montados nos gabinetes oficiais.
Felizmente, a ideia do estaleiro da Praia do Futuro foi a pique. A firme oposição de muitos urbanistas, incluindo uma bem fundamentada manifestação do Instituto dos Arquitetos, levou o projeto ao naufrágio. Certamente, nunca mais emergirá.

Agora, a partir do debate ensejado pelos manifestantes contrários à obra dos viadutos, viceja uma impressionante (e surpreendente) mobilização de mentes (especializadas ou não) que se põem a discutir o modelo de desenvolvimento urbano de Fortaleza.
Talvez, o símbolo dessa boa nova esteja nas imagens, transmitidas ao vivo via internet, da inusitada reunião do governador com os manifestantes do “ocupe Cocó”. Em especial, o momento em que o estudante de arquitetura rabisca sua ideia alternativa no chão de areia aos pés da autoridade.
Sim, os pratos feitos estão sendo solenemente recusados. No rádio, na TV, no jornal e nas redes sociais, venho apontando que o maior problema da proposta lançada pela Prefeitura é a desconfiança com que ela é vista. Não há um projeto, não há um autor que o defenda. Há apenas uma maquete e um discurso batendo na tecla de que não há outra opção. Um prato (mal) feito.
Vamos partir da hipótese de que a melhor alternativa, considerando o custo e o benefício urbano, seja a apresentada pela Prefeitura. Talvez até seja. Porém, como saber se não há um método e uma instância plural que permitam as comparações?
É óbvio que a queda de braço tende a ser vencida pela Prefeitura. Ela tem legitimidade democrática e, pelo visto, legal para seguir adiante com seu projeto. Mas, o preço político a se pagar não será baixo. Os desgastes se acumulam e haverá sequelas.
Cid Gomes foi aos manifestantes e, sem disfarce, ofereceu uma falsa vitória. Textualmente: “Para que não pareça que não tiveram vitória (...) eu atribuo a legalização (do Parque) a uma deliberação junto com vocês”. Tomara que o prefeito tenha compreendido a imensidão desse erro e não o reproduza.
A estratégia da Prefeitura parece ser apenas uma: realizar a obra a todo custo (político) nem que seja preciso, mais uma vez, estabelecer o conflito com brutalidades, cassetetes, gás, bombas de efeito moral e uma profusão de desgastantes imagens nos meios de comunicação e redes sociais.
Com uma equipe muito jovem, de pouca experiência política e administrativa, o comando da Prefeitura não consegue elaborar linhas paralelas de atuação capazes de atender ao forte clamor urbano surgido a partir da virtuosa polêmica.
E, graças, esse clamor é moderno. Baseia-se nas melhores experiências urbanas mundo afora. Experiências que inverteram prioridades e replanejaram as cidades substituindo um tipo de urbanismo que já se mostrou ultrapassado e fracassado.
FÁBIO CAMPOS 22/08/2013

Fonte: http://www.opovo.com.br/app/colunas/fabiocampos/2013/08/22/noticiasfabiocampos,3115082/o-grande-legado-do-ocupe-coco.shtml

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